Discurso durante a 13ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Lamento pelo falecimento do Sr. Benjamin Beze Junior, primeiro suplente do Senador Jorge Kajuru.

Preocupações com a proposta de reforma tributária que será apresentada pelo Governo, e defesa de uma reforma que onere menos o consumo.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Lamento pelo falecimento do Sr. Benjamin Beze Junior, primeiro suplente do Senador Jorge Kajuru.
ECONOMIA:
  • Preocupações com a proposta de reforma tributária que será apresentada pelo Governo, e defesa de uma reforma que onere menos o consumo.
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/2020 - Página 7
Assuntos
Outros > HOMENAGEM
Outros > ECONOMIA
Matérias referenciadas
Indexação
  • REGISTRO, MORTE, SUPLENTE, JORGE KAJURU, SENADOR, ESTADO DE GOIAS (GO).
  • PREOCUPAÇÃO, PROPOSTA, REFORMA TRIBUTARIA, AUTORIA, GOVERNO FEDERAL, DEFESA, TRIBUTAÇÃO, TRIBUTOS, IGUALDADE, RETORNO, POLITICAS PUBLICAS, REGISTRO, RELATORIO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, COLOCAÇÃO, BRASIL, COMENTARIO, CORREÇÃO, TABELA, IMPOSTO DE RENDA, PESSOA FISICA, PROJETO DE LEI, ORADOR, ASSUNTO, IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS, NECESSIDADE, IMPLEMENTAÇÃO.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Senador Izalci Lucas, é uma satisfação estar com V. Exa. presidindo os trabalhos. Dizem que no Brasil tudo começa depois do Carnaval. Eu espero que comece bem, fortalecendo a democracia, e que essa onda que está no ar aí não seja um movimento que vá ferir a democracia, independentemente de partido, independentemente de cada posição. O processo democrático a gente escreve, inclusive, com pensamentos diferentes, de um e de outro. Agora não dá para ficarem numa onda de ataque à democracia, de ataque ao Congresso, de ataque às instituições, porque todos perdem – perde o Executivo, perde o Legislativo e perde o Judiciário, até porque esta Casa tem votado todos os temas que aqui chegaram.

    Mas, enfim, Presidente, eu tinha que fazer esse comentário. Sei que sua posição é a mesma, em defesa da democracia. Com a democracia, tudo; sem a democracia, nada!

    Mas eu quero, primeiro, lamentar a falta aqui no Plenário do Senador Jorge Kajuru. Eu liguei para ele no fim de semana, porque faleceu o seu primeiro suplente, uma morte inesperada. O suplente dele, como ele diz, é seu irmão, amigo, companheiro, morreu na Colômbia, estava em uma visita à Colômbia e, infelizmente, faleceu. Ele me relatou que ele estava no quarto do hotel e, quando viram, pela manhã, tinha falecido. Sei que o Senador Kajuru tinha um carinho muito grande pelo seu primeiro suplente, como ele falava sempre: "Paim, ele é meu irmão, meu companheiro, meu amigo".

    Mas, enfim, o enterro vai ser hoje, na cidade de Anápolis, às 17h, no Estado em que se encontram os familiares, o Kajuru, enfim, e é por isso que ele não está aqui. Mas ele já me informa que amanhã vai estar presente aqui, no Plenário, e, claro, vai entrar com pedido de voto de pesar em solidariedade a toda a família. E eu adiantei a ele, Senador Izalci, que tanto eu quanto V. Exa. assinaremos o voto de pesar a que ele dará entrada amanhã.

    Presidente, eu vou falar de um tema que está para chegar ao Congresso, quer dizer, que já está no Congresso, em duas Comissões, mas pode vir a posição do Governo, é sobre a reforma tributária.

    Um dos grandes debates que vamos ver, que vamos testemunhar no corrente ano será o da reforma tributária, uma reforma que julgo ser necessária, mas que, obrigatoriamente, deve observar e corrigir as graves disparidades sociais e econômicas do nosso País.

    Um a cada quatro brasileiros é pobre, ou seja, 25% da população. Esse número corresponde à população total – ultrapassa a população de países, eu diria – da Bolívia, da Bélgica, da Grécia, de Portugal e de tantos outros. Já a extrema pobreza atinge 13,5 milhões de pessoas com renda mensal per capita inferior a R$145 ou com pouco mais de R$4 por dia, segundo o Banco Mundial.

    O País precisa, nosso País precisa de uma reforma tributária justa, solidária, progressiva. Quem tem mais, claro, numa reforma tributária, vai alcançar a mão para aqueles que têm menos. Desnecessário dizer que hoje nossa estrutura de tributação representa um entrave ao próprio desenvolvimento do País, pois alimenta a desigualdade. Há o reconhecimento, por parte da quase totalidade dos brasileiros, de que temos uma despesa com impostos e contribuições elevada, similar à verificada nos chamados países desenvolvidos. Porém, não dispomos do mesmo retorno em políticas públicas de qualidade.

    Sr. Presidente, podemos, claro, aqui, lembrar o quanto é grave e por que estamos preocupados com tudo isso. É por ver que os mais pobres, que aqueles que mais dependem da atuação do Estado são, proporcionalmente, os mais prejudicados no pagamento de tributos. Todos aqui sabemos que a grande maioria dos nossos impostos é indireta, recaindo sobre o consumo com natureza regressiva, ou seja, sobre os produtos de primeira necessidade. Como os mais pobres praticamente não dispõem de renda para poupar, quase a totalidade dos seus salários acaba sendo onerada por essas despesas. O mesmo não ocorre com os mais ricos, que desfrutam da possibilidade de poupar a maior parte de seus rendimentos, não se sujeitando, portanto, a uma tributação da mesma intensidade.

    Eu não tenho nada, Sr. Presidente, contra quem é rico ou quem, baseado no seu trabalho, tem lucro. O que nós queremos, e aqui os dados vão mostrar, é que façamos como países de primeiro mundo, onde os que têm fortuna, os que são abastados pagam muito mais do que aqueles que ganham um, dois, três, quatro, cinco salários mínimos.

    Nessa configuração, temos que olhar para os mais pobres. Conforme Relatório de Desenvolvimento Humano publicado pela ONU no ano passado, o Brasil é o segundo País do mundo com a pior distribuição de renda entre a sua população, atrás apenas do Catar, quando analisado o 1% dos mais poderosos. Infelizmente, há uma tendência de piora dos níveis apontados tendo em vista as recentes notícias de desmonte de programas sociais de inegável valor distributivo, como é o caso do Bolsa Família.

    Nesse contexto, estudo publicado pelo Ipea evidenciou que os 10% mais pobres da população sofriam a maior carga tributária – 32% de sua renda. Essa carga decorria essencialmente da tributação indireta – indireta. À medida que a renda aumentava, ou seja, que considerávamos os mais poderosos, o peso dos tributos indiretos caía e o do direto, daqueles mais pobres, aumentava. Por isso, os mais poderosos têm em torno de 21% de sua renda comprometida com o pagamento de impostos.

    Outro dado importante de se lembrar é que, desde 2016, não tivemos a correção, pela inflação, da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física. Eu falei aqui dos 10% e dos 21%, mas falei também que o mais pobre é 32%.

    De acordo com o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal e o Sindifisco, se considerarmos o período de 1996 a dezembro do ano passado, a defasagem é de 103,87%. Para se ter uma ideia, quem, hoje, ganha até R$3,9 mil estaria isento de pagar o tributo caso a correção tivesse sido realizada. Mas não foi realizada. Por isso que pagam e pagam muito. É mais um exemplo da sanha arrecadatória do Estado apenas sobre aqueles que ganham menos em nosso País.

    Sr. Presidente, é por isso que tenho reafirmado que devemos empreender uma reforma tributária que não somente venha a simplificar e reduzir tributos, mas que compreenda também um salto qualitativo na oneração dos cidadãos brasileiros. Infelizmente, hoje as principais propostas que circulam pela Casa, aqui e no Congresso, somente buscam unificar os impostos e contribuições, não fazem uma nova distribuição progressiva, justa e que atenda os que mais precisam, ou seja, reduzindo os impostos sobre os bens de consumo.

    Não se discute, por exemplo, a correção dessa nefasta regressividade por meio da implementação de instrumentos como o Imposto sobre Grandes Fortunas, lucros e dividendos. Não se vê proposta de tributação de aviões, helicópteros, lanchas, embarcações de festa e bens de luxo, que se encontram à margem da cobrança de impostos específicos.

    É por isso que a Oxfam Brasil, entidade de reconhecimento internacional pela qualidade de suas pesquisas sobre desigualdade socioeconômica, tem realizado várias críticas às principais propostas de reforma em negociação e sugerido iniciativas que trariam mais justiça à arrecadação de tributos em nosso País.

    Entre essas propostas estariam:

    1) simplificar e reduzir a tributação sobre o consumo;

    2) buscar a equidade no Imposto de Renda de Pessoa Física com o fim da isenção a lucros e dividendos, além de maior distribuição das faixas de renda e alíquotas para tributação;

    3) buscar a equidade no Imposto de Renda de Pessoa Jurídica, para evitar que grandes empresas terminem pagando menos e que as pequenas e médias paguem mais;

    4) aplicar o ITR, o IPTU rural, nas suas funções sociais e de preservação ambiental, além da sua capacidade arrecadatória nas grandes propriedades;

    5) adotar o Imposto sobre Grandes Fortunas sobre aqueles que efetivamente acumulam e acumulam muito, muito mais riqueza.

    Vejam: são propostas realizáveis e – eu diria até – bem singelas, que, de fato, trariam um salto enorme em direção a uma cobrança de impostos mais justa, democrática e que objetiva o desenvolvimento econômico do nosso País.

    Apenas abrindo um parêntese sobre o assunto, gostaria de lembrar que há cerca de cinco anos se encontra em tramitação na Casa o PL nº 315, de nossa autoria, que institui um imposto decente sobre as grandes fortunas ou grandes heranças, se for o caso, como já está previsto no inciso VII do art. 153 da Constituição, de cuja elaboração fiz parte lá em 1988 ainda.

    Em minha proposta, esse imposto compreenderá a cobrança de 1% somente sobre o patrimônio que ultrapasse o valor de R$50 milhões – friso: R$50 milhões! Não estamos falando aqui mais de um imposto sobre a classe média nem sobre aqueles que são mais ou menos ricos; estamos falando de pessoas muito ricas. Esse é o objetivo. São pouquíssimos brasileiros que dispõem desse patrimônio, e, em uma democracia tão desigual como a nossa, creio que devem, sim, contribuir mais para o bem de todos.

    À época da apresentação dessa proposta, estimávamos que, uma vez aprovado o imposto, seria possível uma arrecadação de mais de R$50 bilhões por ano.

    Para se ter uma ideia, isso representa quase o dobro do orçamento previsto do Bolsa Família para este ano, um programa que paga, em média, R$189 a cerca de 3,5 milhões de famílias brasileiras que se encontram em situação de pobreza e de extrema pobreza.

    Como não se impressionar com tamanha desigualdade em nosso País, Sr. Presidente!

    Mas também defendo que criemos instrumentos para a cobrança de impostos sobre determinados bens de luxo, tais como os que aqui já destaquei.

    Segundo o Sindifisco, deixar de tributar grandes fortunas e aquilo que é de luxo, como aeronaves, helicópteros, é abrir mão de R$5 bilhões por ano de receita. Essa conta não inclui mais de 12 mil aviões comerciais no País.

    Sr. Presidente, estou ciente de que o incremento de receitas em razão dessa iniciativa permitiria reduzir as alíquotas de tributos sobre a folha de pagamento e até sobre o consumo, bem como possibilitaria maiores aportes financeiros a fundos de desenvolvimento regionais.

    É bom lembrar, Sr. Presidente, que de tudo isso que eu falei aqui, existem países, como Estados Unidos, como França, como Alemanha, como Itália, como Espanha, como Portugal – os países mais desenvolvidos de todos –, que têm uma tributação maior sobre os poderosos e menor sobre aqueles que são considerados pobres e miseráveis. Uma forma de atender isso – não tributar pobres e miseráveis – é não tributar os bens de primeira necessidade, os chamados bens de consumo.

    Sr. Presidente, eu vou concluir. Em vista dos temas e propostas que trouxe aqui, realmente faço votos de que consigamos concluir uma reforma tributária boa para todos, para todo o nosso País. E lembro: em países de primeiro mundo – citei alguns aqui e posso citar outros, como Dinamarca, se não citei aqui ainda nesta minha primeira fala, e outros, praticamente todos chamados de primeiro mundo... Sr. Presidente, uma reforma tributária justa, solidária e progressiva que pavimente um caminho de diminuição de desigualdades é boa para todos, porque, quanto mais o povo da classe média, pobre e até miserável tiver poder de compra, mais consumo teremos. E quem vende os produtos que são fundamentais, se quisermos falar da linha branca, se quisermos falar de automóvel, se quisermos falar de arroz, de feijão, de carne e daqueles que possuem mais, porque, se eles vendem mais, também vão ganhar mais, e isso permite que a população tenha uma qualidade de vida bem melhor. Uma reforma que seja efetivamente o motor para o crescimento de toda a economia – se a economia cresce, todos ganham –, que compreenda os valores da justiça, da solidariedade e da sustentabilidade.

    Sr. Presidente, é uma fala que fiz tendo como eixo uma reflexão da importância da reforma tributária para todos os empregados, empregadores, consumidores, quem vende, enfim, é assim que gira a roda da economia, gerando mais emprego e renda para todos.

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/2020 - Página 7