Discurso durante a 70ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Em fase de revisão e indexação
Autor
Eduardo Girão (NOVO - Partido Novo/CE)
Nome completo: Luis Eduardo Grangeiro Girão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Aparteantes
Humberto Costa.

    O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Para discursar.) – Paz e bem, Sr. Presidente Senador Chico Rodrigues, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, funcionários desta Casa, a quem agradeço, assessores e você, brasileira, brasileiro, que está nos acompanhando agora pelo trabalho muito correto da equipe de comunicação desta Casa revisora da República, a TV Senado, a Rádio Senado e a Agência Senado!

    Sr. Presidente, estamos começando aqui uma segunda-feira com um alerta que eu quero fazer a quem está nos acompanhando em casa e aqui também. Estão pautadas para quarta-feira a volta dos bingos, dos cassinos, e, de quebra, a regularização do jogo do bicho na nossa nação brasileira.

    Eu fico tentando fazer o exercício para entender que prioridade é essa, que sanha maluca é essa, quando a gente teve, no passado recente, uma tragédia social sem precedentes em todo o território nacional, que foi a época dos bingos: escândalo por cima de escândalo, corrupção... Tanto que o Presidente da República à época, o Presidente Lula, assinou um decreto acabando com a jogatina, com aquelas casas de bingo infestadas de brasileiros, especialmente aposentados, que torravam até o último centavo da sua aposentadoria, passavam dia e noite lá dentro; e a gente viu um endividamento altíssimo dos brasileiros, para o deleite de poucos.

    Porque ali é tudo feito, Senador Chico Rodrigues – não sei se o senhor teve a oportunidade de ir a algum cassino –, ali é tudo feito... Eu já fui, inclusive para estudar o tema, para observar o comportamento. Olhei dados de criminalidade em países que liberaram, olhei dados de emprego, olhei dados de receita, olhei o impacto na saúde: é tudo ruim, é tudo negativo para o país. E ali é feito... É um pouco até que parecido, guardadas as devidas proporções, com este Plenário lindo em que a gente está, em que a gente não consegue ver a luz do dia, saber se está de noite, de dia; só que lá eles botam, Senador Humberto Costa, o som, a bebida subsidiada barata, eles colocam... É tudo pensado: o design das máquinas...

    Senador Humberto, em Macau, eu tive a oportunidade de adentrar um, e uma cena chocante que eu vi: uma senhora de meia-idade – meia-idade –, e dava para ver, usando um fraldão – fraldão. E aquilo me intrigou, eu disse: "Vem cá, o que é que está acontecendo aqui?". Passava essa senhora lá. Depois o cara me explicou, a pessoa que era especialista lá disse: "Você sabe o que é isso aqui? Não é só ela, não: olhe ali, tem outro, olhe ali". A pessoa fica tão fissurada que ela não quer perder os minutos em que ela iria ao banheiro, para não perder o lugar naquele caça-níquel; e ela fica ali horas e horas, porque ela tem medo de que, se ela for ao banheiro e voltar em, sei lá, cinco minutos, ela pode perder o lugar dela; e aquele dinheirinho que ela botou ali, alguém pode chegar, sentar e ganhar. Olha que coisa é feita na mente! O design, as cores, é tudo feito para uma arapuca.

    Esse projeto, Izalci Lucas, que está na CCJ, da volta dos bingos, cassinos, jogo do bicho, é simplesmente devastador e vai privilegiar os magnatas de fora do país inclusive. É a socialização do prejuízo para beneficiar o lucro de poucos. Quem vai pagar essa conta é o Brasil. Quem vai pagar essa conta são os brasileiros. Você quer que eu prove isso, que eu dê um exemplo? Já falei aqui em números, estatísticas, tudo que você pode eu já falei desta tribuna, não é a primeira vez que eu falo aqui sobre isso, mas o lobby é poderoso e quer porque quer enfiar goela abaixo, como se isso fosse prioridade do Brasil – como se isso fosse prioridade do Brasil!

    Você quer um exemplo que nós votamos contra aqui, mas perdemos? – faz parte da democracia, como falou o Senador Chico Rodrigues. A questão das apostas esportivas. Eu sou um desportista, fui Presidente de clube de futebol, desde pequeno vou aos estádios, acompanho jogos. E eu, com convicção, alertei no ano passado – falta de aviso não foi –, alertei meus colegas: esse negócio de liberar as bets vai dar problema para o Brasil, vai endividar as pessoas, os torcedores vão ficar com ojeriza do futebol porque vão perder tudo. A primeira coisa que vão cortar é o sócio-torcedor. Os próprios clubes, que estão recebendo uma bolada, a curto, a médio e a longo prazo, vão ter a rebordosa, vão perder porque o sócio-torcedor não vai aguentar. E o pior: vai afastar as pessoas do futebol, e nós somos os país do futebol, o país das chuteiras. A família vai ficar com ojeriza porque viu um ente querido perder tudo.

    Quer uma prova disso? Datafolha de agora de março, um mês e meio atrás, mostrou que R$100 – eu vou repetir: na verdade, mais de R$100 – do Bolsa Família o brasileiro já gasta em média com apostas esportivas. Esse dinheiro vai sair de onde? Esse dinheiro vai sair da alimentação da sua família, do lazer, do básico, porque aquilo é uma lavagem cerebral. Senador Humberto, o senhor gosta de futebol, a gente não consegue assistir mais a futebol na televisão: aposte, aposte, aposte, todo tempo, na placa do estádio, na camisa do time, virou algo assim a céu aberto, uma promiscuidade a céu aberto, e o futebol perde, o Brasil perde.

    E eu faço um apelo aqui, eu critico o Governo, critico mesmo, mas votei a favor de algumas coisas do Governo que vi que eram a favor dos brasileiros, como, por exemplo, o Mais Médicos. E eu voto em outras pautas, já votei também, porque estou interessado em defender o Brasil, não uma ideologia.

    Eu faço um apelo, Senador Humberto, porque a posição do Governo vai ser muito importante nisso. O Governo Lula já viu anteriormente a tragédia social, e este Governo se proclama como o Governo do social para ajudar os pobres. Estes vão ser o foco desses magnatas: Senador Chico Rodrigues, são 800 bingos – 800! – espalhados pelo Brasil, com propaganda, com tudo que se possa imaginar. Não é possível que a gente coloque a digital e aprove um troço desse, ainda mais neste momento com esses dados a que a gente já tem acesso.

    A tragédia social no Rio Grande do Sul, o Brasil mobilizado lá, e o Senado deliberando, a toque de caixa, a volta dos bingos, cassino no Brasil? A quem interessa isso? Ao brasileiro é que não é, jamais será.

    Então, faço um apelo, porque isso transcende a questão de Governo, transcende se é de direita, se é de esquerda. Vejam bem, muitos liberais chegam para mim: "Mas aí gastou o dinheiro com o que quis. A tática é a ideologia, o princípio. Gastou o dinheiro com o que quis". Meu amigo, não é assim – não é assim! Gastou-se o dinheiro, porque, quando você adoece, você adoece a família toda, você adoece a sociedade.

    Senador Izalci, para cada dólar arrecadado... Tem livros publicados, Gambling in America é um desses livros. Em Gambling in America, há vários cientistas mostrando que, para cada dólar arrecadado, você gasta três dólares de custo social. Que matemática louca é essa? Repito: é para socializar o prejuízo em detrimento do lucro de pouquíssimos.

    Não sei se o senhor gostaria de fazer um aparte. O senhor fique à vontade.

    O Sr. Humberto Costa (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para apartear.) – Senador Girão, V. Exa. sabe que nós temos divergências profundas na maior parte dos temas de que trata este Senado, mas temos alguns pontos em que temos identidades, como a nossa luta para proibir esse cigarro eletrônico que é, sem dúvida, um absurdo. E eu fico, às vezes, espantado de ver pessoas, inclusive que têm uma visão da importância do SUS, da questão da saúde pública, fazendo discurso de política de redução de danos, quando, na verdade, é uma coisa extremamente mais grave do que o cigarro, eu diria até do que a própria bebida alcoólica.

    Temos uma identidade nesse ponto e temos uma identidade nesse ponto que diz respeito aos jogos de azar. Eu votei favoravelmente à implementação dessas coisas de apostas. Votei a favor de um destaque que ampliaria o valor da contribuição à Receita. E votei outras em que, inclusive, estive de um lado diferente das Lideranças do nosso Governo aqui no Senado, no Congresso Nacional, e me preocupa muito o que tenho visto. Eu não costumo tentar pegar uma observação que alguém fez para tentar generalizar, mas eu vi algumas situações recentemente que são muito preocupantes.

    Conversando com um empresário que é meu amigo, meu conhecido, ele dizia que esse negócio das apostas virou uma febre, e ele dizia que, na empresa dele, especialmente os jovens estão, o tempo inteiro, querendo receber algum recurso, trocar vale-refeição por dinheiro, querendo receber qualquer coisa para fazer aposta esportiva e, com isso, retirar o dinheiro que poderia ser utilizado para uma causa mais nobre.

    Por outro lado, realmente eu não imaginava que nós teríamos essa invasão de empresas que trabalham com apostas. É lamentável que a CBF tenha vendido o próprio Campeonato Nacional a uma empresa de apostas, quer dizer, isso é um estímulo a tudo: eles hoje patrocinam cantores, eles hoje patrocinam festas, eles hoje patrocinam, no futebol, praticamente tudo, e quem não tiver a possibilidade de ter esse patrocínio não tem praticamente mais nada para...

    Eu me lembro do tempo em que nós brigamos e conseguimos que, por exemplo, na Fórmula 1 não tivesse patrocínio de cigarro, que jogo de futebol não tivesse patrocínio de cigarro, exatamente porque era um produto nocivo. Pois bem, essa prática da aposta, produzindo dependência, produzindo uma situação como essa que nós estamos vendo hoje, é muito grave, mais ainda agora, com história de bingo, de cassino.

    Eu, em algum momento, ainda fui favorável à ideia de cassino em algumas estâncias, lugares turísticos e tal, mas eu confesso que hoje não sou mais a favor disso. Se nós aprovarmos isso, nós vamos estar estimulando ainda mais a lavagem de dinheiro, estimulando ainda mais o gasto das pessoas com coisas que são absolutamente supérfluas e fazendo com que os nossos aposentados, que vão terminar voltando para o bingo – que é uma forma mais fácil de jogar – e gastando as suas economias, a sua aposentadoria, enfim. Isso é uma coisa lamentável.

    Então, eu quero me associar, nesse ponto, a V. Exa. e dizer que, se eu estiver, quarta-feira, lá na Comissão de Constituição e Justiça – porque eu sou suplente, mas se eu estiver com o direito de votar –, eu vou votar contra, e vou votar contra aqui no Plenário também. E espero que os demais Senadores votem contra essas medidas também, porque eu acho que são profundamente equivocadas.

    E eu espero que o Governo não apoie essas proposições, porque vem um discurso: "Não, mas o Governo vai arrecadar mais, esse dinheiro está se perdendo". E o custo que isso tem, não é? É um custo social, é um custo da saúde mental das pessoas.

    Então, eu quero, nesse ponto aqui, me associar a V. Exa. e dizer que votarei contra, e espero que o nosso Governo oriente o voto contra também.

    O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) – Muito obrigado, Senador Humberto Costa. Eu peço ao Presidente que incorpore esse aparte integralmente no discurso.

    Quero dizer, Senador Humberto, que inclusive sobre a questão do plasma, nós também votamos juntos, contra a comercialização disso no Brasil. Acredito que isso faz parte da democracia, reconhecer certos pontos, dialogar.

    Mas olha, não tem como defender cassino e bingo. Senador Izalci, o senhor sabia que esse projeto, esse PL que está lá na CCJ não chega nem perto do que o Senador colocou agora, o Senador Humberto, de que eles poderiam colocar em lugares afastados, no agreste, em alguns lugares longe da... Não! Está privilegiando, Senador Humberto, os grandes centros. Então perderam completamente o pudor com relação a isso.

    É algo danoso à sociedade brasileira de verdade. É uma coisa, assim, que deixa a gente indignado. Como é que se insiste em algo assim? Nós estamos aqui para defender o interesse da nação.

    Como é que você vai justificar algo que não gera emprego, sabe por quê? É simples: vai canibalizar o dinheiro que o cara ia gastar na pizzaria com a família, o dinheiro com que ele ia comprar um tênis. Esse dinheiro vai faltar para isso. Vai lá para o cassino. E você sabia que paga 40% menos, segundo o Ministério da Educação dos Estados Unidos, 2016, a indústria do jogo, que é uma indústria poderosa, um lobby articulado, gasta, paga 40% menos o trabalhador do que no comércio, ou seja, não gera emprego, não gera renda. Agora, vai gerar bilhões para os magnatas, aí, sim – aí, sim.

    E o Senador Humberto falou algo que eu tinha esquecido: lavagem de dinheiro. Não é à toa, Senador Humberto, que a PGR está conosco, é contra. Tem duas notas técnicas contra, a PGR.

(Soa a campainha.)

    O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) – A Associação dos Delegados da Polícia Federal é contra. O Coaf é contra também a liberação de bingo e cassino.

    E aí, vamos para outro aspecto também, porque eu faço uma conclamação às pessoas de bem deste país, que defendem valores, princípios, os evangélicos, os católicos, os espíritas, de outras religiões, afrodescendentes, que sabem da tragédia disso, porque sabem. A CNBB já emitiu duas notas contra. Os evangélicos sempre se movimentaram contra.

    Isso vai gerar um problema grave, lavagem de dinheiro, corrupção. É para o benefício de poucos. Não dá para entender como é que interesses pessoais podem prevalecer sobre o interesse da nação. É de indignar.

(Soa a campainha.)

    O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) – Eu espero que o Senado não passe essa vergonha, priorizar um assunto desse, a toque de caixa. Isso tem que debater, é o local para debater? É, mas vamos fazer isso em cinco... Leva para a Comissão de Assuntos Sociais, leva para a Comissão de Segurança Pública. A Senadora Eliziane tem um requerimento para levar, para ouvir a sociedade. Sabe quantas audiências públicas fizeram? Uma. Fizeram uma audiência pública sobre esse tema. Temos que fazer no Plenário. O Senador Carlos Viana tem uma para trazer para o Plenário, um requerimento para trazer para o Plenário.

    Então, que Deus nos dê juízo, serenidade para rejeitarmos, com louvor, rejeitar essa proposta aqui, porque há 30 anos, tentam, com lobby poderoso nos corredores deste Senado Federal. E, aqui não é casa de troca.

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE) – Deus abençoe.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/06/2024 - Página 12