Como Relator - Para proferir parecer durante a 87ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Como Relator - Para proferir parecer sobre o Projeto de Lei (PL) n° 2108, de 2021, que "Acrescenta o Título XII na Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), relativo aos crimes contra o Estado Democrático de Direito; e revoga a Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983 (Lei de Segurança Nacional), e dispositivo do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais)".

Autor
Rogério Carvalho (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: Rogério Carvalho Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Como Relator - Para proferir parecer
Resumo por assunto
Direito Penal e Penitenciário, Soberania, Defesa Nacional e Ordem Pública:
  • Como Relator - Para proferir parecer sobre o Projeto de Lei (PL) n° 2108, de 2021, que "Acrescenta o Título XII na Parte Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), relativo aos crimes contra o Estado Democrático de Direito; e revoga a Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983 (Lei de Segurança Nacional), e dispositivo do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais)".
Publicação
Publicação no DSF de 11/08/2021 - Página 20
Assuntos
Jurídico > Direito Penal e Penitenciário
Soberania, Defesa Nacional e Ordem Pública
Matérias referenciadas
Indexação
  • RELATOR, PARECER, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, DECRETO LEI FEDERAL, CODIGO PENAL, ACRESCIMO, TITULO, CRIME, AMEAÇA, ESTADO DEMOCRATICO, CRIME CONTRA A SEGURANÇA NACIONAL, CAUSA DE AUMENTO DE PENA, HONRA, VITIMA, FUNCIONARIO PUBLICO, PRESIDENTE, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REVOGAÇÃO, LEI DE SEGURANÇA NACIONAL, DISPOSITIVOS, CONTRAVENÇÃO PENAL.

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE. Para proferir parecer.) – Boa tarde a todos os Senadores e Senadoras.

    Sr. Presidente, inicialmente, eu gostaria de agradecer esta oportunidade de relatar uma matéria de tamanha relevância para a democracia e para o Brasil.

    Minha fala hoje reivindica um momento histórico para o País. É urgente a aprovação do PL nº 2.108, de 2021, uma matéria de extrema importância para a defesa do Estado democrático de direito e que iniciou sua tramitação na Câmara dos Deputados em 1991. Está, portanto, há 30 anos em tramitação. É nossa responsabilidade aprovar o texto e enviá-lo para a sanção hoje e não o devolver à Câmara. Adequações poderão ser feitas em novos projetos, autônomos, mas não é possível adiar mais a revogação da Lei de Segurança Nacional.

    A aprovação do Projeto de Lei 2.108, de 2021, significará o fortalecimento da nossa democracia e a derrota do obscurantismo. Estaremos recuperando valores fundamentais do Estado brasileiro. Falo da isonomia política e da tolerância com a diferença. O filósofo John Rawls demonstrou, enfaticamente, que não existe justiça possível sem o devido respeito às liberdades individuais; demonstrou também que não existe política sem diversidade de pensamentos.

    Podemos dizer que o Estado democrático pressupõe a igualdade política tanto quanto a liberdade dos indivíduos. Temos um histórico de lutas nesse sentido, consolidado em nossa Carta fundamental. Há mais de 30 anos, a Constituição Cidadã venceu o conflito contra o autoritarismo e realizou avanços institucionais sem precedentes. De modo mais recente, tivemos a oportunidade de revisar diplomas anacrônicos e promulgar leis compatíveis com o nosso tempo. O Supremo Tribunal Federal declarou sem efeito a lei de imprensa, um instrumento a serviço da ditadura. Da mesma forma, o Congresso Nacional aprovou a Lei de Migração e revogou o estatuto do estrangeiro. Agora, contra o espectro autoritário, temos a oportunidade de sanear o ordenamento jurídico e cumpriremos o nosso papel. Podemos dar o nosso voto para abolir a Lei de Segurança Nacional e, com esse gesto, mostrar que nenhum governo terá a autorização para agir com excesso.

    A Lei de Segurança Nacional estava submetida ao esquecimento quando, nos últimos tempos, foi recuperada do fundo da gaveta e foi promovida como instrumento preferencial de silenciamento do atual Governo. Foram várias as tentativas de calar a crítica, com ações contra o influencer Felipe Neto e o cartunista Aroeira. E não somente eles, muitos outros jornalistas e manifestantes foram alvos de perseguição política apoiada por um diploma do tempo da ditadura.

    Por todos esses motivos, recebi com honra o dever de relatar o Projeto de Lei nº 2.108, de 2021, proveniente da Câmara dos Deputados.

    A aprovação dessa norma representará um dos mais importantes avanços democráticos dos últimos anos. Em lugar de definições abertas que permitem o enquadramento de inúmeras condutas como criminosas, incluiremos no Código Penal o Título XII – Dos Crimes contra o Estado Democrático de Direito.

    Temos a compreensão de que as democracias precisam de normas penais para assegurar a soberania da Nação e o respeito ao Estado democrático de direito. Ameaças à estabilidade democrática devem ser coibidas com rigor. Neste contexto, acreditamos que o projeto de lei a ser aprovado estabelece regras apropriadas para garantir a segurança institucional sem o risco de servir ao propósito de perseguição política.

    Que a aprovação do presente projeto represente um legado de respeito à democracia, às liberdades individuais e à pluralidade política e que possamos continuar a seguir sempre na direção do fortalecimento da democracia!

    O Projeto de Lei nº 2.108, de 2021, proveniente da Câmara dos Deputados, originalmente numerado como PL nº 2.462, de 1991, teve por autor o Deputado Hélio Bicudo e por Relatora de Plenário naquela Casa a competente Deputada Margarete Coelho, a quem homenageio neste momento. O projeto, recentemente aprovado na Câmara, essencialmente revoga a Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983 – Lei de Segurança Nacional, e, em seu lugar, acrescenta no Código Penal o Título XII – Dos Crimes Contra o Estado Democrático de Direito.

    O novo Título XII está dividido em capítulos que versam sobre “Crimes Contra a Soberania Nacional”, “Crimes Contra as Instituições Democráticas”, “Crimes Contra o Funcionamento das Instituições Democráticas no Processo Eleitoral”, “Crimes Contra o Funcionamento dos Serviços Essenciais” e “Crimes Contra a Cidadania”, além de um capítulo com as disposições comuns.

    O capítulo dos “Crimes Contra a Soberania Nacional” compreende os delitos de atentado à soberania, atentado à integridade nacional e espionagem.

    No que pertine aos “Crimes Contra as Instituições Democráticas”, o projeto de lei contempla os crimes de abolição violenta do Estado democrático de direito e o de golpe de Estado.

    No capítulo dos “Crimes Contra o Funcionamento das Instituições Democráticas no Processo Eleitoral”, estão previstos os delitos de interrupção do processo eleitoral, comunicação enganosa em massa e violência política. Para esses crimes, o PL estabelece a possibilidade de ação penal subsidiária da pública, de iniciativa de partido político com representação no Congresso Nacional.

    O crime da sabotagem é o único constante do capítulo dos “Crimes Contra o Funcionamento dos Serviços Essenciais”. Da mesma forma, o atentado a direito de manifestação é o único previsto no capítulo dos “Crimes Contra a Cidadania”.

    Por fim, no capítulo das disposições comuns, o art. 359-T ressalva a manifestação crítica aos poderes constitucionais, a atividade jornalística e as reivindicações de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, de reuniões, de greves ou de quaisquer manifestações políticas com propósitos sociais.

    Foram apresentadas 40 emendas.

    A Emenda nº 01-PLEN, de autoria do Senador Esperidião Amin, é no sentido de inserir na Lei de Abuso de Autoridade o art. 27-A, para punir a conduta do magistrado que requisita a instauração de inquérito policial para investigar supostas condutas de que foi vítima e cuja ação penal será a autoridade jurídica competente para processar e julgar. A pena proposta é de detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

    A Emenda nº 02, também do Senador Esperidião Amin, dá nova redação ao inciso II do art. 5º do Código de Processo Penal, para restringir ao Ministério Público a possibilidade de requisição de instauração de inquéritos policiais. Como efeito prático, fica vedada a requisição por parte da autoridade judiciária.

    Ambas as emendas são justificadas pela prevalência do princípio acusatório e do princípio da imparcialidade do juiz.

    Por sua vez, a Emenda nº 03-PLEN, apresentada pela Senadora Rose de Freitas, criminaliza a conduta de aliciar estrangeiros para a invasão do território nacional, para a qual comina pena de reclusão, de quatro a dez anos. Além disso, estabelece causas de aumento de pena para as hipóteses de efetivamente ocorrer a invasão, ou a sua tentativa. No mesmo sentido, embora com penas distintas, são as Emendas nº 14, do Senador Izalci Lucas, e a nº 29, do Senador Luis Carlos Heinze.

    A Emenda 04, do Senador Veneziano Vital do Rêgo, prevê uma qualificadora para o crime de golpe de Estado, se a conduta for praticada pelo Presidente da República, pelo Vice-Presidente da República, pelo Presidente da Câmara dos Deputados, pelo Presidente do Senado Federal, pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal ou pelo Procurador-Geral da República. A pena seria de reclusão, de 12 a 30 anos, e multa.

    A Emenda nº 05-PLEN, do Senador Veneziano Vital do Rêgo, acrescenta parágrafo ao art. 359-I, que define o atentado à soberania, para prever que incorre na mesma pena do caput quem incita publicamente governo estrangeiro a promover guerra ou hostilidade contra o Brasil.

    A Emenda nº 06-PLEN, do Senador Veneziano Vital do Rêgo, modifica o art. 359-Q para estabelecer a legitimidade subsidiária para propositura da ação penal, nos crimes previstos no Capítulo III do novo Título XII da Parte Especial do Código Penal, por parte de qualquer cidadão representado por advogado, em vez da legitimidade de partido com representação no Congresso Nacional.

    A Emenda nº 07, da Senadora Mara Gabrilli, modifica a redação do art. 359-P, para definir como violência política a conduta de restringir, impedir ou dificultar, com emprego de violência física, sexual ou psicológica, o exercício de direitos políticos a qualquer pessoa em razão de seu gênero, orientação sexual, raça, deficiência, cor, etnia, crença, religião, origem ou quaisquer outras formas de discriminação.

    A Emenda nº 08, do Senador Veneziano, pugna pela inserção do novo art. 359-V, para prever que “as definições de crimes previstas nesse título aplicam-se ainda que o réu seja parlamentar no exercício das funções, não incidindo a inviolabilidade por opiniões, palavras e votos prevista no caput do art. 53 da Constituição Federal”.

    A Emenda nº 09, do Senador Angelo Coronel, propõe a supressão do art. 359-O, que define o crime de comunicação enganosa em massa.

    A Emenda nº 10-PLEN, do Senador Telmário Mota, acrescenta ao Código Penal artigo para criminalizar a conduta de convidar, aliciar, obrigar ou coagir estrangeiro a ingressar ou invadir território nacional com fim de criar instabilidade social, política ou institucional. A pena seria de reclusão de cinco a doze anos, aumentada de metade se efetivado o ingresso ou a invasão.

    A Emenda nº 11-PLEN, da Senadora Leila Barros, modifica a redação do parágrafo único que o PL acrescenta ao art. 286 do Código de Processo Penal, para prever que o crime também é cometido no caso de a animosidade ser incentivada entre as “forças de segurança pública”. A pena seria de detenção de seis meses a um ano, e multa.

    A Emenda nº 12-PLEN, do Senador Izalci Lucas, insere dispositivo no corpo do PL para estabelecer a competência da Justiça Federal para os crimes nele definidos.

    A Emenda nº 13-PLEN, do Senador Izalci Lucas, é no sentido de equiparar ao golpe de estado, de que trata o art. 359-M, a tentativa de impedir a posse de governo legitimamente eleito.

    A Emenda nº 15-PLEN, também do Senador Izalci Lucas, acrescenta parágrafo ao art. 359-L, para estabelecer que incorre na pena de um a quatro anos de reclusão quem, mediante propaganda ou discurso, faz apologia a regime ditatorial ou prega a edição de instrumentos normativos que permitam estabelecer um regime de exceção no País.

    A Emenda nº 16-PLEN, do Senador Carlos Viana, estabelece a competência da Justiça Federal, como regra, para processar e julgar os crimes do PL, ressalvadas as competências originárias dos tribunais superiores e da Justiça Eleitoral, no caso dos crimes previstos no Capítulo III.

    A Emenda nº 17-PLEN, do Senador Carlos Viana, estende o aumento de pena proposto pelo PL, no caso de crime contra a honra, nas situações em que a ofensa for dirigida a qualquer membro do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal, e não apenas aos presidentes desses órgãos.

    A Emenda nº 18-PLEN, dos Senadores Telmário Mota, Flávio Bolsonaro, Marcos Rogério e Sérgio Petecão, e também as Emendas nºs 32-PLEN, do Senador Davi Alcolumbre, 33-PLEN, do Senador Lasier Martins, e 35-PLEN, do Senador Esperidião Amin, são no sentido de suprimir o art. 359-S e o inciso III do art. 359-U do Projeto de Lei nº 2.108, de 2021, que tipifica o atentado a direito de manifestação e prevê aumento de pena para militares, com a perda do posto e da patente ou graduação.

    A Emenda nº 19-PLEN, do Senador Jorge Kajuru, insere no PL o art. 359-Q para incriminar a ameaça ao funcionamento de qualquer dos Poderes, com pena de reclusão de quatro a oito anos e multa, aumentada de um sexto se a ameaça e incitação é propalada com divulgação de desinformação.

    A Emenda nº 20-PLEN, do Senador Fernando Bezerra Coelho, e a Emenda nº 25-PLEN, da Senadora Soraya Thronicke, alteram a redação do caput do art. 359-J, para suprimir a exigência de violência ou grave ameaça que consta da redação do PL, para a tentativa de desmembramento de parte do território nacional para a constituição de país independente.

    A Emenda nº 21-PLEN, do Senador Fernando Bezerra Coelho, Emenda nº 26-PLEN, da Senadora Soraya Thronicke, são no sentido de incluir no PL o crime de apoderamento de aeronave, embarcação ou veículo de transporte coletivo, com emprego de violência ou grave ameaça à tripulação ou a passageiros. A pena seria de reclusão, de dois a dez anos, aumentada até o dobro, se resultar lesão corporal grave, ou até o triplo, se resultar em morte.

    A Emenda nº 22-PLEN, da Senadora Soraya Thronicke, e a Emenda nº 27-PLEN, do Senador Marcos do Val, inserem parágrafo único no art. 359-R, para prever a punição dos atos preparatórios da sabotagem, com a pena do caput reduzida de dois terços, se o fato não constitui crime mais grave.

    A Emenda nº 23-PLEN, da Senadora Soraya Thronicke, e a Emenda nº 28-PLEN, do Senador Marcos do Val, incluem dispositivo para punir a conduta de revelar segredo obtido em razão de cargo, emprego ou função pública, relativamente a planos, ações ou operações militares ou policiais de caráter estratégico, tático ou operacional. A pena proposta é de reclusão, de dois a dez anos.

    A Emenda nº 24-PLEN, da Senadora Soraya Thronicke, tal qual a Emenda nº 30-PLEN, do Senador Luis Carlos Heinze, é emenda substitutiva, que altera o PL em diversos pontos, com destaque para a inclusão de um capítulo designado como “Do Atentado”, dedicado às condutas que atentam contra a vida, a integridade física e a liberdade pessoal.

    A Emenda nº 31-PLEN, do Senador Luis Carlos Heinze, altera o §1º do art. 359-I, para prever o aumento de pena na hipótese de serem desencadeados atos de hostilidade como decorrência da negociação com governo ou grupo estrangeiro a que se refere o caput. Além disso, suprime o §2º, que trata da participação do agente em operação bélica com o fim de submeter o Território nacional, ou parte dele, ao domínio ou à soberania de outro país. Em seu lugar, prevê artigo autônomo para punir, com reclusão de quatro a doze anos, a conduta de tentar submeter o Território nacional, ou parte dele, ao domínio ou à soberania de outro país.

    A Emenda nº 34-PLEN, do Senador Carlos Portinho, insere artigo no Código Penal para punir a conduta de atentar contra o Serviço de Segurança Pública mediante crime contra a vida e/ou crime contra a liberdade individual de agente de segurança pública, no exercício de sua função. A pena proposta é de reclusão de dois a quatro anos, sem prejuízo da pena correspondente ao crime praticado contra o agente.

    A Emenda nº 36-PLEN, do Senador Luis Carlos Heinze, e a Emenda nº 39-PLEN, da Senadora Soraya Thronicke, modificam o art. 359-O em dois pontos: aprimoram a redação do caput, para fazer alusão à higidez do processo eleitoral – e não ao processo eleitoral em si – e acrescentam parágrafo único para ressalvar que “configura o crime previsto no caput a mera reprodução, encaminhamento ou manifestação de apoio a fato disseminado por terceiro, ainda que por meio de comunicação de caráter público”.

    A Emenda nº 37-PLEN, da Senadora Soraya Thronicke, inclui no Código Penal capítulo designado como “Do Atentado”, dedicado às condutas que atentam contra a vida, a integridade física e a liberdade pessoal, que, aliás, consta das Emendas nºs 24 e 30-PLEN, mencionadas anteriormente.

    A Emenda nº 38-PLEN, da Senadora Soraya Thronicke, e a Emenda nº 40-PLEN, do Senador Luis Carlos Heinze, propõem nova redação para o art. 359-T e a inclusão de parágrafo único, nos seguintes termos:

Art. 359-T. Não constitui crime previsto nesse título a manifestação crítica aos poderes constitucionais membros de Poder ou agentes públicos, nem a atividade jornalística nem a crítica de caráter individual ou, ainda, a reivindicação de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, reuniões, greves, aglomerações ou qualquer outra forma de manifestação política, de caráter coletivo ou individual. Parágrafo Único. Não configura violência ou grave ameaça a manifestação crítica aos poderes constitucionais, aos membros de Poder ou a agentes públicos ou a calúnia, injúria ou difamação dirigida a membros de Poder agentes públicos que serão objeto de apuração e processamento na forma da legislação ordinária.

    Tramita em conjunto o PL nº 1.385, de 2021, da Senadora Eliziane Gama, que estabelece a Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito.

    Os tipos penais previstos no PL nº 1.385, de 2021, são, em essência, semelhantes aos definidos no PL nº 2.108, de 2021. O primeiro opta, contudo, pela edição de uma lei penal autônoma, enquanto o segundo promove as alterações no Código Penal.

    Análise.

    O projeto será apreciado pelo Plenário nos termos do Ato da Comissão Diretora nº 8, de 2021, que regulamenta o funcionamento das sessões e reuniões remotas e semipresenciais no Senado Federal e a utilização do Sistema de Deliberação Remota.

    Não observamos, no projeto de lei sob exame, vícios relacionados com a constitucionalidade e a juridicidade, nem óbices de natureza regimental.

    A matéria trata de direito penal, estando abrangida pela competência legislativa da União, admitida a iniciativa de qualquer dos membros do Congresso Nacional, nos termos dos arts. 22, I, e 61, caput, da Constituição Federal.

    Em relação à técnica legislativa, não há reparos a fazer, uma vez que atendidos todos os preceitos da Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998.

    A Lei de Segurança Nacional constitui um dos últimos diplomas normativos de cunho autoritário ainda vigentes após a redemocratização. A atual lei, é preciso reconhecer, revela-se mais branda do que as que a precederam, mas nela continuam presentes resquícios, traduzidos em regras punitivas, da famigerada doutrina de segurança nacional, que, numa linguagem belicista, identificava os críticos e opositores ao regime autoritário com a figura do “inimigo interno”.

    Até mesmo como reação dos novos ares democráticos, a Lei de Segurança Nacional permaneceu, nas primeiras décadas de vigência da Constituição de 1988, quase que esquecida, com sua aplicação limitada a casos como os que envolviam a introdução ilegal, em Território nacional, de armamento privativo das Forças Armadas. No entanto, esse quadro se modificou nos últimos anos com a crescente invocação da lei com o objetivo de punir manifestações críticas ao governo de plantão e calar adversários políticos.

    Curiosamente, já à época da edição da Lei nº 7.170, de 1983, o grande penalista Heleno Fragoso observava: "a quase totalidade dos processos movidos com base na Lei de Segurança, depois da revogação do Ato Institucional nº 5, refere-se a crimes de manifestação do pensamento". Com isso, apontava para a tendência de os regimes de inclinação autoritária se valerem de leis penais rigorosas com o escopo de calar opositores políticos.

    Retornando aos tempos atuais, verificamos um sensível aumento do número de inquéritos instaurados com base na Lei de Segurança Nacional, a partir de 2019, chegando a 51 no ano de 2020. E em 2021, até o dia 13 de julho, foram 17 inquéritos de acordo com documentos recebidos do Núcleo de Gestão Estratégica da Polícia Federal.

    Esse número foi de 26 em 2019; de 19 em 2018; de cinco em 2017; de sete em 2016 e de 13 em 2015, conforme levantamento publicado pelo jornal Folha de S.Paulo em 21 de janeiro de 2021. E grande parte deles se refere aos chamados “delitos de opinião”, numa estratégia clara de intimidar e impor o silêncio a jornalistas, políticos e demais cidadãos.

    Evidentemente, o uso da Lei de Segurança Nacional com esse propósito se afigura incompatível com a Constituição de 1988 e com os contornos amplos que ela deu às liberdades de expressão, de informação e de imprensa (arts. 5º, IV, IX e XIV, e 220).

    A existência, na Lei de Segurança Nacional, de normas inconciliáveis com a Carta Política não deve levar, porém, à conclusão de que seja inconstitucional toda e qualquer norma incriminadora de condutas que desafiam as instituições estatais e a ordem constitucional. Muito ao contrário disso, é a própria Carta de 1988 que, em seu art. 5º, XLIII e XLIV, estabelece um regime punitivo mais severo para crimes como o terrorismo e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático de direito, vedando, também, em seu art. 17, §4º, que os partidos políticos utilizem organização paramilitar.

    As nações democráticas se valem de normas penais para coibir tentativas de comprometer a existência soberana da nação ou ainda de quebrantar o Estado de direito – normas que se destinam, portanto, a proteger o Estado e suas instituições contra ameaças externas e internas.

    Conveniente e oportuno, portanto, o Projeto de Lei sob exame, que estabelece normas penais incriminadoras apropriadas para a defesa da soberania nacional e do Estado democrático de direito.

    Não obstante, o texto proveniente da Câmara dos Deputados pode ser aprimorado em alguns pontos, por emendas de redação.

    No art. 359-K, o “perigo” colocado na lei penal sem concretude assume um caráter vago e torna o tipo penal aberto. A palavra "concreto" fecha mais o tipo penal e não abre possibilidades de supor um risco que talvez não exista.

    Assim, exige a comprovação da existência de um perigo real, não abrindo espaço para o uso do tipo para vetar a denúncia documental a organismos internacionais ou governos parceiros ou influentes, por exemplo, como mote para proteger governos antidemocráticos ou ações ilegais.

    No art. 359-O, que o PL insere no Código Penal para tipificar a “comunicação enganosa em massa”, é imprescindível esclarecer que a tutela da norma incriminadora recai sobre a higidez do processo eleitoral, e não sobre este em si mesmo. A despeito da prática da conduta descrita nesse dispositivo, o processo eleitoral pode não sofrer intercorrências, embora seu resultado tenha sofrido influência da prática delituosa.

    Neste ponto, portanto, aproveitamos parcialmente a Emenda nº 36-PLEN, do Senador Luis Carlos Heinze e nº 39-PLEN, da Senadora Soraya Thronicke.

    Além disso, o dispositivo se ressente de aprimoramento redacional. Veja-se que a parte final está redigida da seguinte forma: “disseminar fatos que sabe inverídicos capazes de comprometer o processo eleitoral”. No caso, o conhecimento prévio, que caracteriza a ação dolosa, deve recair apenas sobre a inveracidade dos fatos, mas não sobre o potencial comprometimento da higidez do processo eleitoral.

    É preciso, ainda, registrar que esse novo tipo penal, que só encontra paralelo, por ora, na legislação austríaca, estará submetido ao triplo filtro decorrente da nova redação proposta. O primeiro é ter em mente que as condutas típicas de “promover” e de “financiar” sugerem uma orquestração, um concerto, alguma atitude organizada, e não o mero encaminhamento episódico de mensagens. O segundo, o de que essas condutas estão vinculadas à utilização de um expediente de certa forma “clandestino”, que escapa ao controle do provedor de aplicação de mensagem privada, e que se traduz nos conhecidos “robôs” e nos virulentos disparos em massa. Já o terceiro, é importante ressaltar que o fato inverídico deve possuir um peso tal que possa atingir a higidez do processo eleitoral, não bastando alguma informação falsa marginal, sobretudo porque o tipo é construído sob a forma do que se convencionou chamar de “delito de aptidão” – no caso, para comprometer a higidez do processo eleitoral, e não para prejudicar individualmente este ou aquele candidato, o que pode representar apenas um resultando acompanhante.

    Por último, o parágrafo único que o PL acrescenta ao art. 286 do Código Penal, que trata de incitação ao crime, deve ter sua redação aprimorada para deixar claro que o que se pune é a animosidade das Forças Armadas contra os Poderes e contra a sociedade, que são objeto da tutela da Lei.

    Registro que participaram de Sessão de Debates Temáticos no Senado Federal os palestrantes Alexandre Wunderlich, Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; Alaor Leite, Docente-Assistente junto à Cátedra de Direito Penal, Direito Processual Penal, Direito Penal Estrangeiro e Teoria do Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade Humboldt, de Berlim; Maurício de Oliveira Campos Júnior, Professor da Faculdade de Direito Milton Campos, Professor Titular da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e advogado; Virgínia Dirami Berriel, Conselheira do Conselho Nacional de Direitos Humanos e representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT); Camila Asano, Coordenadora Jurídica da ONG Conectas Direitos Humanos; Raisa Ortiz, Coordenadora da Área de Espaço Cívico da ONG Artigo 19; Juliana Vieira dos Santos, advogada na Rede Liberdade; e Pedro Estevam Serrano, Advogado e Professor de Direito Constitucional.

    Além da Sessão de Debates Temáticos, para a construção do presente relatório, foram realizadas reuniões com representantes dos seguintes movimentos e organizações: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra; Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político; Artigo 19; Rede Justiça Criminal; Terra de Direitos; Centro Popular de Direitos Humanos; Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos; Coalizão Direitos na Rede; Pacto pela Democracia; Instituto de Defesa do Direito de Defesa; Aliança Nacional LGBTI+; Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa; Instituto Vero; Instituto Socioambiental; Rede Liberdade; Instituto Igarapé; Comissão Arns; World Wide Fund For Nature; e Conectas Direitos Humanos.

    Em sua maioria, os debatedores expuseram que o texto vindo da Câmara dos Deputados não é o ideal, mas que seria importante garantir a sua aprovação nesta oportunidade, com algumas emendas de redação. Os aperfeiçoamentos substanciais podem ficar para momento posterior, após a convolação do projeto em lei.

    Com efeito, todas as emendas apresentadas implicam alterações de mérito substantivas, e seu acolhimento implicaria o retorno da proposição à Casa iniciadora. Diante disso, embora reconheça o inegável mérito dessas emendas, considero que não são oportunas, razão pela qual as rejeito, ressalvado o já mencionado aproveitamento parcial das Emendas 36 de Plenário, do Senador Luis Carlos Heinze, e nº 39, da Senadora Soraya Thronicke, no que pertine ao aprimoramento redacional do art. 359-O.

    Com relação ao PL 1.385, de 2021, considero que a proposição é meritória. Contudo, há que se reconhecer que o PL 2.108, de 2021, já foi debatido na Câmara dos Deputados e, no Senado Federal, foi submetido a debates a que acorreram renomados juristas, conforme dissemos linhas atrás.

    Diante disso, e até pela adiantada fase do processo legislativo em que se encontra o PL 2.108, de 2021, ele deverá prevalecer sobre o PL 1.385, de 2021, razão pela qual o voto será pelo arquivamento deste último.

    Voto.

    Por todo o exposto, o voto é pelo arquivamento do Projeto de Lei 1.385, de 2021, pela rejeição das Emendas 1 a 40, ressalvado o aproveitamento parcial das Emendas nº 36 de Plenário, do Senador Luis Carlos Heinze, e nº 39, da Senadora Soraya Thronicke, nos termos de emenda de redação que propomos nesta oportunidade, e pela aprovação Projeto de Lei 2.108, de 2021, com as seguintes emendas de redação:

    EMENDA Nº - PLEN

    Dê-se ao caput do art. 359-K do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal –, nos termos do art. 2º do Projeto de Lei nº 2.108, de 2021, a seguinte redação:

“Art. 359-K. Entregar a governo estrangeiro, a seus agentes, ou a organização criminosa estrangeira, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, documento ou informação classificados como secretos ou ultrassecretos nos termos da lei, cuja revelação possa colocar em perigo concreto a preservação da ordem constitucional ou a soberania nacional:

..................................................................................................................................................................................................................................................”

    EMENDA Nº - PLEN

    Dê-se ao caput do art. 359-O do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal –, nos termos do art. 2º do Projeto de Lei 2.108, de 2021, a seguinte redação:

“Art. 359-O. Promover ou financiar, pessoalmente ou por interposta pessoa, mediante uso de expediente não fornecido diretamente pelo provedor e aplicação de mensagem privada, campanha ou iniciativa para disseminar fatos que sabe inverídicos, e que sejam capazes de comprometer a higidez do processo eleitoral:

..................................................................................................................................................................................................................................................”

    EMENDA Nº - PLEN

    Dê-se ao parágrafo único do art. 286 do Decreto-Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal –, nos termos do art. 3º do Projeto de Lei 2.108, de 2021, a seguinte redação:

“Art. 286. .....................................................................................................................................................................................................................................

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem incita, publicamente, animosidade entre as Forças Armadas, ou delas contra os poderes constitucionais, as instituições civis [...].”

    Sem mais, esse é o relatório, Sr. Presidente.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/08/2021 - Página 20