Exposição de convidado durante a 188ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de Debates Temáticos destinada a discutir o conflito entre Israel e o Hamas.

Autor
CLAUDIO LOTTENBERG
Casa
Senado Federal
Tipo
Exposição de convidado
Resumo por assunto
Assuntos Internacionais:
  • Sessão de Debates Temáticos destinada a discutir o conflito entre Israel e o Hamas.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/2023 - Página 11
Assunto
Outros > Assuntos Internacionais
Matérias referenciadas
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, DISCUSSÃO, CONFLITO, PAIS ESTRANGEIRO, ISRAEL, HAMAS.
  • REPUDIO, ATAQUE, HAMAS, TERRORISMO, GUERRA, CONFLITO, PAIS ESTRANGEIRO, ISRAEL.

    O SR. CLAUDIO LOTTENBERG (Para exposição de convidado.) – Senador Jorge Seif, a quem eu, em nome da comunidade judaica do Brasil, agradeço e muito pela sua oportuna sensibilidade em relação ao momento em que nós, judeus de todo o mundo, ultrapassamos. Meu prezado Senador Sergio Moro, amigo de tantos anos; Embaixador de Israel, Daniel Zohar Zonshine, e neste momento, até numa quebra de protocolo; Sra. Mary Shohat; Sra. Hen Nisenbaum, a quem eu estendo a minha plena e total solidariedade, vamos manter as esperanças. Nós não estamos somente torcendo, nós estamos vivendo cada um dos momentos de seus familiares como se fossem nossos familiares, e nós não vamos nos acalmar ou sossegar enquanto os reféns não forem devolvidos às suas condições de vida.

    Bom dia a todos. Quero agradecer ao Senador Jorge Seif pelo convite para estarmos aqui nesta importante tribuna, que é o Senado Federal do Brasil. Agradeço também ao Embaixador Daniel Zohar Zonshine, ao Cônsul Rafael Heidrich, que foram incansáveis para que este momento pudesse acontecer. Agradeço imensamente aos familiares dos reféns que seguem em poder dessa organização terrorista, que é o Hamas, por mais esse exemplo de força, resiliência e coragem. Agradeço, senhores familiares, pelo amor de vocês, pois só o amor é que nos dá força. O amor que, como brasileiros, conhecemos como poucos; o amor que se contrapõe ao ódio; o amor que alimenta a esperança e que não mais do que meritório se opõe ao discurso de ódio.

    Mas quero iniciar fazendo uma retrospectiva. O Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto foi designado pela Assembleia Geral da ONU em 1º de novembro de 2005. A data escolhida, 27 de janeiro, marca a libertação do campo de concentração de Auschwitz-Birkenau pelas forças aliadas em 1945. Esse dia visa lembrar as vítimas do Holocausto e prevenir a repetição de tais atrocidades, promovendo a educação sobre a história do Holocausto e os princípios dos respeitos aos seres humanos.

    Pois saibam, o Brasil, liderado naquela época já pelo Presidente Lula, teve um papel central nesta criação. E eu me encontrava, quando isso foi formalizado, aqui mesmo em Brasília. Fomos nós, brasileiros, os primeiros signatários desta iniciativa.

    Aliás, o Brasil se caracteriza por ser palco das convergências, polo de entendimento entre os diferentes e um sinônimo de compromisso com a paz.

    Afirmo, Sr. Presidente, que o discurso de ódio, preconceito, discriminação, agressão a minorias não é parte de manual de conduta do povo brasileiro. Em nosso Brasil convivem todas as etnias, pessoas das mais diferentes origens. Somos a pátria que nasceu da integração entre um povo nativo, os índios, e gerações de gerações de imigrantes que sempre se relacionaram aqui no nosso Brasil e muito bem.

    Entretanto, não poderia imaginar que viveria eu para presenciar mais uma data para não ser esquecida, o dia 7 de outubro de 2023, o dia que marca o calendário da humanidade de forma singular, pois, após o Holocausto, foi este o dia do pior, do maior e mais bárbaro ataque contra o povo judeu já ocorrido. O grupo terrorista Hamas invade Israel e massacra barbaramente 1,4 mil inocentes civis de várias nacionalidades, incluindo brasileiros, torturando, matando e sequestrando, com especial crueldade. Bebês, crianças, mulheres e idosos, ninguém – ninguém – foi poupado. Pais foram torturados diante de filhos antes de serem mortos e vice-versa. Pessoas foram queimadas vivas, mulheres estupradas e mutiladas antes de serem mortas. Muitos ainda estão sequestrados, infelizmente. Foi o pior e mais bárbaro ataque contra o povo judeu desde o Holocausto, conforme dizia anteriormente.

    Mas aí surge o inesperado ou, então, meus amigos, o esperado. Fatos se apagam e o discurso de ódio começa a emergir. Reféns são esquecidos, Senador, e o quadro fratricida simplesmente subtraído. Falas ou citações equivocadas, distorções da realidade, observações unilaterais. E o relato e o retrato estão aí: o número de denúncias de atos e manifestações antissemitas aumentou em 1.000%, comparando-se os períodos entre 2022 e 2023.

    Pior, o perigo não está só no discurso de ódio. Aqui, em nosso Brasil, indivíduos foram presos em razão do possível planejamento de um atentado terrorista contra instituições e contra a liderança judaica.

    Preocupo-me, Senadores, preocupo-me como judeu, preocupo-me com brasileiros contra instituições e contra a liderança judaica, preocupo-me também como um cidadão do mundo.

    E hoje estamos aqui para tomar, graças à sua iniciativa, Senador, uma posição clara, não apenas com palavras para agradar a um público consternado, mas com verdadeira compreensão e crença como o mundo de fato espera de nós.

    Acredito que, como líderes de instituições, temos a responsabilidade e a obrigação de usar nossas plataformas privilegiadas para ajustar a bússola moral de nossa sociedade, orientando os nossos liderados a distinguir o certo do errado e a se levantar pelo que é certo. A condição respeitada de nossas instituições, os efeitos em cascata de nossas palavras e as implicações para a sociedade não podem e não devem ser subestimadas.

    Numa nota final, Israel está em guerra, de fato, Embaixador, contra uma organização terrorista e cruel, e o país está vivendo o momento, talvez, de maior dificuldade de sua história.

    Um brasileiro ainda é mantido como refém pelo Hamas, a quem foi negada a visita da Cruz Vermelha. E ele nos importa como quase duas centenas de reféns de outras nacionalidades ainda ali mantidos.

    O mundo não quer conviver com o terrorismo, mal que afeta hoje a pátria judaica, mas pode, como já aconteceu, se espalhar globalmente.

    Um país como o Brasil, Senador Moro, por sua presença em vários fóruns de debate internacionais, possui importância no cenário econômico e é referência, principalmente por sua história de boa convivência, como já mencionei. Temos todas as condições para inspirar o mundo e participar de maneira determinada em processos que construam paz e aproximem os diferentes. Entretanto, cabe nesse protagonismo a responsabilidade do discurso equilibrado, da capacidade de entendimento do todo e do pano de fundo e, mais, do sério e grave problema que representa uma organização terrorista e suas ramificações junto a regimes absolutistas.

    Vale lembrar que o Hamas é uma derivada da Irmandade Muçulmana, grupo sectário nascido no Egito no início do século XX, que já gerou o ISIS e o Al-Qaeda, entre outros. Defender, justificar ou relativizar as atrocidades do Hamas não é apenas prejudicial à causa palestina, mas também uma afronta aos valores fundamentais.

    A leitura do todo é o que nos preocupa. Enquanto houver sequestrados, enquanto houver protagonismo do terrorismo, o mundo não pode fechar os olhos ressignificando dados de um passado recente.

    Sabemos muito bem que não é desejo de ninguém importar esse conflito, mas também não podemos deixar de participar do debate. As responsabilidades dos cidadãos transpõem fronteiras estabelecidas no mundo geopolítico, mas, para essa participação, é necessário ter a clareza de que Israel se defende, de que reféns devem ser libertados e de que o terrorismo deve ser eliminado. Isso não é importante somente dentro do contexto do Oriente Médio, isso é importante no contexto do mundo civilizado e da boa geopolítica.

    Importante lembrar aqui o que prega o Hamas, como disse o Embaixador: a aniquilação de Israel e morte aos judeus em todo o mundo; jihad, guerra santa; regime de extremismo religioso restringindo liberdades e direitos; utilização de recursos para a compra de armas e ataques em vez de cuidar dos civis; bases militares instaladas propositadamente em hospitais, escolas e mesquitas; uso da população civil como escudo humano. Com o Hamas não há negociação e muito menos paz.

    A história nos ensina que a desconstrução não é um fenômeno isolado e inacabado. O Holocausto e o horror dos campos de concentração são lembranças imprescindíveis para que algo do gênero jamais ocorra novamente. E este é o momento de defendermos o "jamais novamente". É agora, quando o antissemitismo vem envolto em negacionismo e atos de ódio que ignoram o direito à convivência pacífica.

    Neste momento crítico para israelenses e palestinos, é fundamental reconhecer que a verdade está em jogo e que a história está sendo escrita em um palco onde a tecnologia, a comunicação e a condição humana se entrelaçam em uma narrativa sem precedentes. O combate à desinformação, ao antissemitismo e ao extremismo é um esforço coletivo.

    E ações como a sua, Senador, que exige a participação e a convocação ativa de todos, chamando aqui membros do Senado, jornalistas, agências de verificação de fatos, plataformas, nos ajudam e ajudam muito, porque a desinformação e o discurso de ódio são ameaças que não apenas distorcem a realidade como colocam vidas em perigo igualmente e, em uma guerra em andamento, como é a de Israel contra o grupo terrorista Hamas, elas podem ainda ser mais letais. Uma mentira organizada e generalizada, ainda que seja incapaz de substituir a verdade e produzir uma nova, tem a força de destruir a verdade factual, talvez de maneira irrecuperável, como já diria Hannah Arendt, em 1967.

    A comunidade judaica e todos nós aqui presentes estamos unidos e mobilizados como nunca estivemos, cada um fazendo o que pode fazer contra o terrorismo e contra o antissemitismo. E o fazemos porque essa batalha não é nossa, não é só dos judeus, não é só de Israel tampouco. Ela é o retrato da luta do bem contra o mal.

    A liderança comunitária é um trabalho coletivo e o que nos anima é ver mobilização e apoio de todos nessa hora. É, por isso, Sr. Senador, que nós da liderança judaica agradecemos muito a todos vocês pelo apoio, pela mobilização, pelo esforço neste momento fundamental da história judaica.

    O povo judeu já resistiu a piores catástrofes e resistirá e sairá ainda mais forte. Nós unidos jamais seremos vencidos. Nós unidos somos capazes de realizar milagres. E essa é a nossa história, esse é o nosso segredo. Os dados, a história, a ética, os direitos são muito claros, não preciso eu repeti-los.

    Senadores, só o preconceito explica como a mentira consegue sufocar a verdade, mas nós estamos juntos a bem da verdade, da legitimidade, na luta do bem contra o mal.

    Am Yisrael Chai. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/2023 - Página 11