Discurso durante a 101ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a eventual perda de investimentos e negócios externos ante a imagem do atual Governo no cenário internacional.

Preocupação com o mercado de trabalho, o desemprego e o crescimento da pobreza no País.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Considerações sobre a eventual perda de investimentos e negócios externos ante a imagem do atual Governo no cenário internacional.
TRABALHO:
  • Preocupação com o mercado de trabalho, o desemprego e o crescimento da pobreza no País.
Publicação
Publicação no DSF de 25/06/2019 - Página 8
Assuntos
Outros > ECONOMIA
Outros > TRABALHO
Indexação
  • COMENTARIO, ASSUNTO, SITUAÇÃO, PERDA, INVESTIMENTO, ORIGEM, EXTERIOR, MOTIVO, VISÃO, PAIS ESTRANGEIRO, REFERENCIA, GESTÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, MERCADO DE TRABALHO, DESEMPREGO, AUMENTO, POBREZA, PAIS, BRASIL.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Obrigado pelas considerações.

    Presidente Izalci, Senador Reguffe, eu falo hoje com uma enorme preocupação sobre um documento que recebi das organizações não governamentais sobre a situação do Brasil em relação à Europa e ao Canadá.

    Sr. Presidente, há uma realidade perturbadora. O Brasil está sendo julgado lá fora de forma muito negativa e preocupa todos nós, até porque, pouco tempo atrás, a situação era diferente. Cerca de 340 organizações não governamentais encaminharam para a União Europeia e para o Canadá documento solicitando a imediata interrupção das negociações comerciais com o Brasil. Isso é agravante, pois acontece em meio a tratativas para um acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia.

    Diz a carta:

Desde o início do [atual] Governo [...], em janeiro de 2019, temos testemunhado o crescimento de violações a direitos humanos, ataques a minorias, populações indígenas, LGBTs e comunidades tradicionais. Além disso, [diz a carta] a administração continua a ameaçar o funcionamento democrático básico da sociedade civil, enquanto instiga ataques a algumas das regiões mais preciosas e ecologicamente valiosas do mundo.

    Fecha aspas.

    O documento tem cinco demandas: primeira, a interrupção imediata das negociações de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul; segunda, a garantia de que os produtos brasileiros consumidos pelo Bloco Europeu não contribuam para o desmatamento, grilagem de terras e violação dos direitos humanos; terceira, o pedido de confirmação formal de que o Governo brasileiro está comprometido com a implementação do acordo de Paris; quarta, o apoio a ONGs brasileiras que trabalham pelos direitos humanos e pelo funcionamento da democracia; quinta, o monitoramento sobre violações de direitos humanos, incluindo investigação de casos e proteção a quem estiver sob risco, como defensores ambientais, quilombolas e populações indígenas.

    Carta semelhante foi encaminhada ao Governo canadense. Parte da carta – abro aspas: "Exigimos que o governo canadense interrompa as negociações com o Brasil para acordo de livre comércio entre o Canadá e o Mercosul. Assinar um acordo com esse regime extremista de direita só exacerbará os riscos para as pessoas e o meio ambiente" – fecha aspas.

    Fiquei sabendo também que, em maio, uma carta assinada por 600 cientistas europeus já havia feito pedido semelhante, exigindo que a União Europeia deixasse de importar produtos brasileiros ligados ao desmatamento.

    Sr. Presidente, quando leio essas duas partes dessas duas cartas é demonstrando a minha preocupação. Numa época de tanto desemprego, se acontecer esse boicote por parte dos países europeus e Canadá, é realmente preocupante. Creio que essa situação constrangedora para o nosso País, tendo como fatos esta realidade, coloca em xeque a nossa real capacidade de captar investimentos externos. Convenhamos que, em época de desemprego em alta, se aproximando dos 14 milhões, com 43 milhões de pessoas nessa situação de pobreza extrema, afastar investidores é um equívoco. Espero que não aconteça. Temos que dar um novo rumo para a nossa imagem lá fora. Se há erros, que se revertam. O Brasil não pode se isolar.

    Senhoras e senhores, mas também há uma realidade aqui dentro para a qual não podemos fechar os olhos.

    Vamos pegar aqui alguns dados do Ipea. Informa o Ipea que quase um quarto dos domicílios brasileiros viveu sem renda decorrente de trabalho no primeiro trimestre de 2019. A proporção dos domicílios sem renda do trabalho – onde se incluem aposentados, pensionistas, Bolsa Família, investimento em ações, entre outros – subiu de 19%, no primeiro trimestre de 2014, para 22%, de janeiro a março deste ano. Foi o maior crescimento entre todas as faixas de renda pesquisadas. Já os domicílios que vivem de renda alta pouco se mexeram. Em cinco anos, caiu de 2,2% para 2,1%.

    Houve ainda, Sr. Presidente, uma alta na parcela de desempregados, que estão nessa situação há mais de dois anos. Aumentou a parcela daqueles que estão há dois anos desempregados.

    Segunda o Ipea, no primeiro trimestre de 2015, quando o emprego começou a declinar no País, essa parcela representava 17,4% do total e subiu para 24,8% no primeiro trimestre deste ano, ou seja, 3,3 milhões de pessoas.

    Em quatro anos, o crescimento das pessoas que estão há mais de dois anos sem emprego foi de 42,4%. É realidade que a crise bateu forte na porta de toda a nossa gente e entrou sem pedir licença.

    É muito constrangedor, Sr. Presidente, saber que 43,4% das crianças brasileiras vivem na pobreza, conforme aponta o relatório Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2018, elaborado pelo IBGE.

    São 18,2 milhões de crianças de zero a 14 anos vivendo em situação de pobreza no País. Isso representa, repito, 43,4% de todas as crianças nessa faixa etária, ou uma em cada 2,3 crianças. As crianças de zero a 14 anos compõem, proporcionalmente, a faixa etária mais atingida pela pobreza no País. Em seguida, vem a faixa de 15 a 29 anos: 30,1% na extrema pobreza.

    Considerando pessoas de todas as faixas etárias, 54,8 milhões de brasileiros viviam em situação de pobreza em 2017, isto é, com menos de meio salário mínimo para sobreviver, exatamente R$406. O IBGE aponta, ainda, que a proporção da população em situação de pobreza subiu de 25,7% para 26,5% de 2016 para 2017.

    A Região Nordeste concentrou o maior percentual de pessoas em situação de pobreza em 2017: 44,8%, o que equivale a cerca de 26 milhões de pessoas.

    Entre os Estados, a maior proporção de pessoas em situação de pobreza foi observada no Maranhão, 54,1%, mais da metade da população daquele Estado. Além do Maranhão, a proporção também foi alta em Alagoas: 48,9%.

    Segundo o Ipea, seria necessário investir R$10,2 bilhões por mês na economia para que a pobreza fosse erradicada no nosso País. Além da opção de investimento na economia, o estudo também diz que outra alternativa seria garantir R$187 por mês a mais, em média, da renda de cada pessoa que está em situação de pobreza.

    Sr. Presidente, também hoje, na Comissão de Direitos Humanos, fizemos uma audiência pública para discutir o trabalho e o desemprego, e um dado assustador que chegou lá, por parte de um dos painelistas, um dado internacional, diz que o Brasil está entre os dez piores países do mundo em relação ao mundo do trabalho. Isso divulgado em situações do mundo do trabalho. Está somente ali, nesses dez, na frente da Nigéria. É preocupante esse quadro, Sr. Presidente, porque estamos, de fato, vivendo uma recessão, que já falam em estagnação e até em depressão.

    E, nesse aspecto, Sr. Presidente, eu vou usar os meus últimos oito minutos para ler o editorial de O Estado de S. Paulo, com o título "A vida em tempo de desemprego". Sr. Presidente, quero deixar registrado o artigo publicado nesta segunda-feira, na coluna Notas & Informações, do jornal O Estado de S. Paulo, com o título "A vida em tempo de desemprego".

    Diz o artigo, abro aspas:

A vida em tempo de desemprego.

Há 3,3 milhões de trabalhadores há pelo menos dois anos à procura de uma ocupação remunerada. Esse número é 42,4% maior do que o de dois anos antes. A constatação de que em quase um quarto dos domicílios não há nenhum morador com renda gerada pelo trabalho mostra uma nova dimensão da tragédia social que a persistência da crise econômica torna cada dia mais dramática.

[Diz mais o Estado de S. Paulo.] Com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua), técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) constataram que a proporção de domicílios sem renda do trabalho, que já era alta, está crescendo. [Diz o artigo.] Passou de 19% do total no início de 2014 para 22,2% no último trimestre de 2018 e 22,7% no primeiro trimestre deste ano.

Além de ser um dado que causa espanto, pelos dramas familiares que resume, essa informação se acrescenta a outras – como o número de desempregados, subocupados e pessoas disponíveis para trabalhar, mas que não encontram ocupação, que somam 28,4 milhões de pessoas, ou o tempo cada vez maior que se leva para encontrar emprego – que mostram a severa deterioração [Sr. Presidente] do mercado de trabalho.

Para boa parte das pessoas que não têm ocupação adequada, o futuro próximo não é animador, pois as previsões mais otimistas são de que o mercado só começará a melhorar no ano que vem – se tudo caminhar bem.

De que vivem as pessoas abrigadas nesses domicílios se não é com a renda do trabalho? Decerto há entre elas as que formaram poupança suficiente para viver de outras rendas que não as geradas pelo trabalho.

Há também quem viva de pensões e aposentadorias ou de benefícios sociais pagos pelo Estado. Mas a grande maioria enfrenta imensas dificuldades para sobreviver [na nossa avaliação, passam fome].

"A crise bateu muito forte no mercado de trabalho e mais forte no trabalhador menos escolarizado, com emprego de pior qualidade, e é esse trabalhador que tem sofrido mais com a crise" [ou seja, setores mais vulneráveis], disse ao O Estado a economista Maria Andreia Parente Lameiras, uma das responsáveis pelo estudo sobre o mercado de trabalho, publicado na mais recente edição da revista Carta de Conjuntura, editada pelo Ipea. Os menos preparados, Sr. Presidente, são, de fato, os mais vulneráveis, mas a crise atinge todos os tipos de trabalhadores.

Outra constatação do Ipea é a de que o tempo em que se fica desempregado está aumentando. Desagregando os dados da Pnad Contínua, aferida mensalmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os economistas do Ipea constataram que é crescente o número de pessoas que estão desempregadas [aí eles repetem] há mais de dois anos [repito: desagregando os dados da Pnad Contínua]. No primeiro trimestre de 2015, 17,4% dos desempregados estavam nessa situação há mais de dois anos; neste ano, a proporção continua subindo [repito] [...] ou praticamente um quarto dos desempregados [o que dá mais ou menos 25%]. Isso significa que 3,3 milhões de trabalhadores estão há pelo menos dois anos à procura de uma ocupação remunerada. Esse número [então vai para] [...] 42,4% [...].

Outros milhões de trabalhadores deixaram de procurar um emprego que tentaram encontrar durante muito tempo e passaram a integrar o grupo de desalentados [que se aproxima já de 5 milhões de pessoas]. Esse grupo é formado por pessoas que não procuraram emprego no período de referência da pesquisa por se considerar muito jovem, muito idoso ou pouco experiente, ou por acreditar que não encontraria oportunidade [...] [alguma e acaba desistindo]. No primeiro trimestre deste ano, segundo o IBGE, o contingente de desalentados era formado por [...] [aproximadamente 5 milhões de pessoas – eu já havia falado antes –, mais precisamente 4,8 milhões].

"O mercado de trabalho é o pior retrato da crise econômica pela qual o Brasil está passando" [neste momento], segundo Andréa Lameiras. "Estamos saindo da crise, mas muito lentamente, e o mercado de trabalho reage depois da economia como um todo."

    Sr. Presidente, eu fiz uma síntese aqui do artigo do Estado de S. Paulo e também relatei esse documento encaminhado para o Canadá e para a União Europeia, em relação à situação do Brasil.

    Era isso.

    Obrigado, Presidente.

    Peço que considere na íntegra, por favor.

DISCURSO NA ÍNTEGRA ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR PAULO PAIM.

(Inserido nos termos do art. 203 do Regimento Interno.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/06/2019 - Página 8