Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Destaque à importância de aprimoramento da legislação sobre inovação e tecnologia. Breve explicação sobre a “Lei do Bem”, que beneficia empresas que investem em inovação tecnológica, e sobre como esta pode ser aprimorada para promover o desenvolvimento brasileiro no mapa da competitividade.

Autor
Izalci Lucas (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/DF)
Nome completo: Izalci Lucas Ferreira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CIENCIA E TECNOLOGIA:
  • Destaque à importância de aprimoramento da legislação sobre inovação e tecnologia. Breve explicação sobre a “Lei do Bem”, que beneficia empresas que investem em inovação tecnológica, e sobre como esta pode ser aprimorada para promover o desenvolvimento brasileiro no mapa da competitividade.
Aparteantes
Confúcio Moura.
Publicação
Publicação no DSF de 18/02/2020 - Página 22
Assunto
Outros > CIENCIA E TECNOLOGIA
Indexação
  • DEFESA, APERFEIÇOAMENTO, LEGISLAÇÃO, INOVAÇÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA, COMENTARIO, LEI FEDERAL, BENEFICIO FISCAL, REDUÇÃO, TRIBUTOS, IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS (IPI), IMPOSTO DE RENDA, PESSOA JURIDICA, EMPRESA, INVESTIMENTO, TECNOLOGIA, PESQUISA, DESENVOLVIMENTO, COMPETITIVIDADE.

    O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - DF. Para discursar.) – Sr. Presidente, Senador Telmário, Senador Confúcio, meu querido amigo Marcio Bittar, Sras. Senadoras e Srs. Senadores, eu tenho trazido a esta tribuna a importância de o Brasil investir pesado na inovação. Porém, nosso País tem poucos instrumentos legais que buscam incentivar a inovação. Dentre os existentes, está a Lei do Bem, aprovada por este Congresso em 2005 e regulamentada um ano depois. Não há dúvida de que ela é um importante aliado para o estímulo à inovação, principalmente das empresas brasileiras, ao conceder benefícios fiscais àqueles que investem em tecnologia. No entanto, na prática, os empresários começaram a esbarrar na burocracia.

    Foram surgindo resoluções e normas de um modo geral, portarias, que, em vez de facilitar a vida de quem quer inovar, viraram exatamente entraves. Além disso, a lei ficou restrita a um grupo de empresas. Por isso, é uma lei que precisa ser aprimorada para abarcar e incentivar mais empresas, mais companhias dispostas a inovar.

    Vou explicar como funciona a Lei do Bem, para depois mensurar as vantagens e, a partir daí, debater o que pode e deve ser melhorado. A Lei do Bem criou benefícios fiscais para as empresas com interesse em desenvolver inovação, inovação tecnológica. Dentre os incentivos estão a dedução do Imposto de Renda Pessoa Jurídica dos gastos com pesquisa. Além dos gastos com pesquisa, desenvolvimento, redução de 50% do IPI, o imposto sobre industrializados na compra de equipamentos nacionais ou importados, destinados também à pesquisa e desenvolvimento. É um incentivo para trazer equipamentos e poder deduzir do Imposto de Renda os investimentos de pesquisa.

    A alíquota zero de Imposto de Renda retido na fonte nas remessas efetuadas para o exterior, destinadas ao registro e manutenção de marcas e patentes e subvenção na folha de pagamento de pesquisadores. Nós aprovamos, inclusive, a reforma, o marco regulatório de ciência e tecnologia, mas as pessoas ficam procurando nos pontos e nas vírgulas como é que vão cobrar mais imposto, mais isso, mais aquilo, e querem já. Ninguém pagava esse Imposto de Renda sobre as bolsas, mas sempre há alguns fiscais que interpretam que têm que cobrar sobre as bolsas, daí traz uma insegurança. Em vez de facilitar, em vez de desburocratizar, em vez de dar segurança jurídica, acabam criando insegurança jurídica com relação a isso. Tem que ficar claro.

    Ao criar a Lei do Bem, a ideia era que o Brasil tivesse mecanismos a mais de incentivo à inovação no ambiente empresarial. Inovação acontece é nas empresas, não é nas universidades. Então, você tem que criar ambiente nas empresas para isso. O objetivo da legislação é alavancar o gasto privado em pesquisa e desenvolvimento no PIB (Produto Interno Bruto).

    Lá atrás, eu fui Secretário de Ciência e Tecnologia, o setor empresarial não conversava com o setor acadêmico. O acadêmico tinha dedicação exclusiva, o pesquisador não podia participar de nada, não podia participar da patente, dos resultados, do lucro. Não podia ter nada, só o salário dele e tinha que ter dedicação exclusiva. Nós mudamos isso exatamente para facilitar.

    Há outras formas de incentivo ao mercado privado como financiamentos com taxas subsidiadas. Houve agora uma certa redução, aliás, uma significativa redução da taxa de juros, mas ainda é caro o serviço financeiro, o empréstimo financeiro ainda é muito caro para investimento em pesquisa e inovação.

    Crédito sobre impostos, subvenções ou ainda regra contábeis mais flexíveis. No entanto, entre as vantagens dos incentivos fiscais, estão o baixo custo administrativo, a facilidade de acesso pelas empresas e a independência do setor público nas decisões de alocação de projetos e de montante a ser aplicado. Temos de flexibilizar.

    Pois bem. Diante deste cenário, segundo os dados divulgados no artigo "Efetividade da Lei do Bem no estímulo aos dispêndios em P&D: uma análise com dados em painel", feito por pesquisadores do Ipea e divulgado em 2016, o Brasil foi aos poucos aprendendo a usar a Lei do Bem.

    Segundo o Ipea, houve impacto positivo tanto no nível de dispêndio em pesquisa e desenvolvimento quanto em número de pessoal técnico-científico ocupado, porque, aí, houve essa integração, começou essa integração entre universidade e empresa.

    De acordo com o Ipea, o aumento estimado no dispêndio em pesquisa e em desenvolvimento, devido ao incentivo fiscal que foi dado, situou-se entre 43% e 81% em média. Já o aumento do número de pessoal técnico-científico variou entre 9% e 10%.

    Se a Lei do Bem trouxe benefício para a inovação brasileira, ela poderia ter trazido muito mais.

    O próprio estudo do Ipea diz que é necessário ampliar a capacidade de utilização do benefício fiscal, alargando sua base de beneficiários, e, assim, permitindo a sua plena utilização por parte das empresas.

    No entanto, com o passar do tempo, foram sendo criados vários regulamentos que repercutem em um emaranhado de procedimentos burocráticos que atrapalham e encarecem a operação empresarial, assim como comprometem as interações estabelecidas entre o setor público e o setor privado. Esse imbróglio pode ser ilustrado a partir das incongruências identificadas na aplicação dos normativos infralegais da Lei do Bem.

    Vejam: cinco anos depois da edição do Decreto 5.798, de 2006, que regulamentou a lei e que regulamentou, portanto, os incentivos fiscais, as atividades de pesquisa tecnológica e de desenvolvimento, a Receita Federal – depois de se aprovar o decreto – aprovou a Instrução Normativa 1.187, de 2011, que disciplina o mesmo conjunto de incentivos. A partir de dessa instrução normativa, empresas que usufruíam dos benefícios antes da vigência da IN, da instrução normativa, foram autuados pela Receita por terem seguido procedimentos distintos dos prescritos, embora estivessem previstos em lei e em sua regulamentação.

    A lei previa, o decreto regulamentou, e veio uma instrução normativa, o cara mete uma caneta lá, e vale mais do que uma lei, mais do que um decreto.

    Chega a ser um absurdo!

    A insegurança jurídica resultante dessa situação atingiu as medidas de incentivo, reduzindo seu potencial de efetividade. Além disso, as empresas que usufruem dos incentivos previstos na lei são autuadas pela Receita Federal e depois precisam brigar tanto no âmbito administrativo, quanto no Judiciário por seus direitos.

    Outro dia, uma empresa de uma rede de óticas teve que recorrer ao Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), porque foi autuada em R$17 milhões por não recolher a integralidade do IPI de componentes usados para a fabricação de produtos incentivados pela Lei do Bem. O cara usou a lei, obedeceu ao decreto, aí vem a Receita e mete a multa.

    Eu estive, na semana passada, na Receita, com a instituição filantrópica – vou citar o nome – Secular. Aí chega o fiscal... Ela doou os bens usados. Para não jogar fora, para não queimar, doou os bens usados para uma outra instituição. O fiscal descaracterizou a entidade dizendo que ela perdeu, então, a sua imunidade, a sua isenção. E aí já começou, a partir daquele ano que ela doou os bens, a autuar essa instituição, inclusive, com um percentual sobre a folha de pagamento – mas ela é imune, está na Constituição. Se não me engano, no art. 150. São imunes. Não são isentas, são imunes. Você não pode tributar essas instituições. Eu não sei se é porque o fiscal vai aumentar o percentual. Eu não sei se há percentual de rentabilidade ou se ele vai receber alguma coisa na promoção. Acho que há isso. Aí os caras vão autuando uma instituição em R$380 milhões. A Receita não vai ganhar nunca isso. Aí você tem que contratar advogado, há essa burocracia toda, não há mais certidão. Milhões de alunos estudando, e o Governo tem que pagar, porque é pós-graduação, doutorado, mestrado. E aí não pode, porque não há certidão, porque está sendo discutida essa questão.

    Então, aberrações é o que mais há. Nós temos que levantar, inclusive, esse excesso de instruções normativas. Cara, é impressionante! Eu estive lá também. A empresa estava num parcelamento, veio o Refis e ela optou pelo Refis. Quando ela optou, a Receita depois a excluiu, porque ela não podia, dizia que não podia, mas a lei é clara. Agora, não, tudo bem, reconheceram. Mas você tem que pagar todas as parcelas do outro parcelamento, e esse que você já pagou ela não quer compensar, não. Você tem que pedir restituição, o que leva cinco anos, sei lá quantos anos para receber. É um negócio maluco!

    Todos os dias há isso. Eu estava falando aqui, na sexta-feira, sobre o governo eletrônico, a digitalização, a importância de você colocar tudo isso em meio eletrônico, usar a tecnologia, a internet. Mas não é você pegar o mesmo processo burocrático que há hoje e jogar dentro do computador, não. Você tem que usar a tecnologia para acabar com essa burocracia. E eu disse aqui que o atendimento pessoal hoje em qualquer instituição pública fica em torno de R$48. Se você faz on-line é R$1,20, 97% de economia.

    O Rogério Carvalho é médico. Imaginem todos os médicos recebendo o seu paciente já com o prontuário digitalizado, tudo no computador, todos os exames que ele já fez na vida dele toda. O que seria uma coisa tão simples e óbvia a gente não consegue fazer.

    Voltando à Lei do Bem, a esse caso da ótica que foi autuada em R$17 milhões porque usou um equipamento e o fiscal achou que esse equipamento não estaria enquadrado na Lei do Bem. O fiscal entendeu que a empresa não provou que os comprovantes importados eram para produtos cabíveis na Lei do Bem. Aí botou alto, R$17 milhões. Aí você pega uma empresa, Senador Confúcio, e tem que contratar advogado de escritório e pagar não sei quantos por cento já desse troço.

    Eu dou um aparte a V. Exa. e lhe agradeço, inclusive, porque enriquece o nosso discurso.

    O Sr. Confúcio Moura (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - RO. Para apartear.) – Eu não queria, Senador Izalci, inibir sua linha de raciocínio, que está muito fluente, mas ainda bem que o Senado tem V. Exa. para levantar temas dessa natureza, do Brasil conspirando contra o Brasil. É o Brasil contra o Brasil, sendo que a inovação é o mecanismo natural da evolução do homem na Terra. Primeiro, pela modernização das ferramentas. Nós, até os anos 60, aqui mesmo no Tocantins, onde eu nasci, usávamos o pilão para socar arroz, não é? Quando chegou uma máquina de beneficiar o arroz com casca, para nós lá foi uma coisa extraordinária, um avanço.

    O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - DF) – Na minha cidade também.

    O Sr. Confúcio Moura (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - RO) – A gente fazia fubá para fazer cuscuz socando o milho no pilão. Depois vieram os pacotinhos de fubá, hoje em dia. E assim as ferramentas... E nem falo da tecnologia moderna, dos avanços, que são fantásticos.

    E V. Exa. está expondo aqui essa conspiração verdadeira para o lado do atraso, puxando a gente para o fundo da terra, não querendo permitir que o Brasil avance nada em inovação. Inovação significa criar coisas novas, inventar, modernizar, facilitar.

    Parabéns a V. Exa. pelo seu discurso! Parabéns a V. Exa. pela sua coerência, pelo seu trabalho aqui no Senado e na Câmara, sempre com a mesma tese! Água mole em pedra dura, todo dia falando, para ver se consegue sensibilizar, através do discurso, através dos atos, esses corações duros, corações desalmados, que realmente inibem o crescimento do Brasil. Parabéns a V. Exa.!

    O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - DF) – Obrigado.

    Continuando, sobre esse fiscal então, esse processo é do Carf, está correndo ainda lá no Carf, porque os julgadores pediram diligência para entender melhor o que estava ocorrendo. Eles acharam que não tinham capacidade técnica suficiente para julgar a questão – o próprio conselho –, mas o fiscal meteu a caneta.

    Mas veja que a situação... Um outro exemplo: um caso de aplicação da Lei do Bem que chega à última instância administrativa fiscal. Olha o desgaste para uma empresa. São custos com advogados, planejamento frustrado, possibilidade de ter que devolver um valor que não estava nos planos. Por isso, a Lei do Bem merece aprimoramentos voltados para ampliar a segurança jurídica das empresas, desburocratizar processos e, sobretudo, intensificar a sua utilização.

    Apesar do crescimento do número de empresas beneficiadas por esse dispositivo legal entre 2006 e 2017, a sua abrangência ainda é reduzida quando se leva em consideração o universo de empresas brasileiras inovadoras. Segundo dados do Ministério da Ciência e Tecnologia, 1.476 empresas foram beneficiadas, em 2017, pela Lei do Bem. No entanto, as empresas brasileiras inovadoras somam 47.693. Então, temos que avançar muito.

    O limitado número de empresas atendidas pode ser explicado pelas restrições impostas pela Lei do Bem para a concessão dos benefícios. De fato, no capítulo que trata dos incentivos à inovação tecnológica, a Lei do Bem concede vantagens fiscais que se destinam, exclusivamente, às empresas em regime de lucro real e que tenham alcançado resultado positivo correspondente naquele ano fiscal. Só para explicar: o regime de lucro real é o lucro líquido gerado pela empresa, ou seja, a diferença entre a receita e a despesa. Já o lucro presumido, que é o da maioria das empresas, são estimativas de lucro, e o Fisco trabalha com alíquotas de presunção dessas estimativas.

    Como a maior parte das empresas trabalha com o regime de lucro presumido ou opta pelo Simples Nacional, as restrições implicam a vedação de seu acesso aos incentivos da Lei do Bem.

(Soa a campainha.)

    O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - DF) – Só mais um tempinho, Sr. Presidente. Já estou terminando.

    Essa situação revela que o uso da Lei do Bem ainda pode ser melhorado. Por isso, é preciso simplificar as exigências de enquadramento e desburocratizar as rotinas e os procedimentos administrativos.

    Dadas essas evidências positivas para o impacto da Lei do Bem, cabe discutir formas de aperfeiçoamento do instrumento. Como eu já disse, é necessário ampliar a capacidade de utilização do benefício fiscal, alargando não apenas sua base de beneficiárias, mas permitindo sua plena utilização por parte das empresas. Isso envolve maior esclarecimento e melhor regulamentação por parte dos executores da lei, no caso, o Ministério da Ciência e Tecnologia e a própria Receita Federal.

(Soa a campainha.)

    O SR. IZALCI LUCAS (Bloco Parlamentar PSDB/PSL/PSDB - DF) – No mais, é necessário pensar em alterações futuras da lei para ela não se tornar obsoleta e para ser alcançada por um número maior de empresas. Ainda que esses resultados apontem para a efetividade do benefício fiscal, é importante não se perder de vista o constante processo de aperfeiçoamento do instrumento, discutindo as alternativas para evitar o seu esgotamento.

    O que eu sempre defendi e defendo aqui nesta tribuna é a eficiência da gestão. Vamos ver o que temos de marco regulatório, vamos mapear aqui os benefícios e os itens que precisam ser aprimorados, como a Lei do Bem. O certo é que precisamos colocar o Brasil na rota global da inovação. Isso se faz urgente, porque precisamos de uma cultura inovadora, empresas eficientes e competitivas, garantindo mais melhorias, melhores empregos e tecnologias que melhorem a vida de todos nós cidadãos brasileiros, que irão impactar no nosso desenvolvimento como país e reposicionar o Brasil no mapa da competitividade.

    Era isso, Sr. Presidente.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/02/2020 - Página 22