Pronunciamento de Eliziane Gama em 27/09/2023
Discussão durante a 139ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Discussão sobre o Projeto de Lei (PL) n° 2903, de 2023, que "Regulamenta o art. 231 da Constituição Federal, para dispor sobre o reconhecimento, a demarcação, o uso e a gestão de terras indígenas; e altera as Leis nºs 11.460, de 21 de março de 2007, 4.132, de 10 de setembro de 1962, e 6.001, de 19 de dezembro de 1973."
- Autor
- Eliziane Gama (PSD - Partido Social Democrático/MA)
- Nome completo: Eliziane Pereira Gama Melo
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discussão
- Resumo por assunto
-
Domínio e Bens Públicos,
Patrimônio Genético,
População Indígena:
- Discussão sobre o Projeto de Lei (PL) n° 2903, de 2023, que "Regulamenta o art. 231 da Constituição Federal, para dispor sobre o reconhecimento, a demarcação, o uso e a gestão de terras indígenas; e altera as Leis nºs 11.460, de 21 de março de 2007, 4.132, de 10 de setembro de 1962, e 6.001, de 19 de dezembro de 1973."
- Publicação
- Publicação no DSF de 28/09/2023 - Página 54
- Assuntos
- Administração Pública > Domínio e Bens Públicos
- Meio Ambiente > Patrimônio Genético
- Política Social > Proteção Social > População Indígena
- Matérias referenciadas
- Indexação
-
- DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, LEI FEDERAL, PROIBIÇÃO, CULTIVO, Organismo Geneticamente Modificado (OGM), AREA, UNIDADE, CONSERVAÇÃO, EXCEÇÃO, AREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL, ESTATUTO, INDIO, COMPETENCIA, UNIÃO FEDERAL, ESTADOS, DISTRITO FEDERAL (DF), MUNICIPIOS, GARANTIA, COMUNIDADE INDIGENA, POSSE, USUFRUTO, TERRAS INDIGENAS, CRIAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, DISPOSITIVOS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DEMARCAÇÃO, GESTÃO, TERRAS, DEFINIÇÃO, PRINCIPIO JURIDICO, PROCESSO ADMINISTRATIVO, ATUAÇÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DOS POVOS INDIGENAS (FUNAI), LIMITAÇÃO, PERIODO, RECONHECIMENTO, OCUPAÇÃO, INDENIZAÇÃO, PROPRIEDADE, BENFEITORIA, POSSUIDOR, DESAPROPRIAÇÃO, INTERESSE SOCIAL, HIPOTESE, DESTINAÇÃO, IMOVEL.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA. Para discutir.) – Sr. Presidente, senhores colegas, Senadores e Senadoras, este dia de hoje, no Senado Federal, pode ser marcado, não há dúvida nenhuma, a partir do resultado desta votação, como um dia triste do Congresso Nacional no que se refere à política ambiental brasileira.
Quando nós estamos acompanhando, no mundo inteiro, as nações do mundo inteiro se unindo e juntando forças para a proteção da política ambiental de seus países, para a proteção dos seus povos originários; quando nós temos, no Brasil, a retomada da política ambiental – como, por exemplo, colocar mais uma vez, para a sociedade brasileira, o Fundo Amazônia; votar projetos importantes como o PPCDAm e o PPCerrado; votar tantas outras iniciativas, reposicionando o Brasil na política ambiental –; quando nós tivemos, no ano passado, o Presidente Lula – ainda sem assumir, tomar posse como Presidente da República –, que foi para a COP e ali, em Sharm el-Sheikh, se posicionou como um Líder, como um Chefe de Estado responsável e comprometido com a política ambiental – e aí retira o Brasil da retranca e, mais uma vez, o Brasil assume a cabeceira da mesa no debate da política ambiental –; o Congresso Nacional, o Senado Federal, hoje, aprovando esse projeto de lei, hoje, aqui, nesta Casa, estará dando para este mesmo mundo, para estas mesmas nações, um recado muito ruim, um recado de retrocesso.
Esse projeto de lei, para além do vício de inconstitucionalidade gritante que está aqui presente, pelas razões que agora há pouco eu acabei de destacar, não se pode alterar uma Constituição brasileira através de projeto de lei... Como eu disse, nem as pessoas que têm um conhecimento baixo acerca das questões jurídicas brasileiras deixam de compreender que, para mudar a Constituição do país, você tem que, necessariamente, apresentar uma proposta de emenda à Constituição.
Nós estamos aqui, apresentando um projeto de lei, que é uma questão ordinária, para mudar a Constituição Federal do Brasil; ou seja, isso não vai prosseguir, isso não vai ter segurança.
Hoje, quando nós tivemos o resultado do Supremo Tribunal Federal, com o placar de 9 a 2, atestando a inconstitucionalidade... Ela coloca sobre a mesa, para a nação brasileira, dois elementos que são fundamentais. O primeiro: dar as condições para qualquer órgão, para qualquer instituição, que tenha a prerrogativa e as condições de arguir uma ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, recorrer ao Supremo Tribunal Federal buscando a inconstitucionalidade. Se antes o Presidente Lula, no seu dever, como Chefe de Estado, não vetar este projeto de lei, ou seja, um projeto e uma decisão do Supremo Tribunal Federal, com repercussão geral, vincula o Poder Executivo.
Nós temos, no processo democrático de Direito, gente, um princípio que é elementar: a independência, é verdade, mas a harmonia entre os Poderes.
Esta Casa cria leis, esta Casa aprova leis, mas o Poder Executivo sanciona leis – o Poder Executivo sanciona leis.
Esta Casa cria leis, mas o Supremo Tribunal Federal, a Justiça brasileira, o Poder, que é fundamental, que é a magistratura do país, o Poder Judiciário, tem um papel fundamental. Ele é guardião da Constituição. O Congresso Nacional não pode trabalhar à revelia. O Poder Executivo não pode trabalhar à revelia. Nós precisamos entender que aquilo que é a base do processo legislativo, que é a nossa Constituição Federal, tem que ser respeitada; e esse projeto de lei, se for aprovado, ele não será respeitado; e claramente será derrubado – e aí não será uma intervenção do Supremo Tribunal Federal, porque a intervenção de um Poder em outro é quando este Poder tenta assumir as mesmas funções. O Supremo Tribunal Federal está arguindo sobre a constitucionalidade. Esse é o ponto central. Ou seja, o Supremo Tribunal Federal está na sua missão precípua de agir em relação ao marco temporal.
Vejam, esse projeto, para além da inconstitucionalidade, em um dos seus artigos, estabelece, por exemplo, que o posseiro fique na terra. Veja, ele pode ficar na terra até o fim do processo de demarcação. Vocês sabem quantos anos leva em média um processo de demarcação no Brasil? De dez a 35 anos. Esse é o tempo que se tem para uma demarcação. Esse projeto de lei que está aqui estabelece que esse posseiro – ou seja, quem está em situação de ilegalidade – possa, na verdade, ficar nessa terra por muito tempo, quase ad aeternum. Ou seja, por décadas a fio, claramente uma invasão premiada em essa lei sendo configurada.
Um outro artigo deste mesmo projeto de lei permite que reservas indígenas que foram estabelecidas antes da Constituição Federal possam, inclusive, ser retomadas, ser retiradas dos povos tradicionais, dos nossos povos originários, dos nossos povos indígenas, por um simples elemento: pela mudança de traços culturais. Ou seja, esse projeto de lei cria um elemento que é subjetivo para retirar dos índios as suas terras.
Um outro ponto também que é absolutamente temerário: nós tivemos, gente, a pandemia no Brasil. Para que alguém tivesse acesso aos povos isolados, o Ministério da Saúde estabelece um protocolo e, nesse protocolo, a pessoa, para ter acesso a essa área, tem que também passar por todo um isolamento prévio. Ou seja, ela precisa fazer uma bateria de exames para saber se ela tem condição de ter acesso à terra dos povos isolados, porque são povos com uma imunidade baixíssima. Este projeto de lei permite o acesso, inclusive, para a implantação de projetos por instituições que forem autorizadas pelo poder público.
A alteração que a Senadora Augusta apresentou hoje, na CCJ, não era impedindo a não entrada de agentes de saúde, porque lá ela respeitava esse caso que ela criava como exceção. O que este projeto, na verdade, apresenta é uma forma deliberada de acessar esses povos. Em alguns deles, inclusive, quando um pega uma gripe, todos os demais podem também pegar uma gripe e até vir à morte. Esse é o cenário que está sendo colocado hoje aqui, diante de nós.
Eu quero dizer, meus colegas Senadores e minhas colegas Senadoras, que os nossos povos indígenas, hoje, são os maiores responsáveis pela nossa preservação ambiental. As nossas florestas, que são lugares sagrados para os povos indígenas, são mantidas quando você tem lá o povo presente e respeitando as suas individualidades, as suas crenças, a sua cultura. É com esse resultado que se tem a proteção ambiental e esse projeto de lei fere frontalmente, se ele for aprovado, hoje, aqui, no Plenário do Senado Federal.
Eu quero finalizar. Quando alguém diz aqui: "Olha, não se quer índio produzindo". Isso não é verdade. Os índios, por exemplo, da Raposa Serra do Sol, são índios que têm uma ampla produção, sobretudo na área da pecuária. Os índios querem, sim, produzir!
(Soa a campainha.)
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) – Agora, os dados que nós temos, hoje, são de que, entre os nossos povos indígenas, estão aumentando, infelizmente, casos de suicídio.
Presidente, só mais um minuto, para fechar apenas um dado.
Esse projeto também vai aumentar a violência no campo. Vejam os números que são apontados agora. Em 2018, a quantidade de mortes era de 627; em 2019, Leila, Presidente da Comissão de Meio Ambiente desta Casa, minha querida Leila, aumentou para 797; em 2020, houve um boom, Zenaide, para 1.044; em 2021, 695; em 2022, 926.
O meu Estado do Maranhão, infelizmente, é um dos estados onde há um aumento significativo, inclusive, de assassinatos de índios. Nos últimos 15 anos, a quantidade, segundo o Cimi, chegou a mais de 50 índios assassinados.
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Pacheco. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MG) – Para concluir, Senadora Eliziane.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MA) – Para concluir, Presidente, eu quero fazer aqui um apelo aos colegas, na defesa dos direitos dos nossos povos originários, na defesa dos direitos humanos, porque é lá, na Comissão de Direitos Humanos desta Casa, que se debate a questão da política indígena deste país.
Em nome desses povos que são responsáveis, de forma decisiva, pela proteção de nossas florestas, vamos dizer "não" a esse projeto de lei! Vamos dar uma resposta para o Brasil e vamos dar uma resposta para o mundo! Não podemos andar na contramão de como a humanidade, hoje, está trabalhando, que é na proteção e defesa do nosso meio ambiente e, sobretudo, dos nossos povos originários.
Muito obrigada, Presidente.