Discurso durante a 98ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão Especial destinada a debater as causas do aumento dos casos de feminicídio e discutir soluções para enfrentar os problemas da violência doméstica e familiar contra a mulher e do feminicídio.

Apresentação do Projeto de Lei nº 3.671, que aumenta as penalidades para estupro, especialmente em transporte público, em casos de vulnerabilidade ou reincidência.

Autor
Augusta Brito (PT - Partido dos Trabalhadores/CE)
Nome completo: Augusta Brito de Paula
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Mulheres:
  • Sessão Especial destinada a debater as causas do aumento dos casos de feminicídio e discutir soluções para enfrentar os problemas da violência doméstica e familiar contra a mulher e do feminicídio.
Mulheres:
  • Apresentação do Projeto de Lei nº 3.671, que aumenta as penalidades para estupro, especialmente em transporte público, em casos de vulnerabilidade ou reincidência.
Publicação
Publicação no DSF de 27/08/2025 - Página 30
Assunto
Política Social > Proteção Social > Mulheres
Matérias referenciadas
Indexação
  • SESSÃO ESPECIAL, DEBATE, MOTIVO, AUMENTO, FEMINICIDIO, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, VIOLENCIA, GENERO.
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, DECRETO LEI FEDERAL, CODIGO PENAL, CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL, TIPICIDADE, CRIME, AUMENTO, PENA, FIXAÇÃO, CAUSA DE AUMENTO DE PENA, ESTUPRO, FRAUDE, IMPORTUNAÇÃO SEXUAL, ASSEDIO SEXUAL, ESTUPRO DE VULNERAVEL.

    A SRA. AUGUSTA BRITO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE. Para discursar.) – Bom dia a todas, bom dia a todos que aqui estão.

    Quero primeiro cumprimentar a nossa Presidenta, nossa Senadora Leila, parabenizá-la pela iniciativa; nossa Líder, Senadora Dorinha, pelo trabalho que vem fazendo; todas as Senadoras e os Senadores aqui presentes, todos os convidados e convidadas, as convidadas com quem aqui já nos encontramos algumas vezes.

    Eu quero dizer da importância deste momento, dessa discussão em que cada um que aqui vem falar dá realmente sua contribuição da importância e o significado disso. A cada número que aqui se fala, a cada proposição e proposta que é dita e discutida aqui que nós Senadoras, com certeza, consideramos e podemos tanto transformar em projeto de lei como podemos também mudar as leis já existentes, como essa lei maravilhosa que é a Lei Maria da Penha... Mas o que é mais difícil não é mudar a lei, apesar de ter a dificuldade de mudança de lei também; o mais difícil é a gente mudar a cultura machista que existe no nosso país e no mundo. O mais difícil é, verdadeiramente, a gente fazer com que as pessoas se respeitem de forma igual, que parem de competir e que não exista briga de sexo.

    E essa competição com a gente é muito forte, porque, a todo momento, a todo instante, nos é dito que os espaços de decisão e poder não são nossos. E a todo momento, a todo instante, nós estamos lá, como essas guerreiras Senadoras que aqui estão e essas mulheres que aqui estão também, provando que esses espaços são, sim, nossos e que podem ser ocupados. E, quando são ocupados, elas fazem verdadeiramente a diferença na vida de tantas outras – e não digo só mulheres – e de tantos outros também.

    Eu disse que ia falar pouco, eu me empolgo, mas eu trouxe aqui... Eu acho que é uma missão eu trazer. É um projeto que nós apresentamos, e esse projeto – a maioria dos projetos que a gente apresenta aqui; não estou falando só por mim, aqui eu estou até tendo a liberdade de falar pelas minhas amigas Senadoras – vem da necessidade realmente da existência do projeto. Do mesmo jeito que foi necessidade de se criar a Lei Maria da Penha, então há outros projetos que vêm aí para garantir o aumento de penalidades, para realmente ver se a gente consegue dar uma segurança, que é nosso dever e nossa obrigação para com todos e todas.

    E aí nessa... Infelizmente – infelizmente também, porque a gente está aqui –, nós temos um caso específico lá no Ceará que é só um exemplo de tantos outros que aconteceram. Foi neste ano de 2025. Eu vou falar, porque a vítima está fazendo, do que ela sofreu, uma luta, e ela quer que se dê o nome dela, ela quer que se diga o nome dela. Então ela autoriza que a gente fale o que ela passou.

    Então é um PL em que eu dei entrada aqui, o de nº 3.671, que fala sobre a questão de aumentar as penalidades na questão de estupro. E aqui eu não vou nem me ater a ler a minha fala para não ficar tão comprida. Só para a gente ter ideia, no ano de 2024, foram 87.545 casos de estupro no nosso país, praticamente mais de 230 por dia, estupro de vulneráveis, né? Olha aí como isso representa mais do que um estádio de futebol lotado, e ainda fica mulher fora, ainda fica gente fora! Como isso é grave!

    Por que eu estou falando aqui do caso de estupro? Porque esse caso de estupro do Estado do Ceará aconteceu com uma mulher de nome Renata, que pegou um transporte de aplicativo e, de forma muito cruel, foi levada para outro local e foi violentada de todas as formas. E aí o agressor foi pego em flagrante, fez seu depoimento e, cinco dias depois, ele estava solto. Então ela ficou revoltada, porque a Justiça o soltou, mas a Justiça o soltou porque tinha os precedentes que a lei dava para que se soltasse: era réu primário, etc., etc. Acho que aqui tem muitas juristas, vão saber mais do que eu. E aí ela começou, a partir daí, a fazer uma luta.

    Eu vi aqui, nesta tribuna, várias solidariedades, várias falas, redes sociais, e a minha preocupação de ocupar o Senado Federal, de estar aqui, era assim: o que efetivamente eu vou fazer para mudar, mais do que só ficar falando e dando minha solidariedade ou o meu ombro? Porque é tão fácil a gente receber o ombro quando a gente está na pior. Difícil é a gente ter o reconhecimento quando a gente está na melhor. Infelizmente ainda é assim.

    Então, eu fiquei pensando no que nós vamos fazer efetivamente para que tantas outras Renatas – que nesse caso aqui se indignou pela penalidade, por a pessoa já estar solta, o criminoso, com cinco dias – não passem pela mesma coisa: tanto por ele, com a capacidade de fazer com outras; como por ela, com a indignação de ter sido violentada, de ter uma marca para a sua vida inteira e a penalidade ter sido mínima.

    E aí a gente foi discutir dentro do Estado do Ceará, e nós tivemos aqui participações tanto da nossa assessoria, porque na mesma hora eu fiquei revoltada, eu queria tirar todas as... Como a gente fala? Estão aqui as nossas juristas, que são advogadas. Todas as atenuantes. Eu queria tirar todas no caso de estupro. Aí disseram: "Calma, não pode ser assim. Vamos pensar melhor". Aí eu comecei a me unir com a OAB lá do Estado do Ceará, com professores de universidade também, com as nossas assessoras, advogadas do nosso gabinete – para eu não ser injusta eu quero dizer aqui... – e com a Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica, professores e um professor também de Processo Penal, para que a gente pudesse fazer uma proposta validada legalmente, a que a gente fez aqui no Senado Federal.

    Então, a gente já deu entrada a esse projeto, ele está tramitando dentro do Senado e vem para aumentar o rigor punitivo dessa lei, que trata sobre a questão, especialmente também, dos estupros, e para fechar qualquer tipo de brecha, para que a gente não tenha essas injustiças de ter um agressor que confessou o crime e foi pego em flagrante liberado com cinco dias.

    E esse projeto prevê penas mais duras nesses crimes cometidos em transporte público ou por aplicativo. E também, dependendo da vulnerabilidade – se ela estiver inconsciente, ameaçada ou dependendo de alguma coisa que realmente faça com que ela esteja em vulnerabilidade ainda maior –, que essa pena também seja aumentada. Essa proposta prevê que as penas podem ser aumentadas se o criminoso for reincidente, também nos casos contra crianças e adolescentes e no contexto de violência doméstica.

    Tem algumas condições que a gente botou aqui, porque, quando a gente apresenta o projeto, a gente tem todo um carinho também de acatar algumas propostas ou emendas de quem quiser também contribuir para a construção dele.

    E também não estamos falando só em punir, com maior rigor, nós estamos também falando do compromisso, porque nós temos que deixar claro que o corpo – o nosso corpo, o corpo das mulheres – tem que ser inviolável, que sua liberdade de ir e vir é sagrada e que qualquer violação terá resposta dura e inegociável.

    Só para se ter uma ideia, no ano de 1940, foi a edição do Código Penal brasileiro, e a expectativa de vida até lá era de 45 anos; agora aumentou para 75 anos. Então, significa que as mulheres estão ocupando mais as ruas, estão realmente mais expostas também, estão trabalhando, estão indo para a vida pública. Infelizmente, a penalidade ainda continua a mesma desde o ano de 1940, para justificar o aumento e a proposta do projeto também pela questão do tempo.

    Então, é um passo firme em defesa da dignidade de todas e de todos, especialmente das mulheres brasileiras. A proposta, como eu falei, não apenas pune com maior rigor os agressores, mas também reconhece com sensibilidade e coragem as circunstâncias reais que limitam a autonomia sexual da vítima.

    Há mais de 30 anos, Rita Lee já cantava. Eu não vou cantar, mas eu vou falar só o trecho. (Risos.)

    Graças a Deus não, né?

    "Toda mulher quer ser amada, toda mulher quer ser feliz."

    Eu me atrevo a completar ainda mais esse verso daquela rainha, da nossa rainha do rock...

(Soa a campainha.)

    A SRA. AUGUSTA BRITO (Bloco Parlamentar Pelo Brasil/PT - CE) – ... em nome de todas as vítimas e potenciais vítimas de violência sexual, de gênero: só seremos plenamente felizes quando pudermos andar sem medo e livres de todas as formas de violência. E ainda completo: de poder vestir a roupa que quiser, de poder ocupar o espaço que quiser sem ser julgada e muito menos violentada. Porque, há poucos dias, também eu soube de um caso, infelizmente, de uma mulher que foi estuprada ser questionada de que a culpa era dela. E aí a gente vê isso se repetindo sempre, e a gente não pode naturalizar de forma alguma.

    E ainda gostaria agora só de destacar que essa proposta foi construída, como eu disse, com essas mãos a quem eu já agradeço – Comissão da Mulher Advogada, lá do Estado do Ceará; Associação Brasileira das Mulheres de Carreiras Jurídicas também; professoras universitárias, como Ana Paula; Fábio Holanda; e a própria Renata, que acompanhou todo esse processo de várias reuniões, de discussões e que realmente está fazendo dessa dor uma bandeira para que outras não passem a mesma dor que ela passou e, além da dor, ainda a indignação com o tamanho da pena e com a liberdade do seu agressor.

    Para finalizar mesmo, eu me aproprio agora de mais alguns versos da nossa MPB, que é como um manifesto de resistência imortalizado por Milton Nascimento:

    Mas é preciso ter força, é preciso ter raça

    É preciso ter gana sempre

    Quem traz no corpo a marca, Maria, Maria

    Mistura a dor e a alegria

    Então, senhoras e senhores, Senadoras aqui presentes, imprensa, a Rádio, a TV Senado, todos e todas, nós somos Marias, nós somos Renatas. Vamos juntas, unidas, reunidas, fazer com que não só esse projeto seja aprovado como tantas outras propostas que nós temos aqui, dessas Senadoras maravilhosas, e Senadores também, mas, sobretudo, ouvindo sempre a todos e todas, e a sociedade como um todo.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/08/2025 - Página 30