Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da aprovação do Projeto de Lei nº 2903, de 2023, que determina o marco temporal para demarcação de terras indígenas.

Autor
Vanderlan Cardoso (PSD - Partido Social Democrático/GO)
Nome completo: Vanderlan Vieira Cardoso
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Política Fundiária e Reforma Agrária, População Indígena:
  • Defesa da aprovação do Projeto de Lei nº 2903, de 2023, que determina o marco temporal para demarcação de terras indígenas.
Aparteantes
Dr. Hiran.
Publicação
Publicação no DSF de 20/09/2023 - Página 44
Assuntos
Economia e Desenvolvimento > Política Fundiária e Reforma Agrária
Política Social > Proteção Social > População Indígena
Matérias referenciadas
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, CRIAÇÃO, MARCO TEMPORAL, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS.

    O SR. VANDERLAN CARDOSO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - GO. Para discursar.) – Minha Presidente, que honra, Senadora Zenaide, ver V. Exa. sentada aí, presidindo esta sessão nossa.

    Meus cumprimentos aos Senadores e Senadoras presentes.

    Antes de iniciar a minha fala, minha Presidente, eu quero apresentar alguém que está nos visitando aqui, o Deputado Federal Márcio Correa. Ele, que está aqui nesta visita, é lá da cidade de Anápolis e nosso Presidente do partido MDB. Acompanhando-o, está o Deputado Estadual Amilton Filho, competentíssimo jovem Deputado Estadual, e a Vereadora Andreia Rezende. Sejam muito bem-vindos, Andreia, Márcio e Amilton, a esta Casa de leis.

    Sra. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, como vocês se sentiriam se a Justiça autorizasse que a sua casa, onde você vive com sua família, filhos e netos, fosse tomada de você e entregue a uma outra pessoa? Uma terra sua, que você adquiriu ou recebeu do Governo e ocupava, há anos, onde você realizou benfeitorias, construiu um lar e começou a produzir. Tudo para entregar para uma outra pessoa que alega ter vivido ali antes. Já pensaram?

    Pois é exatamente isso o que acontece no Brasil. Muitas vezes, quando se define uma nova demarcação de terras indígenas, homens, mulheres e crianças são retirados de suas propriedades – tudo o que eles conseguiram construir durante anos –, todos mandados embora, sem nenhuma consideração por todo o trabalho e por tudo o que construíram ali.

    Temos, hoje, em nosso país, cerca de 13% do território nacional já demarcado e consolidado como terra indígena, Senador Cleitinho. Não é segredo para ninguém que existem interesses nem sempre republicanos ou legítimos que envolvem as terras ricas e produtivas que temos por aqui. Por isso, defendo com veemência, Senador, o Projeto de Lei 2.903, de 2023, conhecido como marco temporal, que busca regulamentar as terras indígenas no Brasil. O projeto veio da Câmara após 15 anos de tramitação e recebeu parecer favorável do Relator aqui, no Senado, Senador Marcos Rogério.

    Aqui, a matéria foi aprovada pela Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, onde eu tive o prazer de votar favoravelmente, em agosto, quando a Relatora, Senadora Soraya Thronicke, rejeitou dez emendas para alteração do texto.

    Para quem não sabe e está nos assistindo pela TV Senado, marco temporal é uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. A tese surgiu em 2009, em parecer da Advocacia-Geral da União sobre a demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima.

    Sra. Presidente, eu acompanhei essas discussões de perto, porque eu conheço, como V. Exa. sabe, aquela região. Conheço a Raposa Serra do Sol, conheço a Reserva Yanomami, Surucucu, toda aquela região eu conheço pessoalmente, não de ouvir falar, não, mas de ir lá conhecer, Senador Astronauta Marcos Pontes.

    E agora querem acabar com o marco que deu estabilidade e tranquilizou muitas famílias que já estão em suas terras. Acompanho esse assunto de perto e vivi na pele o que muita gente enfrenta hoje em dia, o que gerou uma insegurança jurídica dos produtores rurais do nosso país, desde os pequenos produtores, do agricultor familiar e do grande produtor.

    Quando eu era ainda criança, entrando na adolescência, meu pai sonhava em ter um pedaço de terra para poder trabalhar. Morávamos em Goiás, não tínhamos condições de comprar nenhuma chacrinha, nenhum alqueire de terra, Senador Marcos, em Goiás.

    Na década de 70, começo de 80, na época aí dos militares, ocupar a Amazônia Legal, começando ali de Barra do Garças e descendo aí até o Estado de Rondônia, Roraima, Amazonas, Amapá, Acre, e assim por diante, o próprio Governo Federal incentivou milhares de famílias a migrarem para essa região e receber um pedaço de terra para chamar de seu, onde poderiam produzir e prosperar. Partimos para o Norte do Brasil.

    Senadora, nossa Presidente, à época, meu pai foi muito corajoso. Acho que o sonho dele era maior do que as dificuldades. Então, nós fomos ali, cinco filhos, todos pequenos. Eu estava, então, com 17 anos de idade, a mais velha, com 18, e os outros ainda pequenos. Então, nós fomos para Roraima com esse sonho, porque ali tinha a reforma agrária.

    Então, chegava ali, Senador, requeria um pedaço de terra, e o Governo dizia o seguinte: tem que trabalhar, formar a pastagem, plantar, para ter direito à escritura, à titularização dessas terras. E assim meu pai e nós trabalhamos ali feito doidos. Meu pai era bruto para trabalhar, Senador. Pensa num homem bruto para trabalhar, Senador!

    Anos se passaram trabalhando arduamente naquele solo, preparando e cultivando a terra. Um dia, minha Presidente, pessoas que não eram brasileiros, pessoas da Guiana Inglesa, caboclos que trabalhavam naquelas fazendas, que foram... a maioria daqueles proprietários foi pela reforma agrária, inclusive meu pai. Ali, eles se ajuntaram, porque no final de semana eles não queriam voltar para a Guiana Inglesa, e ali formaram o que era chamado ali de maloca, Senador Esperidião Amin. E maloca nada mais é do que uma juntada de pessoas.

    E ali o governo, a Funai começou uma história de que era terra indígena. Essa região, Senador, é a região do Estado de Roraima chamada Serra da Lua, região muito bonita. E ali foi formada uma reserva indígena, e se demarcou uma grande quantidade de terra para uma meia dúzia, Senador Cleitinho, de caboclos que existiam ali, que não eram brasileiros – não eram –, falavam o dialeto deles, ali da Guiana Inglesa. E se tomou tudo o que nós tínhamos, o que nós produzimos ali ao longo desses anos com muito esforço e dedicação. Isso foi feito sem qualquer debate ou critério justo, pois essas pessoas não eram índios e nem brasileiras, mesmo assim nós perdemos tudo e tivemos que recomeçar do zero, sem terra e sem esperança.

    Essa experiência marcante da minha família reflete a importância crucial de estabelecer um marco temporal para as demarcações de terras, porque não foi apenas a gente que passou por essa situação; muitos brasileiros e brasileiras tiveram suas terras tomadas em casos parecidos com o do meu pai. O Projeto de Lei 2.903, que agora debatemos, visa estabelecer esse marco temporal de 1988, delimitando quais áreas indígenas têm direito à demarcação, considerando territórios já ocupados.

    Mas por que isso é tão relevante, minha Presidente?

    Primeiramente, é importante entender a extensão...

(Soa a campainha.)

    O SR. VANDERLAN CARDOSO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - GO) – Já estou terminando, Sra. Presidente.

    É importante entender a extensão das terras indígenas no Brasil. De acordo com levantamento do censo do IBGE e da Funai, mais de 100 milhões de hectares são reconhecidos como terras indígenas, principalmente na Amazônia Legal. A existência de tantos conflitos entre produtores indígenas em diversas regiões ressalta a necessidade de estabelecer regras claras e justas. A agricultura familiar é vital para nosso país. Com quase 4 milhões de propriedades, ela contribui com 23% do valor da produção agropecuária e gera 67% das ocupações rurais. Qualquer insegurança jurídica nessas áreas pode ter consequências devastadoras, afetando diretamente nossa produção de alimento, como mandioca, feijão, carne, arroz, milho...

(Soa a campainha.)

    O SR. VANDERLAN CARDOSO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - GO) – ... e tantos outros produtos. Em estados como o de Mato Grosso, o agronegócio representa mais de 20% do PIB, com destaque para o cultivo de soja e milho, além de empregar cerca de 187 mil pessoas. No Pará, lideramos a produção nacional de diversos produtos, agrícolas e minerais. Exportamos uma quantidade significativa desses produtos.

    A incerteza em torno das demarcações coloca em risco essas atividades econômicas essenciais, Senador Hiran.

    O marco temporal visa garantir a segurança jurídica para os produtores, mantendo a soberania nacional. Terras demarcadas como a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, Senador Hiran, demonstram que interesses internacionais podem prevalecer sobre os nacionais.

    Esse projeto busca proteger nossos produtores rurais contra invasões e incertezas...

(Soa a campainha.)

    O SR. VANDERLAN CARDOSO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - GO) – ... que prejudicam a produção e a venda de alimentos em nosso país.

    Presidente, eu sei que eu estou passando do tempo, mas o assunto é muito importante, esse tema. Eu queria aqui mais uma vez, Senador Hiran, falar de Raposa Serra do Sol.

    Senador Hiran, ao chegar em Roraima na década de 1980, começo de 1980, já o conheci. Nós sabemos o que era a Raposa Serra do Sol quando ela produzia ali arroz, arrendado ali pelos índios aos produtores rurais.

    Eles, além de receber por esse arrendamento, ainda tinham o trabalho garantido ali naquelas produções de arroz. Depois que se levantou a polêmica e foi demarcado pelo STF Raposa Serra do Sol, vai lá em Roraima conhecer a situação hoje que passam aqueles índios, aqueles caboclos de Raposa Serra do Sol.

    Olha só a gravidade, minha Presidente, do que estão tentando fazer com relação à demarcação e à extensão de mais áreas indígenas no nosso país. Portanto, reitero meu apoio ao projeto, que busca estabelecer o marco temporal para as demarcações de terras indígenas no Brasil.

    Essa proposta é fundamental para garantir a segurança jurídica e preservar nossa soberania, promovendo a paz social em nosso país. Juntos, podemos construir um futuro mais próspero para todos os brasileiros, incluindo nossos irmãos indígenas.

    O Sr. Dr. Hiran (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) – Minha Presidente, a senhora me permite apartear o nosso querido Senador Vanderlan?

    A SRA. PRESIDENTE (Zenaide Maia. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - RN) – Sim.

    O Sr. Dr. Hiran (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR. Para apartear.) – Querida Presidente Senadora Zenaide, minha colega, amiga, é uma honra fazer um aparte ao Senador Vanderlan, que também... Você, além de minha colega médica, o Vanderlan é meu amigo há 40 anos. Parte da família já passou pelas minhas mãos.

    Vanderlan, eu quero aqui reforçar as suas palavras, essa sua fala. No nosso Estado de Roraima, que você conhece muito bem. Aliás, o seu pai foi para lá e terminou perdendo as terras, por essa insegurança jurídica. E eu também, Vanderlan, primeiro dinheirinho que eu ganhei lá em 1982 eu comprei uma propriedade. A minha foi a primeira a ser desintrusada da área Ponta da Serra, que é lá no caminho...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Dr. Hiran (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) – ... de quem vai para Pacaraima, porque ali também tem uma reserva, que é a Reserva São Marcos, de 800 mil hectares.

    Veja bem, hoje no nosso Estado de Roraima nós temos apenas 18% do nosso estado apto para o agronegócio e a agricultura familiar, minha querida Zenaide, porque temos lá, senhoras e senhores, meu querido Vanderlan, 33 reservas indígenas demarcadas.

    Temos uma reserva lá que é a Reserva Yanomami. A senhora sabe de que tamanho é essa reserva, minha querida Presidente? Ela sabe porque ela participou da nossa Comissão Externa Yanomami. Ela é um pouquinho maior do que Portugal. Portugal tem 9,6 milhões de hectares e 13 milhões de pessoas; e lá nós temos uma reserva de 9,6 milhões de hectares para cerca de 20 mil indígenas.

    Além do que, também, como nós já falamos da reserva...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Dr. Hiran (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) – ... São Marcos, também, ao lado da reserva São Marcos, isolando todo o norte do nosso estado, da nossa fronteira com a Venezuela e com a Guiana, nós temos a Raposa Serra do Sol, que são duas coisas completamente distintas, mas que, infelizmente, foram juntadas pelo Supremo Tribunal Federal numa coisa só.

    Nós temos várias etnias. Etnia do lavrado, onde estava a nossa maior plantação de arroz irrigado na Várzea, que se acabou; e nós temos a área lá da Serra do Sol, dos ingaricós, que é uma etnia completamente diferente dos indígenas macuxis e uapixanas do lavrado.

    Olhem só, toda essa insegurança jurídica acontece por quê? Porque nós não temos esse marco legal.

    Quando se fala: "Olha, vai ampliar áreas indígenas em nosso estado". Minha querida Presidente, vários investidores aqui do Centro-Oeste e do Sul do país, que estão fazendo aí uma revolução...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Dr. Hiran (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) – ... no agronegócio no nosso estado, voltam atrás, não querem mais investir.

    E sabe quem sofre com isso, Presidente? São os brasileiros, os roraimenses que moram lá, que têm que sustentar os roraimenses, têm que sustentar os venezuelanos que chegam à Roraima diariamente, em cerca de 600 a 700 pessoas, cuja metade é acolhida pela Operação Acolhida e cuja outra metade fica a perambular e vagar sob as marquises e as árvores, tanto da nossa capital quanto do nosso interior.

    Agora mesmo, o Governo brasileiro ampliou algumas áreas de preservação.

    Quando se fala "vamos ampliar a área de preservação", pronto! A nossa atividade mais importante, que é o agronegócio, dá uma parada, sofre uma solução de continuidade. Por isso, e também combatendo narrativas, porque tem gente dizendo que, se a gente aprovar o marco temporal aqui, nós vamos diminuir terra indígena. Não!

(Soa a campainha.)

    O Sr. Dr. Hiran (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) – As terras já demarcadas são terras já demarcadas, nós respeitamos. Agora, nós precisamos estabelecer um limite, e esse limite já está consignado, inclusive, nas disposições transitórias, quando foi aprovada a Raposa Serra do Sol e o Ministro Menezes de Direito colocou as condicionantes lá. Lá está o marco temporal.

    Eu acho que a gente precisa aprovar o mais rápido possível esse projeto aqui nesta Casa para dar segurança jurídica a quem sustenta este país, que é o agronegócio, Presidente, porque a indústria, neste país, está andando de lado, não cresce há muito tempo. Só o que cresce neste país é o agronegócio e a agricultura familiar.

    Parabéns, meu querido Senador Vanderlan.

    O SR. VANDERLAN CARDOSO (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - GO) – Obrigado, Senador.

    O Sr. Dr. Hiran (Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) – Um grande abraço e dê um grande abraço na minha querida suplente de Senador, Izaura, sua esposa, por quem eu tenho um grande respeito, admiração e amizade.

    O SR. VANDERLAN CARDOSO (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - GO) – Obrigado, Senador.

    Presidente, era só para o momento.

    Obrigado, Sra. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/09/2023 - Página 44