Pronunciamento de Damares Alves em 17/06/2024
Discurso durante a 81ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal
Sessão de Debates Temáticos destinada a discutir o procedimento de assistolia fetal previamente aos procedimentos de interrupção de gravidez, nos casos de aborto previsto em lei, quando houver probabilidade de sobrevida do feto em idade gestacional acima de 22 semanas, e a Resolução nº 2.378/24, do Conselho Federal de Medicina (CFM).
- Autor
- Damares Alves (REPUBLICANOS - REPUBLICANOS/DF)
- Nome completo: Damares Regina Alves
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
Direito Penal e Penitenciário,
Direitos Humanos e Minorias:
- Sessão de Debates Temáticos destinada a discutir o procedimento de assistolia fetal previamente aos procedimentos de interrupção de gravidez, nos casos de aborto previsto em lei, quando houver probabilidade de sobrevida do feto em idade gestacional acima de 22 semanas, e a Resolução nº 2.378/24, do Conselho Federal de Medicina (CFM).
- Publicação
- Publicação no DSF de 18/06/2024 - Página 84
- Assuntos
- Jurídico > Direito Penal e Penitenciário
- Política Social > Proteção Social > Direitos Humanos e Minorias
- Matérias referenciadas
- Indexação
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- SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, DISCUSSÃO, OBJETIVO, PROCEDIMENTO, PREPARAÇÃO, ABORTO, CORRELAÇÃO, RESOLUÇÃO, CONSELHO FEDERAL, CONSELHO DE MEDICINA, COMENTARIO, EXPERIENCIA, VIDA, ORADOR, TERCEIROS, ENFASE, CRIANÇA, NEGRO, GRAVIDEZ, DEFESA, NORMAS, CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM).
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF. Para discursar.) – Eu precisava começar a minha fala me dirigindo às mulheres do Brasil. É possível que muitas das mulheres que passaram pelo procedimento do aborto acompanharam esse debate. E eu quero abraçar essas mulheres. Algumas delas foram para o procedimento sem que verdades fossem ditas para elas. É possível, inclusive, Senador Girão, que algumas estejam se sentindo muito culpadas, a partir de todos os debates dos últimos dias. Eu quero abraçar as mulheres que passaram pela violência.
Eu passei pela mesma violência. Eu não engravidei, porque eu tinha apenas seis anos de idade. Eu passei pelo estupro dos seis aos oito anos. Eu sei o que é violência sexual contra a mulher. Eu sei como dói, eu sei que é uma marca para a vida inteira. E quem está falando aqui é alguém que se identifica com a dor. Eu fiz dessa dor a minha luta, Senador Girão. Eu não faço outra coisa nesse Senado a não ser lutar pela vida, como estou desde o primeiro dia.
Quiseram me impedir de todas as formas: primeiro de ser Ministra, depois de ser Senadora. O primeiro processo de cassação no Senado, em 2023, foi o meu, porque sabiam que eu ia fazer o debate. Mas eu quero fazer esse debate, Senador, da forma como eu sempre fiz, falando verdades e sem acusar, dizendo para as mulheres do Brasil: venham comigo enfrentar o estupro. Venham comigo enfrentar o estuprador. O nosso foco tem que ser o enfrentamento ao crime de estupro. E ultimamente o que eu estou vendo não é isso. O foco virou o aborto, e nessa briga toda aqui o foco tem que ser o estupro, Senador. Ou a gente faz um pacto nacional pelo fim da violência sexual contra meninos e meninas no Brasil, ou a gente faz um pacto. Ou a gente faz um pacto nacional pelo enfrentamento à violência sexual contra mulheres, ou a gente faz um pacto. Não tem alternativa "b".
Nós precisamos nos encontrar nesta discussão! Direita, esquerda, feministas, não feministas, nós vamos ter que nos encontrar e não nos separar mais!
Esta tem sido a minha vida: dizer "não" ao estuprador.
Desde o primeiro dia em que cheguei ao Senado Federal, eu tenho encontrado lacunas na lei, tenho atuado no aperfeiçoamento da lei. Quarta-feira, agora, vai estar na pauta um projeto de lei de que sou Relatora que proíbe o regime de progressão de pena. E já tem gente dizendo que não, que esse projeto não tem que ser aprovado.
Eu vou continuar lutando não é só sobre o fim da saidinha, não, Senador. O estuprador não pode ter direito ao regime de progressão de pena! Ele tem que cumprir a pena integral, em reclusão, preso, enjaulado!
Essa é a minha posição!
E nós tínhamos que estar falando sobre isso. Como eu gostaria que o Brasil inteiro tivesse se levantado, nesse final de semana, contra o estupro! Mas o Brasil inteiro se levantou contra um ato médico, contra uma resolução do Conselho Federal de Medicina!
Aqui, como mulher, eu quero abraçar as mulheres do Brasil e dizer: nós sabemos que não é fácil enfrentar um estupro. Não existem Senadores aqui querendo culpar você, vítima. Não. Existem Senadores querendo discutir.
As verdades estão sendo ditas para todas as mulheres?
Sobre este projeto de lei, assim como o Senador...
(Soa a campainha.)
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) – ... Marcos Rogério falou, nós temos dúvidas sobre o texto? Temos.
Foi em momento oportuno a apresentação do projeto? Tenho dúvida.
Será que não era para a gente estar discutindo lá no âmbito do Judiciário, ajudando o Conselho Federal de Medicina a enfrentar este debate lá no STF?
Mas os Parlamentares, lá na outra Casa, entenderam que se precisava do projeto. E o projeto já prestou um serviço: ele descortinou que não tem romantismo atrás do aborto. Não existe este romantismo de que se fala, que é o direito da mulher.
Ele descortinou uma verdade. Ele mostrou para o Brasil a verdade de que este método usado, a assistolia, é violento. Ele machuca a criança e machuca a mulher também.
Permita-me, Presidente, dar o exemplo daquele famoso caso da menininha de São Mateus, em que eu fui tão envolvida, sem ter feito absolutamente nada. Eu só era ministra da pasta que cuidava de mulher e de criança. E aquele caso estoura.
Quando chegou a provocação ao nosso ministério, a provocação era: existem outros casos em São Mateus. O que está acontecendo em São Mateus que tem tanta menina abaixo de 14 anos engravidando? O ministério vai à cidade para entender o que estava acontecendo e no que a Secretaria Nacional da Criança poderia fortalecer a rede de proteção.
Quando o ministério chega lá, está toda a polêmica em volta da menina. Não tivemos acesso à menina, porque ela estava numa rede de proteção já do Estado. Estranhamente, ontem, jornalistas tiveram acesso à família da menina. E eu estou preocupada. Os jornalistas estão tendo acesso à menina e à família dela? Então, ela não está protegida pelo Estado?
Esta é uma outra discussão que vamos ter que fazer nesta Casa: como os jornalistas chegaram à menina ontem? Para mostrar para o Brasil o que aconteceu com a menina, o que está acontecendo com ela, quatro anos depois.
Mas a discussão deste projeto, que eu repito, não sei se era hora, foi uma reação do Congresso a uma decisão do Ministro Alexandre, que eu entendo que não foi uma decisão jurídica nem com base na ciência. Foi uma decisão política. E a Casa reage à decisão do Ministro Alexandre, que não ouviu o Conselho Federal de Medicina.
E aqui eu quero me solidarizar com o CFM e com todos os médicos. Desculpa, mas estão colocando os médicos na posição de estupradores. Os médicos estão sendo criticados em redes sociais como se fossem monstros, e eles não são. O CFM não está tomando uma atitude de monstro, não.
O que acontece, Brasil? A ciência mudou. A fetologia está aí. Nós estamos vendo que a ciência hoje consegue ajudar um bebezinho de 22 semanas a sobreviver. Em 1940, seria impossível, mas hoje é possível. Então, o que os médicos estão falando? Que a ciência evoluiu. "Se a ciência evoluiu, por que nós também como médicos não podemos acompanhar essa evolução e garantir a essa criança a vida?", foi simplesmente isso que os médicos fizeram. "Êpa, esse bebê aqui tem chance de viver." E quantas imagens estão chegando para nós, Senador Girão, de bebezinhos de 22 semanas que estão na faculdade hoje, que estão tendo uma vida normal hoje. A ciência mudou, e os médicos tão somente quiseram acompanhar essa evolução.
Quero dizer para o Brasil: vamos nos acalmar. Vamos baixar os ânimos, por favor. Chega de briga no Brasil! Vamos fazer essa discussão da forma como foi feita aqui, agora de manhã: com a ciência. Quem falou nessa mesa e quantos cientistas passaram por esse debate aqui hoje? Vamos ouvir os cientistas: "Esse bebê pode ou não sobreviver?". É tão somente isto que a resolução está falando: há viabilidade num bebê com 22 semanas em diante.
Senador, quando a gente falava, lá atrás – a Lenise lembrou bem –, que nós chegaríamos a esse estágio, que nós chegaríamos a esse momento em que iam querer abortar em qualquer estágio gestacional, diziam que nós éramos loucos, mas eu quero avisar o Brasil que já há uma discussão também – não no Brasil, mas a academia já começa a ser influenciada – sobre o aborto pós-parto, e a gente vai ter que acreditar que quem está fazendo a discussão são outras pessoas, lá do outro lado, e que já há a possibilidade de se discutir no mundo o aborto pós-parto. Será que, daqui a dez anos, a gente estará sentado neste Plenário também discutindo que alguém está dando sentença que é permitido no Brasil o aborto pós-parto: algumas horas depois, a mãe pode decidir, depois de o bebê nascer, se ele vive ou se ele morre? Essa discussão está posta também.
Então, Brasil, o que está acontecendo aqui hoje? Cientistas e o Conselho Federal de Medicina vieram a este Senado – nós não estamos discutindo o PL, que está na Câmara; a discussão está lá –, de uma forma muito clara, dizer porque e o que motivou a resolução. O Dr. Raphael falou que foi uma discussão muito grande dentro do conselho, e o conselho parou para discutir. Com certeza, tinha médicos contra e médicos a favor, mas eles acabaram entrando no consenso e publicaram a resolução, e a gente vai ter que respeitar o Conselho Federal de Medicina. O ato médico é de vocês. Nesta nação, infelizmente, estão invadindo a autonomia médica, e isso me preocupa por demais. A autonomia médica está o tempo todo sendo colocada em xeque no país.
Conselho Federal de Medicina, aceite a nossa solidariedade, o nosso respeito, o nosso abraço!
Essa discussão tem que continuar. Mulheres do Brasil, ninguém está querendo colocar uma mulher vítima de estupro na cadeia, não é isso! Por favor, não caiam nesse engano, não é isso! Quem começou essa discussão foi quem entende de vida, que são os médicos. Os médicos estão discutindo: é possível essa criança sobreviver?
E eu volto ao caso de São Mateus, Senador Girão. A menina tinha só dez anos, mas ela estava grávida de um bebê de seis meses, e ninguém vem me dizer que houve romantismo em torno daquele aborto, porque não houve. Aquela menina sofreu...
(Soa a campainha.)
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) – ... ao passar pelo procedimento. Ela era uma menina pequena, com um corpo pequeno, pelo que falam, e ela teve que parir um bebê morto. Pelo que eu entendi, na manhã inteira, pelas imagens que vocês me mostraram, o bebê é morto, e depois a mãe tem que parir um bebê morto.
Eu não pari, eu não gerei, e não gerei por causa de um estuprador. Eu não tive a honra de gerar um bebê, porque um estuprador me machucou na infância. Mas as mulheres que passam pelo parto falam que não é fácil parir um bebê vivo, que ajuda no parto, ele faz força e sai.
Imaginem uma menina de dez anos que passou por um parto normal de um bebê morto. Essa menina não sofreu? Vocês vêm me dizer que teve romantismo em torno disso? Não! Direito de a menina sofrer?
Aquele bebê era viável, tanto que...
(Soa a campainha.)
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar Aliança/REPUBLICANOS - DF) – ... os médicos do Espírito Santo não quiseram fazer com medo de a menina morrer no ato.
Eu só lamento que mentiras estejam sendo ditas, Senador, mas vamos abaixar os ânimos todo mundo. "Bora", gente! "Bora" abaixar os ânimos, "bora" acreditar que a ciência evoluiu, que esses bebês podem sobreviver.
E eu quero lembrar as pessoas que estão nos assistindo agora de que, depois de um procedimento, depois de um abortamento, o que se faz com o material? Ele é sepultado, ele vai para lata de lixo, ele vai para pesquisa, ele vai para laboratório? A mulher que passa pelo aborto de uma criança de 25 ou 26 semanas sai com uma guia de sepultamento do hospital? Não é guia de sepultamento? Essa criança é sepultada ou não é? Tem tantas nuances em torno de tudo isso que as pessoas não querem falar.
E este projeto mostrou para o Brasil: "Olha, gente, não tem alegria nisso. Tem sangue, tem dor, tem violência para a mulher e para a criança". Não tem romantismo no aborto, nenhum romantismo!
O Conselho Federal de Medicina está pensando na mulher, eu sou defensora das mulheres, e vocês me assustaram quando me disseram tudo isso que acontece em uma assistolia. Eu estou assustada. Eu vim aqui hoje para ouvi-los, estive com vocês lá durante a discussão, torcendo para que vocês tomassem a melhor decisão, mas as imagens mostradas aqui, hoje, são uma oportunidade de o Brasil parar a briga. Parem de lacração nas redes sociais!
E eu quero lembrar também que não são só crianças negras que são abortadas, crianças brancas também são abortadas. Um desenho animado está rolando por aí, Senador, de uma menina negra na rua que é estuprada, tem um bebê para a polícia matar depois, e a bancada da Bíblia bate palma. Gente, ai do Brasil se não fossem as religiões cuidando de tantas pessoas nesta nação! Eles colocam a bancada da Bíblia batendo palma pela morte de um menininho, um filho do estupro. E é tudo negro, inclusive chamando a atenção: "Olha, se for negro, pode abortar". Não! Isso é muito grave!
A gente sabe que, nos Estados Unidos, pode-se patrocinar o aborto, e tem clínicas clandestinas para as quais as pessoas ligam e falam: "Olha, eu quero ajudar uma mulher pobre a fazer o aborto"; clínicas legalizadas, na verdade. E você pode ajudar uma mulher pobre a fazer, mas tem gente que liga e fala: "Mas eu quero ajudar uma mulher negra a fazer o aborto". Eugenia? Isso acontece nos Estados Unidos, a gente sabe disso. Vamos ficar atentos a tudo que está em torno de todo esse debate: eugenia, controle populacional. Vamos ficar atentos! As crianças precisam ser protegidas e o estuprador precisa ficar na cadeia.
Senador, eu encerro estas minhas palavras parabenizando-o pela coragem de fazer o debate. Foi um debate de alto nível, os nossos palestrantes aqui foram incríveis com as suas falas, com os seus eslaides, com o trabalho que trouxeram. Eles nos provocaram, nos incomodaram, arrancaram lágrimas da gente com as imagens, arrancaram lágrimas, mas a gente precisava deste momento.
Aqui, no Senado, senhores, o debate é em outro nível. Nós somos, por lei, mais velhos; nós somos por lei... Nós ficamos mais tempo, aqui no Senado. Nós vamos conduzir o debate aqui, no Senado, com muita serenidade. Eu só lamento que, enquanto a gente tem serenidade, a liminar do Alexandre de Moraes está valendo e crianças estão morrendo sem serenidade. Mas a gente vai continuar este debate aqui na Casa, olhando nos olhos dos Senadores e falando: "Senadores, é possível essa criança sobreviver". E a gente vai continuar este debate aqui dizendo que lugar de estuprador é na cadeia.
Senador Girão, parabéns! Conselho Federal de Medicina, que Deus abençoe a cada médico! E eu sei que essa confusão toda, inclusive, provocou em alguns médicos, que estavam aliados, a vontade de sair da luta. Não saiam da luta; não desistam dessa luta! Colocaram a população contra o Conselho Federal de Medicina, sem ouvir o Conselho Federal de Medicina. Que Deus abençoe vocês!
Nós vamos continuar o debate aqui na Casa; nós vamos continuar a luta aqui pelas duas vidas: a da mãe e a da criança; e nós vamos continuar a nossa luta pelo fim do abuso sexual no Brasil, pelo fim da pedofilia, pelo fim do estupro.
Que Deus abençoe os nossos médicos do Brasil e parabéns pela coragem de mostrarem para o Brasil que não há nisso nenhum romantismo! Vocês abriram uma cortina, sim, e o Brasil está entendendo que é grave o que acontece dentro de um consultório, dentro de uma clínica, dentro do hospital quando a mulher passa pela assistolia. E o debate aqui, hoje, não é aquele projeto; é o procedimento. Que fique bem claro aqui: nós viemos debater o procedimento, e nós entendemos que o procedimento é muito ruim.
O Conselho Federal de Veterinária tomou a decisão e ninguém questionou; o Conselho Federal de Medicina tomou uma decisão e estão questionando. Essa é a minha dúvida: por que vocês não podem tomar uma decisão e o de veterinária pode tomar uma decisão?
Obrigada, doutores, por terem vindo esclarecer. Nós vamos mandar, como o Senador Girão falou, o discurso do Presidente do CFM, com toda a justificativa do motivo da resolução, para cada Senador que não pôde estar aqui hoje ler, e o debate aqui vai continuar.
Mas eu peço ao Brasil: vamos diminuir os ânimos, vamos parar de brigar. Mesmo as pessoas que defendem o aborto, vamos parar de brigar agora e vamos entender: nós vamos continuar com a assistolia no Brasil ou não? Esse é o melhor caminho? Eu entendi, hoje, que não é o caminho. Nunca poderá ser esse o caminho. Esse procedimento tem que ser banido.
Parabéns, médicos! Que Deus abençoe vocês! (Palmas.)