Discurso proferido da Presidência durante a 42ª Sessão Especial, no Senado Federal

Sessão Especial destinada a comemorar o Dia do Trabalhador, a Abolição da Escravatura e o Dia do Trabalhador Rural.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso proferido da Presidência
Resumo por assunto
Data Comemorativa, Direitos Humanos e Minorias, Homenagem, Trabalho e Emprego:
  • Sessão Especial destinada a comemorar o Dia do Trabalhador, a Abolição da Escravatura e o Dia do Trabalhador Rural.
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/2022 - Página 9
Assuntos
Honorífico > Data Comemorativa
Política Social > Proteção Social > Direitos Humanos e Minorias
Honorífico > Homenagem
Política Social > Trabalho e Emprego
Matérias referenciadas
Indexação
  • SESSÃO ESPECIAL, COMEMORAÇÃO, DIA, TRABALHADOR, ABOLIÇÃO, ESCRAVATURA, TRABALHADOR RURAL.
  • CRITICA, REDUÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, PREOCUPAÇÃO, AUMENTO, DESEMPREGO, SALARIO, SINDICATO, NECESSIDADE, REFORMA, FISCALIZAÇÃO, TRABALHO, COMBATE, TRABALHO ESCRAVO, AGRESSÃO, RACISMO, HOMICIDIO, VITIMA, NEGRO, MULHER, APOIO, TRABALHADOR RURAL, AGRICULTURA FAMILIAR.

    O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Para discursar - Presidente.) - Neste momento, eu vou convidar os nossos painelistas que estão de modo presencial para que venham à mesa e, na sequência, nós vamos dando a palavra para aqueles que estarão no espaço virtual.

    Convido para a mesa o Sr. Romulo Machado e Silva, Subsecretário de Inspeção do Trabalho da Secretaria de Trabalho do Ministério do Trabalho e Previdência. (Palmas.)

    Segundo informação que nos chegou, ele teve um problema de deslocamento. Ele vai entrar, mas vai entrar virtualmente. O.k.?

    Convidamos agora a Sra. Mariel Angeli Lopes, Supervisora do Escritório Regional do Distrito Federal do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Ela também vai entrar online.

    Só estou seguindo a sequência aqui.

    Presencial.

    Chamo agora a Sra. Maria Rosângela Lopes, Secretária para Assuntos Raciais e Combate à Discriminação da Força Sindical, Secretária de Relações Públicas da Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM). (Palmas.)

    Seja bem-vinda. (Pausa.)

    Nós temos algum outro convidado presencial, que eu vou direto aqui.

    Sr. Paulo Douglas Almeida de Moraes, Procurador do Trabalho e representante do Procurador-Geral do Trabalho Sr. José de Lima Ramos Pereira. (Palmas.)

    Seja bem-vindo.

    E, também presencial, Sr. Luiz Antonio Colussi, Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). (Palmas.)

    Sr. José Gilberto, representando a nossa querida Cobap.

    José Gilberto Gomes dos Santos, Presidente da Confederação Brasileira de Aposentados, Pensionistas e Idosos (Cobap). (Palmas.)

    Seja bem-vindo.

    Sejam todos bem-vindos aqui, ouviu? Vamos dividir aqui o trabalho juntos.

    Meu amigo da Cobap...

    Neste momento, eu falo em nome da Presidência da Casa, com este pronunciamento de abertura.

    Bom dia a todos e todas.

    Como eu disse na abertura, maio, mês das mães, da deusa da fertilidade, dos solfejos. Uma antiga tradição francesa diz que, neste mês, era costume plantar árvore de maio em celebração de alguém; fazer reflexão sobre o mundo, a coletividade, os fatos e a realidade; buscar novos caminhos.

    Temos datas simbólicas no mês de maio, como o Dia das Mães, como já falei; 1º de maio, Dia do Trabalhador e da Trabalhadora; 13 de maio, a Lei Áurea; 25 de maio, Dia do Trabalhador Rural. São três datas que nos unem aqui, hoje, nesta manhã, nesta sessão especial, em conexo triângulo de visões.

    Tivemos, em recente passado, aqui, no Brasil, uma reforma trabalhista. Muitas ilusões foram vendidas. Prometeram gerar até 10 milhões de novas vagas de trabalho, mas não aconteceu. Nós falamos aqui, desta tribuna, quase diariamente, sobre essa questão e as nossas preocupações com o aumento do desemprego. O interesse, infelizmente, foi mais o de tirar direitos dos trabalhadores: aumentou a carga horária, reduziu salários, enfraqueceu contrato de trabalho, e os sindicatos foram enfraquecidos. Tivemos ainda o trabalho intermitente. O trabalho informal aumentou.

    A atual crise atingiu por demais a classe trabalhadora: perda de renda, menos dinheiro no bolso, inflação, aumento do custo de vida, uberização, trabalho escravo, acidentes e doenças no trabalho. O Anuário Estatístico do INSS de 2020 registrou mais de 500 mil acidentes de trabalho. Contra esses números lamentáveis, de guerra, o único caminho que nós recomendamos - e fizemos até uma sessão de debates neste Plenário - é a prevenção. A prevenção é o melhor caminho.

    São 20 milhões que temos hoje entre desempregados, desalentados e com força de trabalho subutilizada.

    A política nacional de valorização do salário mínimo, inflação mais PIB, infelizmente, foi extinta. O salário mínimo chegou a valer US$350; hoje vale em torno de US$250.

    O trabalhador e a trabalhadora não têm tido motivos para festejar este dia. Temos que repensar a reforma trabalhista e pensar as novas profissões, a regulamentação do trabalho à distância. Em debate aqui, na Casa - e eu sou o Relator -, nós temos o novo Estatuto do Trabalho, que está tramitando no Senado e que pode ser uma alternativa para toda essa complexidade.

    É inaceitável que haja diferença salarial, por exemplo, marcante entre homens e mulheres para a mesma função. Há o PL 130, que, aprovado na Câmara, veio para o Senado e de que fui Relator; aprovamos, mas acharam uma forma inédita e mandaram de volta para Câmara, que até hoje não votou. Infelizmente, entre o salário do homem e o da mulher, chega a ter uma diferença de 50%.

    No caso do salário da mulher negra em relação ao do homem branco, a diferença pode chegar a 70%.

    É fundamental também o fortalecimento da estrutura da fiscalização do trabalho, é só lembrar o trabalho escravo no Brasil. Há poucos dias, a doméstica Madalena Santiago da Silva, negra, foi resgatada de um trabalho análogo à escravidão na Região Metropolitana de Salvador; ela trabalhou 54 anos sem receber salários. Não houve quem não tenha se emocionado. Eu mesmo, confesso, porque dizem que homem não chora, mas algumas lágrimas rolaram e não só dos meus olhos; tenho certeza de que nos de muitos brasileiros, porque ela - me lembro aqui - chorou ao tocar na mão de uma repórter, que era branca, da TV Bahia, muito querida ela, a Adriana Oliveira, que também foi às lágrimas, e isso aconteceu durante a gravação.

    Emocionada, a doméstica desabafou sobre as agressões que sofria. A doméstica chegou a perguntar se ela podia tocar numa mão branca, em outras palavras. E ela disse - agora, aqui, palavras da doméstica -; a filha desse casal disse para a doméstica e assim a doméstica contou: "Sua nega desgraçada, vai embora!", fecho aspas, assim disse que ela ouviu da filha dos seus patrões.

    Vamos, nesse momento, muito mais do que eu falar aqui, tomado um pouquinho com a emoção, o que é natural de todos nós, vamos passar o vídeo aqui. Aí eu abro um espaço para terminar meu pronunciamento. Nesse momento, eu quero passar o vídeo - desde já agradeço à Rede Globo da Bahia, que nos autorizou a transmiti-lo. Então, nesse momento, se possível, eu peço que passem o vídeo.

(Procede-se à exibição de vídeo.) (Pausa.)

    O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) - Acho que o silêncio, o silêncio de todos nós diz tudo, não é? Eu vi que o Plenário não sabia o que fazer e nem eu: se batia palma pela grandeza da reportagem... Mas não tinha como bater palma mediante a tristeza de tudo que nós vimos.

    Só vou dizer obrigado à Rede Bahia, que nos autorizou a transmissão! Obrigado, Adriana, pela sua sensibilidade! E obrigado, obrigado, obrigado, Madalena! Você foi transparente e disse aquilo que lhe ensinaram, que o racismo estrutural lhe ensinou. E você Madalena mostrou ao Brasil, com a Adriana junto, que tudo pode ser diferente.

    Mas não adianta: por mais que eu fale aqui, as imagens dizem tudo.

    Eu continuo com o meu pronunciamento.

    Como vemos, os desafios são enormes no nosso país. É preciso que a gente una todas forças progressistas, populares e humanitárias para mudar este país, para combater o racismo estrutural e o trabalho escravo, que está aí - está aí! Não haverá desenvolvimento econômico no Brasil sem adoção de políticas efetivas de geração de emprego e de renda. Não haverá democracia plena enquanto existir racismo. A recuperação do poder aquisitivo é pressuposto para que a economia volte a girar no ritmo de que o país precisa. Que a gente não tenha mais que fazer uma sessão como esta, comparando o salário de negros e brancos. Que não tenhamos mais que passar reportagens como essa.

    Mas, enfim, vamos em frente.

    Há 134 anos o povo negro era - entre aspas -, eu repito aqui, "libertado". Sofre até hoje uma abolição não concluída. Onde estão os direitos e as garantias de cidadania, saúde, educação, emprego, renda, segurança, moradia?

    Entre os 10% mais pobres da população brasileira, negros e pardos representam 78%. O racismo é estrutural na sociedade brasileira. Temos que enfrentar essa situação e combatê-la, nós, negros e negras, brancos e brancas.

    O Congresso tem a sua responsabilidade. O Senado aprovou o PL 5.231, de 2020, que trata da abordagem policial, uma demanda do movimento negro Coalizão Negra por Direitos - eu fui o autor, e o Senador Contarato foi o Relator. A Câmara tem que aprovar; está lá um bom tempo já e ainda não votou. Da mesma forma, o PL 4.373, que tipifica como crime de racismo a injúria racial, porque neste país qualquer tipo de crime de racismo é dito como injúria. Nós aprovamos aqui o projeto, de nossa autoria, mas infelizmente a Câmara também não votou. Nessa mesma linha, mais de dez projetos que aqui apresentamos e aprovamos, com o apoio de Senadores e Senadoras, a Câmara também não deliberou e não aprovou.

    Enfim, por que a Câmara dos Deputados não vota? Isso merece uma reflexão. Por que o Senado aprova dez projetos de combate ao racismo nesses últimos dois anos e a Câmara não delibera?

    Vamos em frente.

    Neste país torturam crianças negras. Jovens, mulheres, homens morrem assassinados por serem negros. São inúmeros relatos de violações dos direitos humanos perpetrados contra a população negra, contra os quilombolas do campo e da cidade. A chance de um homem negro morrer vítima de homicídio é oito vezes maior do que a de um homem branco. A situação ainda é pior, a que é vivida pelas mulheres negras, que sofrem a dupla discriminação: por ser mulher e por ser negra.

    Treze milhões de pessoas negras que estavam empregadas antes da pandemia não conseguiram voltar ao trabalho. Entre as mulheres, as trabalhadoras negras foram demitidas em maior número, durante a crise da pandemia. Elas não conseguiram nova colocação. O número de desempregados e desempregadas negras saltou de 4,4 para 7,3 milhões - dados do IBGE. O salário da mulher negra é, em média, menos da metade do salário dos homens brancos. Os menores salários pagos no Brasil são aos negros. Infelizmente, os não negros ganham, em média, mais de R$1,2 mil por mês do que os negros. O povo negro não está em cargo de chefia, não está na linha de ponta da política, no Congresso, no Judiciário e no Executivo. É só lembrar o número de Senadores negros que vocês vão encontrar e o número de Deputados Federais negros. Não é diferente nas prefeituras, nas Câmaras de Vereadores e naturalmente também entre os Governadores.

    Enfim, 13 de maio, o momento para exaltar a resistência e denunciar, como estamos fazendo aqui, a desigualdade em um país que não conseguiu vencer as marcas da escravidão. Com o racismo e a discriminação não existe democracia, não existe bem-estar social e justiça. Somente com uma abolição que seja concluída que nós poderemos de fato nos transformar - por que não dizer? - num país de primeiro mundo.

    Vamos em frente. Vou agora falar, nesta última parte, sobre o trabalhador rural.

    Em 2017, estive na casa de uma agricultora familiar, Sra. Juliane Schneider, em Selback, no Rio Grande do Sul. Lá eu pude conferir, de perto, a vida de quem trabalha com a terra, de quem adormece com as estrelas e acorda antes de o sol nascer. Existe um dito popular que fala que, pelo menos uma vez na vida, você já precisou de um médico ou de um advogado para... Mas lembre-se de que pelo menos três vezes ao dia você precisa de um agricultor, porque é ele quem produz o alimento. Nossa gratidão a quem produz alimentos, aos trabalhadores e às trabalhadoras do campo, sejam brancos, sejam negros, sejam quilombolas, sejam indígenas, sejam refugiados, sejam imigrantes que chegam a trabalhar mais 12 horas por dia, sete dias por semana e não possuem décimo terceiro nem férias.

    Eu estive, nessa experiência, na casa de uma pequena propriedade, e o que me disseram lá? "Para nós, não tem Natal, a gente sempre trabalha no dia de Natal". No primeiro dia do ano, eles têm que trabalhar, porque têm que tirar o leite da vaca, por exemplo; têm que alimentar os bichos, sejam onde estão os suínos, onde estão as aves. Então, para eles não tem feriado; todos os dias eles têm que trabalhar. São aqueles que lançam a semente na terra e ficam olhando para o céu, esperando a chuva para irrigar a plantação. E, quando não vem a chuva, como a seca recentemente na Região Sul, o prejuízo é enorme. Muitas vezes as chuvas chegam tarde, a estiagem faz sofrer, a terra faz cair lágrimas dos olhos.

    No Rio Grande do Sul, mais de 60% da soja, do milho e do leite e de toda a produção para o autoconsumo foram pedidos no ano passado. No momento em que eles mais necessitam de socorro e de apoio, os governos não podem virar as costas - para todos!

    Há uma dívida que esta Casa tem com a nossa gente: promessas sobram, mas precisam, de novo, de crédito, auxílio, Pronaf e por aí vai. O Governo Federal anunciou uma MP liberando R$1,3 bilhão, mas criou uma cláusula que exclui a maioria dos agricultores que sofrem com as estiagens. Infelizmente, a maioria que sofre não está contemplada, conforme documentos do Governo Federal que recebi e que entregamos aqui. Não podemos desconhecer que 70% da comida que vai para a mesa dos brasileiros são produzidos pela agricultura familiar. E aqui volto com outro dito popular: se a agricultura familiar não planta, a cidade não janta. Milhões de trabalhadores e trabalhadoras rurais recebem, no máximo, um salário mínimo. Não possuem sequer mínimas condições de comprar o básico para sustentar a sua família.

    Há que se destacar que são frequentes os relatos da fiscalização de que se deparam com agressões físicas, cárcere privado, cerceamento da liberdade de locomoção e exposição ao risco de vida e de saúde.

    São inúmeros casos que aqui poderão ser falados de trabalho escravo. O Brasil precisa valorizar o trabalhador e a trabalhadora rural, fortalecer a agricultura familiar.

    Termino dizendo: creio no despertar da vida, no amor, na solidariedade e na fraternidade. Creio em todos vocês que estão aqui, pois são espelho dos que estão lá fora. Façamos a nossa parte. A nossa responsabilidade para com os que mais precisam e com o país é enorme. Tenhamos, então, aqui hoje uma excelente sessão especial de debates.

    Para tanto, para esse debate e para cada um expor o seu ponto de vista, neste momento eu começo a passar a palavra para os nossos convidados.

    De imediato, concedo a palavra, por dez minutos, ao Sr. Romulo Machado e Silva, que está online, Subsecretário de Inspeção do Trabalho da Secretaria de Trabalho do Ministério do Trabalho e Previdência.

    Dr. Romulo, a palavra é sua, por dez minutos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/2022 - Página 9