Pela Liderança durante a 29ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre a situação fiscal brasileira.

Autor
Veneziano Vital do Rêgo (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PB)
Nome completo: Veneziano Vital do Rêgo Segundo Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Reflexões sobre a situação fiscal brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 21/03/2019 - Página 72
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, ENFASE, SITUAÇÃO FISCAL.

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB. Pela Liderança.) – Presidente, meus cumprimentos. Boa noite a V. Exa., a todas as companheiras Senadoras e aos demais companheiros Senadores que se encontram em Plenário.

    Sr. Presidente, eu retorno a esta tribuna. Se não estiver enganado, se a memória não faltar a mim neste instante, da última vez que tratei deste tema – e fatalmente voltarei, Senador Jorginho, a fazê-lo nestes próximos dias e meses, porque trataremos de questões que envolvem a reforma previdenciária –, eu dizia que há algo em mim que incomoda profundamente, quando este debate proposto, que é necessário que seja feito, realizado... Há uma certa ausência de – desculpem-me a expressão – honestidade ao tratar o tema como sendo aquele que vai definitivamente pôr-nos, a nós, ao Brasil, na linha da superação do déficit fiscal; que vai, com a sua possível... Ninguém sabe, pois, da maneira como está, é muitíssimo difícil que assim o seja, mas é como se fosse o que vai corrigir tudo aquilo que nós vemos, temos e que nos aflige, querida Senadora Rose de Freitas. Isso me incomoda, porque, convictamente, não é a proposta de uma reformulação previdenciária por si, isoladamente, que vai nos levar à consecução desejada de mudanças eficientes que nos ponham na linha desejada. Por isso, fiz um pronunciamento, e fiz questão. Não é do meu feitio. Quem me conhece sabe que sou um tanto quanto avesso, querido Senador Eduardo Gomes, às falas por escrito. Prefiro muito mais o improviso. Isso é muito de quem foi talhado nas disputas eleitorais, andando de canto a canto em nosso Município, nas condições de candidato, à época, à Câmara Municipal, à Prefeitura de Campina Grande, e depois no Estado, fazendo e ocupando a tribuna e tendo podido conviver com grandes figuras, efetivos tribunos. Então, eu gosto da fala que realça muito mais o sentimento proveniente do coração. Mas nesse tema particular, até para que não pudéssemos – e eu não me permitiria – perder alguns dados estatísticos, alguns números, meu querido Senador Irajá, eu fiz questão de escrevê-los.

    Então, no momento em que o Congresso Nacional recebe a proposta de reforma da previdência, cujo principal mote vem a ser a redução do déficit fiscal, quero fazer no dia de hoje, aqui desta tribuna, uma breve análise da situação fiscal do nosso País, conhecida de todos, quiçá, mas sob outro prisma.

    Sempre foi muito mais fácil culpar servidores públicos, aposentados, pelos sucessivos rombos nas contas nacionais, mas poucos falam sobre a contribuição dos mais aquinhoados para essa grave situação fiscal. Refiro-me aos grandes conglomerados financeiros nacionais. Os quatro maiores bancos do País, com ações listadas na bolsa – Banco do Brasil, Bradesco, Itaú, Unibanco e Santander – lucraram juntos, no ano passado, R$69 bilhões, maior valor da história, lucro e rendimento. O conjunto desses bancos cresceu quase 20% de 2017 para 2018, superando com folga os principais indicadores econômicos em um momento de grave crise do País. Em 2018, a inflação oficial, por exemplo, ficou em 3,75%. O PIB cresceu apenas 1,1 pontos percentuais, e o CDI, taxa de juros que remunera a maioria dos investimentos de renda fixa, rendeu 6,42%. Notemos ainda que os cinco maiores bancos concentram algo em torno de 80%, Senador Girão – 80%! –, dos depósitos bancários do Brasil, mas estranhamente esses bancos pagam apenas 18% de alíquota efetiva de tributação – portanto, menor do que pagam as pessoas físicas com renda a partir de R$3.700,00. Veja o paradoxo, veja a injustiça.

    Então, vivemos em um País em que bancos pagam menos impostos do que os próprios trabalhadores. Mas se os lucros são tão altos e o mercado tão concentrado, não deveriam gerar uma arrecadação muito maior do que o que se verifica na realidade? Não deveria a tributação sobre esse segmento ser maior? E por que não os tributar? Também há os dividendos pagos a acionistas das grandes empresas.

    Notem bem, Sras. e Srs. Senadores, que graças à Lei nº 9.249, de 1995, lucros e dividendos pagos a acionistas são isentos de tributos. Diversos especialistas afirmam que essa total isenção de impostos sobre lucros e dividendos é uma das maiores injustiças do Sistema Tributário Nacional. É também um dos principais motivos para mantermos a sociedade brasileira como uma das mais desiguais do mundo, além de contribuir com a crônica falta de verba para saúde, educação, infraestrutura, inclusive a própria previdência.

    E aqui faço um pequeno parêntesis apenas para mencionar um dado estarrecedor: o montante dos 500 maiores devedores da previdência chega à casa dos R$425 bilhões. Em 2016, o valor dessa dívida já era equivalente a três vezes o chamado déficit da previdência. Por que, então, o Governo não se esforça para recuperar esses créditos? E já ouvi, já li, inclusive na linha do que interessa ao próprio Governo, que essa busca, que essa recuperação chegaria a não valer a pena, porque seria no montante de R$50 bilhões, o que não sugeriria tamanho esforço – imaginemos nós, Sras. e Srs. Senadores.

    Mas voltando à questão dos dividendos pagos a acionistas, apenas para que nós tenhamos uma real ideia da dimensão da injustiça praticada contra a população brasileira: em 2016, cerca de 2,5 milhões de pessoas, pouco mais de 1% da nossa população, ganharam R$269 bilhões – 1% da nossa população ganhou R$269 bilhões, auferiu esse valor a título de lucros e dividendos, segundo dados da própria Receita Federal. Ora, em 2018, o déficit da previdência foi da ordem de R$195,2 bilhões, e o resultado primário do Governo Federal ficou negativo em R$120 bilhões. Então, a simples taxação progressiva de lucros e dividendos pagos a acionistas seria mais do que suficiente não só para equacionar esse déficit da previdência, mas também para equilibrar o próprio resultado primário do Governo.

    Além dessa sugestão, uma outra seria aumentar a própria tributação dos lucros dos bancos, a exemplo do que foi feito na Hungria, e não faz tanto tempo. Vamos aos fatos: no ano de 2010, o então Primeiro-Ministro daquele país, Viktor Orbán, num discurso histórico, vale salientar, afirmou que quem não desenvolve atividade produtiva e geradora de empregos deveria ser penalizado e anunciou um imposto especial válido apenas por três anos sobre o setor bancário húngaro. Segundo Orbán, os bancos ganharam muito dinheiro nos anos anteriores à crise e deveriam, portanto, contribuir com a recuperação da economia. Assim, rapidamente a Hungria saiu da crise e tornou-se uma das economias mais prósperas da Europa.

    Na esteira desse exemplo, por que, então, não instituir um imposto especial que nós estabeleceríamos sobre os lucros dos bancos e os dividendos pagos a acionistas, por um período determinado, a título de contribuição? Com isso, o Governo estaria equacionando esse déficit fiscal e o próprio déficit da previdência, sem impor à população os pesados sacrifícios previstos no projeto de reforma da previdência, da maneira como ela está apresentada.

    Eu sempre faço questão de salientar, pondo a vírgula necessária, porque não quero aqui apresentar-me como uma pessoa que não está disposta a esse debate para correções e aperfeiçoamentos da matéria como ela assim chegou à Câmara Federal. Não há essa indisposição, não há esse preconceito, mas nós não podemos concordar, absolutamente. Hoje pela manhã, antes da Ordem do Dia, tratando sobre outros temas, eu fazia essas menções. É inadmissível que nós imaginemos que nessa proposta esteja mais um pedido, quase que uma imposição a agricultoras e agricultores brasileiros, principalmente do nosso Nordeste, e quem sabe qual é a realidade de vida desse povo tem a dimensão exata de como se abateriam sobre eles sacrifícios horrendos e não mais suportáveis.

    Eu ouvi, certa feita, o Senador Paulo Paim se pronunciando da mesma forma em relação aos agricultores do Sul. Imaginem quando pomos em comparação a realidade do sul do País com a realidade do nosso Semiárido, Senador Eduardo Gomes.

    O Sr. Eduardo Gomes (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - TO) – Senador, um aparte, por favor.

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB) – Pois não, Senador.

    O Sr. Eduardo Gomes (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - TO) – São duas estreias hoje de V. Exa. na tribuna, e a minha nos apartes.

    Nós estamos aqui nesses dias conhecendo o Senado Federal. Tenho certeza de que V. Exa., com muito mais experiência e com a carreira política brilhante que fez em Campina Grande, na Paraíba, emprestará a este Congresso Nacional e a este Senado um nível exemplar de debate.

    Eu quero parabenizar V. Exa. pela abordagem e, principalmente, pela disposição ao debate e às discussões que traz a esta Casa, ao Congresso e, em seguida, ao Senado, como o debate sobre a reforma da previdência e tantos outros temas importantes para o País.

    Fico feliz de chegar aqui pelo nosso Tocantins e ser colega de V. Exa. Sei da qualidade que V. Exa. vai emprestar ao debate e tenho certeza de que os brasileiros, principalmente os nordestinos e os paraibanos, estão seguros de que mandaram para cá um grande representante.

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB) – Muito grato.

    O Sr. Eduardo Gomes (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - TO) – Meu aparte é nesse sentido. Estou atento aqui ao seu discurso, porque tenho certeza de que servirá de fonte para os debates que nós vamos fazer aqui nesta Casa.

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB) – É uma colaboração muito modesta, sinceramente digo, meu querido amigo, companheiro, Senador Eduardo Gomes, que fala muito mais pelo coração, porque tais merecimentos não os tenho. Aqui está um Senador esforçado para não decepcionar os nossos conterrâneos paraibanos, que me distinguiram com a oportunidade incomum que tenho de poder fazê-lo, assim como fiz como Deputado Federal, como Prefeito durante oito anos na nossa amada e sempre querida Campina Grande, e como Vereador, escola que me permitiu ter grandes lembranças e que tem sido fundamental nessa nossa caminhada.

    Continuando, Sr. Presidente, muitos em nosso País se perguntam qual é a verdadeira causa desse déficit. As respostas geralmente oferecidas pela ortodoxia convencional para explicar isso são, de um lado, o populismo fiscal, ou seja, os gastos decididos pelos governantes para agradar eleitores e satisfazer seus interesses eleitorais, os desperdícios de uma burocracia estatal, e, de outro, a corrupção de políticos e servidores públicos. Embora esses sejam fatores que contribuam para o crescente déficit, eles não são suficientes para explicá-lo. Mais importante do que eles é a elevada taxa de juros praticada em nosso País. Sem dúvida, a taxa de juros paga pelo Estado brasileiro é muito mais uma causa do que uma consequência da crise fiscal.

    Segundo a última proposta orçamentária enviada pelo Governo, em 2020, a dívida bruta deverá ultrapassar 80% do PIB. Destaco que a dívida bruta brasileira fechou o ano passado em patamar bem acima da média do Brics – grupo formado pelo nosso País, Índia, China, Rússia e África do Sul –, dos países da América Latina e também das nações classificadas como "emergentes", segundo dados do Fundo Monetário Internacional.

    É verdade que muitos países desenvolvidos têm uma dívida maior do que a do Brasil, mas o risco deles é bem menor pelo fato de a maior parte de seu endividamento ter taxas prefixadas, ou seja, que não se alteram quando a taxa básica de juros sobe para conter eventuais pressões inflacionárias.

    Já no nosso caso pátrio, é muito diferente. Quase 30% do total dos títulos da dívida pública brasileira são pós-fixados, com a remuneração atrelada ao juro básico da economia. Logo, qualquer alta de juros vai ter aqui um efeito direto na composição da dívida. Ora, sabemos muito bem que a taxa de juros paga pelos títulos brasileiros vem sendo altíssima há muitos anos. Embora hoje a Selic esteja em 6,5 pontos percentuais, ela já chegou a 45 pontos percentuais em 1999. Então é essa elevadíssima taxa a causa central desse brutal endividamento do setor público brasileiro, porque o juro incidente sobre essa rolagem é muito alto.

    Até agora não vimos nenhum governo, seja com viés de esquerda, de centro-esquerda, liberal, atacar frontalmente essa situação. Fala-se apenas em reforma da previdência como solução para o déficit, mas sem mexer nesse ponto central do problema, que obviamente afetaria também a altíssima lucratividade dos bancos.

    O Governo do ex-Presidente da República conseguiu aprovar a PEC dos gastos públicos, que engessou o Estado brasileiro e limitou investimentos em áreas essenciais da vida nacional. Conseguiu também aprovar uma reforma trabalhista – e aqui registro que votei contra – numa conjuntura de plena crise econômica, reforma essa bastante contraditória, pois seu efeito final é a diminuição da população economicamente ativa. Vejam os senhores, meus queridos amigos cidadãos que nos acompanham pela TV Senado, seu efeito final é a diminuição da população economicamente ativa, com menos empregos formais, o que significa menos pessoas contribuindo para a previdência. E portanto, uma menor arrecadação, um verdadeiro tiro no pé.

    Sinceramente não acho que seja prudente ao Congresso Nacional aceitar essa solução simplista da maneira como ela se apresenta, apressando-a para resolver um problema que tem raízes muito mais profundas, como é o caso do nosso déficit fiscal. Precisamos debater seriamente o assunto, tanto aqui no Senado, quanto na Câmara dos Deputados, sob pena de aprovarmos uma reforma inócua, que além de não equacionar em definitivo a questão desse déficit já citado, poderá prejudicar a ampla maioria dos trabalhadores brasileiros, ao elevar ainda mais a idade e o tempo de contribuição.

    Está mais do que na hora de chamarmos os que mais têm e mais lucraram desmedidamente neste País, em detrimento dos mais pobres, dos mais humildes, a participarem. Se tivermos de fazer uma reforma da previdência, que a façamos com a consciência, mas que não a coloquemos como solução para as finanças públicas nacionais.

    Sr. Presidente, eu agradeço a V. Exa., agradeço a atenção, o aparte do Senador Eduardo Gomes. Eu continuarei e tenho por mim a convicção de que nós não podemos tratar de forma simplória, simplista, sem que nós nos detenhamos em outras razões e outras causas que fizeram com que chegássemos a esse déficit fiscal. Então, grato pela atenção de todos.

    E vamos, ao longo destes próximos dias, inclusive com a própria definição de ofício de S. Exa. o Presidente Davi Alcolumbre, que estabeleceu e já fez as indicações para a composição da Comissão que tratará, paralelamente à Câmara Federal, o assunto, nós vamos também, como suplente, já que com muito gosto pedi a S. Exa. o Senador Davi Alcolumbre para substituir o meu nome na condição de titular dessa Comissão para reservar à nossa querida companheira da Bancada do Senado Independente, Eliziane Gama, essa condição. E não tenho dúvidas de que, com muito mais competência, brilhantismo e com muito mais conhecimento de causa, haverá de nos ajudar profundamente.

    Despedindo-me, eu quero aqui abraçar cordialmente um amigo e irmão, o Deputado Federal Vitor Valim, aqui comigo hoje, integrando a Assembleia Legislativa. Figura que tive a honra de dividir, durante quatro anos, bancadas na Câmara Federal, com o mesmo partido, com a mesma legenda.

    Aqui eu faço essas menções porque são menções sinceras e francas a um companheiro combativo, cearense, bom de briga – no bom sentido. Um grande abraço, meu Deputado Vitor Valim.

    Um grande abraço a todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/03/2019 - Página 72