Como Relator - Para proferir parecer durante a 153ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Como Relator - Para proferir parecer sobre o Projeto de Lei (PL) n° 1012, de 2020, que "Institui o Cadastro Nacional de Pessoas Condenadas por Crime de Feminicídio, Estupro, Violência Doméstica e Familiar contra a mulher (CNPCMulher)".

Autor
Eliane Nogueira (PP - Progressistas/PI)
Nome completo: Eliane e Silva Nogueira Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Como Relator - Para proferir parecer
Resumo por assunto
Mulheres, Processo Penal, Segurança Pública:
  • Como Relator - Para proferir parecer sobre o Projeto de Lei (PL) n° 1012, de 2020, que "Institui o Cadastro Nacional de Pessoas Condenadas por Crime de Feminicídio, Estupro, Violência Doméstica e Familiar contra a mulher (CNPCMulher)".
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/2021 - Página 27
Assuntos
Política Social > Proteção Social > Mulheres
Jurídico > Processo > Processo Penal
Soberania, Defesa Nacional e Ordem Pública > Defesa do Estado e das Instituições Democráticas > Segurança Pública
Matérias referenciadas
Indexação
  • RELATOR, PARECER, PROJETO DE LEI, CRIAÇÃO, LEI FEDERAL, CADASTRO, AMBITO NACIONAL, CONDENADO, CRIME, FEMINICIDIO, VIOLENCIA DOMESTICA, VIOLENCIA, FAMILIA, MULHER, POLITICAS PUBLICAS, COMBATE, PREVENÇÃO.

    A SRA. ELIANE NOGUEIRA (Bloco Parlamentar Unidos pelo Brasil/PP - PI. Para proferir parecer.) – Então vamos ao relatório.

    Trata-se do Projeto de Lei nº 1.012, de 2020, que institui o Cadastro Nacional de Pessoas Condenadas por Crime de Feminicídio, Estupro, Violência Doméstica e Familiar contra a mulher (CNPCMulher), de autoria da Senadora Kátia Abreu.

    Preliminarmente, registramos que a matéria sob exame não apresenta vícios de constitucionalidade formal, uma vez que o direito processual penal está compreendido no campo da competência legislativa privativa da União, consoante dispõe o art. 22, I, da Constituição Federal.

    Ademais, não se trata de matéria submetida à iniciativa privativa do Presidente da República, nos termos do §1°, do art. 61, da Carta Magna.

    No mérito, entendemos que o PL é conveniente e oportuno, mas alguns aperfeiçoamentos ao seu texto se fazem necessários.

    O principal deles é de técnica legislativa. A proposição em exame foi lida em Plenário em 26/03/2020, mas cerca de seis meses depois foi sancionada a Lei nº 14.069, de 1º de outubro de 2020, que cria o Cadastro Nacional de Pessoas Condenadas por Crime de Estupro.

    Veja-se, assim, que, considerando os objetivos do presente PL, poderíamos vir a ter duas leis tratando de cadastro de condenados por estupro. Desse modo, até para bem e fielmente atender a Lei Complementar nº 95, de 1998, aproveitaremos as inovações pretendidas – notadamente a criação de um cadastro de feminicidas e de criminosos que praticaram violência doméstica e familiar contra a mulher – em um substitutivo que altera a legislação vigente, mais especificamente a Lei nº 14.069, de 2020.

    Isso porque as disposições atualmente vigentes quanto ao cadastro de estupradores são praticamente idênticas às pretendidas para o cadastro dos demais condenados por crimes violentos contra a mulher.

    De início, é preciso ter em mente que o novo Cadastro Nacional a ser criado seria, textualmente, um “instrumento de uniformização e consolidação de informações com intuito de fortalecer as políticas públicas de combate e prevenção à violência contra a mulher” (art. 1º, caput, do PL).

    Nesse passo, o Cadastro é uma ferramenta de trabalho para os agentes públicos, em especial os profissionais da segurança pública e do sistema de justiça, para prevenir e combater a violência contra a mulher. Não é, portanto, para uso geral da população, o que poderia redundar em bisbilhotices sem fim, atentando contra os direitos individuais de condenados e, até mesmo, causando riscos para a integridade física destes.

    De todo modo, a intenção de fazer antecipar o conceito de condenado para momento anterior ao do trânsito em julgado da ação penal condenatória (parágrafo único do art. 1º do PL) atenta, a nosso sentir, contra expressa disposição constitucional (art. 5º, LVII, da Constituição Federal).

    Em razão disso, excluímos esse dispositivo no substitutivo que apresentamos ao final, sendo que faremos referência expressa à inclusão no Cadastro somente das pessoas condenadas por decisão condenatória transitada em julgado.

    Noutro giro, a cláusula genérica constante do projeto de lei original, no sentido de fazer constar do Cadastro toda e qualquer condenação em que eventualmente se reconhecer a existência de violência doméstica e familiar contra a mulher – o que só seria possível quando expressamente aplicada a agravante do art. 61, II, “f”, do Código Penal – poderia trazer complicações interpretativas para um instrumento que se pretende objetivo e de fácil implementação. Em seu lugar, nos ocupamos de listar, pormenorizadamente, os crimes violentos praticados contra a mulher, os quais entendemos, segundo aplicação do princípio da proporcionalidade, ensejar a inclusão dos dados de um condenado no cadastro. Foram todos colhidos do Código Penal. São eles:

    I - feminicídio (art. 121, §2º, VI);

    II - estupro (art. 213, caput e §§1º e 2º);

    III - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§1º, 3º e 4º);

    IV - lesão corporal praticada contra a mulher (art. 129, §13);

    V - perseguição contra a mulher (art. 147-A, II); e

    VI – violência psicológica contra a mulher (art. 147-B).

    Outro ponto de nossa preocupação – minha e do Senador Ciro Nogueira – é a correta utilização da genética no processo penal. Não custa lembrar que é do hoje Ministro a autoria do Projeto de Lei do Senado nº 93, de 2011, que redundou na edição da Lei nº 12.654, de 2012, e possibilitou a coleta de perfil genético como forma de identificação criminal.

    Recentemente, também apresentei o Projeto de Lei nº 3.373, de 2021, que busca equacionar ainda o mesmo tema, diante dos vetos lançados sobre o Pacote Anticrime (Lei nº 13.964, de 2019), os quais em sua maioria foram derrubados pelo Congresso Nacional, e das mais recentes contribuições dos especialistas.

    É disso que trata o art. 2º, inciso II, do Projeto de Lei nº 1.012, de 2020. As informações a respeito do perfil genético do condenado já possuem regramento específico na legislação penal e processual penal. A Lei nº 12.654, de 2012, já referida, inicialmente restringiu a identificação criminal genética aos condenados por crime praticado com violência de natureza grave contra a pessoa ou por qualquer dos crimes hediondos. A legislação de regência sobre o tema foi recentemente alterada pelo Pacote Anticrime (Lei nº 13.964, de 2019), que ampliou o rol de crimes em que o condenado poderá ser submetido à identificação do perfil genético (“crime doloso praticado com violência grave contra a pessoa, bem como por crime contra a vida, contra a liberdade sexual ou por crime sexual contra vulnerável”).

    Diante disso, o PL nº 1.012, de 2020, cria uma contradição, na medida em que constará do Cadastro a identificação genética do estuprador, mas não a do autor de feminicídio, ainda que, em ambos os casos, tais dados já tenham sido colhidos por ocasião do ingresso do condenado no estabelecimento prisional (art. 9º-A da Lei nº 7.210, de 1984). Dessa forma, no substitutivo que apresentamos abaixo, trocamos a referência ao crime de estupro pela ressalva de que a coleta dos dados genéticos deverá seguir a legislação específica sobre o tema, possibilitando que a informação seja disponibilizada em outros casos também.

    Já o art. 3º, a exemplo do que ocorre com a Lei nº 14.069, de 2020, deixou toda a regulamentação de operação do cadastro a ser realizada por meio de instrumentos de cooperação a serem celebrados entre a União, Estados e Municípios. Como expressamente se referiu à questão dos acessos ao banco de dados, temos por adequado firmar a proibição de acesso por particulares, conforme expomos anteriormente.

    Outro ponto relevantíssimo diz respeito à necessidade de prazo máximo para que o nome do condenado possa constar do cadastro. A Constituição Federal proíbe as penas de caráter perpétuo (art. 5º, inciso XLVII, alínea “b”, da CF), sendo que o Código Penal (art. 93 do CP) contém o instituto da reabilitação, que se dá dois anos após a extinção ou o cumprimento da pena. Ademais, a Lei de Identificação Criminal também estabelece determinados casos de exclusão de perfis genéticos de seus bancos de dados (Art. 7º-A da Lei nº 12.037, de 2009).

    Sendo assim, nada mais apropriado que a permanência do nome do condenado no CNPC Mulher se dê por prazo certo e determinado, evitando-se, com isso, maiores discussões interpretativas. Dessa forma, indicamos no substitutivo que a exclusão das informações do condenado da base de dados do cadastro deverá ocorrer após o transcurso do prazo da prescrição em abstrato do delito ou do cumprimento ou extinção da pena.

    Outrossim, no substitutivo que apresentamos abaixo, estabelecemos ainda que o CNPC Mulher será mantido e regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No nosso entendimento, os dados brutos que alimentarão o referido cadastro serão todos produzidos pelo Poder Judiciário. Além disso, a existência de outros bancos e cadastros no âmbito do próprio CNJ facilitaria essa implantação. Sendo assim, consideramos mais producente que a implementação, manutenção e regulamentação do CNPC Mulher sejam atribuídos ao CNJ, tendo o referido órgão concordado com a proposta e adiantado que a efetivação do banco de dados é de fácil criação e manutenção.

    Por fim, alteramos o prazo de vacatio legis de 60 para 180 dias, concedendo prazo hábil para o CNJ para a implementação do CNPC Mulher.

    Feitas essas considerações de mérito, passemos à análise das emendas apresentadas ao PL.

    A Emenda nº 1, do Senador Luiz do Carmo, que formalmente rejeito, foi, em seu mérito, integralmente aproveitada no substitutivo, deixando expressa a exigência da anotação de reincidência do condenado no cadastro.

    Sobre a Emenda nº 2, já indicamos acima as razões para a sua rejeição. Entendemos que o cadastro é uma ferramenta de trabalho para os agentes públicos, em especial os profissionais da segurança pública e do sistema de justiça, para prevenir e combater a violência contra a mulher. Não é, portanto, para uso geral da população.

    A Emenda nº 3 é desnecessária, a nosso sentir. Mesmo que não conste dispositivo específico na Lei Maria da Penha, a jurisprudência tem admitido a sua aplicação à pessoa transgênero. Note-se, ainda, que com a especificação do rol de crimes pelos quais os condenados deverão constar do cadastro, como propomos no substitutivo, o eventual problema desaparece.

    Uma vez decidida no processo a aplicação de algum daqueles tipos penais, a inclusão do nome do condenado no cadastro é cogente.

    As Emendas nºs 4 e 5, ambas da Senadora Rose de Freitas, possuem objetivo idêntico, que é o de incluir no cadastro as informações sobre os condenados por crimes praticados mediante violência contra idosos ou pessoas deficientes. Rejeitamos ambas as emendas, uma vez que fugiram ao tema da presente proposição legislativa, valendo ressaltar, no entanto, que o PL será aplicável se as vítimas forem mulheres.

    Por fim, acatamos a Emenda nº 6, do Senador Rogério Carvalho, que propõe que, para fins de inserção de informações no CNPC Mulher, seja considerada pessoa condenada aquela que tenha contra si proferida decisão condenatória transitada em julgado.

    Nos termos do art. 5º, LVII, da Constituição Federal, somente pode ser considerado culpado – e, portanto, condenado – aquele tenha contra si decisão condenatória transitada em julgado. Sendo assim, incorporamos essa definição no substitutivo que apresentamos abaixo.

    Pelo exposto, somos pela aprovação do Projeto de Lei nº 1.012, de 2020, na forma do substitutivo que apresentamos, rejeitadas as Emendas nºs 1, 2, 3, 4 e 5 e acatada a Emenda nº 6.

    É esse o relatório, Sr. Presidente.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/2021 - Página 27