Exposição de convidado durante a 95ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Exposição do convidado na Sessão de Debates Temáticos destinada à análise do Projeto de Lei nº 4.199, de 2020, que institui o Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem (BR do Mar).

Autor
DIOGO PILONI E SILVA
Casa
Senado Federal
Tipo
Exposição de convidado
Resumo por assunto
Transporte Hidroviário:
  • Exposição do convidado na Sessão de Debates Temáticos destinada à análise do Projeto de Lei nº 4.199, de 2020, que institui o Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem (BR do Mar).
Publicação
Publicação no DSF de 21/08/2021 - Página 52
Assunto
Infraestrutura > Viação e Transportes > Transporte Hidroviário
Matérias referenciadas
Indexação
  • EXPOSIÇÃO, CONVIDADO, SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, LEI FEDERAL, REGIME TRIBUTARIO, INCENTIVO, MODERNIZAÇÃO, AMPLIAÇÃO, INFRAESTRUTURA, PORTOS, PRORROGAÇÃO, PRAZO DETERMINADO, BENEFICIARIO, AQUISIÇÃO, IMPORTAÇÃO, CRIAÇÃO, PROGRAMA NACIONAL, FOMENTO, TRANSPORTE, NAVEGAÇÃO DE CABOTAGEM, DEFINIÇÃO, OBJETIVO, DIRETRIZ, REQUISITOS, HABILITAÇÃO, AFRETAMENTO, EMBARCAÇÃO, DIREITOS, DEVERES, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA INFRAESTRUTURA, TRANSFORMAÇÃO, CARGO EM COMISSÃO, DIREÇÃO, DESTINAÇÃO, AGENCIA NACIONAL DE TRANSPORTES AQUAVIARIOS (ANTAQ), REVOGAÇÃO, NORMAS, ADICIONAL AO FRETE PARA RENOVAÇÃO DA MARINHA MERCANTE (AFRMM), HIPOTESE, INCIDENCIA, BASE DE CALCULO, ALIQUOTA, ARRECADAÇÃO, DEPOSITO, GESTÃO, MOVIMENTAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, AMBITO, BANCO DO BRASIL, COMPETENCIA, SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, CRITERIOS, RESSARCIMENTO, VALORES, EMPRESA DE NAVEGAÇÃO, COBRANÇA JUDICIAL, EXECUÇÃO, DUPLICATA, ENTREGA, MERCADORIA, POSSIBILIDADE, COMPROVAÇÃO, DOCUMENTO ELETRONICO, ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA, DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DOS TRANSPORTES (DNIT), COMPOSIÇÃO, OBRIGATORIEDADE, VAGA, ESTAGIO, ALUNO, EGRESSO, ENSINO PROFISSIONALIZANTE, MARITIMO, AUTORIZAÇÃO, EMBARCAÇÃO ESTRANGEIRA, CONTRATAÇÃO, SEGURO MARITIMO, COBRANÇA, ISENÇÃO, ORIGEM, DESTINO, PORTO, REGIÃO NORDESTE.

    O SR. DIOGO PILONI E SILVA (Para exposição de convidado.) – Boa tarde a todas e todos.

    Primeiro teste aqui: os senhores e as senhoras me ouvem? (Pausa.)

    Eu estou aqui com a tela congelada. Suponho que estão ouvindo.

    Queria, primeiramente, cumprimentar o Senador Nelsinho Trad, que, com muita maestria, tem conduzido essa discussão no âmbito do Senado Federal. Um tema tecnicamente espinhoso – não é, Senador? –, complexo para o entendimento de quem não acompanha a navegação; no entanto, tem aí conseguido conduzir com muita sobriedade, com muito equilíbrio, essa discussão.

    Quero cumprimentar aqui também Dr. Eduardo Nery, Diretor-Geral da Antaq; o Almirante Cursino, representante aqui do DPC da Marinha; e, em nome deles, cumprimentar todos os presentes a esta audiência pública, da qual muito nos dá prazer participar, depois de uma discussão longa e importante para que a gente tivesse uma ideia madura do que vem a ser uma proposta que gere aí os impulsos para que a gente utilize a cabotagem no Brasil de forma mais intensa.

    Para que a gente tenha a ideia desse potencial, a gente pode traçar aqui alguns comparativos internacionais. Enquanto o Brasil ocupa a sua matriz logística com algo em torno de 9% com a cabotagem, considerando os demais modais de transporte, a China utiliza 31% da sua matriz com cabotagem; a União Europeia, 32% da sua matriz; o Japão, 44% da sua matriz com a cabotagem. Um país como o nosso, com a costa que tem, com a disponibilidade de vias navegáveis que tem, não pode se restringir, se limitar a uma participação tão tímida.

    A cabotagem é, claramente, uma alternativa logística que traz grandes vantagens para as nossas cadeias. Se a gente avalia o potencial do que a cabotagem pode trazer, do ponto de vista de redução de custos, nós temos estudos que indicam, estudos do Instituto Ilos, de 2018, que trazem que a cabotagem tem uma emissão de gases de efeito estufa quatro vezes menor do que as demais alternativas logísticas. A cabotagem, impulsionada pelo BR do Mar, tem condição de gerar uma redução de 10 mil acidentes por ano no Brasil e uma redução de custos de frete anual da ordem de R$1,7 bilhões.

    No montante total precificado, as vantagens ambientais, sociais e econômicas, nós estamos falando de um potencial de redução de algo em torno de R$3 bilhões de custos de frete, que vão ser implementados com uma nova política de incentivo.

    A construção da proposta parte desde o início da nossa gestão em 2019, mas a mudança do marco regulatório da cabotagem no Brasil não é uma discussão propriamente que começa em 2019. Uma enormidade de estudos já foi realizada com propostas de endereçamento dos problemas da cabotagem. O BR do Mar, então, e a gestão do Ministério da Infraestrutura, a partir de 2019, buscou, então, consolidar essas propostas e, de fato, implementá-las, a gente passar da mera discussão para a implementação.

    Para que nós pudéssemos apresentar essa proposta ao Congresso Nacional, nós realizamos inúmeras discussões, temos contabilizados algo em torno de 50 webnários, reuniões públicas, sem contar também as nossas reuniões internas, que foram incansáveis, conduzidas principalmente pelo nosso Diretor Dino Batista, que está aqui também representando o Ministério ao meu lado.

    Então, o que nós temos é uma proposta, de fato, madura, já testada e comprovada em diversos debates e discussões com todos os players afetados por essa grande política, que é a política de estímulo à cabotagem.

    Quando a gente se deparou com todos os diagnósticos que nós tínhamos sobre o problema, que é desenvolver ou potencializar a cabotagem, nós tínhamos duas teses bem conflitantes de como resolver o problema da cabotagem: uma tese muito voltada à liberação integral da cabotagem no País, e eu quero dizer isso, mencionando uma abertura total para que a cabotagem fosse realizada por embarcações afretadas, por um lado, e, por outro lado, uma visão mais protecionista, que vislumbrava que, no extremo, a cabotagem deveria ser prestada somente com embarcações próprias ou só com embarcações de bandeira brasileira.

    Nessa discussão, o Ministério da Infraestrutura optou por uma proposta que é equilibrada, que é ponderada e que, por um lado, busca, sim, a abertura; busca, sim, um cenário de maior competição no setor, com entrada ou com redução de barreiras de entrada para novos players ofertarem a cabotagem no País. Por outro lado, mantém alguns dispositivos que são importantes para que a gente tenha a formação de frota vinculada com o Brasil.

    Qual é o interesse com isso? É que a gente tenha condição de manter a prestação do serviço de cabotagem no Brasil com regularidade e com preços de frete, custos de frete regulares. A gente diz muito que a decisão pela utilização da cabotagem é uma decisão que custa muito tempo e muita reflexão por parte de quem utiliza essa alternativa. O que eu quero dizer com isso? Quem adere a uma solução por cabotagem faz muita conta, discute, às vezes, seis meses, um ano, antes de ingressar nessa alternativa.

    Agora suponho que tenhamos uma variação muito grande de custos de frete ou mesmo a indisponibilidade de embarcações para a prestação dos serviços, às vezes, meses depois de que é tomada uma decisão tão difícil. O nosso receio com isso – e, por isso, a gente traz na política ainda alguns estímulos para a composição de frota vinculada ao Brasil e não só afretamento, pura e simplesmente – é que a gente esteja à mercê das vulnerabilidades do mercado de frete internacional.

    O que eu quero dizer com isso? A cabotagem sem uma preocupação com a composição de frota nacional pode ficar à mercê de grupos de variação de frete. E aí cito aqui, como exemplo, em que nós estamos agora enfrentando momento de pandemia, um frete Santos-Xangai, para uma caixa de contêiner, que já foi outrora US$2 mil por unidade, nós estamos com o mercado hoje a US$12 mil por unidade. Então, imagine quem contrata um serviço de cabotagem e contrata hoje um valor de frete x; daqui a seis meses, esse valor de frete está a dois ou três x. O que vai acontecer é que essa carga voltará para a rodovia e a gente não vai ter um crescimento estável desse processo de potencialização da cabotagem no País.

    Então, essa é muito assim onde se posiciona a proposta do BR do Mar. O que a gente tem objetivamente? Eu acho que esse é o coração da proposta do Programa de Incentivo à Cabotagem: nós abrimos novas possibilidades de afretamento de embarcações. Isso já foi muito bem citado pelo nosso Relator, Senador Nelsinho, de modo que nós temos novas hipóteses de afretamento a tempo e a casco nu, sem qualquer necessidade de lastro em embarcação própria.

    Então, no afretamento a tempo nós temos: o afretamento a tempo em substituição de embarcação construída no Brasil em substituição de embarcação construída fora do Brasil; nós temos o afretamento a tempo em operações especiais, que são aquelas operações que vão cativar, que vão buscar novas linhas, novas cargas que hoje não são operadas ainda pela cabotagem. Então, se dá com a operação especial um waiver inicial para a prestação do serviço em que eu vou ter uma redução do custo na prestação do serviço, num primeiro momento, e, no prazo de 36 meses, a partir de um prazo de 36 meses, essa empresa que agora é uma nova entrante ou o serviço que é novo no mercado da cabotagem, ele volta a ter aí aplicação do regramento geral, que são as outras hipóteses de afretamento ou mesmo a construção ou a constituição de frota própria.

    Uma outra modalidade de afretamento a tempo, que também sendo inserida no programa BR do Mar, é o afretamento para contratos de longo prazo. Se, por um lado, há um receio de que a abertura total para o afretamento a tempo pode trazer essa vulnerabilidade da cabotagem ao mercado de frete internacional, como nós temos uma prestação de serviço via afretamento a tempo calcada em contrato de longo prazo, fica estabelecido aí um compromisso desse serviço com o mercado brasileiro, e, portanto, também está sendo trazida a proposta dessa modalidade de afretamento a tempo para contratos...

    Nós temos também, no projeto, a possibilidade dos afretamentos a casco nu, a partir de um prazo estabelecido na lei que está em discussão – inclusive, há emendas nesse sentido. Ficaria livre o afretamento a casco nu com esse prazo de transição. Portanto, é mais uma modalidade de afretamento sem lastro em embarcação própria, o que traz novamente abertura para que novos entrantes possam ingressar no mercado.

    Então, essas modalidades novas de afretamento, por um lado, trazem essa atração para novas empresas.

    Para que a gente mantenha o compromisso das empresas brasileiras de navegação com o serviço de cabotagem, com a constituição de frota, nós mantivemos uma alternativa de afretamento com base em lastro em embarcação própria, jogando, lançando isso para uma regulamentação via decreto. Mantém-se essa modalidade de afretamento, que é aquela que vai gerar o estímulo para que não só se afrete embarcação. Como eu tenho estímulo para afretar embarcações a custos menores, se eu tiver embarcação própria, acabo estimulando as empresas a contratarem frotas, seja na indústria naval brasileira, seja na indústria estrangeira. Então, eu diria que esse é o coração da proposta do BR do Mar.

    Se houver mais algum tempo, Relator, eu usaria aqui mais dois ou três minutos para falar sobre algumas medidas de incentivo também à indústria da construção naval, porque uma das críticas que, ao longo do processo, foram apresentadas é a de que, com a abertura dos afretamentos, estaríamos a nos esquecer da importância da indústria da construção naval brasileira, e nós fomos muito cautelosos em relação a isso. A gente tem um histórico, um mapeamento da política anterior da cabotagem, que era uma política que gerava uma vinculação da cabotagem à indústria naval brasileira. E, quando a gente avalia os números de entregas dos nossos estaleiros especificamente para a cabotagem, a gente vê que os números são muito tímidos. Só para exemplificar: de quase 700 embarcações que foram construídas nos últimos dez anos para os diversos segmentos de navegação – o apoio marítimo, o apoio portuário, a navegação interior e a cabotagem –, somente foram feitas sete encomendas de embarcações para cabotagem – desse universo de quase 700 –, das quais apenas quatro embarcações foram efetivamente entregues nesses últimos dez anos. Não podemos esquecer que, além dessas embarcações que apelidamos de cabotagem puro sangue, existem aquelas que prestam serviço no transporte de combustíveis, normalmente vinculadas à atividade da Petrobras, e aí foram mais 26. Mas, mesmo somadas – 26 mais 4 embarcações da cabotagem puro sangue –, estamos falando de um universo de 30 encomendas entregas num universo de quase 700 embarcações. Isso nos leva à seguinte conclusão: esse vínculo da cabotagem com a indústria da construção naval brasileira precisa ser reavaliado.

    Tivemos muito cuidado na política para não trazer também os outros segmentos em que a indústria naval é muito competente e que têm entregue muitas embarcações. Nós temos os exemplos dos nossos corredores no Norte do País, na hidrovia do Tapajós, na hidrovia de Tocantins, em que houve muita construção de barcaças. Então, nesse nicho, a ideia do BR do Mar é não atuar, é não modificar aquilo que já está funcionando.

    Mas essa preocupação também é mitigada à medida que a gente traz alguns mecanismos de estímulo à indústria naval brasileira, inclusive para a cabotagem, por exemplo, quando a gente permite, quando a gente abre a possibilidade de que empresas estrangeiras construam embarcações nos nossos estaleiros nacionais, então a gente abre um mercado novo, porque, até então, não era permitido; à medida que nós regulamentamos a EBN, que é a Empresa Brasileira de Navegação, que se prestará a construir embarcações ou a contratar embarcações para fretá-las a outros interessados, então, a gente abre um mercado novo, que já tem o interesse de muitas empresas. No entanto, não havia o arcabouço legal que desse segurança jurídica para desempenhar esses investimentos. E nós estamos falando de investimentos altos, de embarcações de R$20 mil, R$30 mil que precisam ser construídas.

    E também, vou concluindo aqui esta visão inicial sobre o BR do Mar, há o estímulo à flexibilização da utilização das contas vinculadas, que são irrigadas com os valores de AFRMM, que são pagos pelas empresas de navegação. Essa conta vinculada trazia algumas restrições para que esse recurso fosse utilizado para manutenção de embarcações, para docagem. E a gente abriu essa possibilidade, a gente flexibilizou o uso das contas vinculadas de modo a também estimular um outro nicho interessante de mercado para a indústria da construção naval, que é o nicho da manutenção, da docagem e que, diga-se de passagem, já agora, tem mobilizado alguns dos nossos grandes estaleiros, que enxergam nessa alternativa já um mercado muito relevante.

    Bom, em linhas gerais, concluo aqui dizendo que, depois dessa longa discussão importante que tivemos, ainda no Senado, há espaço. O Ministério está longe de ser aqui intransigente com as possibilidades, com as emendas que foram, de forma muito competente, apresentadas pelos nossos Senadores, de modo que o Relator, com toda a sua maestria, com toda a sua habilidade, tem transitado por meio dessas emendas. E o Ministério tem sido parceiro e deixa aqui seu compromisso em ser parceiro, para que a gente tenha as melhorias trazidas pelos Senadores, por meio das emendas, incorporadas, sem que a gente perca essa coerência do projeto, que, mais uma vez, concluo de vez, busca, sim, a abertura de mercado, busca um cenário de cabotagem com maior concorrência, com novos entrantes. Por outro lado, busca entender que a cabotagem, no Brasil e em diversos países, precisa ter uma certa blindagem dessa agressividade que o mercado de frete internacional acaba trazendo, com variações de custo muito grandes, que seriam, no nosso caso – esse é o nosso entendimento –, mortais para um serviço de cabotagem sendo prestado no longo prazo, com regularidade e com custos acessíveis, que, eu acho, é o grande objetivo.

    Muito obrigado, Senador, pela oportunidade.

    Estamos aqui à disposição sempre, aguardando a entrada do Ministro, que se deve incorporar à nossa reunião em breve.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/08/2021 - Página 52