Discurso durante a 161ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de debate temático destinada à discussão das Propostas de Emenda à Constituição nº 6, de 2019, e nº 133, de 2019, cujo objeto é a reforma da previdência.

Autor
PAULO TAFNER
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Sessão de debate temático destinada à discussão das Propostas de Emenda à Constituição nº 6, de 2019, e nº 133, de 2019, cujo objeto é a reforma da previdência.
Publicação
Publicação no DSF de 11/09/2019 - Página 22
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, DESTINAÇÃO, DISCUSSÃO, ASSUNTO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), OBJETIVO, REFORMA, PREVIDENCIA SOCIAL.

    O SR. PAULO TAFNER (Para exposição de convidado.) – Boa tarde, Srs. Senadores, Sras. Senadoras, membros da Mesa, meus colegas debatedores e todos os demais presentes.

    Vou me ater a alguns itens específicos da proposta e, particularmente, já dentro da tramitação aqui no Senado.

    O que diz o Sr. Senador Relator do processo aqui no Senado? "De forma mais ampla, a reforma vai ao encontro do princípio da prioridade absoluta da criança e do adolescente, emanado do art. 227 do Texto Magno." Em seguida: "A reforma da previdência se baseia naquela que talvez seja a mais extraordinária conquista da sociedade brasileira nas últimas décadas: a expressiva elevação da expectativa de vida". Ainda: "Não podemos falar que o Governo vai economizar o que o Governo não tem", muito corretamente colocado por V. Exa. Ainda: "Em verdade, este trilhão constitui apenas um alívio na trajetória do gasto", exatamente isso, Senador. "Contudo, o impacto da PEC nº 6, de 2019, é apenas parcial. Ele poderia ser maior se fosse endereçado às previdências de Estados, do Distrito Federal e dos Municípios." E, por isso mesmo, V. Exa. propôs uma PEC denominada PEC paralela. "Contrariamente ao que foi frequentemente veiculado, o impacto fiscal da PEC nº 6, de 2019, chega ao Senado Federal concentrado naqueles que ganham mais." Muito bem. Isso é verdade.

    Todos os elementos aqui apontados, no meu ponto de vista, são tecnicamente verdadeiros, ou seja, muito bem explicitados pelo Senador. Eu vou tentar aqui trazer alguns elementos que, do meu ponto de vista, são consensos, verdades absolutas já conhecidas por todos.

    Primeiro, nós gastamos com previdência mais de 14% do PIB, considerados todos os sistemas previdenciários. Isso é mais do que saúde e educação juntos. Somente no âmbito da União, a despesa aumenta, a cada ano, 50 bilhões. A cada ano, há aumento da despesa, ou seja, nós gastamos, a cada ano, um montante adicional maior do que todo o Programa Bolsa Família. Esse gasto previdenciário já representa mais de 50% de todo o gasto federal. E, nos próximos anos, eu digo, na próxima década, isso já atingirá 80% do Orçamento. O déficit consolidado da previdência, senhores, é de 5% do PIB. O déficit é maior do que deveria ser, segundo a nossa taxa de envelhecimento, a nossa despesa. O déficit é maior do que deveria ser a nossa despesa, dado o padrão de envelhecimento da população brasileira.

    Além do mais, nosso sistema é injusto. A despesa está focalizada nos grupos mais protegidos e não concentrada nos grupos desprotegidos, porque as regras dos grupos protegidos são mais generosas do que as regras dos grupos desprotegidos. Um pobre se aposenta, pelo menos, aos 66 anos, se for homem, e um classe média se aposenta, se for homem, aos 55,5 para 56 – 10 anos antes.

    Muito bem. Nosso sistema, além do mais, será pressionado, como bem apontado aqui por alguns, pela nossa mudança demográfica, que será muito acelerada – e eu vou trazer algumas informações sobre isso.

    Além disso, o que a gente sabe? A gente sabe que o nosso resultado primário, ou seja, aquilo que o governo arrecada vis-à-vis aquilo que ele gasta é negativo – e ele não é negativo este ano, ele não é negativo o ano passado, ele não é negativo apenas o ano retrasado; ele vem negativo já há bastante tempo, como está mostrado nesses dados, as informações são daí.

    Muito bem. A consequência desse descontrole de despesa está fazendo com que a relação dívida-PIB seja crescente e atinja próximo a patamares de 80% do nosso PIB, um padrão que é pelo menos 50% maior do que a relação dívida-PIB dos países emergentes comparáveis ao Brasil.

    Bom, do que trata a reforma? Obviamente que eu poderia... Os senhores têm em mãos o texto da reforma. Mas, sinteticamente, do que trata a nossa reforma? Ela trata da extinção da aposentadoria por tempo de contribuição, que é, digamos assim, um dispositivo que o Brasil dispõe e dispõe apenas a partir dos anos 60, com uma mudança promovida pelo ex-Presidente João Goulart, porque esse dispositivo não havia na nossa legislação, e nos colocou em companhia de alguns países de que eu não gostaria de fazer parte sob a ótica econômica.

    A reforma define uma idade mínima para todos, ainda que diferente entre grupos laborais: alguns vão se aposentar alguns anos mais cedo, mas terão idade mínima. Nós não teremos mais, por exemplo, um policial federal se aposentando aos 50 anos ou 51 anos, como recentemente nós vimos o ex-diretor da Polícia Federal. Mas ele é um caso entre tantos outros.

    Altera a fórmula de cálculo do benefício. Chamo a atenção para os Senadores de que agora tem sido veiculado que o uso da média contributiva é um atentado contra trabalhador. Lembro os senhores que, no passado – alguns aqui devem se lembrar disso –, a aposentadoria já teve seu valor fixado com base na média das últimas 12 contribuições. E era interessante porque o povo, diante disso, contribuía a vida inteira com um salário mínimo e, nos últimos 12 meses, contribuía com dez salários mínimos – usava a regra a seu favor. Mas, ao usar a regra a seu favor, ele simplesmente usava a regra contra o conjunto da sociedade brasileira. Pois bem, usar a média é uma regra neutra, é uma regra de justiça. Colocar algo que está acima da média ou abaixo da média não é nem ajudar, nem prejudicar o trabalhador; é ajudar alguns trabalhadores e prejudicar o conjunto da população, porque aquilo que é dado a mais para uns é retirado de outros. Simples assim! É tão simples quanto isso!

    Muito bem. Altera a regra de pensão, limita a cumulação de benefícios. O Brasil, talvez os senhores não tenham se atentado, permite legalmente a acumulação de seis benefícios. Que outro país permite isso? Nenhum, mas o Brasil permite.

    Muito bem, estabelece alíquotas progressivas – um princípio de justiça; permite a cobrança de alíquotas extraordinárias nos RPPS, em caso de déficit atuarial, porque, hoje em dia, os RPPS que estão em déficits, senhores, são financiados pelos impostos da população.

    Curiosamente a renda do contribuinte médio de qualquer Estado do Brasil é menor do que a renda de benefício do seu aposentado do setor público, e o que isso significa, senhores? Que há uma transferência líquida de recursos dos mais pobres para os mais ricos. Parece-me que não é sensato que tenhamos sistemas que tenham essa propriedade.

    Focaliza o abono salarial. Inclusive, eu queria lembrar o ex-Ministro da Fazenda da Presidente Dilma. Ele próprio escreveu um artigo dizendo que, por ele, extinguiria o abono salarial e transformaria totalmente esse benefício. Eu concordo com a posição do ex-Ministro.

    Bom, para chamar a atenção da demografia, senhores, são apenas três quadros. Eu diria que, na média, todos teremos lembrança desse período, a despeito de haver alguns especialmente jovens. Em 1980, senhores, nós éramos assim: nós tínhamos 45 milhões de crianças, 66 milhões de adultos e apenas 7,2 milhões de idosos. Isso define, entre os economistas que trabalham na área de previdência, uma razão muito importante, qual seja, a razão de suporte. É o número de ativos para suportar cada beneficiário de aposentadoria. Em 1980, senhores, nós tínhamos 9,2 ativos – 9,2 ativos!

    Pois bem, o tempo se passou, 40 anos se passaram, nós estamos agora nesta situação: 44 milhões de crianças – 1 milhão a menos –, 138 milhões de adultos, mais 29 milhões de idosos. Os adultos multiplicaram-se por dois e os idosos por mais de quatro, fazendo com que essa razão caísse para 4,7 ativos para cada inativo.

    Pois bem, senhores, 40 anos à frente, segundo as projeções do IBGE, esta é a situação que nós teremos: apenas 28 milhões de crianças, o número de adultos vai diminuir em 20 milhões e o número de idosos, triplicar, e a razão de suporte será de apenas 1,6 ativo para cada inativo. O que eu quero dizer com isso, Senadores, é que o nosso sistema de repartição está condenado pela demografia.

    Nós, senhores, devemos pensar no futuro. A reforma – eu ouso dizer – foi muito salutar para tratar do passado, mas ela se esqueceu do futuro, e o futuro significa, senhores, que nós temos que começar a planejar um sistema que venha substituir esse. Com essa razão, o sistema de repartição não para em pé.

    Pois bem, senhores, eu vou pegar agora o Brasil em perspectiva comparada, indicando – diferentemente do Prof. José Márcio, porque ele usou uma mostra mais reduzida, eu peguei 203 países do mundo, que eu acompanho regularmente, segundo várias variáveis econômicas, fiscais e demográficas – que o Brasil era um País jovem e vai migrar rapidamente para ser um país idoso, e já está em andamento esse processo, muito rápido. Já na próxima década, nós estaremos entre os 25 países mais idosos; de 2040 para 2050, ele já passa para a posição 22; em 2060, para a posição 17; e, a partir daí, pelas projeções da ONU, nós seremos o décimo país mais envelhecido.

    Isso significa dizer, senhores, que é, mais ou menos, como uma corrida: não basta você ser rápido, você tem que ser mais rápido do que quem está competindo com você. Nós, ao ficarmos velhos, não apenas estamos ficando velhos, Senador, nós estamos ficando mais velhos do que os nossos competidores, o que significa grave risco – grave risco – para a nossa inserção internacional.

    Muito bem. Uma coisa importante neste País, e aqui foi retratada rapidamente pelo Prof. José Márcio Camargo – eu ouso ser mais enfático –, é que o Brasil investe no passado e abandona o seu futuro. Esse dado é um dado simples que mostra, idade por idade, a incidência de pobreza e extrema pobreza no País. Se eu tivesse que dizer, senhores, quem é pobre no Brasil, ele tem cara, ele tem jeito, ele tem idade. Quem é pobre no Brasil são as crianças, os jovens e os adultos, especialmente os jovens. Eu nunca vi uma sociedade sobreviver se você abandona o futuro, você abandona crianças e jovens. É o contrário: cada um de nós dá a vida para salvar o seu filho. O Brasil, coletivamente, abandona os seus filhos. É essa a situação; não sou eu quem está trazendo essa informação. Essa informação é de dados e de registros de pesquisas comuns

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO TAFNER – Estou acabando, Senador.

    E, por fim, senhores, para tratar da questão do salário mínimo, que é tão badalada, apresento apenas algumas considerações.

    O primeiro gráfico, senhores, mostra a distribuição de salário mínimo, entre os decis de renda, em dois segmentos importantes: no mercado de trabalho e nos beneficiários do sistema de aposentadoria.

    Curiosamente, senhores, em vários anos – estão aí 1995, 2012, 2009 e 2014 –, a incidência de salário mínimo no mercado de trabalho está mais concentrada nos quatro primeiros decis de renda, ou seja, os mais pobres, e não no sistema previdenciário, que está fortemente concentrado no quinto decil de renda para frente. O que eu quero dizer com isso, senhores? Receber um salário mínimo já coloca o cidadão distante da pobreza de que muitos falam, mas não sabem do que se trata. Pois bem, o que é pior: no mercado de trabalho a incidência é maior do que... Agora, deu meu tempo, Senador. Eu vou acabar. A incidência está mais concentrada entre os mais pobres do que no nosso sistema previdenciário.

    Por fim, sobre a questão... Esse é um dado do Fabio Giambiagi, compilado também a partir da Pnad – dele e Samuel Franco –, mostrando que o salário mínimo, no sistema previdenciário, é mais frequente nos decis de renda maiores do que nos decis de renda menores.

    E, por fim, senhores, eu vou trazer a questão da pensão e acumulação de benefícios. Esse dado é meu – eu já atualizei, não tive tempo de trazer aqui –, é a incidência de acumulação de benefícios, Senador. E o que é pior: quem acumula benefícios já não é mais pobre. Está longe de ser pobre.

    E vejam, senhores, que, em 1992, dos pensionistas, muito corretamente apontado aqui pelo Eduardo Moreira – muito concentrado nas mulheres, das pensionistas, portanto –, somente 39% delas acumulavam renda de outra fonte; em 2001, 40%; e, em 2013, 47%. Eu já tabulei 2015, e esse número é mais de 50%. E vai continuar crescendo.

    Pois bem, senhores, quem acumula renda, especialmente renda de trabalho e de aposentadoria, que são os itens abaixo da acumulação da renda, são segmentos de renda média e alta. Pobre não acumula benefício, Senador. Se existe uma renda na família, está longe de ser a pobreza.

    Pois bem, por fim, os dados de estimativa da PEC: os meus, que estão à direita, e a projeção do Governo. O meu é intervalar – eu não cravo um ponto, é mínimo, médio e máximo –, muito próximo da estimativa do Governo, mostrando, ao contrário do que é afirmado, que tem, sim, o Governo tem um modelo de projeção. Ele é perfeito? Não é, assim como não é o meu, assim como não é o de nenhum de nós aqui. Mas tem. E deveria ser chamada esta Casa, Senador, para ser conhecido o modelo, muito bem detalhado. Eu conheço o modelo.

    Pois bem, por fim, o que propõe o Relator? Primeiro, basicamente na PEC 006, supressão do dispositivo que constitucionalizava a linha de pobreza do BPC, mediante a aprovação da Emenda 52, o que leva à regra de pontos para a aposentadoria especial. A supressão, correta, do termo "no âmbito da União", no §1º-B do art. 149.

    Aqui os números são o impacto sobre a economia prevista da PEC 06. No primeiro, 25 bilhões; no segundo, 6,3; no terceiro, nenhum impacto.

    A revogação do art. 18 basicamente é para corrigir texto e eventual conflito jurídico.

    E, por fim, uma mudança na pensão, cujo impacto é de 33 bilhões.

    Eu acho que o Congresso e aqui o Senado terão todos os elementos para bem votar e bem conhecer e deliberar sobre a questão da PEC.

    Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/09/2019 - Página 22