Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a Portaria nº 2.979/2019, do Ministério da Saúde, que instituiu o programa Previne Brasil e revogou todos os demais programas anteriores de atenção à saúde básica, dentre eles o Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (Nasf). Destaque para a importância do Nasf. Apelo ao Ministro da Saúde pela revogação da citada Portaria.

Autor
Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE:
  • Preocupação com a Portaria nº 2.979/2019, do Ministério da Saúde, que instituiu o programa Previne Brasil e revogou todos os demais programas anteriores de atenção à saúde básica, dentre eles o Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (Nasf). Destaque para a importância do Nasf. Apelo ao Ministro da Saúde pela revogação da citada Portaria.
Aparteantes
Confúcio Moura, Veneziano Vital do Rêgo.
Publicação
Publicação no DSF de 19/02/2020 - Página 39
Assunto
Outros > SAUDE
Indexação
  • APREENSÃO, PORTARIA, MINISTERIO DA SAUDE (MS), CRIAÇÃO, PROGRAMA, PREVENÇÃO, BRASIL, REVOGAÇÃO, PROGRAMA NACIONAL, SAUDE, FAMILIA, RECURSOS FINANCEIROS.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP. Para discursar.) – Sr. Presidente, Senador Izalci, eu venho aqui para chamar a atenção de uma medida adotada pelo Ministério da Saúde, recentemente, a Portaria 2.979, de 12 de novembro de 2019. Ela instituiu um programa denominado Previne Brasil. Até aí nada a se acrescentar. Nada a se acrescentar se esta portaria não tivesse revogado todos os programas anteriores de atenção à saúde básica que vigoram no Brasil. Entre esses programas e entre o financiamento desses programas, encontra-se o Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (Nasf).

    O Nasf é um programa que tem abrangência em todo o Território nacional, que atende Municípios com 5 mil habitantes a Municípios com 1 milhão de habitantes e que é um dos mais bem sucedidos programas de atenção à saúde da família. O Nasf foi criado pelo Ministério da Saúde, em 2008, Sr. Presidente, e seu objetivo central é apoiar a consolidação da atenção básica à saúde no Brasil. Aliás, esse é um princípio elementar, Sr. Presidente, que está na Constituição sobre o nosso SUS.

    O Sistema Único de Saúde no Brasil é o maior sistema de saúde público do Planeta, o maior. E há alguns princípios estabelecidos nesse sistema, já esculpidos no texto da Constituição. São estes princípios: primeiro, um sistema descentralizado; segundo, um sistema baseado no mandamento elementar de que saúde é direito de todos e é dever do Estado – com a saúde como direito de todos e como dever do Estado, deve ser assegurado o atendimento universal para todos os cidadãos e cidadãs brasileiros –; e um controle social, através dos conselhos municipais e estaduais de saúde e do Conselho Nacional de Saúde, que garanta a execução, a implementação e o perfeito funcionamento desse sistema. E um dos princípios constantes na Constituição é a prioridade para a saúde básica, é a prioridade para a atenção básica, porque esse tipo de atendimento é o que previne as doenças.

    Pois bem, eu faço esse relato do que está na Constituição sobre princípios de funcionamento do Sistema Único de Saúde para entender onde se encaixa o Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica. Ele se encaixa dentro de uma das vertentes estratégicas para atendimento à saúde. O Nasf é responsável pela atenção básica da saúde no Brasil, ampliando as ofertas de saúde na rede de serviços, assim como a resolutividade, a abrangência e o alvo de ações.

    Esse programa foi regulamentado anteriormente pela Portaria de Consolidação nº 2, do Ministério da Saúde, configurando núcleos de equipes multiprofissionais que atuam de forma integrada com as equipes de Saúde da Família, ou seja, o Nasf é parte integrante da outra parte, é um dos pés do tripé que sustenta o atendimento básico de saúde. Por um lado, há as equipes de Saúde da Família; por outro, os Núcleos de Atenção à Saúde da Família, os NASFs.

    Esse programa, Sr. Presidente e colegas Senadores, trabalha sob a lógica da interdisciplinaridade, do apoio da organização da clínica e do cuidado para com a saúde. São equipes de psicólogos, de assistentes sociais que se dedicam ao atendimento domiciliar, que se dedicam a atividades nas Unidades Básicas de Saúde. Para se ter uma ideia, Sr. Presidente, a capital do meu Estado, o Município de Macapá, possui oito equipes do Núcleo de Atenção à Saúde da Família, que dão cobertura para todas as unidades básicas, para as mais de 50 Unidades Básicas de Saúde que nós temos no Município de Macapá. No Estado do Amapá são mais de 20 equipes para atender às Unidades Básicas de Saúde dos 16 Municípios do Estado. É esse tipo de atendimento que vai estar comprometido, porque essa Portaria nº 2.979, editada pelo Sr. Ministro da Saúde no último dia 12 de novembro, na prática, Sr. Presidente, inviabiliza a continuação do financiamento do Nasf e, inviabilizando a continuação do financiamento do Nasf, inviabiliza uma das estratégias fundamentais dos Programas Saúde da Família, que são os programas que previnem que as doenças cheguem e que são os programas que atendem os mais pobres.

    Sr. Presidente, o que está acontecendo é um desmonte dos programas de saúde que atendem os que mais precisam, dos programas de saúde que atendem os mais pobres, do Sistema Único de Saúde como sistema público, para atender a todos.

    Ora, Sr. Presidente, a saúde de média ou de alta complexidade é excepcional, é para atendimento excepcional. Sr. Presidente, a saúde, o atendimento de saúde básico nas Unidades Básicas de Saúde, com estratégias como o de Saúde da Família e como estratégias como o Nasf, é para atender, para dar cabo aos princípios centrais que estão na Constituição sobre o SUS, Sistema Único de Saúde descentralizado, universal e gratuito baseado no princípio de que saúde é direito de todos e dever do Estado. Quando se tira uma dessas pernas – e não venham dizer que não vão tirar –, a Portaria 2.979, claramente, muda a forma de financiamento, estabelece um financiamento próprio e diz que estratégias de saúde da família como o Nasf, para serem mantidas, devem contar com a disponibilidade do Município.

    Veja, Sr. Presidente: só na capital do meu Estado, em Macapá, pelas oito equipes de Nasf, o Município recebe, pelo menos, R$30 mil pela atuação de cada equipe. São, mais ou menos, R$200 mil para a estratégia de saúde da família do Nasf funcionar, na minha capital, por mês. Com a retirada desses recursos, um município como Macapá pode até, de alguma forma, tentar manter um programa como esse, mas o que dizer de Municípios do interior – e eu vou continuar no exemplo do meu Estado –, como Mazagão, como Tartarugalzinho, como a cidade de Amapá, como Oiapoque, como Laranjal do Jari, que não têm a disponibilidade de recursos que a capital tem. E não vou muito longe: até a vizinha Santana onde encontrará recursos para manter um programa dessa natureza? Programa este que, repito, atende aos mais pobres.

    São psicólogos para atender pessoas em depressão. E o meu Estado é um dos Estados que tem um dos maiores índices de suicídio do Brasil. São assistentes sociais que, juntamente com os psicólogos, atendem, em terapia, àqueles que mais precisam. 

    Não há outro termo se não dizer que essa portaria do Ministério da Saúde é uma crueldade. É como se proclamar que os pobres, os que mais precisam não podem ter direito a atendimento psicológico, Senador Veneziano, não podem ter direito a ter assistentes sociais, não podem ter direito ao atendimento da saúde da família. É a mesma coisa que condenar esses a não terem esses direitos.

    Sr. Presidente, existem dois projetos de decreto legislativo – meu caríssimo Senador Confúcio, V. Exa. sabe, com a experiência administrativa que tem, do que estou falando – tramitando aqui no Senado, um de minha autoria, outro de autoria do Senador Humberto Costa. Esses dois projetos de decreto legislativo revogam a Portaria 2.979.

    Eu quero, aqui desta tribuna, apelar ao Sr. Ministro da Saúde, aos colegas Senadores do Amapá para a sensibilidade necessária em relação a esse tema. Eu repito: só na capital, Macapá, são oito equipes de saúde da família, são milhares de amapaenses que são atendidos por esse programa. E quero, ainda desta tribuna, apelar ao Ministro da Saúde. É verdade que há dois projetos de decreto legislativo aqui para revogar a portaria do Ministério da Saúde, mas não era necessário, Senador Veneziano, chegar a tanto. Eu peço ao Ministro da Saúde, que é médico, uma reflexão sobre isso.

    O Ministro da Saúde é médico, conhece o SUS, conhece os princípios do SUS, que, como sempre gosto de repetir, é o maior sistema de saúde pública do Planeta, foi uma conquista da Constituição de 1988, que nós temos sempre de ressaltar. E ele sabe muito bem que essa portaria, na prática, inviabiliza uma das ações centrais, uma das atuações centrais do SUS, que é a universalização da saúde, ou seja, para que a saúde possa chegar àqueles que mais precisam. E ela só pode chegar àqueles que mais precisam através das estratégias de saúde da família e do Núcleo de Apoio à Saúde da Família.

    Extinto o Nasf, o problema é que não está sendo dito o que vai ser colocado no lugar e como centenas de milhares de famílias vão ser atendidas pelos programas de saúde da família e pelos programas de atenção básica.

    Senador Veneziano, é com muita honra e satisfação que o ouço. E ouvirei, em seguida, o médico, abalizado também, competente nessa área, Senador Dr. Confúcio.

    O Sr. Veneziano Vital do Rêgo (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB. Para apartear.) – Prevalentemente, ouçamos o nosso Governador Confúcio.

(Intervenção fora do microfone.)

    O Sr. Veneziano Vital do Rêgo (Bloco Parlamentar Senado Independente/PSB - PB) – Obrigado, Senador Confúcio.

    Senador Randolfe, serei brevíssimo, até porque temos quem particularmente pode dividir com V. Exa. o conhecimento de causa sobre esse assunto.

    Mas eu me atrevo a falar, até porque, bem sabem os companheiros, eu tive a oportunidade e a experiência na prática de poder administrar a nossa cidade, como gosto de tratá-la, pois assim a tenho, a minha amada Campina Grande. E, enquanto Prefeito, durante dois mandatos, nós conseguimos fazer parcerias com o Governo Federal, à época ainda do Presidente Lula e, a posteriori, da Presidente Dilma; parcerias que permitiram a Campina receber investimentos significativos, tendo de nós, enquanto gestores, respondendo pela prefeitura, as devidas contrapartidas dos núcleos de apoio à saúde da família.

    E eu sei o quanto foi importante para um projeto de implementação de investimentos que muitas das vezes são investimentos vistos com olhos enviesados para o setor da atenção básica. E nós sabemos muito bem o que é fazê-lo, o que é poder prevenir para não ter custos maiores quando o paciente não recebe, logo no início de qualquer enfermidade, um tratamento de menor custo.

    Pois bem, nós saímos de 34 equipes do PSF e fomos para 94, mas, ao lado dessas equipes do PSF, Senador Confúcio, nós tínhamos uma estrutura do Nasf, com ginecologistas, com psicólogos, com assistentes sociais, que eram referenciados da atenção básica para lá. E isso trouxe uma qualidade, vista e constatável nos próprios números apresentados pela nossa Secretaria de Saúde.

    Quando nós vemos uma abordagem como essa feita de forma muito competente, precisa e necessária por V. Exa., não há como não, para quem viveu e quem tem minimamente a sensibilidade de saber o que isso significará, aliarmo-nos em convergência a esse apelo. E eu gostaria muito de que V. Exa. me permitisse a subscrição desse PDL.

    Mas também concordo: penso eu e acredito na altura, na competência, no perfil profissional do ex-Deputado Ministro Mandetta, porque, conhecedor muito bem que é, haverá de rever essa decisão ministerial para que nós não precisemos ir tão longe, através de um PDL, a não ser que, de fato, assim precisemos fazê-lo.

    Obrigado e minhas desculpas a V. Exa.

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP) – Incorporo todo o aparte de V. Exa. ao meu discurso.

    Antes de passar a V. Exa., permita-me, Senador Confúcio, dizer, primeiro, ao Senador Veneziano o seguinte: sei o quanto V. Exa. cuidou da bela e grande Campina Grande – que é bela mesmo, sou testemunha disso. E nada melhor do que o abalizado depoimento de V. Exa. para reiterar a importância de um programa como este.

    Os PDLs, na verdade, estão apresentados já, um de minha autoria, outro de autoria do Senador Humberto Costa. Ficaria muito exultante se contasse com a relatoria abalizadora de V. Exa. ou do Senador Otto, médico que é desta Casa também, ou do Senador Confúcio, que eu acho que poderia dar uma enorme contribuição em relação a isso.

    Mas também reitero o que V. Exa. disse: quero apelar ao bom senso de um conhecedor da saúde pública, como é o Ministro Mandetta.

    Senador Confúcio.

    O Sr. Confúcio Moura (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - RO. Para apartear.) – Senador Randolfe, o seu discurso é muito oportuno. É um discurso bem medido. V. Exa. aborda a parte barata da saúde, a parte mais barata da saúde, que é a atenção básica de saúde e todos os seus núcleos formadores. Então, eu cumprimento V. Exa. pela oportunidade do seu discurso.

    O atendimento ambulatorial do SUS é um investimento muito poderoso na parte curativa do pronto-socorro, na parte hospitalar. Aqueles pacientes não atendidos adequadamente vão terminar lá na frente com complicações, o custo é elevadíssimo. Então, V. Exa. está fazendo uma preparatória econômica do gasto público na saúde muito bem feita. Acredito que o seu discurso terá um eco muito bem aceito pelo Ministro Mandetta, que é altamente sensato. E, com certeza, o seu discurso será refletido como de uma profundidade muito grande.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Confúcio Moura (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/MDB - RO) – Parabéns a V. Exa.!

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP) – Obrigado, Senador Confúcio.

    Eu fico mais do que representado aqui, mais pelos apartes, porque são apartes de duas... Um médico, o Dr. Confúcio, Senador Confúcio... Ambos governaram Estados e, no caso do Senador Veneziano, um Município. Sabem a importância de um programa dessa natureza. E faço minhas as suas palavras, Senador Confúcio. Essa é a parte do Sistema Único de Saúde que diminui o gasto público, porque a estratégia de saúde de família impede o atendimento na saúde de média e de alta complexidade e diminui o gasto da saúde para os próprios cofres públicos, ou seja, é o melhor do ponto de vista humanitário, em primeiro lugar; em segundo, é o melhor do ponto de vista também econômico.

    Então, eu concluo, Sr. Presidente, mais do que honrado pelos dois apartes que aqui recebi e que balizam e reiteram o apelo ao Sr. Ministro da Saúde para que reveja essa portaria. E, não sendo revista, eu apelo a esta Casa, ao Presidente Davi Alcolumbre, do meu Estado, que sabe também da importância do Nasf para colocar os dois PDLs em apreciação.

    Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/02/2020 - Página 39