Discussão durante a 176ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Discussão sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n° 8, de 2021, que "Altera a Constituição Federal para dispor sobre os pedidos de vista, declaração de inconstitucionalidade e concessão de medidas cautelares nos tribunais".

Autor
Rogério Carvalho (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: Rogério Carvalho Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
Organização Federativa { Federação Brasileira , Pacto Federativo }:
  • Discussão sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n° 8, de 2021, que "Altera a Constituição Federal para dispor sobre os pedidos de vista, declaração de inconstitucionalidade e concessão de medidas cautelares nos tribunais".
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2023 - Página 43
Assunto
Organização do Estado > Organização Federativa { Federação Brasileira , Pacto Federativo }
Matérias referenciadas
Indexação
  • DISCUSSÃO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), ALTERAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, VISTA, PRAZO, CONCESSÃO, PEDIDO, MEDIDA CAUTELAR, COMPETENCIA, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), JULGAMENTO, AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE, OMISSÃO, AÇÃO DECLARATORIA DE CONSTITUCIONALIDADE, ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF).

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE. Para discutir.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, Sras. Senadoras, em primeiro lugar é importante a gente dizer que nós temos uma Suprema Corte que tem serviços prestados a este país de extrema relevância.

    É importante dizer que nós temos uma Justiça que, gostemos ou não, tem serviços prestados, e de grande relevância, para o nosso país. Podemos dizer que nesse período de instabilidade, que foi um período da tentativa e dos ataques à democracia, uma parte significativa do Judiciário se posicionou e se portou na defesa da institucionalidade democrática. E nessa institucionalidade democrática e na nossa democracia, a nossa República – o que não é fato em outras democracias, em outras repúblicas – dá ao Judiciário a estatura de poder. Portanto, no nosso país, na nossa democracia, na nossa República, a nossa institucionalidade democrática é formada por três Poderes que se equiparam, sendo que o Poder Legislativo e o Poder Executivo têm uma diferença, que é a legitimidade dada pelo voto. Essa legitimidade dada pelo voto é para que a gente possa pensar o futuro, mas quem tem a obrigação de olhar para o passado e fazer as correções daquilo que não foi feito corretamente, num determinado momento do tempo, é o Judiciário. E foi dada ao Judiciário essa posição de poder. A Constituição diz que esses Poderes se equiparam e são independentes entre si.

    Eu queria, corroborando aqui com o ilustríssimo Senador Marcelo Castro, por quem eu tenho muita admiração e respeito, como por todos, dizer que estamos diante de flagrantes inconstitucionalidades mesmo aprovando um projeto de emenda à Constituição, porque, mesmo sendo um projeto de emenda à Constituição, existem aquelas cláusulas que são basilares e que são as cláusulas fundantes, que são as cláusulas constitucionais, chamadas pétreas, sobre as quais se funda e se estabelece o grande edifício da Constituição, da Carta Magna brasileira.

    E aqui eu vou citar algumas das flagrantes inconstitucionalidades. Primeiro, a ofensa ao art. 60, §4º, inciso III, da Constituição Federal, pois a PEC ofende a separação dos Poderes ao invadir o espaço de autodeterminação e auto-organização do Poder Judiciário, o qual não pode ser suprimido nem mesmo por PEC.

    A ofensa ao art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, pois exclui da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, uma vez que enfraquece a tutela provisória enquanto mecanismo inerente ao exercício da jurisdição, que foi citado aqui pelo Senador Fabiano Contarato na fala dele.

    Ofensa ao art. 2º da Constituição Federal por ferir a independência e a autonomia dos Poderes, pois interfere nos poderes do Relator, que funciona como órgão judicial, tolhendo sua independência.

    Ofensa ao art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, que assegura a razoável duração do processo, pois o trancamento de pauta e a inviabilização de decisões monocráticas contribuirão para um processo mais moroso, aumentando a sobrecarga de trabalho e o congestionamento da pauta dos órgãos colegiados do Poder Judiciário.

    Ofensa ao princípio da proporcionalidade e à participação democrática da sociedade, art. 2º da Constituição Federal, uma vez que o prazo de seis meses para julgamento de mérito da ação de controle abstrato de constitucionalidade inviabiliza a participação social ampla, oferecendo subsídio para julgamentos.

    Ofensa à hierarquia entre órgãos jurisdicionais – art. 92 da Constituição Federal. Isso porque, caso aprovada a PEC, o Ministro do Supremo Tribunal Federal terá menos poder que o magistrado de primeira instância. Neste sentido, o juiz de primeira instância poderá conceder, numa ação civil pública, monocraticamente, tutela de urgência, reconhecendo incidentalmente a inconstitucionalidade de quaisquer leis ou atos do poder público, inclusive afetando políticas públicas ou criando despesas. Todavia, essa possibilidade de decisão monocrática será vedada aos Ministros do Supremo Tribunal Federal. O que é isso se não o afrontamento direto à função precípua da Suprema Corte?

    Ofensa ao art. 60, §4º, inciso IV, da Constituição Federal, pois a PEC praticamente suprime a possibilidade de tutela jurisdicional efetiva dos direitos fundamentais em caso de urgência. É de se recordar que foram decisões monocráticas – prestem atenção –, na pandemia, que possibilitaram a aquisição direta de vacinas pelos entes federados e a instalação da sala de situação para conter o avanço e a disseminação do coronavírus entre a população indígena.

    Ofende ainda a Lei Complementar nº 95, de 1998, uma vez que a redação do §1º do art. 97 da PEC é bastante atécnica, ou seja, tem uma técnica que gera dubiedade. Por um lado, determina-se que a cláusula de reserva de plenário é válida para decisões cautelares e outras de quaisquer naturezas. Dessa forma, decisões monocráticas seriam incabíveis em qualquer hipótese. Por outro lado, em contradição, a segunda parte do §1º conduz ao entendimento de que as decisões monocráticas seriam cabíveis, fora as hipóteses dos incisos I e II do art. 97, quando se trata de suspensão de eficácia de lei, suspensão de ato dos Presidentes da República, Senado, Câmara e do Congresso Nacional.

    Eu quero dizer aos Srs. e às Sras. Senadoras que nós vamos passar por um vexame, que é o vexame de ver essa PEC não prosperar por inconstitucionalidade flagrante que hoje praticamos aqui, num ato de certa forma pouco pedagógico com a sociedade, que precisa entender que uma instituição não está e não se move...

(Soa a campainha.)

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE) – ... em função do movimento e da direção do vento, mas a institucionalidade de um país e uma sociedade se move em função de valores e em função, para concluir, Sr. Presidente, e em função de uma estrutura institucional que nós escolhemos: a democracia, a República formada por três Poderes livres e independentes, com equidade de força para consolidar esta democracia.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2023 - Página 43