Discurso durante a 115ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de Debates Temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei nº 3914, de 2020, que dispõe sobre pagamento de honorários periciais e sobre requisitos da petição inicial em litígios e medidas cautelares relativos a benefícios por incapacidade; e revoga dispositivo da Lei nº 8.620, de 5 de janeiro de 1993.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Processo Civil, Regime Geral de Previdência Social:
  • Sessão de Debates Temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei nº 3914, de 2020, que dispõe sobre pagamento de honorários periciais e sobre requisitos da petição inicial em litígios e medidas cautelares relativos a benefícios por incapacidade; e revoga dispositivo da Lei nº 8.620, de 5 de janeiro de 1993.
Publicação
Publicação no DSF de 21/09/2021 - Página 10
Assuntos
Jurídico > Processo > Processo Civil
Política Social > Previdência Social > Regime Geral de Previdência Social
Matérias referenciadas
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, DESTINAÇÃO, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI, PAGAMENTO, HONORARIOS, PERICIA MEDICA, TRABALHADOR, PETIÇÃO, LITIGIO, MEDIDA CAUTELAR, BENEFICIO PREVIDENCIARIO, INCAPACIDADE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), FAMILIA, BAIXA RENDA.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar.) – Presidente Paulo Rocha, meus cumprimentos. Agradeço muito a V. Exa., que se deslocou aí para presidir esta sessão, devido à eu estar em trabalho virtual somente, devido à idade e também à questão da diabetes e da pressão alta. Meus cumprimentos também ao Senador Luis Carlos Heinze, que concordou comigo quando nós fizemos esse movimento. Ele: "Não, Paim. Vamos fazer o debate sim". "Não está claro. Não está claro", eu dizia para ele. Eu disse: "O debate vai ser fundamental". Ele concordou e o Presidente da Casa também concordou, o Colégio de Líderes também concordou, para que não ficasse nenhuma dúvida.

    Mas quero agradecer aqui a todos convidados – todos, todos – já citados pelo Líder Paulo Rocha.

    Permitam que eu entre um pouco no projeto, rapidamente, colocando o meu ponto de vista.

    Enfim, como já foi dito, o Projeto de Lei 3.914 transfere para os segurados o ônus do pagamento dos custos das perícias médicas em ações contra o INSS, já a partir de janeiro do ano que vem, que está aí, praticamente daqui a três, quatro meses. Na realidade do dia a dia, essa medida afasta, inibe, eu chego a dizer que quase proíbe a gratuidade da Justiça para parcela significativa da população. Calcule: ele está desempregado e tem que pagar adiantado o perito. Nunca vi isso; estou com quase 40 anos de Parlamento, nunca vi isso que surge agora em plena pandemia! O projeto estabelece que o segurado precisa pertencer à família de baixa renda; restringe o conceito de baixa renda, para que as pessoas tenham que comprovar renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo ou renda familiar mensal de até três salários mínimos.

    É mais grave ainda: em razão do pente fino, Programa de Revisão dos Benefícios por Incapacidade adotado pelo INSS, a proposta fere a Constituição. A perícia médica essencial para o trabalhador produzir prova de incapacidade para o trabalho. Se ele entra com ação, é porque ele foi prejudicado. Só que ele não pode entrar se ele não puder pagar.

    Essas alterações – lembro aqui, eu vi aqui, na informalidade, a Dra. Magda falar –, essas alterações já constavam no Projeto de Lei de Conversão nº 17, oriundo da Medida Provisória 1.045, rejeitada por ampla, ampla maioria pelo Senado Federal! O Senado derrubou todo o projeto, e um dos motivos principais foi esse. A OAB se mexeu, muita gente se mexeu, lembro-me das centrais, da Magda, enfim, todo mundo se mexeu no Brasil todo, e um dos motivos foi esse. A MP limitava o acesso à Justiça gratuita, prejudicando aposentados, pensionistas, consumidores e trabalhadores; exigia que, nas ações previdenciárias, o beneficiário antecipasse os honorários dos peritos. E nada contra o perito; perito tem que ganhar um salário bom, sim; vai cobrar de quem tem que pagar, vai cobrar do Estado, e não do pobre trabalhador.

    E eu vou dar aqui alguns dados, sou obrigado a dar, aproveitando aqui a cobertura da TV Senado para todo o Brasil.

    O fantasma da MP 1.045 está rondando novamente a vida do povo brasileiro, mediante esse projeto que alguém, não sei de onde, apresentou e surgiu como um fantasma, porque ninguém falava dele. Quando derrubamos a 1.045, aparece, desculpe a expressão, esse projeto, que é – eu diria até, eu vou usar um termo leve – agressivo ao trabalhador. Numa crise como a que nós estamos vivendo: desemprego; custo de vida em alta; inflação já na casa dos dois dígitos, está ali coladinho; pobreza; miséria; fome; taxa de juros também subindo; gás, gasolina nem vou dizer o patamar em que se encontram, nunca visto; 62 milhões de brasileiros endividados no Serasa, é essa faixa que o projeto não contempla; 20 milhões de desempregados, somando desempregados e desalentados; metade da população, metade, metade implorando auxílio de emergência... Você sabe quanto que é o auxílio de emergência? Não chega a meio salário mínimo na melhor das hipóteses; e, na outra hipótese, é a metade da metade da metade. Uma crise sanitária das mais cruéis. Num momento desse, em que estamos chorando praticamente 600 mil mortes, vamos querer que essa gente ainda pague o perito?

    Eu não acredito, em sã consciência, que esse projeto seja para valer. Eu acho que é mais para marcar a posição para o debate. Acabar com o direito dos trabalhadores é muito cruel – é muito cruel. É um projeto que está fora da curva, fora da realidade do nosso País. Eu chego a dizer que tentativas como essa de atacar assim os direitos dos trabalhadores é buscar e querer implantar a escravidão moderna. É escravidão moderna: se tem direito, não pode receber, porque não pode entrar com ação – nesse caso específico.

    Ora, é mais um ataque também à previdência pública. Lembro que tentaram aprovar a capitalização. Para quem está nos ouvindo, capitalização é "adeus, previdência": tu vais ter direito a uma poupançazinha individual. Não há poupança, não há previdência. A capitalização felizmente já a Câmara derrubou. Tentaram depois no Senado, mas não conseguiram. Aumentaram o tempo de idade mínima: 62, 65; 62 para a mulher, 65 para o homem. Eu vou só resumir aqui. Passaram a utilizar 100% das contribuições do segurado e não mais 80% das maiores contribuições. A idade mínima é exigida hoje até para aposentadoria especial, vejam só.

    Este cenário demonstra que tudo aquilo que falavam e falam também nesse projeto: "Não, vai gerar emprego, vai gerar renda, vai gerar não sei o quê"... Não gerou nada. O desemprego aumentou, estão aí os dados que eu dei. Quem puder falar depois diga que o desemprego não está na faixa de entorno de 15 milhões e, se pegar os desalentados, vai para 20 milhões. E diziam que ia aumentar 10 milhões de novos empregos. Não aumentou um emprego; aumentou o desemprego. Isso é o que nós estamos nesse momento debatendo.

    Esse PL 3.914 é uma tentativa de dificultar o acesso aos benefícios previdenciários. Por exemplo, se um trabalhador sofrer um acidente qualquer e precisar pedir o auxílio a doença, quem vai pagar o perito se for negado num primeiro momento, inclusive? Quem vai pagar? Ele fica no limbo, como a gente fala. Ele não tem nem o emprego – vocês sabem disso e eu sei também –, ele não tem nem o emprego, nem o benefício, porque a empresa diz: "Assim, aqui, tu não trabalhas". O médico da empresa diz isso. É comum isso. E não há perito também. Como ele fica? Sem salário, não pode pagar o perito, e sem o emprego. A situação é muito triste.

    Como é hoje? Só para situar quem está nos assistindo. Hoje o juiz analisa caso a caso. Se a pessoa comprovar que não tem condição de pagar o custo do processo, ele defere a gratuidade. Se esse projeto for aprovado, ainda que a pessoa não tenha condição de pagar pela perícia, pelos novos critérios, nem o juiz poderá conceder a gratuidade, se ele não for enquadrado naquelas faixas que os autores desse projeto estão colocando. Ali diz que poderá, sim, desde que não seja enquadrado nas faixas ali apresentadas.

    Enfim, para terminar, apresentei uma emenda substitutiva, global, para assegurar que o Poder Executivo pague a perícia no processo judicial, e nos casos de acidente de trabalho sejam isentos das custas processuais e honorários.

    Apresentei também o pedido para que esse projeto tramite nas Comissões – que ele não seja votado no Plenário sem ser apreciado em todas as Comissões.

    Esta sessão de hoje tem origem em requerimento que apresentei – uma dúzia. Estão aqui a Senadora Zenaide Maia, Paulo Rocha e tantos outros que apoiaram o requerimento.

    É necessário que os Senadores e as Senadoras, que a sociedade e a população entendam que esse projeto prejudica, e muito, os trabalhadores e as trabalhadoras do campo e da cidade.

    Reafirmo: o Governo está tentando resgatar, com essa medida provisória, o mesmo que tinha como objetivo a 1.045. O PL 3.914 é inaceitável! Se o Senado o aprovar, estará cometendo um erro gravíssimo, gigantesco. Estará jogando, mais uma vez, nas costas do trabalhador e da trabalhadora um pagamento que não é de responsabilidade deles. Eles só pedem a perícia porque estão tendo negado o seu direito. Peço respeitosamente que V. Exas. reflitam sobre o projeto.

    Presidente Paulo Rocha, eu tenho aqui muitas perguntas – como as pessoas sabiam, eu tenho 20 perguntas –, mas eu quero fazer 3 que vêm muito do que eu li por tudo aqui e que mexem com o meu coração e que devem mexer com o coração de vocês – e aí vão as perguntas.

    Esse projeto, na minha avaliação, não tem nada a ver com a pandemia da covid-19, e nós tínhamos um acordo entre nós Senadores – para os convidados entenderem – de que nós só entraríamos com projeto neste sistema virtual quando estivesse ligado diretamente à pandemia. Indiretamente, bom, até a vida está, tudo está, não é? Mas esse projeto não tem razão nenhuma de ser votado no Plenário do Senado, neste momento, como se fosse uma questão de urgência urgentíssima. Deveria ser debatido nas Comissões. Eu tenho certeza de que vocês também vão concordar que esse projeto não tem nada a ver com pandemia.

    Segunda pergunta. É justo, mais uma vez, o trabalhador, num país com a maior concentração de renda do mundo, ser chamado a pagar a conta? Vejam bem! O nosso País é o país da maior concentração de renda do mundo, e os pobres são chamados a pagar a conta porque estão postulando um direito deles?

    E, ainda, como vocês veem a situação de um trabalhador que é proibido de entrar com uma ação porque dizem para ele: "Olha, você não pode pagar". Só quem pode pagar é que vai poder pleitear esse direito?

    Termino dizendo: eu sempre procuro me colocar no lugar do outro. Foi com esse olhar que pedimos esta sessão temática. Aí fica para a reflexão dos senhores: coloquem-se no lugar do trabalhador – coloquem-se no lugar do trabalhador! Esqueçam: eu não sou Senador, nenhum de vocês são o que conquistaram no longo da vida, e coloquem-se no lugar do trabalhador. Ele está olhando para nós. Queiramos ou não, nós o representamos aqui.

    Esse trabalhador desempregado, com fome, não vai poder pagar o perito, vai ter que renunciar antecipadamente ao direito. É desumano, é cruel, é um ataque às políticas humanitárias.

    Se eu tiver oportunidade, farei outras perguntas num outro momento.

    Muito obrigado pela tolerância, Líder Presidente Paulo Rocha.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/09/2021 - Página 10