Discurso durante a 40ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de Debates Temáticos destinada a debater a Proposta de Emenda à Constituição nº 45/2023, que “altera o art. 5º da Constituição Federal, para prever como mandado de criminalização a posse e o porte de entorpecentes e drogas afins sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.

Autor
Rogério Carvalho (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: Rogério Carvalho Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Direito Penal e Penitenciário:
  • Sessão de Debates Temáticos destinada a debater a Proposta de Emenda à Constituição nº 45/2023, que “altera o art. 5º da Constituição Federal, para prever como mandado de criminalização a posse e o porte de entorpecentes e drogas afins sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/2024 - Página 39
Assunto
Jurídico > Direito Penal e Penitenciário
Matérias referenciadas
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, DEBATE, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), ALTERAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CRIME, POSSE, ENTORPECENTE, DROGA, AUSENCIA, AUTORIZAÇÃO.
  • DEFESA, DESCRIMINALIZAÇÃO, PORTE DE DROGAS, POSSE, ENTORPECENTE, DROGA.

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE. Para discursar.) – Meus cumprimentos ao Sr. Presidente, Senador Jaques Wagner.

    Em primeiro lugar, eu quero chamar a atenção, na condição de médico, para que uma das primeiras coisas que a gente aprende é que nenhum evento de saúde é causa-efeito. São várias causas que produzem uma doença ou que produzem uma dismorfia ou uma alteração fisiológica.

    Eu quero também chamar a atenção para que os problemas de saúde mental não podem ser todos colocados na mesma corrente, como se todos eles fossem decorrentes do uso de substâncias que tenham um efeito alucinógeno ou que tenham algum efeito de mudança do funcionamento do cérebro.

    Eu quero também chamar a atenção para que, quando a gente fala da proibição, e eu quero aqui resgatar a proibição da Lei Seca, nos Estados Unidos; foi onde nasceu a máfia... A máfia, como nós conhecemos, nasceu da Lei Seca nos Estados Unidos e, por isso, ninguém deixou de consumir álcool nos Estados Unidos no período da Lei Seca.

    Eu quero também chamar a atenção para que nós não estamos tratando de descriminalizar o uso, quer dizer, de descriminalizar as drogas, porque a ideia que está se passando aqui é a de que nós estamos descriminalizando as drogas. Ninguém está descriminalizando droga nenhuma, nem a maconha, nem nenhum outro tipo de drogas psicoativas, nenhum tipo! (Palmas.)

    É preciso dizer isso de forma clara, para não enganar a sociedade, porque depois vem fake news: "Ah, o Senador Rogério foi a favor da descriminalização das drogas", porque esse não é o debate. O debate é: o uso e o que é quantidade para uso individual, que está no âmbito das liberdades individuais, que está garantido pela Constituição como cláusula pétrea, e o que é quantidade, o que é considerado tráfico de drogas.

    Eu quero chamar a atenção dos Srs. Parlamentares e das Sras. Parlamentares, porque, aqui, nós estamos fazendo um debate dizendo que nós estamos reagindo ao STF. E nós estamos deixando em aberto para que agentes públicos aumentem o seu poder discricionário sobre a vida dos indivíduos e sobre as liberdades individuais. Isto é muito grave: você transferir para autoridades, sejam elas quais forem, de forma discricionária, a definição sobre o futuro das pessoas.

    Eu vou contar um fato, Sr. Presidente.

(Soa a campainha.)

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE) – Essa semana, instalaram uma tecnologia de identificação facial. Tudo bem: a tecnologia veio para ajudar na segurança. Mas foi uma mulher preta e um homem preto que foram presos: num evento público, uma mulher preta e, num jogo de futebol, um homem preto, por discricionariedade. Não foi a tecnologia. Foi a discricionariedade de um agente público, que foi lá e separou, no meio da multidão, como separam, no meio da multidão, quem são os pobres e os pretos, que estão mais vulneráveis.

    E vou lhes dizer, para concluir, porque o nosso tempo é mais curto: 40% das mulheres que estão encarceradas foram condenadas por tráfico de drogas. Houve um aumento significativo.

(Soa a campainha.)

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE) – São dados. Então, eu não estou entendendo. E por quê? Porque aumentou a discricionariedade. A maioria são pretos periféricos ou pretas periféricas, porque aumentou a discricionariedade!

    Então, nós temos que discutir aqui o tema central desta PEC: aumentamos ou não aumentamos a discricionariedade dos agentes públicos através de uma PEC? Ao fazer isso, nós estamos tirando da cláusula pétrea, que diz que a gente tem que ter a liberdade, e dando a nossa liberdade para o agente público estabelecer qual é o tamanho dela. Vamos ser honestos! Quando a gente quer – para concluir, Sr. Presidente – resolver um problema, a gente resolve...

(Soa a campainha.)

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE) – ... encarando o problema.

    Eu vou dar um exemplo: aleitamento materno. E, aqui, tem um médico: Osmar Terra, pediatra. O aleitamento materno foi criminalizado no Brasil, criminalizado, porque diziam que o leite materno era fraco e introduziram o leite de vaca, com várias fórmulas. E nós revertemos. Sabem por quê? Porque a gente assumiu que o aleitamento materno era o melhor para a criança. Quando a gente assumiu que o tabaco fazia mal – e foi o sistema público de saúde, o Brasil é campeão nisso –, a gente reduziu o tabagismo. Então, quando a gente pega determinados problemas e coloca debaixo do tapete, a gente só aumenta a discriminação, a gente não resolve o problema, a gente adia o problema e aumenta o sofrimento social...

(Soa a campainha.)

    O SR. ROGÉRIO CARVALHO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE) – ... humano e de saúde pública da população brasileira.

    Pelo amor de Deus, a hipocrisia não vai salvar o povo brasileiro. Abaixo a hipocrisia que domina a política brasileira neste momento! (Palmas.)

    Por isso, o que está em discussão é, concluindo, o excesso de discricionariedade. O que é discricionariedade? É dar para o agente público dizer o que é certo e o que é errado. Transferir para o outro a sua própria liberdade. E, disso, nós não podemos ser a favor. Não estamos aqui tratando de descriminalização de nenhum tipo de droga.

    Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/2024 - Página 39