Discurso durante a 185ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Insatisfação com a proposta de ajuste fiscal apresentada pelo Governo Federal que, supostamente, penaliza a política de valorização do salário mínimo e os cidadãos que recebem o benefício de prestação continuada (BPC) e expectativa quanto às alterações que serão promovidas na Câmara dos Deputados para sanar esse problema.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Assistência Social, Finanças Públicas, Idosos, Pessoas com Deficiência, Remuneração:
  • Insatisfação com a proposta de ajuste fiscal apresentada pelo Governo Federal que, supostamente, penaliza a política de valorização do salário mínimo e os cidadãos que recebem o benefício de prestação continuada (BPC) e expectativa quanto às alterações que serão promovidas na Câmara dos Deputados para sanar esse problema.
Publicação
Publicação no DSF de 18/12/2024 - Página 36
Assuntos
Política Social > Proteção Social > Assistência Social
Economia e Desenvolvimento > Finanças Públicas
Política Social > Proteção Social > Idosos
Política Social > Proteção Social > Pessoas com Deficiência
Política Social > Trabalho e Emprego > Remuneração
Matérias referenciadas
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), PROPOSTA, AJUSTE FISCAL, PREJUIZO, VALORIZAÇÃO, SALARIO MINIMO, CRITERIOS, CONCESSÃO, BENEFICIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (BPC), ASSISTENCIA SOCIAL, PESSOA IDOSA, DEFICIENTE FISICO, DEFICIENTE MENTAL, SOLICITAÇÃO, ALTERAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Presidente Sergio Moro, Cleitinho, Plínio Valério, eu confesso que procuro a linha da verdade sempre, porque, quando a gente fala a verdade, não tem castigo, é a verdade simples e simples.

    Eu fiz um pronunciamento sobre o pacote fiscal. O pronunciamento está aqui pronto, mas tive uma reunião – por isso é que me atrasei – da bancada do meu partido com o representante do Ministério da Fazenda. E o que me falaram, vou adiantando aqui, depois vou ler aquilo que eu entendo possível da minha avaliação do pacote, o que me informaram é que vai haver mudanças na Câmara dos Deputados. Eu entendo que não poderia ser diferente e disse lá a minha opinião. Felizmente, a informação que temos, pelo menos em relação ao BPC, claro, porque o debate vamos fazer nós também aqui, é que vai haver mudanças para que não fique... Numa família, se tem uma pessoa com deficiência e um idoso e os dois ganham BPC, um dos dois seria cortado. Em tese é isso, o exemplo que estou dando, me disseram que isso foi resolvido.

    Então, primeiro, cumprimento os Deputados, que já mostraram que as coisas não podem chegar à Casa e ser carimbadas na íntegra como veio, seja qual for o Governo. Então, os Deputados, felizmente, já apontaram que o BPC, como está, não vai passar. Eu vou discorrer aqui na minha análise sobre esse tema.

    O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) – Mas a notícia é alvissareira, Senador.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – É muito positiva.

    O SR. PRESIDENTE (Sergio Moro. Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) – Porque o ajuste fiscal, corte de gastos é necessário, agora não em cima do deficiente e do idoso.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Da pessoa mais vulnerável, não é? Então essa mudança me parece que a Câmara está já encaminhando.

    Mas, Presidente, subo à tribuna ainda com uma profunda inquietação, que reflete o sentimento de milhões de brasileiros e brasileiras que têm, inclusive, se manifestado, nos últimos dias, demonstrando a sua indignação com a proposta de mudança, principalmente do benefício de prestação continuada (BPC). Já anunciei, pela informação que recebi, e já falei na tribuna duas vezes, que nós estamos no caminho certo se fizermos as mudanças adequadas. A reforma tributária, como eu disse, obteve, entre um momento e outro, a reforma tributária e a regulamentação, cerca de mil emendas. Por que não poderíamos ter nenhuma mudança no pacote da forma como chegou? Então a notícia é esta: a Câmara não aceitou como chegou o BPC e está propondo alterações.

    É claro que eu construí minha vida sempre preocupado com o social. Desde que eu era moleque lá, com meus quatro, cinco, seis anos de idade até hoje, sempre foi a preocupação social, porque eu sabia, numa família de dez irmãos em que só o pai ganhava o salário mínimo, que tínhamos que viver. Então plantávamos, pescávamos. Eu era pescador, com o anzolzinho lá, eu pegava muito peixe, que eu levava para casa e ajudava. Mas também mostrei a minha preocupação com a questão do salário mínimo. O salário mínimo é uma política que foi construída por todos nós, eu viajei o país todo. A inflação mais PIB foi um acordo que envolveu trabalhador, empresário e governantes, e por isso foi sancionada. Eu também apontei as minhas preocupações com mudança no Estatuto da Pessoa com Deficiência e no do Idoso. Garantiram-me que não vai haver mudança, como estava no projeto original, nem no Estatuto do Idoso, nem no estatuto da previdência.

    Mas, enfim, eu estou ainda, claro... Essa minha visão de que inflação mais PIB foi um caminho que nós construímos... E, quando eu cheguei ao Congresso, há quase 40 anos – 38 –, o salário mínimo valia US$60; depois que construímos essa política... Num primeiro momento, sem a política, fomos a US$100, no Governo Fernando Henrique – isso aí tem que ser dito. Ele atendeu uma demanda não só minha, mas de outros Parlamentares. Mas, depois que viajamos o país com as centrais sindicais, confederações, dialogamos com o Governo, com os empresários, conseguimos aprovar a política de inflação mais PIB, que eu sempre considerei um avanço. Se o PIB cresce, o país ficou mais rico. Qual é o problema de assegurar o que foi dado? Se foi 3% do PIB, é 3%. Se for 3% do PIB, cresce 3%. Se foi negativo o PIB, não cresce nada. Foi devido a isso que eu já tinha preparado este pronunciamento, e eu espero que a gente, até votar a matéria, faça outros ajustes.

    Ontem mesmo, ao expressar minhas preocupações nesta tribuna sobre este momento, recebi, e confesso, uma avalanche de mensagens de todo o país. E as perguntas são as mesmas: "Por que mexer no BPC e no salário mínimo, que são os mais vulneráveis, os mais pobrezinhos? Por que as contas do país sempre recaem para os ombros dos mais pobres?". Vivemos em um país onde os preços dos alimentos não param de subir. O custo de um medicamento está lá no céu, está nas alturas. Como fica o poder de compra das famílias? Os planos de saúde cancelaram unilateralmente os serviços, prejudicando autistas, idosos, portadores de doenças raras, pessoas com deficiência – uma situação desumana.

    A taxa de juros asfixia o crescimento econômico e penaliza o consumo. A projeção para março de 2025 – março agora – é de que a taxa de juros vai para 14,25%. E o que vemos? Bancos batendo o recorde de lucro, trimestre após trimestre, enquanto os pobres têm que escolher entre comprar comida e remédios. E, como disse, felizmente a Câmara está a mexer, está aí essa discussão do BPC, um benefício que atende idosos e pessoas com deficiência em situação de extrema pobreza. Repito: os Deputados deixaram claro que não aceitariam a mudança do BPC da forma como chegou lá à Câmara dos Deputados e tiveram reunião para encontrar caminhos.

    Digo mais, Sr. Presidente, uma ferramenta fundamental para a dignidade, direta e indiretamente, de mais de 80 milhões de trabalhadores aposentados e pensionistas é o salário mínimo. A pergunta que fica é: "Quem pode achar que essa solução de mexer na política de salário mínimo e no BPC iria resolver os problemas fiscais do país?". Por que não discutimos com a mesma intensidade a tributação de grandes fortunas? Por que não discutimos a questão dos altos salários? Por que não discutimos o combate efetivo à sonegação fiscal e a revisão de inserções fiscais bilionárias que beneficiam sempre os mais poderosos? Por que as sugestões da CPI da Previdência que eu presidi não são colocadas em prática? Cobrança dos devedores, assim chamados, contumazes; combate às fraudes, à sonegação; fortalecimento de órgãos de fiscalização e controle.

    A dívida acumulada da previdência, se voltarmos no tempo, vai a trilhões de reais. Devedores muitas vezes – eu estou aqui há 40 anos – negociam: "Ah, eu estou com uma dívida de tanto", negociam por mais 20 anos, não pagam esses 20 anos e, no fim, são anistiados e não pagam nada. O trabalhador é descontado em folha – é descontado em folha –, não tem alternativa. E muitas vezes aquele que desconta em folha é que não paga a sua parte, como eu disse aqui.

    A CPI comprovou que o sistema previdenciário público brasileiro é viável. Se houvesse um controle efetivo, com certeza não se estaria falando aqui de desvio de bilhões e até trilhões. O BPC e o salário mínimo não são meros números de uma planilha de ajuste fiscal; eles são uma garantia de sobrevivência para os mais vulneráveis, são instrumentos de justiça social em um país marcado pela desigualdade histórica. É verdade que o ajuste fiscal é necessário? Eu digo que é. É verdade, sim, mas não em cima dos mais pobres. É verdade também que ele não pode ser feito às custas daqueles que já não têm mais o que oferecer, que são os vulneráveis, os mais pobres, os assalariados, as pessoas com deficiência, os idosos, os aposentados, os pensionistas e os trabalhadores que dependem desse pequeno valor de R$1,4 mil.

    A verdade é que o Brasil precisa de ajustes nas contas públicas, mas é verdade também que esses ajustes não podem ser feitos às custas de quem já vive com o básico do básico. E o nome já diz: salário mínimo. Água potável, esgoto sanitário, moradia decente, saúde, educação, segurança; os pobres e vulneráveis não podem continuar pagando a conta. É preciso questionar as grandes fortunas, onde está a taxação tão falada em fóruns mundiais dos super-ricos? Por que não enfrentamos de forma responsável o debate dos altos salários? Ou alguém tem dúvida de que neste país muita gente ganha não R$50 mil, mas acima de R$50 mil; ganha R$100 mil, ganha R$200 mil, ganha até R$300 mil por mês? E por que não se envia a fundo, seja no Executivo, seja no Judiciário, seja no Legislativo, seja nas empresas estatais? E por que não enfrentar este debate? Há regras que permitem, enfim, que isso aconteça.

    Como fica a faixa de isenção do Imposto de Renda? Parece que o mercado ia morrer se quem ganha até cinco salários mínimos – cinco salários mínimos –, com os devidos descontos... E não são cinco salários mínimos; é até R$5 mil só. A proposta da faixa de isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$5 mil – não dá cinco salários mínimos – simplesmente desapareceu, o debate parece que não existe mais, e é um compromisso que nós todos tínhamos assumido.

    Sublinho com cores fortíssimas – e vou para o final, Sr. Presidente – que o Brasil não pode penalizar os pobres e os vulneráveis. A reforma tributária foi aprovada com um número recorde de emendas, que se não me engano chegou a mais de mil, entre a proposta da reforma tributária e a regulamentação, demonstrando a complexidade dos interesses que permearam esse debate. Repito, não sou contra debater pacote, ajuste fiscal, mas temos questões pontuais que precisam de um debate profundo, olhando para os que mais precisam.

    Sr. Presidente, a reforma trabalhista, eu me lembro, prometeu milhões de empregos, e não foi gerado nenhum emprego na época. Sempre quem paga a conta no final é o trabalhador, é o assalariado, é o aposentado, é a pessoa com deficiência, são os mais vulneráveis, é o cidadão comum, que não tem força para fazer lobby aqui. Quem ganha um salário mínimo vai vir para cá fazer lobby? Se for deficiente, pior ainda. A corda sempre arrebenta, infelizmente, do lado mais fraco.

    Convido a todos a uma reflexão. Precisamos rever as prioridades. O bem viver, o bem-estar da nossa população tem que ser prioridade.

    A nossa gente tem o direito de ser feliz. Precisamos, acima de tudo, ouvir o clamor que vem das ruas, do campo e da cidade, das comunidades, das periferias. O povo não aceita mais uma vez ser chamado para pagar a conta.

    O Brasil é um país rico, que está entre a oitava e a sétima economias do mundo, e por que a riqueza está tão concentrada nas mãos de poucos? Há quem diga que é 1%.

    Enfim, rico cada vez mais rico e pobre cada vez mais pobre. Essa é a verdade que precisamos encarar e discutir!

    E isso começa, senhores e senhoras, com muito equilíbrio, mas com muita coragem de enfrentar esse debate, para que a gente descubra efetivamente onde estão os privilégios. Milhões de brasileiros e brasileiras do presente e do futuro dependem das nossas decisões.

    Portanto, o BPC e o salário mínimo são um debate, sim, urgente para a dignidade...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... social do povo brasileiro.

    Explico.

    Fui informado hoje, em torno das 13h, que, numa reunião na Câmara dos Deputados, entre representantes do Ministério da Fazenda e da Câmara dos Deputados, se chegou a um entendimento de que o BPC não ficará como está e que as mudanças são para diminuir o prejuízo daqueles que dependem do BPC.

    Parabéns à Câmara dos Deputados, que mais uma vez se adianta e diz: "Não, assim não dá; assim como veio, não dá".

    Eu espero que a gente também tenha espaço aqui no Senado, tenha espaço para dialogar, para conversar.

    Todo mundo sabe que eu sou do PT, sou da base do Governo. Agora, quanto a dialogar, conversar, construir caminhos que ajudem o povo brasileiro, eu entendo que estaríamos todos à disposição.

    Agora, não dá para dizer: "Olha, os mais vulneráveis é que vão pagar a conta, porque os outros acham que a riqueza deles, sem...".

    Quando falo em riqueza, estou falando em super-ricos, não estou falando das pessoas de classe média ou dos que sejam ricos. Estou falando aqui de super-ricos e de supersalários. Supersalários que, eu digo e afirmo, chegam a ser de até R$300 mil mensais.

    Era isso e obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/12/2024 - Página 36