Discurso durante a 179ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Exposição sobre as condições de vida da população em situação de rua no Brasil. Destaque para os Projetos de Lei nºs 6802/2006 e 1635/2022, que buscam assegurar os direitos básicos dessas pessoas, bem como possibilitar sua reinserção na sociedade.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Assistência Social, Desenvolvimento Social e Combate à Fome:
  • Exposição sobre as condições de vida da população em situação de rua no Brasil. Destaque para os Projetos de Lei nºs 6802/2006 e 1635/2022, que buscam assegurar os direitos básicos dessas pessoas, bem como possibilitar sua reinserção na sociedade.
Publicação
Publicação no DSF de 28/11/2023 - Página 8
Assuntos
Política Social > Proteção Social > Assistência Social
Política Social > Proteção Social > Desenvolvimento Social e Combate à Fome
Matérias referenciadas
Indexação
  • DISCURSO, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, LEI FEDERAL, DESTINAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, FUNDO NACIONAL, HABITAÇÃO, INTERESSE SOCIAL, PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA (PMCMV), REQUISITOS, PRIORIDADE, ATENDIMENTO, BENEFICIARIO, POPULAÇÃO, SITUAÇÃO, LOGRADOURO PUBLICO, PROIBIÇÃO, HOSTILIDADE, ARQUITETURA, CRIAÇÃO, ESTATUTO, VULNERAVEL, EXTREMA POBREZA, ABANDONO, FAMILIA, DIRETRIZ, COMPETENCIA, PODER PUBLICO, GARANTIA, DIREITOS, ASSISTENCIA SOCIAL, FINANCIAMENTO, PROGRAMA, PROMOÇÃO, AUTONOMIA, PARTICIPAÇÃO, SOCIEDADE, ORIGEM, RECEITA, COMITE, ACOMPANHAMENTO, POLITICA NACIONAL, COMPOSIÇÃO.
  • DISCURSO, PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS), AUTORIZAÇÃO, EXECUTIVO, CRIAÇÃO, PROGRAMA, INCLUSÃO SOCIAL, DESTINAÇÃO, POPULAÇÃO, ESTADO DE POBREZA, HABITAÇÃO, DOMICILIO, FINANCIAMENTO, RECURSOS PUBLICOS, COORDENAÇÃO, FUNDO DE COMBATE E ERRADICAÇÃO DA POBREZA (FCEP).

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Muito bem, Presidente Dr. Hiran, é uma satisfação poder falar da tribuna de um tema muito sensível. E sei da sua sensibilidade com os mais vulneráreis. Eu diria que é claro que tem exceções em todas as áreas, mas todo médico tem uma certa sensibilidade – uns mais, outros menos –, e V. Exa., como médico e Parlamentar, tem essa sensibilidade.

    Presidente Dr. Hiran, quero abordar hoje um assunto que não apenas é uma questão social, mas o reflexo na nossa humanidade e na nossa sociedade. Falo hoje dos moradores em situação de rua no Brasil. É fundamental reconhecer que a presença de pessoas vivendo nas ruas e praças de nossas cidades é um desafio que exige a nossa atenção. Exige nossa empatia saber que cada um dos moradores em situação de rua tem uma história de vida – algumas eu vou passar aqui. Portanto, não podemos ignorá-los.

    Os moradores em situação de rua são parte invisível da nossa sociedade, mas eles existem. Eles são seres humanos, com sonhos e desafios. A maioria enfrenta dificuldades, como desemprego, fome, problemas de saúde mental, dependência química. Não têm, de fato, onde morar. São pessoas que são abandonadas, muitas vezes, pelas famílias, que, por diversas razões, perderam o acesso a uma vida digna e segura.

    As cidades de papelão, cidades de plástico, construídas com restos da cultura descartada, são uma realidade. O Brasil é um país rico. Temos recursos, cultura e diversidade. Mas temos também a segunda maior desigualdade de renda do mundo: riqueza para poucos e pobreza para muitos. Alguns têm abundância, possuem recursos, vivem; outros sobrevivem; outros mais lutam para encontrar abrigo, comida e cuidados médicos básicos. Temos o dever de garantir que todos tenham a oportunidade de uma vida melhor.

    A nossa Constituição Cidadã vigora há 35 anos. Eu estava lá, fui Deputado Federal Constituinte. O Capítulos II, dos Direitos Sociais, no art. 6°, diz:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados [...]

    Dr. Hiran, Senador Laércio, que agora chega ao Plenário, segundo pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), a população em situação de rua hoje, no Brasil, é de 281 mil pessoas – um aumento de 38% desde 2019, após a pandemia da covid-19.

    Há um alerta nessa pesquisa: o aumento é muito maior em proporção do que o da população em geral. Ou seja, cresce o número de pessoas abandonadas nas ruas. O instituto mostra que, no período de 10 anos, de 2012 a 2022, o crescimento nesse segmento vulnerável foi de 211%. Segundo dados do IBGE, o aumento populacional brasileiro foi de 11% nesse mesmo período, entre 2011 e 2021, 2012 e 2022, e o crescimento da população de rua foi de 211%.

    A pesquisa mostra, ainda, que a Região Sudeste concentra pouco mais da metade da população em situação de rua do país: são 151 mil pessoas. Na sequência, estão Nordeste, Sul, Centro-Oeste e Norte.

    A pesquisa ainda mostra que, na Região Norte, está a menor parcela da população de rua do país; no entanto, mais do que dobrou de 2019 a 2022, saindo de 8 mil para mais de 18 mil pessoas vivendo nas ruas.

    Conforme relatório do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, o DF é a unidade da Federação com maior percentual de pessoas em situação de rua no Brasil – aqui, na Capital Federal! A Capital tem quase três pessoas em situação de rua a cada mil habitantes. Quanto ao número absoluto de moradores de rua, ou seja, a população total, Brasília aparece em quarto lugar, com 7.924 pessoas nessa situação, o que representa 3,4% do total da população em situação de rua de todo o País.

    Outras cidades: São Paulo, em torno de 60 mil pessoas; Rio de Janeiro, em torno de 14 mil pessoas – estou arredondando –; Belo Horizonte, em torno de 12 mil pessoas; Salvador, em torno de 8 mil pessoas; Fortaleza, em torno de 6,5 mil pessoas, quase 7 mil; Curitiba, também se aproxima de 4 mil; Porto Alegre, 3.189.

    Vejamos o perfil dos moradores em situação de rua conforme os dados registrados no CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais): masculino, 87%; adulto, 55% têm entre 30 e 49 anos; já tiveram emprego com carteira assinada, 68% dos moradores de rua; pessoas negras – pardas, 51%; pretas, 17% –, no total, entre pardas e pretas, 68%; sabem ler e escrever, 90% de quem está nas ruas.

    O percentual de pessoas em situação de rua com deficiência é de 15%. Desse total, 47% são pessoas com deficiência física, 18% são pessoas com transtornos mentais, 16% são pessoas com deficiência visual.

    Quanto ao local de nascimento, 37% nasceram no município atual em que vivem, 59% em outros municípios, e 4% vieram de outros países. São 9.749 estrangeiros morando nas ruas do país. Do total de imigrantes internacionais, 54% são provenientes da América do Sul, dos quais 43% são de origem venezuelana, 23% angolanos e 11% afegãos.

    Os principais motivos apontados para a situação de rua, de acordo com a pesquisa, foram: problemas familiares, 44%; desemprego, 39%; alcoolismo e uso de droga, 29%; perda de memória, 23%.

    O Brasil precisa ampliar os programas de assistência social, a promoção de emprego, entre outros. Apresentamos em 2006 o Projeto de Lei 6.802, que cria o Programa de Inclusão Social da População em Situação de Rua. Já foi aprovado aqui no Senado, por unanimidade, e está na Câmara dos Deputados, com o parecer favorável da Deputada Sâmia Bomfim. O objetivo da proposta é dar assistência, oportunidade de qualificação profissional e condições para inclusão social de pessoas com renda inferior à linha da pobreza que não tenham casa e durmam em abrigo ou nas ruas.

    Situações assim exigem políticas efetivas, urgentes e abrangentes de acolhimento e expõem a população de rua a situações humilhantes, dificultando ainda mais o caminho de reencontro com a autoestima e com a dignidade. As causas do problema são estruturais, mas o Estado não pode esperar que as questões estruturais sejam solucionadas para enfrentar os graves problemas sociais.

    A Comissão de Direitos Humanos do Senado aprovou recentemente o Projeto de Lei 1.635, de 2022, que cria o Estatuto da População em Situação de Rua. Esse estatuto é de autoria do Senador Randolfe Rodrigues – eu fui o Relator –, e a Comissão o aprovou por unanimidade. Destaco que esse projeto é uma ideia do Padre Júlio Lancellotti. O objetivo é reinserir essas pessoas na sociedade, de modo que não haja mais brasileiros nessa situação.

    Para garantir a dignidade básica das pessoas, o texto atribui ao poder público assegurar o acesso à alimentação gratuita, água potável, itens de higiênica básica e banheiros públicos. Naturalmente, como eu dizia aqui, a alimentação é fundamental.

    O estatuto prevê a criação do comitê intersetorial de acompanhamento e monitoramento da política nacional para a população em situação de rua, composto por representantes do Governo e da sociedade civil com mandato de dois anos. O comitê deve acompanhar a implementação das medidas previstas no estatuto e avaliar seus resultados. Já o Governo Federal está construindo um programa integrado com um olhar para a população de rua com habitação, saúde e direitos humanos a quem não tem onde morar.

    A mudança começa com cada um de nós. Não podemos fechar os olhos para essa realidade. Em vez disso, devemos estender a mão e trabalhar juntos para criar um Brasil mais justo. O valor de uma sociedade se mede pela forma como ela cuida das pessoas vulneráveis. Ao abraçar essa responsabilidade, podemos trabalhar para um Brasil onde ninguém tenha que viver nas ruas, ninguém tenha que passar fome, ninguém fique exposto à violência; onde todos tenham a oportunidade de alcançar seu potencial e levar uma vida digna.

    Sr. Presidente, como eu tenho que ir para outro evento, fiquei hoje nos meus 12 minutos.

    Agradeço muito a V. Exa.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/11/2023 - Página 8