Discurso durante a 191ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentário sobre a necessidade de melhoria na segurança pública no País.

Autor
Sérgio de Castro (PDT - Partido Democrático Trabalhista/ES)
Nome completo: Sérgio Rogério de Castro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA:
  • Comentário sobre a necessidade de melhoria na segurança pública no País.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/2017 - Página 57
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, APROVAÇÃO, PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA, OBJETIVO, MELHORAMENTO, SEGURANÇA PUBLICA, REDUÇÃO, VIOLENCIA, AMBITO NACIONAL, REFERENCIA, PROGRAMA DE GOVERNO, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), RESULTADO, COMBATE, AUMENTO, CRIME, POPULAÇÃO CARENTE.

    O SR. SÉRGIO DE CASTRO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PDT - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, todos os ouvintes, telespectadores e internautas, quero juntar-me ao esforço dos Senadores que têm preocupação com a segurança em nosso País.

    "Da pobreza, tira o forte riqueza mais nobre."

    É, no mínimo, inquietante o discurso que atribui à exclusão social, à miséria, o principal motivo do aumento da criminalidade em nosso País.

    Fosse verdade, hoje, com os índices de desemprego e da indigência no Brasil, já teríamos sucumbido. Fossem todos criminosos não haveria espaço para a vida honesta no País. Fosse a pobreza a causa maior e única da criminalidade, o Piauí teria os maiores índices de ocorrência de roubos furtos e homicídios do País, mas os maiores índices, como se sabe, estão nos Estados mais ricos.

    Alguns dos mais pobres países africanos têm baixas taxas de crime, enquanto a Nação mais rica do Globo, os Estados Unidos, tem uma alta taxa de criminalidade.

    Olhando para as últimas décadas, mesmo havendo um incremento na inclusão social decorrente do crescimento da nossa economia no período, nós tivemos um aumento de 10,6%, de 2005 a 2015, na taxa de homicídios.

    Ora, fosse a miséria o principal motivo do aumento de criminalidade em nosso País, teríamos um resultado diverso.

    Por que a maioria opta por levar uma vida honesta?

    Porque o homem prosperou vivendo em sociedade e só é possível viver em sociedade respeitando-se algumas regras. Na verdade, estamos sujeitos a três mecanismos que mantêm o comportamento dos indivíduos sob controle. O primeiro deles é o autocontrole, um processo interno que estabelece o compromisso de cada um com as regras sociais.

    Para o antropólogo Luiz Eduardo Soares, o autocontrole é a força maior que evita a barbárie. O solo mais firme e fundo da mediação que evita o crime é o reconhecimento de seu valor, que a criança precisa receber na família e no seu grupo social. Por outro lado, se a criança só experimenta rejeição, ressentimento, insegurança e ódio de si mesma, ela tende a não se identificar com esses valores da sociedade.

    É claro que isso depende dos valores que importam para os pais e amigos. Faz diferença se ela cresce entre pessoas que acham bacana ser esperto e levar vantagem ou se o comportamento ideal é ser trabalhador e honesto.

    Outro importante fator de controle que desvia as pessoas do cometimento de crimes é o medo da punição, ou seja, o controle formal que a sociedade exerce sobre cada indivíduo. Quanto mais forte for a mensagem de que a punição está ali, à espreita, menor será o cometimento de crimes.

    É a essência do recado do jurista italiano Cesare Beccaria, que no século XVIII proferiu a célebre frase: “O que inibe o crime não é o tamanho da pena, mas a certeza da punição." Quanto mais eficiente for o sistema criminal, mais forte será o sentimento de punição e justiça.

    Mas talvez seja a cultura o mais importante meio de controle social. As normas culturais, notadamente as normas éticas, ainda que desprovidas de sanções aplicáveis pelo Estado, produzem o efeito da repulsa social, forte inibidor de condutas moralmente indesejadas.

    A vergonha, a moral e outras normas sociais que não estão escritas em lei alguma, mas nos foram ensinadas por pessoas próximas e emocionalmente importantes - nossa mãe, nossa avó, o irmão mais velho, o grupo de amigos -, são as primeiras normas que nos impedem de desviar para o caminho do crime. O cinismo em relação às regras sociais formais, infelizmente, tem sido uma característica do controle social informal brasileiro.

    O grau de coincidência entre as normas legais e as regras informais de conduta é diretamente proporcional à legitimidade que a população enxerga no governo, nas autoridades e na lei. Em outras palavras, quanto mais legítimos os governantes e as autoridades, maior será o respeito da população às regras daquela comunidade.

    Nós, brasileiros, infelizmente, estamos mal. Em uma sociedade desigual, os menos favorecidos tendem a achar que regras tão injustas não se aplicam a eles, e a delinquência aumenta.

    É inegável o lamentável impacto que os maus exemplos acarretam, principalmente daqueles que deveriam ser inatacáveis em suas reputações, líderes políticos de uma Nação. Infelizmente, acontece conosco que autoridades e políticos não se envergonham com as graves acusações de corrupção que assombram a sociedade. Ao contrário, ao invés de pedirem desculpas, alimentam o discurso do ódio, imputando a supostas perseguições fatos incontroversos que revelam seus delitos. E, ainda que sejam inocentes, deveriam dar o exemplo, afastando-se de suas funções para provar a inocência que alegam.

    Mesmo assim, a maioria que acha o Brasil injusto, gente que não vê perspectiva de melhorar na vida, nem por isso pega um revólver e sai por aí roubando e matando inocentes. O que mantém essas pessoas honestas são justamente as regras informais, em geral herdadas da família, da escola ou da religião.

    Pesquisas realizadas na periferia de grandes cidades americanas entre jovens pertencentes às classes menos favorecidas mostram que os mais propensos à criminalidade e à delinquência são aqueles com menor envolvimento com as instituições sociais tradicionais.

    A pobreza diminui o contato entre pais e filhos e enfraquece a transmissão do legado familiar sobre como viver em sociedade. Pai e mãe passam o dia fora trabalhando e deixam os filhos para serem criados na rua ou adotam solução pouco melhor, que é a de deixar suas crianças aos cuidados de babás, muitas vezes com problemas familiares maiores do que as crianças de que cuidam. O fato é que as crianças crescem à mercê da influência de outros jovens, muitos já delinquentes. Isso quando há pai e mãe.

    "O grau de delinquência de uma comunidade é diretamente proporcional ao número de famílias monoparentais, ou seja, em que os filhos são criados só pelo pai ou pela mãe", afirma o sociólogo Tulio Kahn, do Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e o Tratamento do Delinquente.

    Não bastasse isso, em vizinhanças mais pobres, cujas casas geralmente são compartilhadas por várias famílias e vivem abarrotadas, os jovens preferem passar seu tempo fora de casa, longe dos olhos dos pais. Infelizmente, a disponibilidade de creches e escolas públicas de tempo integral no Brasil é muito pequena.

    No Espírito Santo, avançamos muito nos últimos anos com a construção e operação de um grande número de creches, em especial na Região Metropolitana de Vitória, e com o Projeto Escola Viva, que oferece atividades atrativas e úteis à boa formação dos estudantes durante todo o dia. Mas o número de instalações ainda é insuficiente.

    É bom lembrar que a maior parte da criminalidade gerada em meio à pobreza tem como vítima os próprios pobres, que ainda vivem o drama de não ter a quem recorrer. Por isso que, em muitos bairros de baixa renda, a presença da polícia e de serviços de saúde é muito menor.

    Nesse aspecto, também no meu Estado do Espírito Santo, temos um projeto de prevenção de violência muito eficaz, um projeto de Estado, e não de um governo; um projeto da sociedade, pois começou no governo anterior e foi ajustado, mas mantido, pelo atual. Intitulado inicialmente Estado Presidente, hoje nominado Ocupação Social.

    Reitero que esse projeto tem dado ótimo resultado. Recebeu reconhecimento internacional, tem levado aos bairros de baixa renda os equipamentos públicos indispensáveis à melhoria da qualidade de vida, e, como consequência, colhe-se a redução da violência.

    Sr. Presidente, Srªs Senadoras, no meu entendimento, vivemos uma crise social em que os fatores inibidores da criminalidade estão fragilizados. O processo acelerado de concentração populacional nos grandes centros urbanos, como ocorrido a partir da segunda metade do século passado, difere do europeu pela rapidez do seu crescimento, e isso o agrava. Esse processo esgarçou os vínculos culturais mais importantes de uma população oriunda do meio rural.

    Também os valores morais que só a família, a religião - a religião sem fanatismo - e as boas relações de vizinhança podem preservar estão se perdendo, pois a família está em crise, as religiões mercantilizadas e as relações de vizinhança empobrecidas pelo medo, pela correria do dia a dia.

    Os dados não deixam dúvidas: os bairros marginalizados das principais cidades brasileiras respondem por aproximadamente 35% da população nacional. Por outro lado, a morosidade da Justiça penal e até mesmo a leniência com que se trata aquele que delinquiu, que quase nunca cumpre a pena estabelecida, gera a sensação de permissividade, que anula o medo da punição.

    Assim, no meu sentir, a vitimização do delinquente, implícita no discurso que justifica o crime pela miséria, além de injusta para com a grande maioria de trabalhadores honestos, afasta-nos do verdadeiro enfrentamento do problema da criminalidade. É preciso reverter o processo de aglomeração urbana, através de investimentos capazes de gerar emprego nas pequenas e médias cidades do País e mesmo ordenar o espaço urbano das grandes cidades, de modo a oferecer às populações das periferias equipamentos e serviços públicos adequados.

    É preciso também a revisão da nossa política criminal, fazendo com que a certeza da punição volte a ser um inibidor do crime. E, mais do que tudo, é preciso ter coragem para uma abordagem que não se quede diante de patrulhas ideológicas, nem que seja encantada pelo discurso fácil do ódio social. E, sobretudo, é preciso que nos concentremos sobre os temas mais sensíveis para nossa sociedade, como este da segurança.

    Recentemente, a Senadora Simone Tebet pronunciou-se sobre a necessidade de um maior esforço do Parlamento brasileiro, a começar por aqui, pelo Senado Federal, para aprovação de projetos que tratam da questão da segurança pública, alertando para o que bem chamou de vulcão da violência.

    A nobre Senadora citou três projetos que merecem destaque. Entendo que não necessitamos de mais projetos. O que temos de projetos no Congresso resolve todos os problemas do Brasil. E ela cita três desses projetos, prontos para serem votados na CCJ: a Proposta de Emenda à Constituição 118, do ex-Senador Pedro Taques, que impede o contingenciamento de recursos dos fundos de prevenção à violência; e dois projetos de lei do Senador Wilder Morais: um, que disciplina o uso de veículos aéreos não tripulados pelos órgãos de segurança; e o PLS 285, de 2016, que autoriza a doação de armas apreendidas para as forças de segurança.

    Cito, também, a PEC 33, de 2014, a chamada PEC da segurança pública, de autoria do titular do meu mandato, Senador Ricardo Ferraço, que, de forma acertada, inclui no texto da Constituição a segurança pública como uma das obrigações de competência comum entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Essa PEC, já aprovada pelo Senado, está aguardando andamento na Câmara dos Deputados.

    O cenário é gravíssimo! É urgente que sejam pautados, aperfeiçoados, relatados, discutidos e votados - e espero que aprovados - todos esses projetos da pauta da segurança no Senado.

    Em meu Estado, o Espírito Santo, ainda que consideremos a crise na segurança pública gerada pela paralisação de policiais, no início deste ano, que reverteu a tendência de sete anos contínuos de queda dos homicídios, felizmente a expectativa é de que, em 2018, voltemos a reduzir esse indicador de violência, contribuindo assim para a redução da média do Brasil. A reação do Governo do Espírito Santo foi firme e competente, não cedeu à chantagem dos grevistas.

    Se analisarmos os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, há uma estrita relação entre o aumento dos homicídios e o crime de tráfico de drogas. Felizmente também tem havido queda dessas ocorrências em todo o País. Mas são dados que nos deixam estarrecidos.

    Devemos fazer a nossa parte, dando prioridade ao que é prioritário para a sociedade brasileira.

    Não há tempo a perder. A insegurança vivida por nossas famílias, por todos nós, nos aprisiona, enquanto aqueles que cometem violência estão soltos.

    Não há tempo a perder. Ou vamos punir os que cometem crimes ou vamos reclamar dos que são presos e depois são soltos. Isso é uma questão de Estado, é uma questão inadiável.

    A citação final, Sr. Presidente, é de H. G. Wells, que diz que "Os crimes e as más vidas dão-nos a medida do fracasso de um Estado. Todos os crimes são, afinal, o crime de uma comunidade."

    O problema é nosso, precisamos tratá-lo com prioridade e urgência.

    Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/2017 - Página 57