Discurso durante a 137ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre o conteúdo das mensagens divulgadas pelo jornal The Intercept acerca da Operação Lava Jato.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINISTERIO PUBLICO:
  • Comentários sobre o conteúdo das mensagens divulgadas pelo jornal The Intercept acerca da Operação Lava Jato.
Publicação
Publicação no DSF de 16/08/2019 - Página 39
Assunto
Outros > MINISTERIO PUBLICO
Indexação
  • COMENTARIO, CONTEUDO, COMUNICAÇÃO DE MENSAGENS, JORNAL, ASSUNTO, OPERAÇÃO LAVA JATO, CRITICA, SERGIO MORO, PROCURADOR DA REPUBLICA, MINISTERIO PUBLICO, POLICIA FEDERAL, CURITIBA (PR), REPUDIO, DESOBEDIENCIA, LEGISLAÇÃO PROCESSUAL.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para discursar.) – Sr. Presidente, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, os que nos acompanham pela Rádio Senado, pelas redes sociais, mais uma vez peço justiça e liberdade para o Presidente Lula.

    E hoje quero falar que temos assistido, inteiramente assombrados, a revelação cotidiana de uma série de episódios dantescos, urdidos nos porões da Operação Lava Jato.

    Dia a dia, uma rede de veículos de imprensa, encabeçada pelo The Intercept, divulga um capítulo sórdido desse que é o maior escândalo jurídico brasileiro e, sem dúvida, um dos maiores do mundo. Uma trama de caráter messiânico, fundada no culto à personalidade de alguns agentes públicos que, julgando-se acima do Estado de direito, vendiam o falso propósito de limpar o País pelo expurgo daqueles que eles apontavam como um mal a ser eliminado. Um enredo de terror, com tons típicos do nazismo.

    A verdade é que esses falsos puritanos foram todos pegos em seus próprios pecados. Foram consumidos pela fogueira das vaidades que eles mesmos acenderam.

     A Lava Jato, de redentora da moralidade, depois de ter cumprido um papel relevante no combate a práticas de corrupção no Estado brasileiro, virou agora o maior caso de corrupção da história do Direito pátrio, em que o Estado-juiz, representado pelo Poder Judiciário, e o Estado Acusador, representado pelo Ministério Público, selaram um casamento promíscuo e criminoso, criando um poder supraestatal para trucidar o devido processo legal e promover a célere execução de penas de desafetos políticos.

    Sergio Moro como juiz, chefiou diretamente o Ministério Público e a Polícia Federal em Curitiba, rasgando a Constituição e todas as normas jurídicas vigentes, para alcançar os objetivos que queria.

    Com o pretexto de combater a corrupção, a Lava Jato agiu de forma deplorável. Foi corrupta, transitou fora da lei para perseguir o que julgava ser fora da lei. Atuou da mesma forma que os criminosos que dizia condenar.

    Na condição de magistrado, Moro solicitou operações policiais, determinou a substituição de procuradores, mandou que o Ministério Público atuasse em determinadas linhas de investigação, solicitou antecipadamente a inclusão de documentos em peças que ele iria julgar, revisou petições que somente depois seriam incluídas nos processos. Tudo isso coordenado fora dos autos, em diálogos privados, criminosos, que só agora vêm à luz.

    Com adversários como Lula, Moro foi implacável. Conduziu o ex-Presidente sob vara para um depoimento, num ato deplorado pelo mundo jurídico, sem que Lula nunca tivesse se recusado a depor. Mandou apreender o tablet de seus netos e o celular de D. Marisa. Mas com outras pessoas com quem o ex-Juiz tinha afinidade de caráter, como o delinquente Eduardo Cunha, a história foi outra: Moro absolveu a mulher de Cunha das acusações que lhe eram imputadas com provas e protegeu o ex-Presidente da Câmara da apreensão dos seus aparelhos celulares. Assim também foi com o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, que ele mandou não mexer para não melindrar.

    Sua fama lhe rendeu muito dinheiro fora do já polpudo contracheque. Moro deu palestras que nem sequer declarou ao Imposto de Renda. Disse que doou tudo para uma instituição de caridade que, curiosamente, contratava os serviços de sua senhora. Moro agiu todo o tempo como alguém com interesses políticos bem definidos. Ele confessou a procuradores que a delação de Antonio Palocci era imprestável, que Palocci falava até daquilo que ele achava que podia ser que talvez fosse, para usar aqui as palavras de um procurador da Lava Jato.

    Mesmo assim, o que fez Sergio Moro? Divulgou uma fajuta delação de Palocci durante a eleição do ano passado, com o claro propósito de prejudicar o PT e o nosso candidato Fernando Haddad e ajudar Jair Bolsonaro na disputa presidencial.

    E, hoje, onde está o ex-Juiz? No lamentável papel de serviçal do mesmo Bolsonaro, para o qual ele suou a toga para ajudar a eleger. Assim como Moro, o perseguidor da República Deltan Dallagnol também projetou fortunas com a fama que fez na Lava Jato. Ganhou dinheiro até de empresas que a operação investigava. E, se, de um lado, se prestava ao papel de despachante de Sergio Moro, forjando com o ex-Juiz até falsas denúncias, de outro, ele e sua turma organizavam um conluio para emparedar altas autoridades da República com a finalidade precípua de tentar chantageá-las.

    Assim foi com os ministros do Supremo, que eles não tinham sequer a prerrogativa de investigar. Tramaram com outras instituições do Estado para derrubar os Ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Insultaram a Ministra Cármen Lúcia, a quem chamaram de frouxa. Articularam movimentos de extrema direita para atacar membros da Corte. Nem mesmo a Procuradora-Geral da República, chefe deles, chefe do Ministério Público, foi poupada pelos seus subordinados, que dela disseram – abro aspas: "O barraco tem nome e sobrenome, Raquel Dodge"– fecho aspas.

    Enfim, essa é uma turma que rasgou o Texto Constitucional e se colocou acima do Estado de direito, que criou até mesmo uma fundação bilionária com recursos desviados da Petrobras, totalmente à margem da lei, para financiar projetos de cunho pessoal e político.

    Grandes nomes mundiais do Direito, muitos deles com um histórico invejável de combate à corrupção, como a jurista americana Susan Rose-Ackerman, admirada por Dallagnol, se insurgiram contra essa escabrosa armação montada no seio do Estado. Juntamente com outros dos maiores especialistas do mundo em combate à corrupção, ela assinou um manifesto em que pede ao Supremo Tribunal Federal a imediata libertação do ex-Presidente Lula e a anulação do seu processo.

    Não é dúvida para qualquer pessoa de compreensão mediana, de que estamos vivendo um momento extremamente disfuncional da nossa democracia. O devido processo legal foi eliminado. As garantias constitucionais foram eliminadas. Todas as leis, todos os códigos de conduta foram rasgados em nome de um lawfare odioso, montado por uma rede de usurpadores do Estado de direito, determinados a dobrar a democracia às suas próprias vontades. Isso é inaceitável.

    E as instituições no Brasil, que foram maculadas por esses maus agentes, têm obrigação imperiosa de reagir a eles. O Supremo Tribunal Federal, a Procuradoria-Geral da República, o Conselho Nacional do Ministério Público não podem se intimidar diante desses mitos carcomidos, diante desses falsos profetas. É preciso que eles respondam, dentro da lei, por todos os crimes que praticaram sob a proteção do Estado. É preciso que, dentro do devido processo legal, sejam investigados, processados e punidos por terem utilizado a estrutura estatal para a consecução de fins pessoais em prejuízo do próprio Estado de direito e do regime democrático.

    Não pode Sergio Moro ter praticado os atos ilícitos que cometeu e seguir como Ministro de Estado da Justiça e da Segurança Pública, subordinando, inclusive, a Polícia Federal, que deveria investigá-lo. Ao que parece, aliás, essa turma da Lava Jato segue agindo nas sombras a todo vapor. Quando as mensagens vazadas começaram a ser conhecidas, eles acusaram hackers sofisticados e até uma possível conspiração russa por trás de tudo. O argumento era o da desestabilização da Lava Jato. Uma operação tabajara midiática foi montada e não chegou além de uns golpistas de cartão de crédito de Araraquara, mas foi o suficiente para Moro tentar chantagear altas autoridades com supostos conteúdos de vazamentos que ele tinha em mãos e que prometia destruir à margem da lei novamente.

    Depois, houve a tentativa de transferir o Presidente Lula para um presídio comum, medida repudiada até por seus adversários e derrubada no Supremo Tribunal Federal por dez a um. Na sequência, um novo e ridículo vazamento à imprensa tentava associar o PT ao PCC, algo tão absurdo que foi logo refutado pelo promotor do Ministério Público de São Paulo mais especializado em crime organizado. Agora, vem uma outra delação de Palocci, aquele mesmo condenado de quem Moro considerou a fala como absolutamente inútil.

    Então, o que se vê é um desespero geral dessa turma, que, descoberta praticando crimes, age de todas as formas para opacar os escândalos diários que se sucedem sobre os umbrais da Lava Jato. Não conseguirão! A cada novo fato conhecido, nós vamos exigir a rigorosa apuração e a consequente punição dos envolvidos. É incabível que Deltan Dallagnol, diante de tudo o que já é conhecido sobre ele, continue à frente da Lava Jato, eventualmente destruindo provas que poderiam incriminá-lo. Isso é inaceitável e o Conselho Nacional do Ministério Público precisa agir urgentemente.

    O Brasil está dotado de mecanismos de combate à corrupção eficazes que nada deixam a dever aos países mais desenvolvidos do mundo. Muitos deles foram legados pelos Governos do PT, como a Lei da Delação Premiada, a Controladoria-Geral da União e a autonomia da Polícia Federal, bem como o respeito à independência do Ministério Público, que hoje Bolsonaro ataca vivamente. Mas não é admissível que, a despeito de se combater a corrupção, o Estado seja corrompido por maus agentes que rasgam a lei para atingir objetivos, a imensa maioria deles de caráter pessoal, como temos presenciado. Isso é uma prática de países totalitários, de países fascistas, nos quais a lei é deixada de lado para que os agentes tenham saciadas as suas vontades. Foi isso, Sr. Presidente, o que Sergio Moro, Deltan Dallagnol e outros agentes do Estado fizeram. Não podemos aceitar pelo bem do próprio Estado democrático de direito.

    Muito obrigado, Sr. Presidente, a todos e a todas.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/08/2019 - Página 39