Discurso durante a 59ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao Governo Federal e preocupação com o aumento da violência contra trabalhadores rurais e índios.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Críticas ao Governo Federal e preocupação com o aumento da violência contra trabalhadores rurais e índios.
Publicação
Publicação no DSF de 09/05/2017 - Página 65
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PERIODO, GESTÃO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, APREENSÃO, AUMENTO, VIOLENCIA, VITIMA, TRABALHADOR RURAL, INDIO, COMENTARIO, DEMISSÃO, PRESIDENTE, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), DEMARCAÇÃO, RESERVA INDIGENA, REFORMA, DEFESA, MELHORIA, TRATAMENTO, COMUNIDADE INDIGENA.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Srª Presidenta, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, internautas que nos seguem pelas redes sociais, eu quero voltar, na tarde de hoje, a chamar a atenção de todas as brasileiras e dos brasileiros para os ataques que têm sido organizados por este Governo facínora – não há outro termo que descreva este Governo – de Michel Temer aos nossos povos indígenas, aos nossos povos originários.

    Tenho denunciado, desta tribuna, sistematicamente, o crescimento assombroso da violência no campo contra os trabalhadores rurais e contra os índios, que tem contado com o apoio irrestrito do Governo Federal, dados o silêncio e a inércia diante do avanço criminoso de pistoleiros e matadores de aluguel sobre essas minorias.

    Já disse – e reitero – que este Governo tem as mãos sujas de sangue, que o Ministro da Justiça é um pau mandado dos latifundiários e que os massacres que andam ocorrendo são de inteira responsabilidade desta Administração nefasta, que os aplaude e os patrocina ao proteger o poder político e o poder econômico que estão por trás desses massacres.

    Na última semana, quem confirmou todas essas denúncias – vejam bem –, quem confirmou todas essas denúncias foi o próprio Presidente da Funai, o Sr. Antônio Fernandes Toninho Costa, demitido do cargo na última sexta-feira sem nem sequer ter sido notificado da decisão do próprio chefe, sem nem receber um telefonema. Soube que havia sido exonerado quando leu o Diário Oficial da União. Pois vem dele – vem dele; não do Cimi, não de nenhum Parlamentar de esquerda – exatamente a informação de que foi demitido porque não admitia cometer malfeitos na Presidência da Funai; porque não aceitou ingerência política. Saiu, segundo ele, porque era honesto, em contraponto a este Governo dissoluto, em que o próprio Ministro da Justiça chama de "grande chefe" o maior líder de uma organização criminosa.

    Então, está aí a prova mais bem-acabada de que Michel Temer comanda um acelerado processo de desmonte de todas as nossas políticas indigenistas, políticas que, ao longo dos governos do PT, foram aceleradas para pôr fim aos conflitos entre as mais de 250 etnias indígenas e os produtores rurais, especialmente no que se refere às demarcações de terras.

    Mas este Governo, sustentado por latifundiários e ruralistas, parou o processo e deu início ao desmonte da Funai. Cortou mais de 340 cargos de uma estrutura já precária, retirou mais de 40% do seu orçamento e vai asfixiando anos de conquistas, em um violento retrocesso que expõe os índios às ações criminosas.

    E quero sublinhar aqui, mais uma vez, a fala do Presidente exonerado da Funai, que foi nomeado por Michel Temer – abro aspas:

Incompetência é a desse governo [Ele foi chamado de incompetente], que quebrou o País, que faz cortes de 44% no Orçamento porque não teve competência de arrecadar recursos. Incompetência é a desse governo, que é incapaz de convocar os 220 concursados. Incompetência é a desse governo, que faz corte de funcionários e servidores da instituição.

    Fecho aspas. Foi o que afirmou Toninho Costa.

    Quando o Presidente da Funai, que foi nomeado pelo próprio Temer, deixa o cargo dizendo que o Governo não tem política para os índios e que o País está às vésperas de um período de ditadura, isso tudo é muito grave e exige do povo brasileiro uma reação imediata para tirar do poder essa camarilha que tomou o poder de assalto.

    Este é um País de 8,5 milhões de quilômetros quadrados. Há espaço para todos, absolutamente todos – para os produtores rurais, que sustentam 48% da nossa pauta de exportações com o seu trabalho, mas há lugar também para o que restou dos nossos povos originários, pouco mais de um milhão de pessoas que têm o sagrado direito de ter demarcadas as terras que eram suas e lhes foram retiradas por invasores europeus.

    O último grande ato de demarcação no Brasil foi feito pela Presidenta Dilma em favor dos índios de Mato Grosso, antes de ser deposta pelo golpe parlamentar de 2016. Mas até hoje nada foi demarcado, nada seguiu em frente. É aí onde temos muitos problemas, porque, se 55% dos nossos índios estão na Amazônia, outros 45% estão pulverizados em várias regiões do País, onde se encontram apenas 1,6% das suas terras, muitas delas sem demarcação, gerando tensão, conflitos, violência e mortes.

    Em Pesqueira, por exemplo, no Agreste de Pernambuco, agressões ao povo xukuru – rotineiramente cometidas no governo Fernando Henrique Cardoso – levaram o Brasil à Corte Interamericana de Direitos Humanos, onde estamos sendo julgados por violações cometidas contra essa etnia, lá no meu Estado.

    Na semana passada, a ONU criticou duramente o Brasil pela falta de compromisso com os nossos povos originários, que, cada vez mais, têm sido vítimas de agressões, dada a leniência com que o Governo Federal trata os criminosos. E toda máquina governista realmente opera para atacar os nossos índios.

    Não bastasse o Ministro da Justiça se portar como um capacho da Bancada Ruralista, que ele representa, assistimos à vergonhosa CPI da Funai montada pelos governistas na Câmara dos Deputados, que produziu um dos maiores descalabros já vistos neste Parlamento: um relatório final, que deve ser votado esta semana, que pede o indiciamento de 103 pessoas, muitas dos quais ativistas extremamente ligados à defesa dos direitos indígenas.

    E de quem é essa aberração? Quem produziu esse relatório esdrúxulo? Foi ele, sim, o Deputado Nilson Leitão, do PSDB – PSDB! O Deputado Nilson Leitão é aquele deputado ruralista e escravocrata que apresentou um projeto de lei para que os trabalhadores rurais deixem de receber salário e passem a ser pagos com mercadorias, como se nós vivêssemos em um regime de servidão.

    O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PSD - MT) – O Senhor está mentindo.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE) – Não. É verdade! V. Exª pode estar mentindo neste papel difícil que cumpre de ser aqui o único representante do Governo a defender isso que aí está, mas eu estou aqui falando a verdade. É um projeto dele, e o Brasil todo o conhece. Aliás, já houve até gente dentro do PSDB que pediu a expulsão desse cidadão. Acho que se o PSDB é realmente um Partido que está preocupado em se manifestar como uma força democrata já deveria tê-lo expulsado há muito tempo.

    Aliás, esse juiz Sérgio Moro já foi fazer homenagem a ele lá em Mato Grosso – já foi fazer homenagem a este Deputado.

    É dele, é desse expoente do PSDB, o Partido que é o maior partícipe e patrocinador deste Governo pútrido de Michel Temer, o relatório que criminaliza a defesa dos índios e propõe a extinção da Funai.

    Então, nós precisamos fazer essa denúncia para que os brasileiros, como bem disse o próprio Presidente demitido da Fundação, despertem para o grave momento político por que estamos passando.

    Eu tenho reiteradamente vindo a esta tribuna para alertar que os conflitos no campo estão disparando e que o Governo, além de nada fazer, estimula essa onda ao proteger os autores intelectuais e materiais dessa violência. Estamos transformando, uma vez mais, o interior do Brasil em um barril de pólvora cuja explosão só vai vitimar os mais fracos.

    Nesse sentido, eu venho juntar às minhas denúncias mais esta fala do Presidente demitido da Funai. E vou chamá-lo, Presidenta Regina Sousa, a nossa de Comissão de Direitos Humanos do Senado, para que ele venha de viva-voz esclarecer o grave teor das suas acusações contra o Governo do qual era representante.

    Nós precisamos urgentemente salvar os nossos índios desses massacres que se avizinham. Precisamos salvar os nossos trabalhadores rurais. Precisamos salvar os trabalhadores sem-terra deste País.

    Precisamos salvar o povo pobre do Brasil, que não aguenta, que não tem como suportar um ano e meio deste desgoverno, deste descalabro chamado Governo Michel Temer.

    É por isso que temos insistido, Presidenta Regina Sousa, em que renuncie o Sr. Michel Temer. Faça alguma coisa pelo Brasil, agregue alguma coisa de positivo à biografia de Vossa Excelência: renuncie, saia de onde está, dê ao Brasil a oportunidade de convocar eleições gerais ainda neste ano, para mudar este Congresso Nacional, para mudar os governos estaduais, para mudar o Presidente da República e eleger alguém que tenha a legitimidade, o respeito, a confiança do povo brasileiro, para tentar tirar este País dessa crise.

    Nós não vamos parar de cobrar isso. Nós não vamos parar de denunciar este Governo. E o maior retrato do que é este Governo hoje é que, no início, depois que eles deram o golpe parlamentar, este plenário era cheio todos os dias. Faziam fila para ocupar esta tribuna para defender este Governo. Hoje, tirando um ou dois que resolveram assumir esse papel suicida, ninguém mais faz isso; ninguém da Base do Governo vem aqui para defender essa reforma trabalhista, que pretende acabar com direitos elementares e históricos conquistados pelos trabalhadores e pelas trabalhadoras brasileiras, Srª Presidenta – coisas elementares como o direito de programar as suas férias, que não terão mais; coisas elementares como poder cumprir a jornada de 44 horas por semana, receber integralmente o seu salário e não ser submetido a esse chamado emprego intermitente, uma palavra bonita para descrever sabe o quê? Que você vai ficar 24 horas à disposição do seu patrão, que o chama para trabalhar na hora em que quiser, apenas com cinco dias de antecedência. Você vai trabalhar se houver trabalho. Se trabalhar cinco horas, recebe cinco horas; se trabalhar três, recebe três.

    Ora, para onde estamos marchando, caminhando? Nem nos momentos mais sombrios da história do Brasil alguém pensou em aplicar uma legislação como essa. Nem a ditadura militar, nem os generais, que governaram por 21 anos, no Brasil, tiveram a coragem – a coragem – de propor coisas como estas; a coragem de propor que uma mulher grávida possa trabalhar num ambiente insalubre; a coragem de dizer que um acordo feito entre um patrão e um trabalhador ameaçado de demissão ou entre um patrão e um grupo de trabalhadores representando aquela empresa, ou seja, que eles podem fazer um acordo, e esse acordo valha mais do que a lei.

    É como se pegássemos uma galinha para que ela negociasse com a raposa a sua sobrevivência. E mais: além de o trabalhador poder negociar individualmente sem a presença do sindicato, ainda querem enfraquecer os sindicatos, acabando com o imposto sindical, propondo medidas para restringir a atividade do sindicato. É como se dissessem o seguinte: "Você agora vai negociar diretamente comigo, mas tudo que puder significar um fortalecimento da sua reivindicação, do que você defende nessa negociação você não terá mais. Seremos você e eu. E, se quiser, aceite; se não quiser, a porta da rua está ali para sua serventia". Isso se chama modernização? É o que eles estão chamando de modernização.

    Para completar, vem a terceirização. Todas as estatísticas no Brasil mostram que o trabalhador terceirizado ganha muito menos, está muito mais submetido a condições precárias de trabalho, sofre muito mais acidentes de trabalho e, portanto, é o que se chama modernidade.

    Hoje eu vi aqui um Senador que eu respeito muito falando, comentando as eleições francesas. De um lado, ele dizia: "Não, não pode ser aquela volta ao passado". E o que é isso que está acontecendo hoje, se não é uma volta ao passado?

    No campo, há alguém aí lançando a ideia da volta do barracão. O barracão, em Pernambuco, começou a ser combatido quando Miguel Arraes foi Governador pela primeira vez, em 1963, e demorou muito tempo para acabar com ele. No barracão, o trabalhador rural era obrigado a comprar ali pelo preço que o dono do barracão definia, e era descontado do seu salário. É a modernidade. São as relações modernas que querem trazer para o Brasil.

    Não! O que, na verdade, querem fazer é que os pobres do Brasil, os trabalhadores, os aposentados, as mulheres, os trabalhadores rurais, os índios, os pobres paguem por uma conta que não foi criada por eles. Basta analisar o lucro dos bancos, basta analisarmos isso; a cada dia cresce mais, aumenta mais e não para.

    O Governo aprovou aqui uma proposta de emenda constitucional que congelou por 20 anos os gastos do Orçamento da União, inclusive os gastos sociais, exceto o pagamento dos juros. Significa que quanto mais o brasileiro empobrece mais os banqueiros ficam ricos. E aqueles que jogam tudo o que têm também no sistema financeiro enriquecem muito mais.

    Por isso, Srª Presidenta, quero concluir aqui minhas palavras – agradecendo a tolerância de V. Exª – dizendo que apresentarei, ainda nesta semana, requerimento para que o ex-Presidente da Funai seja convidado à Comissão para que ele possa nos dizer, de viva voz, aquilo que ele já falou para o Brasil inteiro e que o povo não deve se cansar de ouvir e saber que estamos sendo governados, ou melhor dizendo, desgovernados por aqueles que têm compromisso não com o povo brasileiro, mas com as elites econômicas do País.

    Muito obrigado, Srª Presidenta.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/05/2017 - Página 65