Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Repúdio à decisão do Presidente Jair Bolsonaro de determinar às Forças Armadas a comemoração do 31 de março de 1964.

Comentários sobre a oitiva do Ministro da Justiça, Sérgio Moro, pela Comissão de Constituição e Justiça no dia 27 de março de 2019.

Autor
Veneziano Vital do Rêgo (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PB)
Nome completo: Veneziano Vital do Rêgo Segundo Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER EXECUTIVO:
  • Repúdio à decisão do Presidente Jair Bolsonaro de determinar às Forças Armadas a comemoração do 31 de março de 1964.
SEGURANÇA PUBLICA:
  • Comentários sobre a oitiva do Ministro da Justiça, Sérgio Moro, pela Comissão de Constituição e Justiça no dia 27 de março de 2019.
Publicação
Publicação no DSF de 28/03/2019 - Página 27
Assuntos
Outros > PODER EXECUTIVO
Outros > SEGURANÇA PUBLICA
Indexação
  • REPUDIO, JAIR BOLSONARO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INCENTIVO, COMEMORAÇÃO, GOLPE DE ESTADO, DITADURA, MILITAR.
  • COMENTARIO, AUDIENCIA, SERGIO MORO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PUBLICA, ASSUNTO, AUSENCIA, SEGURANÇA.
  • DEBATE, PROPOSTA, COMBATE, CRIME, AUTORIA, EXECUTIVO.

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB. Para discursar.) – Presidente, obrigado pela atenção. Obviamente, não há razões para agradecimento. V. Exa., além de todos os valores reconhecidamente dos seus pares, dos seus conterrâneos do País, é um gentleman, fidalgo, não no sentido que desconheçamos, mas no trato para com todos os seus companheiros. Meus cumprimentos a V. Exa.

    Boa tarde a todos os companheiros e companheiras, funcionários do Senado Federal, aos que nos acompanham em seus lares Brasil afora.

    Saúdo a presença de S. Exas. os Senadores Humberto Costa e Paulo Rocha, estimado Senador Styvenson do meu sempre e querido Estado do Rio Grande do Norte, Senador Plínio, enfim, todos os companheiros e companheiras.

    Senador Anastasia, eu poderia até, ao tempo em que o Senador Humberto Costa falava da tribuna e fazia menções em uma reação plenamente compreensível, diante do que nós vimos anteontem, quando Sua Excelência o Presidente da República conclamava, chamava, se não incitava, provocava, para que os quarteis pudessem comemorar o 31 de março de 1964, como se essa data fosse comemorativa para o País, eu o aparteava, mas também já vinha... Desde o instante primeiro, Senador Plínio, eu vi as declarações de Sua Excelência o Presidente da República são declarações que trazem consigo algo que nos deixa perplexos diante da altíssima responsabilidade que todos nós temos como representantes eleitos, em especial, particularmente, daquele que responde pelo mais alto cargo da República. É de lamentar.

    E não é só um pronunciamento simplesmente, mas a reação de quem sabe, mesmo não tendo vivido na pele. Sou nascido no ano de 1970, portanto, poderia aqui não ter a dimensão exata, mas acompanhei isso de perto, Presidente Anastasia, porque, no meu lar, próximo a mim, e fora dele, outros tantos depoimentos ao longo desses últimos anos e pude absorver, como decerto V. Exa.

    Não tem cabimento algum, não apenas nos dias atuais, mas em quaisquer momentos, que estejamos a referendar ditaduras, sejam estas à esquerda, sejam estas à direita, nenhuma delas. Quaisquer que sejam os propósitos ditatoriais devem merecer de todos nós a repulsa, a atenção, a vigilância.

    Foi por essa razão que, quando me dirigi à S. Exa. o Senador Humberto Costa, eu muito gostaria que nós todos... Meu querido e que tem formação militar, mas que nem por isso, tenho absoluta convicção, deixa de defender, porque aqui veio e veio de forma extraordinária, por força do seu trabalho, veio de maneira democrática, pela escolha soberana e livre do povo potiguar, norte-rio-grandense. Não tem cabimento que haja, das palavras expostas, trazidas por parte do Presidente da República, o incitamento para que, mais uma vez, o País volte a discutir sobre algo que foi doloroso. Festejar mortes, jamais; festejar censuras, absurdamente não podemos aceitar; festejar aquilo que vimos durante um período que se arrastou por mais de duas décadas... E o que mais me deixa incomodado é que justificativa, entre aspas, seria a de que aquilo seria necessário por força de um eminente perigo de que o Brasil fosse tomado por um regime comunista.

    Ora, ora, ora, 20 anos foram necessários para que nós impedíssemos que esse perigo maior do regime comunista pudesse se alastrar no País.

    Ora, Presidente Anastasia, não há, nunca houve qualquer sustentáculo, nunca houve qualquer fundamento se não o desejo de impor a Nação brasileira ao livre-arbítrio daqueles que comandavam sobre os urutus nas ruas, com os coturnos a silenciar os artistas, os profissionais, os advogados, como o meu próprio pai.

    Eu me recordo muito bem de que a minha mãe, os meus irmãos, que sofreram na pele, porque mais velhos do que eu, nascidos na década de 60, diziam que meu pai, como uma das maiores referências que a advocacia do País conheceu, Antônio Vital do Rêgo, de saudosa memória, que teve a grande alegria e honra de poder representar à altura o povo paraibano na Casa vizinha, Câmara Federal, por três mandatos, depois de ter sido cassado pelo regime militar, pelo AI-5, em 1969, não pôde sequer, Senador Plínio, exercer a advocacia, porque quem viesse hipoteticamente a chegar como seu cliente era chamado, e dirigido a um possível cliente constituinte, se dizia: "Mas você está tresloucado? Você perdeu o juízo? Você vai constituir como seu advogado um cassado do regime militar?"

    Isso foi um fato que nós vivenciamos, e durante alguns anos, a minha casa, os meus pais só puderam prover as obrigações comuns dos pais para com seus filhos pela ajuda de amigos seus. Essa é a mais pura verdade, e, por hipótese alguma, como filho de Vital do Rêgo, como Neto de Pedro Gondim, como cidadão brasileiro, que tem que se solidarizar com tantas famílias que perderam os seus e não puderam sequer sepultá-los, porque até hoje os seus corpos e restos mortais não foram identificados, eu não poderia deixar, estando aqui no Congresso Nacional, que sofreu diretamente com a presença e a instalação do regime militar, eu não poderia, eu não me perdoaria, e não poderiam me perdoar aqueles que sentiram, que conheceram na pele um período que se estendeu por mais de duas décadas.

    Por isso, Sr. Presidente Antonio Anastasia, Senador Reguffe, aqui a minha palavra é a de repulsa, a minha palavra veemente é a de repúdio. Nós precisamos trazer de volta ao País uma relação em que não esteja permitido esse engalfinhamento entre aqueles que são eleitos possivelmente, supostamente como os que praticam o mal, ou que representam o mal, em relação àqueles que supostamente representam o bem. Quando nós vamos parar e reconhecer que já passou da hora de nós restabelecermos uma relação do bom debate, uma relação da boa disputa de ideias? Isso é que prevalece em qualquer democracia digna, e não diferentemente na democracia brasileira.

    O Presidente, mais uma vez, se insurge contra isso, contra esse postulado, contra esses princípios, contra aquilo que é próprio e necessário, exigível de um Presidente da República, como qualquer um que exerce um cargo eletivo. A gente espera um dia que o Presidente da República se contenha em suas opiniões desastrosas. Se ele as tem como convicção, que permaneça com elas para si, mas não incite o sentimento de revanchismo, não incite o sentimento de brasileiros contra brasileiros.

    Não é verdade – e eu lastimo que alguns companheiros o tenham dito aqui nesta Casa – que a população...

(Soa a campainha.)

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB) – ... majoritária do País, à época, tenha aplaudido e tenha recebido felizmente o regime militar. V. Exa. bem sabe que isso não é verdade, muito pelo contrário. Se, em alguns momentos, no Brasil, a população esteve silente, calada, foi por uma imposição que lhe foi feita exatamente pela presença de um regime autoritário. Ninguém, em sã consciência, pode pretender isso, Presidente Antonio Anastasia.

    Então, ao invés de comemorarmos o 31 de março, devemos tê-lo como uma história que não pode ser reeditada, que não pode ser reiterada. Nós precisamos é levar às nossas escolas, a todos e quaisquer ambientes da sociedade civil o que é importante: fazer prevalecer e lutar pela democracia. Fazer valer o respeito às autoridades militares, sim, Styvenson, mas dentro daquilo que compete às Forças Armadas e não mais do que isso...

(Soa a campainha.)

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB) – ... nos limites das suas atribuições como fundamentais, para que a própria democracia, em especial com a presença do Legislativo, possa subsistir.

    Então, este é o meu apelo: que nós, no dia 31, estejamos refletindo para que no Brasil, jamais, em tempo algum, sequer se venha a mencionar uma possibilidade tão nefasta e que foi extremamente dolorosa a tantos e tantos brasileiros.

    Por fim, Sr. Presidente, hoje pela manhã, de forma inclusive bem extensa, com a presença de V. Exa., a Comissão de Constituição e Justiça recebeu S. Exa. o Ministro Sérgio Moro. A minha primeira fala a esse respeito é de congratulações pela disposição do Ministro de vir, assim como, agora, estamos a receber na CAE – e para lá estou a me dirigir – o Ministro Paulo Guedes, da Economia.

    S. Exa. o Ministro Sérgio Moro esteve conosco demonstrando aquilo que é a intenção de todos nós, brasileiros, isto é, tratar sobre esse tema que nos deixa inquietos, que nos deixa extremamente preocupados há um bom tempo: a insegurança que reina em grande parte do nosso País, que foi motivo de uma iniciativa de V. Exa., Senador Styvenson, para o levantamento científico da percepção dos entrevistados – e é importante que nós assim o façamos.

    Não há de nossa parte senão o desejo de fazer o bom debate sobre o conjunto de ideias do Ministério da Justiça. Não haveremos de deixar de reconhecer que algumas dessas sugestões já tramitam tanto nesta Casa, como na Câmara dos Deputados, mas é muito importante, salutar e necessário, Presidente Anastasia, que nós tenhamos cuidado, muito cuidado, em relação a alguns pontos dessa proposta, que tem de nós, de forma imediata, o acolhimento, mas que também deve ter de nós algumas palavras...

(Soa a campainha.)

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB) – ... para consideração e algum aperfeiçoamento necessário e exigível.

    A questão que diz respeito à excludente de ilicitude, à sua abrangência, à sua amplitude, faz-nos crer que o próprio Estado brasileiro assume, confessa a sua falência quanto à atribuição e ao dever que tem de garantir essa segurança e termina por deixar, licenciosamente, para que ações sejam perpetradas por agentes do próprio Estado, no caso, policiais. Não é isso que nós desejamos, da maneira como lá está. Sem que nós fechemos, sem que nós limitemos essa atuação, haveremos de ter, ao final de cada ano, números cada vez mais horrendos e perigosos.

    Outro ponto é a plea bargain, instituto que já prevalece nos Estados Unidos da América e que deve ser defensável para nós, conquanto tenha a presença de um magistrado...

(Soa a campainha.)

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB) – ... e não apenas na relação com o delegado ou com o membro do Ministério Público. E jamais que aquele que vem a fazer a confissão possa estender a terceiros como se a ele o direito de confessar por terceiro. Isso também é muito perigoso.

    Um terceiro ponto que me chama negativamente é uma delação premiada materializada. É o Estado pagando a um delator para que ele o faça e, ao fazendo, tenha um percentual que retribua o seu gesto de ter delatado. Está lá. É uma das propostas contidas no conjunto de sugestões do Ministério da Justiça.

    Ademais, outras que precisam ser tratadas por nós, mas precisam primeiro, Senador Reguffe, ter uma previsão constitucional e não lei ordinária. Façamos as mudanças constitucionalmente que já preveem situações desejadas, defendidas as suas mudanças, porque, caso contrário, desconheceremos aquilo que esta própria Casa, estas Casas, o Congresso Nacional, fez durante outros momentos. Isso me chamou a uma reflexão e me trouxe essa preocupação.

    Ademais, quero saudar a presença do Ministro Sergio Moro. Não há absolutamente dúvidas que ele tenha as mesmas intenções que nós outros temos de debater esse tema, que tomou a sociedade brasileira e que nos imposta é como obrigação de tratá-la.

    Ao Sr. Presidente e aos companheiros que se permitiram carinhosamente ouvir-me, o meu agradecimento e as minhas desculpas por ter me estendido.

    Vou me dirigir à sabatina, à conversa, à exposição que S. Exa. o Ministro Paulo Guedes está fazendo à CAE, até porque eu gostaria de perguntar ao Ministro se realmente se confirma aquilo que ele disse...

(Soa a campainha.)

    O SR. VENEZIANO VITAL DO RÊGO (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB) – ...que, se a reforma previdenciária não for aprovada, o Governo Federal não pagará aos servidores públicos. Isso foi posto e foi veiculado. E me chama a atenção também a maneira como isso é defendido ou, se não defendido, é falado, como se imposições, como se coagindo o Parlamento, para que nós façamos quaisquer que sejam as reformas. Caso contrário, serão impostos os dissabores aos servidores.

    Então, a gente vai, cumprindo o nosso dever, questionar e arguir a S. Exa., o Ministro Paulo Guedes.

    Muito grato a todos os senhores, de maneira particular à sua sempre gentil forma de conduzir os trabalhos, Presidente, Prof. Antonio Anastasia.

    O SR. PRESIDENTE (Antonio Anastasia. Bloco Parlamentar PSDB/PODE/PSL/PSDB - MG) – Muito obrigado, Senador Veneziano Vital do Rêgo, meus cumprimentos.

    V. Exa. realizou um pronunciamento, na realidade, uma ode à democracia e deve receber sempre o nosso cumprimento e nosso aplauso, até porque V. Exa. trouxe também experiências pessoais da trajetória histórica do Estado da Paraíba, da sua família, do senhor seu avô, do senhor seu pai. Receba, então, os nossos cumprimentos.

    Mais do que isso, traz também, na segunda parte do pronunciamento, observações lúcidas e procedentes sobre o projeto de lei que tramita na Câmara das questões de ordem de direito penal, que V. Exa. conhece muito bem, sendo também grande advogado e professor que é da matéria. Meus cumprimentos.

    Parabéns, Senador Veneziano.

    Damos sequência à lista dos oradores.

    O próximo inscrito, presente plenário, é o eminente Senador Plínio Valério, do PSDB, do Estado do Amazonas, a quem, portanto, tenho a grata satisfação de convidar para assumir a tribuna e realizar o seu pronunciamento.

    Com a palavra, o Senador Plínio Valério.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/03/2019 - Página 27