Discurso durante a 89ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Indignação com a maneira como as medidas provisórias têm chegado à Casa.

Manifestação contrária à aprovação da Medida Provisória nº 871, de 2019.

Comentários em torno de matéria intitulada “Capitalização é absurdo”, do jornal Correio do Povo, de Porto Alegre-RS.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO:
  • Indignação com a maneira como as medidas provisórias têm chegado à Casa.
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Manifestação contrária à aprovação da Medida Provisória nº 871, de 2019.
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Comentários em torno de matéria intitulada “Capitalização é absurdo”, do jornal Correio do Povo, de Porto Alegre-RS.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/2019 - Página 13
Assuntos
Outros > SENADO
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • APREENSÃO, MOTIVO, AUSENCIA, TEMPO, NECESSIDADE, DEBATE, VOTAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), LOCAL, SENADO.
  • MANIFESTAÇÃO, AUSENCIA, APOIO, APROVAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ASSUNTO, COMBATE, IRREGULARIDADE, BENEFICIO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • COMENTARIO, ASSUNTO, PUBLICAÇÃO, MATERIA, PREVIDENCIA SOCIAL, CAPITALIZAÇÃO, REALIZAÇÃO, JORNAL, CORREIO DO POVO, PORTO ALEGRE (RS).

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Sr. Presidente, eu estou indignado ainda sobre a sessão de ontem e vou dizer o porquê.

    Primeiro, por essa história de a Câmara mandar para cá, correndo, uma medida provisória que interessa a milhões de brasileiros e que foi votada correndo.

    Eu acreditava ontem, Senador Roberto, Senador Kajuru, Senador Lasier, que ia haver discussão da matéria, como sempre foi. Se a matéria é polêmica, há discussão da matéria. Mas não. "Olha, é cinco contra e cinco a favor e vamos votar".

    Eu ali sentadinho, esperando iniciar a discussão. Quando eu subo, eram cinco favoráveis e cinco contra, quer dizer, o próprio Senado não admite nem que os Senadores se posicionem, que discutam a matéria, contra ou a favor. Não estou aqui julgando quem votou contra ou quem votou a favor. Não dá. Que Senado é esse, meu Deus do céu, aonde uma medida provisória chega na calada da noite, bem dizer, e a gente não pode nem discutir? Quando eu vi, já eram cinco a favor e cinco contra, e acabou e pronto. Eu estava tranquilo que ia iniciar a discussão da matéria.

    Eu respeito o voto de cada um, Senador Kajuru. Não faço nenhum prejulgamento. Mas eu votei e votaria de novo, votaria de novo. E vou explicar por quê. Eu presidi a CPI da Previdência. Eu sei onde está a fraude, onde está a corrupção, onde está o desvio, onde está a sonegação e onde está o roubo. Ora, alguém tem dúvida de que a CPI mostrou com clareza? O que essa MP nº 871 faz? Ela vai caçar quem ganha um salário mínimo. Vê se ela caça alguém que ganha mais que um salário mínimo. Não. É o rural, é o pescador, é o deficiente, é o idoso do BPC. São esses que ela caça. Aí eu pergunto: e os que devem trilhões na sonegação, na roubalheira e nos desvios?

    Sr. Presidente. Esses dados não foram levantados por mim. Eu vou dar um dado aqui: o Procurador-Geral da Fazenda Nacional atualizou o montante de dívidas de empresas com a previdência. Ele chega a R$1 trilhão. E ele cita as empresas. Aí vai banco, grandes empresas. E não são empresas que estão falidas. Nenhuma que ele cita aqui está falida. Eu pergunto: e a apropriação indébita? Dados da CPI: R$30 bilhões por ano. Roubam do trabalhador, não passam para a previdência e embolsam. E daí? Não se faz nada. Como são dois pesos e duas medidas?

    Então, eu faço agora um regime de caça a quem ganha um salário mínimo e pode ter cometido algum delito. Se cometeu o delito, vai ter que responder. Mas eu quero saber os trilhões – trilhões! – que são desviados pelo poder econômico e não acontece nada. Se é para mobilizar, e eu quero mobilizar nesse sentido, para combater toda fraude, toda corrupção e todo desvio... O que dói e nos deixa triste é saber que, no fim das contas, os mais atingidos são somente os pobres, aqueles que dependem desse dinheirinho para sobreviver, para comer. São esses os atingidos.

    E me falam: "Mas o cara é aposentado por invalidez". Quem o aposentou por invalidez? Foi o sindicato? Foi o Kajuru? Foi o Lasier? Foi o Paim? Foi um perito! Ninguém se aposenta por invalidez sem que um perito diga que ele não pode mais trabalhar. Agora, esse mesmo perito vai dizer que não: "Enganei-me, e tu tens que voltar a trabalhar". É isso que foi aprovado nessa MP, infelizmente. Milhões de pessoas serão sacrificadas nessa MP. E, claro, isso nos deixa triste, Sr. Presidente.

    A MP nº 871 é a base da reforma da previdência – eu diria avant-première, pré-estreia. Ora, estão acreditando, creio eu, independente do voto, cada um naquela confusão...

    Senador Kajuru, de coração mesmo, não estou prejulgando, porque cada um deve votar como a sua consciência mandar naquele momento da história. Agora, não podem também daqui a pouco dizer que quem é contra o regime de capitalização está contra o Brasil e eu mostro essa matéria do Correio do Povo de Porto Alegre.

    O que diz o Correio do Povo de Porto Alegre? "Capitalização é absurdo". Afirma quem? Marcelo Ramos, Presidente da Comissão Especial da Reforma, numa palestra que ele fez lá, em Porto Alegre. Eu concordo com ele. Aí vão ficar bravos porque eu concordo com ele? De fato, é um crime a tal de capitalização. Quem vai se dar bem com a capitalização? Só o sistema financeiro. Não adianta mentirem, todo mundo sabe que ninguém vai se dar bem a não ser os grandes bancos, os grandes fundos de pensão privados. Você vai ter que dar parte do seu dinheiro para eles, eles vão fazer o que bem entendem, dizem que vão ser 10%. É um investimento de risco. Se ele disser que aplicou mal, dançou porque assim é a previdência privada.

    Não dá, Sr. Presidente, assim não dá.

    Estão tirando do povo brasileiro o direito a uma aposentadoria digna, ao auxílio-doença, à aposentadoria por invalidez, ao salário-maternidade e ao auxílio-reclusão.

    O Brasil já foi chamado de república das bananas, república tupiniquim, terra de Marlboro, ou seja, terra sem lei. E agora? República da desumanidade? Do desamor? República dos muitos que têm pouco e dos poucos que nada têm? Veja bem: república onde uma minoria tem muito e a maioria, na verdade, nada tem. Se continuar assim, podem ter certeza de que vão acabar com a Constituição Cidadã de 1988 e trocá-la pelos ditames, por que não lembrar aqui, do famoso Consenso de Washington, onde o que se estabelece é um mercado interno, de tamanho médio, para cerca, no caso, o Brasil, de 30 milhões de brasileiros. E os outros 170 milhões? Miséria absoluta?

    Assim, nesse cenário, eu vi ontem à noite dois pesos e duas medidas. Para os ricos, tudo; para os bancos, tudo; para quem ganha o salário mínimo, nada, é prisão, é perda de direitos, até quebrar sigilo bancário. Vão quebrar sigilo bancário – pelo que aprovaram aqui hoje, porque nessa história de veto eu não acredito – de quem ganha o salário mínimo porque acham que há algum desvio de conduta. E aqueles que embolsam trilhões – tri, não é bi, não – da previdência? Como faz? Por que não quebram o sigilo bancário de todos os 500 maiores devedores? Mande uma medida para cá que a gente a aprova: dos 500 maiores devedores a gente vai quebrar o sigilo bancário. São essas contradições que, pelo tempo que eu estou aqui, não tem como eu aceitar. Se botassem em votação hoje de novo, eu seria o primeiro a votar de novo contra essa medida.

    Senador Kajuru, na CPI da Previdência, que eu presidi, eu vi banqueiro, eu vi JBS, grandes grupos econômicos, não estou falando de micros e médios empresários porque esses não sonegam, o pequeno também não sonega. Sabem o que eles diziam, os grandões? "Devo, não nego, não pago, eu tenho uma banca de advogados enorme, estou brigando na Justiça e podem fazer o que bem entenderem". É isso que aconteceu lá, na CPI.

    Agora, vêm com uma reforma que acaba com a nossa seguridade social, onde está a saúde, assistência e previdência. Acabando com a seguridade social, para onde vai o nosso povo? Preocupação não é minha, não é nossa. Nós aqui que ganhamos salário – vamos ser francos – acima de R$30 mil, não temos problema. Quem tem problema é o povo. Como fizeram ontem aqui. E ainda alguns jornais publicam que quem votou contra...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ...essa medida provisória está contra o Brasil, não quer combater a fraude. Mas o que é isso? Nós queremos é combater a fraude, sim. E combater a fraude de todos. De quem ganha um salário mínimo, mas de quem ganha também lucros fabulosos de bilhões e não paga previdência. Desvia o dinheiro.

    Apropriação indébita, como eu dizia, repito de novo, é R$30 bilhões, por ano, que eles descontam do trabalhador e não repassam. Vai dar outra bomba agora no Fundo de Garantia. Mesma coisa: R$2 bilhões – a última informação que eu tive – simplesmente desviados do Fundo de Garantia, e não foi pelo trabalhador. Esse não tem como desviar. Vamos quebrar o sigilo bancário dos grandes, então, de todos. De todos! Agora querem quebrar o sigilo bancário de quem ganha um salário mínimo.

    Sr. Presidente, eu só espero que essa história não se repita na votação da reforma da previdência. Que eles fiquem lá discutindo, discutindo, mandam para cá e aí querem votar na corrida. Queriam votar na quarta, não deu. Tentaram votar na quinta, não deu. Marcaram para segunda e não deixaram nem a discussão da matéria. Eu me lembro, eu estou aqui há tanto tempo. Independentemente de quem era o Presidente, a matéria está em discussão. Aí se inscreviam 20, 30 Senadores, 40, 50 – já houve situações aqui – e todos discutiam.

    Ontem não foi permitida discussão, mas por quê? Porque o prazo terminava à meia-noite. Eu não fiz esse acordo e tenho certeza de que o Humberto Costa não fez, que só poderiam falar cinco. Os cinco primeiros que chegaram aí usaram a palavra. Os outros não puderam usar, não puderam falar, quando iniciou a discussão da matéria. É lamentável que esteja acontecendo isso. Tudo na ânsia maluca e irresponsável de quererem aprovar a reforma da previdência. É a questão de fundo e é a capitalização. Capitalização é a previdência privada. Insisto, mais uma vez: quem vai ganhar será o sistema financeiro. Os bancos serão os grandes ganhadores se aprovarem o que está aqui. E olha, se eu dissesse isso, alguém iria dizer que eu estava contra o Brasil.

    Repito, para terminar, Presidente. Capitalização é um absurdo, afirma Marcelo Ramos. Quem é Marcelo Ramos? É o Presidente da Comissão Especial que está discutindo a reforma da previdência lá na Câmara, numa palestra que deu no meu Estado, ontem, em Porto Alegre e disse tanto para empresários como para trabalhadores.

    Enfim, Sr. Presidente, lamentavelmente essa medida provisória foi aprovada ontem aqui. Lamento e digo mais: ela veio muito pior, Senador Kajuru, veio muito pior, ainda que na Câmara dos Deputados, eles conseguiram retirar algum dos prejuízos maiores ainda, mas, assim mesmo, quem vai pagar a conta, pode ter certeza, é aquele cidadão que ganha um salário mínimo. Isso não dá para aceitar.

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/2019 - Página 13