Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Destaque a documento produzido pela ANFIP e pelo DIEESE intitulado "Previdência: reformar para excluir?".

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Destaque a documento produzido pela ANFIP e pelo DIEESE intitulado "Previdência: reformar para excluir?".
Publicação
Publicação no DSF de 15/02/2017 - Página 22
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • REGISTRO, DOCUMENTO, AUTORIA, DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATISTICA E ESTUDOS SOCIO ECONOMICOS (DIEESE), ASSOCIAÇÃO NACIONAL, AUDITOR FISCAL, RECEITA FEDERAL, ASSUNTO, DEFESA, REJEIÇÃO, PROPOSTA, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, PREVIDENCIA SOCIAL, APOSENTADORIA POR IDADE, APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, primeiro, eu quero parabenizar V. Exª, Senador Valadares, pela participação e atuação na reunião de hoje da CCJ, em que nós íamos discutir a sabatina do indicado ao STF, o Ministro Alexandre de Moraes, quando formos surpreendidos com uma manobra para tentar fazer a sabatina no dia de amanhã, e V. Exª teve um papel decisivo. Digo isso aqui e o cumprimento, porque, a partir da sua declaração, os ânimos mudaram. Foi observado – e o Regimento é muito claro – que são cinco sessões a serem cumpridas depois da leitura. Então, eu queria começar parabenizando V. Exª.

    Sr. Presidente, hoje eu subo esta tribuna para falar de um documento extremamente importante feito pela Anfip e pelo Dieese – Previdência: reformar para excluir? Com a participação de vários profissionais, ele foi coordenado pelo professor e economista Eduardo Fagnani e traz dados extremamente importantes sobre o tema.

    Ele começa por discutir a questão das políticas de austeridade, que nós sabemos que não deram certo em lugar algum do mundo, pois desconhecem que o problema fiscal que nós estamos enfrentando decorre de frustração de receitas, porque nós estamos vivendo uma recessão, e de – boa parte – despesas financeiras: juros! Juros! Falam da Previdência, mas, em 2015, foram gastos 486 bilhões na Previdência e 505 bilhões com pagamento de juros.

    Eu quero adentrar aqui em outros pontos levantados por esse importante documento da Anfip e do Dieese. São duas as premissas da reforma de Temer, ambas questionáveis: "o impacto da demografia nas finanças da Previdência" e o chamado "déficit" e o seu "crescimento explosivo". Ambos os mitos são brilhantemente desmontados no documento da Anfip.

    Em primeiro lugar, a longevidade deve ser bem-vinda e não deve ser criminalizada. Sem dúvida, deve-se reconhecer, diz o documento, "que a transformação da estrutura etária populacional impõe mudanças nas políticas públicas". No entanto, há várias maneiras de fazer essas modificações.

    Para a Anfip, existem alternativas para além desse contrabando do Governo Temer, que pretende passar como “pensamento único".

    O documento nomeia, por exemplo, a experiência internacional dos fundos soberanos financeiros baseados em petróleo e gás. Mesmo no caso brasileiro, deve-se observar que, já hoje, a única fonte de financiamento não é a contribuição dos trabalhadores. Como eu falei, há pouco, no aparte que fiz ao Senador Paulo Paim, o Constituinte colocou Cofins, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, PIS/Pasep e, inclusive, loteria esportiva para pagar o seguro-desemprego. Eles estão fazendo esse debate como se não existisse isso. Isso mostra – eu vou dar os números mais à frente – que o sistema de seguridade social não é deficitário.

    Para o documento da Anfip, a alternativa de longo prazo da Previdência é fazer uma transição da base de financiamento da Previdência: da base salarial, como é hoje, para a taxação de renda e riquezas financeiras.

    Afirma o documento:

[...] não é razoável que as projeções do impacto da demografia sobre as contas da Previdência em 2060 sejam feitas com base em relações de trabalho que prevaleciam em 1960. Superar o desafio de financiar a Previdência social no século 21 requer, dentre outras medidas, ampliar as receitas destinadas à Previdência Social, mediante novas fontes de financiamento como a vinculação de percentuais de tributos incidentes sobre a renda e a riqueza financeira.

    Eu já fiz um pronunciamento ontem aqui. Nós estamos entrando na quarta revolução industrial – aqui é biotecnologia, robótica. Nós vamos ter a diminuição dos postos de trabalho. Nós não podemos sustentar a Previdência do futuro com base apenas na contribuição de trabalhadores e empregados. É fundamental a participação do Governo. Por isso, o debate sobre a renda mínima básica é um debate que ganha força no mundo inteiro.

    Passada a questão demográfica, o documento adentra no segundo tema global relevante: a questão do chamado "déficit da previdência". Na verdade, o que acontece, aqui, é uma megapedalada. Ano a ano – à exceção do ano passado, quando houve um ligeiro déficit –, a Anfip demonstra que a Previdência é superavitária. Em um dos pontos altos do documento, é desvelada a inconsistência técnica desses diagnósticos. Passo a ler o que diz o documento da Anfip:

[...] a narrativa oficial se baseia em modelos atuariais que preveem o aumento explosivo nas despesas com benefícios, sem paralelo com as receitas de contribuição no longo prazo. Estes modelos, caso existam, são guardados a sete chaves, bem longe do conhecimento público [é uma caixa-preta]. Na verdade, não se sabe absolutamente nada sobre o modelo atuarial adotado pelo governo e pelos críticos da Previdência que suportam tais projeções. Quais são as variáveis utilizadas? Quais premissas embasam a projeção de cenários para 2060? Quão acuradas são as projeções financeiras e atuariais do [...] [Regime Geral da Previdência Social] que servem de base para as profecias dos críticos da Previdência?

Um grupo de pesquisadores dedicou-se a comparar (i) as projeções contidas nas [...] [LDOs] de 2002 a 2016, com (ii) os resultados efetivamente observados, extraídos dos Anuários Estatísticos da Previdência Social, da Dataprev e do Tesouro Nacional. Foram escolhidos para o teste os anos de 2012, 2013, 2014 e 2015. Esse estudo, que será divulgado em breve, constatou erros de projeção na receita, na despesa e no “déficit” do [...] [Regime Geral]. Concluiu-se que os números apresentados nessas peças orçamentárias, que projetam em 2017 os resultados para 2060, são muito imprecisos, porque eles vão acumulando pressupostos duvidosos à medida que se afastam do presente.

Dada a importância crucial dessas projeções para as decisões que serão tomadas no presente, o Parlamento tem o dever de exigir que o governo abra a “caixa preta” e apresente para a sociedade os critérios utilizados para sustentar o seu discurso. Na ausência desse debate, prevalecerá a visão daqueles que, há mais de 30 anos, apontam para a “catástrofe” [...] gerada pelas contas da Previdência, com o exclusivo propósito de reduzir gastos e regredir direitos dos trabalhadores.

    A partir desse ponto, uma vez esclarecidos os engodos em torno das questões do déficit e do envelhecimento, o documento alinha os pontos específicos da reforma da previdência.

    Agora, observa a Anfip que o Governo Temer tem o desplante de dizer que “a Previdência é o maior item do gasto público no Brasil”. Mentira. Ora, o maior gasto público no País são as despesas financeiras, que consomem mais de 33% do orçamento, R$505 bilhões, de 2015.

     A Anfip também desmente a tese governista de que, em termos de comparação internacional, a proporção de despesas do PIB do Brasil, em torno de 7,5%, é muito elevada. É demonstrado que muitos países desenvolvidos, com maior taxa de envelhecimento...

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – ... gastam em torno de 14% do PIB.

     Com certeza, em relação a países em desenvolvimento, mesmo comparando com a América Latina:

[...] no Brasil mais de 80% dos idosos têm proteção na velhice, o que corresponde a duas vezes mais que a média da América Latina. Portanto, é natural que o gasto previdenciário no Brasil seja relativamente mais elevado que em nações em desenvolvimento que possuem sistemas mais restritivos.

E não se pode deixar de levar em conta, também, o peso do denominador na relação entre o gasto da Previdência e o PIB. [Este é um estudo que a Anfip demonstra neste texto.] Dado um patamar constante de gasto previdenciário, numa trajetória de crescimento da economia, essa relação se reduz [...].

    Estou já concluindo, Senador, muito rapidamente aqui.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Estou dizendo que, você mantendo:

um patamar constante de gasto previdenciário, numa trajetória de crescimento da economia, essa relação se reduz, pela elevação da riqueza. O inverso ocorre em situações de recessão, como a que vivemos em 2015 e 2016 (retração de 3,5% do PIB [em cada ano]). Simulações realizadas na versão completa deste documento, para o período 1995-2015, mostram que, mantendo-se constante o patamar de gastos do INSS [...], dependendo do comportamento da economia, a relação entre o gasto previdenciário e PIB pode variar entre 8,8% e 3,7% do PIB [mantendo o mesmo gasto].

    A diferença é quando a economia cresce e quando a economia entra em recessão.

    Concluindo, Senador Valadares – eu sei que, desculpe-me, extrapolei o meu tempo –, a reforma da previdência é um assunto muito complexo e de suma importância. Este Senado deverá esmiuçar todos os múltiplos aspectos desta reforma, não podemos fazer uma discussão apressada.

    Por tudo isso, Senadoras e Senadores, vou dedicar-me, nos próximos dias, a abordar em profundidade o elenco de temas da proposta de emenda à Constituição desse Governo ilegítimo de Michel Temer. Não faltarei ao compromisso com os trabalhadores e a sociedade. Creio que esse movimento vai crescer aqui. Diferentemente da PEC 55, que é de difícil entendimento, há uma reação muito grande da sociedade, principalmente aos pontos mais sensíveis, como aposentadoria integral com 49 anos de contribuição. Isso significa que um trabalhador teria que começar a trabalhar aos 16 para se aposentar aos 65, só que todo mundo sabe que ninguém fica 49 anos empregado de forma ininterrupta, sempre você sai, há períodos em que você sai do emprego.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RJ) – Então, nem com 65 anos você vai conseguir se aposentar com a integralidade do salário.

    É maldade também o Benefício de Prestação Continuada. Quem recebe BPC é idoso e pessoa com deficiência, com a renda inferior a um quarto do salário mínimo. Pois bem, esse pessoal, agora, vai receber menos que um salário mínimo e aumentaram a idade para 70 anos.

    Eu acho, sinceramente, que a sociedade brasileira vai levantar-se e, com o povo se levantando, nós vamos ter condições aqui de barrar esta reforma da previdência no Congresso Nacional.

    Muito obrigado, Sr. Presidente, agradeço a tolerância.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/02/2017 - Página 22