Discurso durante a 57ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da necessidade de modernização da legislação de recuperação judicial e falências das empresas.

Crítica à política financeira de juros altos praticada pelos bancos no Brasil.

Autor
Dário Berger (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Dário Elias Berger
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
INDUSTRIA E COMERCIO:
  • Defesa da necessidade de modernização da legislação de recuperação judicial e falências das empresas.
ECONOMIA:
  • Crítica à política financeira de juros altos praticada pelos bancos no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 05/05/2017 - Página 55
Assuntos
Outros > INDUSTRIA E COMERCIO
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • CRITICA, LEI DE FALENCIAS, MOTIVO, INEFICACIA, RECUPERAÇÃO JUDICIAL, COMENTARIO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, MODERNIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO.
  • CRITICA, POLITICA, JUROS, APLICAÇÃO, SISTEMA, FINANÇAS, BANCOS.

    O SR. DÁRIO BERGER (PMDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Senador Elmano Férrer, cumprimento V. Exª.

    Vou falar pouco – vou falar pouco.

    Quanto tempo o senhor me permite, Senador Elmano?

    O SR. PRESIDENTE (Elmano Férrer. PMDB - PI) – Pode ficar à vontade. Vinte minutos para V. Exª.

    O SR. DÁRIO BERGER (PMDB - SC) – Vinte minutos? Eu penso que não será necessário, mas agradeço a V. Exª, que se transformou num distinto e dileto amigo aqui no Senado Federal, meu prezado correligionário, que orgulha o Estado do Piauí.

    Eu quero me dirigir a V. Exª, aos Senadores e às Senadoras, nesta quinta-feira, para abordar um tema que reputo também de grande importância no cenário nacional e, sobretudo, de Santa Catarina. Quero falar acerca da necessidade da modernização da legislação referente à recuperação judicial e às falências das empresas em Santa Catarina e no Brasil.

    Isso, Sr. Presidente, é muito importante, porque, se as empresas não vão bem, todos nós também não vamos bem, porque é delas que surgem, que nascem as oportunidades, os empregos, a produtividade, a produção de bens e de serviços que atende a nossa população brasileira.

    E, Sr. Presidente, em fevereiro de 2005, quando o Governo Lula desfrutava ainda de alta popularidade pelo País, iniciava-se ali um novo e longo ciclo de crescimento econômico. Naquela oportunidade, foi publicada uma lei, a Lei nº 11.101, que inaugurou um novo paradigma para a recuperação judicial, extrajudicial e as falências das empresas instaladas no território nacional.

    O advento da nova lei foi saudado por legisladores, pelo meio acadêmico, por especialistas, por empresários como um marco da modernização, em contraposição ao antigo Decreto-lei de nº 7.661, de 1945, que já não respondia mais aos anseios e aos desafios do capitalismo moderno do século XXI.

    Nascia ali, portanto, Sr. Presidente, um novo tempo, nascia ali uma esperança. O objetivo era o de romper barreiras, romper também dificuldades e obstáculos e iniciar um novo tempo de oportunidade e de trabalho.

    Pois muito bem, passados 12 anos, observamos perplexos e atônitos que a Lei nº 11.101, tão recentemente aprovada, editada e sancionada, infelizmente, já nasceu velha e também não ajuda na prática as empresas em dificuldades financeiras que almejam prosseguir em suas atividades mediante a recuperação judicial. A nova lei foi pensada para que as falências ocorressem apenas em casos extremos. Mas o que se vê na prática são empresas fechando as portas todos os dias.

    A Lei nº 11.101 tem vários dispositivos que, em vez de ajudar o empresariado em dificuldades, burocratizou e o afundou ainda mais, criando mais dificuldades. É o caso do prosseguimento da execução contra sócios solidários, de travas bancárias, da classificação em categoria dos credores, do tempo de blindagem da empresa e do alto custo do plano de recuperação, entre outros problemas que engessam muito, substancialmente, qualquer tentativa de reequilíbrio para o empreendedor.

    As causas principais das falências são: crédito proibitivo, com essa taxa de juros praticada no Brasil, os juros são estratosféricos e o crédito fica proibitivo; o custo Brasil elevado; a burocracia.

    Até em tempos mais remotos, foi criado aqui o Ministério da Desburocratização – V. Exª se lembra disso –, que, infelizmente, não prosperou, não avançou. O Brasil continua burocrático, continua pesado. Não anda na velocidade em que precisa andar, para que efetivamente a gente tenha uma economia de mercado competitiva, com o mercado nacional e sobretudo com o mercado internacional.

    A segurança jurídica, ao invés de avançar, também regrediu. As pessoas hoje estão movidas pela incerteza da sua produção, do seu negócio, da sua atividade. Isso, efetivamente, requer de nossa parte uma atitude bastante rápida e objetiva em relação a esse assunto.

    Pior ainda, Sr. Presidente: Não bastasse a Lei nº 11.101, que se encontra defasada e obsoleta, apesar de jovem, ainda tramita no Congresso Nacional um projeto de reforma do Código Comercial que em nada alivia a vida do comerciante ou do empresário em geral. O projeto é tão ruim e desconectado da realidade que talvez seja melhor manter o antigo código, de 1850, da época de D. Pedro II, naquilo que ainda estiver em vigor.

    Dessa forma, recebi com muita preocupação, Sr. Presidente, minha indicação para compor a Comissão Temporária Interna do Senado Federal que examinará o projeto de lei que reforma o Código Comercial, podendo assim contribuir ativamente para a melhoria da legislação e, consequentemente, do ambiente de negócios do povo brasileiro.

    O resultado da combinação entre leis ruins e a crise econômica sem precedentes que nós estamos observando no Brasil é visível. De acordo com Indicador Serasa de Falências e Recuperações, em 2016, foram requeridos 1.863 pedidos de recuperações judiciais, 44,8% a mais do que o registrado em 2015. O resultado é o maior para o acumulado do ano desde 2006, após a entrada em vigor da Lei n° 11.101, de 2005. Em 2015, Sr. Presidente, foram 1.287 ocorrências, contra 828 em 2014.

    As micro e pequenas empresas lideraram os requerimentos de recuperação judicial de 2016, com 1.134 pedidos, seguidas pelas médias empresas, com 470 pedidos, e pelas grandes empresas, com 259 pedidos.

    Meu Estado de Santa Catarina, por exemplo, nunca havia registrado tantos pedidos de recuperação judicial como em 2016. Por isso, a minha preocupação e o meu alerta. Foram 150, um aumento de 158% em relação a 2015, aumento esse substancialmente superior ao registrado em todo o País.

    O Governo precisa enxergar que, se o setor privado vai mal, como já falei, todos vamos mal, todos perdemos, incluindo o setor público, o setor privado, as famílias e todo o povo brasileiro.

    O Poder Executivo vem trabalhando, Sr. Presidente, de forma inédita, com projeções de altíssimos déficits nas contas públicas na própria lei orçamentária, o que não é prudente e chega às raias do absurdo. Isso significa dizer que todo o esforço para enxugar a máquina pública se reverterá apenas, na melhor das hipóteses, em buracos orçamentários superiores a R$100 bilhões por ano.

    A solução para que todos nós, setor público e setor privado, equacionemos esta crise passa por um choque de capitalismo moderno que o Brasil efetivamente nunca experimentou.

    A única solução possível é reformar a Lei n° 11.101, de 2005, para que empresas consigam sobreviver em períodos de turbulência, honrem seus compromissos com credores de forma digna e continuem a gerar emprego, renda e desenvolvimento. É efetivamente uma nova era que precisa ser construída.

    Portanto, eu rogo e peço ao Poder Executivo que publique os resultados do grupo de trabalho criado pela Portaria n° 476, de 16 de dezembro de 2016, do Ministério da Fazenda, com o objetivo de aprimorar essa lei que não atende mais às necessidades do empresariado brasileiro, que é a Lei n° 11.101, de 2005.

    Que essa discussão, Sr. Presidente, chegue aqui ao Senado Federal e à Câmara dos Deputados, para que possamos, a partir do diálogo e do debate, construir um consenso e uma legislação mais enxuta e favorável para quem verdadeiramente sustenta a economia nacional, acrescentando que essas dificuldades todas de falência e recuperação judicial, como já mencionei, estão diretamente relacionadas, na minha opinião, àqueles fatores que acabei de mencionar, mas, sobretudo, aos juros, que continuam sendo proibitivos em nosso País. Chegamos a quase 15%, num passado recente, de juros – 14,25%, meses atrás. É bem verdade que a taxa selic, os juros vêm baixando, mas o que baixou, na verdade, foi a inflação, e não o juro. O juro permanece 6 a 7%, é o maior juro praticado em todos os países em desenvolvimento e no mundo inteiro.

    A dívida pública, com isso, Sr. Presidente, já atingiu R$4,5 trilhões, cerca de 70%, um pouco mais, do PIB, de todas as riquezas produzidas no Brasil. Mas o problema – quero defender aqui, Sr. Presidente – não é necessariamente o tamanho da dívida, mas, sim, o custo que essa dívida representa para o País, porque o custo da dívida no Brasil chega a 17%, enquanto, nos Estados Unidos, é em torno de 1%; enquanto, no Japão, é de menos de 1%. Então, o problema não é o tamanho da dívida. O problema do Brasil é o custo dessa dívida, quanto é pago para captar esse dinheiro para fomentar o desenvolvimento, infraestrutura, investindo em saúde, educação, segurança etc. e tal.

    Outros países têm uma dívida até bem maior do que a brasileira, porém eles têm capacidade de absorver o custo dessa dívida, porque os juros pagos por ela são praticamente insignificantes se comparados ao Brasil. Veja bem: de 1 para 17%.

    Aí, vamos perceber que o maior gargalo que temos de enfrentar neste País está relacionado na execução orçamentária de 2015, de 2016 – é só nós pegarmos lá, Senador Elmano –, e vamos verificar que, no ano passado, nós pagamos mais de R$1 trilhão com os serviços da dívida e o pagamento de juros da dívida. Isso, por si só, nós nem conseguimos mensurar exatamente o que representa, mas, se fizermos um comparativo com o que investimos, vamos dizer assim, na infraestrutura, nas nossas rodovias, nas nossas ferrovias, no nosso parque de portos e aeroportos, vamos chegar à conclusão de que realmente não precisa de muita inteligência para perceber que essa matemática não fecha.

    E, se nós formos ainda comparar com saúde, educação e segurança pública, nós vamos chegar à conclusão de que nós pagamos mais de 100% do serviço da dívida e do juro e investimos em saúde e educação 10% praticamente disso que custa para nós, o que é um absurdo!

    Vamos ser sinceros e objetivos. Não há como um país sobreviver a não ser ampliando a sua pobreza e a sua dependência com aqueles que são mais necessitados, quando, na verdade, nós pagamos mais de R$1 trilhão de juros da dívida e de rolagem da dívida e investimos menos de R$100 bilhões com saúde, menos de R$100 bilhões com educação, e, se eu não me engano – não tenho exatamente esse número –, mas na construção de novas rodovias, em manutenção das nossas rodovias, cerca de R$8 bilhões. Aí percebemos que há buraco esperando buraco para entrar, e o Governo não dá conta de fazer com que o nosso sistema rodoviário possa transportar a nossa riqueza nacional. Então, veja bem, as reformas que nós precisamos fazer neste País.

    Para concluir, Sr. Presidente, uma das questões que me chamou muito a atenção na comissão de controle presidida pelo Senador Ataídes... Nós tivemos uma audiência pública ontem em que fomos tratar de cartões de crédito, juros do cartão de crédito. Os juros do cartão de crédito hoje giram em torno de 400 e tantos, 490%, quase 500%. Isso é de rir. Eu fiz uma pergunta lá e quero indagar aqui: por que os bancos públicos, por exemplo, não entram nessa questão e praticam juros menores, forçando efetivamente o mercado financeiro a baixar essa taxa de juro? Mas me parece que os bancos públicos também estão surdos. Eles não estão vendo com nitidez o que precisa ser visto para que efetivamente possam fazer uma intervenção no mercado financeiro para baixar a taxa de juro.

    Por mais incrível que pareça, eu, como gosto mais de Matemática do que de discurso – aliás, o meu forte nunca foi o discurso. Eu sempre tive na minha mente a máxima de que pouco discurso e muito trabalho é uma forma mais dinâmica e moderna das administrações públicas –, quero dar um exemplo para V. Exª, para os Senadores e Senadoras: se nós, com uma taxa de juros de 490%, hoje, contrairmos uma dívida no cartão de crédito de R$1 mil, no ano que vem, nessa mesma data, nesse mesmo dia, nesse mesmo horário, nós estaremos devendo para o cartão de crédito, para a instituição financeira cerca de R$4,5 mil. E o que é pior, Sr. Presidente: daqui a cinco anos, nós estaríamos devendo R$1,13 milhão. E, daqui a dez anos, R$1,28 bilhão.

    Então, eu quero perguntar aqui ao Plenário do Senado Federal...

(Soa a campainha.)

    O SR. DÁRIO BERGER (PMDB - SC) – Eu quero perguntar a V. Exª se V. Exª não tem interesse em que eu lhe empreste – eu estou com vontade de empresar – R$1 mil para receber, daqui a dez anos, R$1,28 milhão. Aliás, para V. Exª, dada a estima que tenho, eu posso fazer uma redução desse juro; posso diminuí-lo em 50%, diminuí-lo em 70%, em 80%, porque realmente me parece brincadeira. Chega às raias de termos que brincar, porque não é possível que eu possa deparar com uma realidade dessa natureza no Brasil do século XXI, que nós estamos vivendo.

    Eu até peço aos meus assessores que estão aqui no plenário do Senado Federal que chequem esses números, porque eles chegam às raias do inacreditável. É calculado assim porque é juro composto, é juro sobre juro, e juro sobre juro. Lamentavelmente, é o que se tem na triste realidade do momento financeiro que nós estamos vivendo no País.

    Então, meus amigos, eu vou ficando por aqui, agradecendo a V. Exª, Senador Elmano Férrer, desejando a V. Exª uma ótima semana. E, na semana que vem, estaremos aqui de novo no plenário do Senado Federal.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/05/2017 - Página 55