Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Crise do pacto federativo brasileiro.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Crise do pacto federativo brasileiro.
Aparteantes
Heloísa Helena, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 21/12/2004 - Página 44050
Assunto
Outros > ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • APREENSÃO, ORADOR, CRISE, PACTO, FEDERAÇÃO, RESULTADO, DIFICULDADE, DESEQUILIBRIO, SITUAÇÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS, AUMENTO, RECEITA, UNIÃO FEDERAL, EXCESSO, CRIAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, AUSENCIA, REVERSÃO, MELHORIA, SERVIÇOS PUBLICOS, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO.
  • COMENTARIO, HISTORIA, FEDERALIZAÇÃO, PAIS.
  • QUESTIONAMENTO, DESEQUILIBRIO, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA, INEFICACIA, ATUAÇÃO, SENADO, EXCESSO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), PREJUIZO, FUNÇÃO LEGISLATIVA, CRITICA, MANIPULAÇÃO, GOVERNO, EMENDA, CONGRESSISTA, SISTEMA, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA.
  • DEFESA, URGENCIA, REVISÃO, SISTEMA, FEDERAÇÃO, NECESSIDADE, ESCLARECIMENTOS, SEPARAÇÃO, FUNÇÃO, ATIVIDADE, EFICIENCIA, SERVIÇOS PUBLICOS, SOLUÇÃO, PROBLEMA, CIDADÃO, GARANTIA, EXECUÇÃO, MODELO, REPUBLICA FEDERATIVA.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como muitos outros brasileiros, estou profundamente preocupado com a grave crise que atinge o pacto federativo deste País. O quadro que me leva a essa inquietação é a quebradeira geral dos Estados e de vários dos Municípios mais importantes. Enquanto isso, a União “engorda” às custas da criação de contribuições que, na maioria das vezes, não revertem em bons serviços para a população.

É evidente que muita coisa está profundamente errada no federalismo brasileiro.

Alguns estudiosos enxergam problemas no nosso federalismo desde a sua implantação, que se confunde com a Proclamação da República - que, na verdade, foi um golpe de Estado.

O paradigma federativo com o qual somos freqüentemente comparados nos é francamente desfavorável: os Estados Unidos da América do Norte. Mas um estudo mais aprofundado acabará nos levando a conclusão diversa do senso comum: não existe apenas um modelo de federação. Na realidade, existem pelo menos quatro formações políticas distintas que resultaram em modelos federativos nos dias de hoje.

Existe o modelo norte-americano, o mais conhecido e mais debatido, no qual há uma pluralidade política interna de seus membros, resultando em fortes identidades regionais que igualam, quando não ultrapassam, a identidade nacional, mas cuja sobrevivência depende da coexistência e cooperação com os outros membros.

Existe o modelo alemão, onde o federalismo apareceu como solução para a fragmentação de um império decadente. Nesse paradigma é ressaltada a ação de vontades prévias, que, em uma manobra de concertação, mantém a unidade sob nova forma federalista, que permite o respeito às diferenças.

Existe um modelo característico de Estados plurinacionais, resultado do processo de descolonização do século XX, normalmente obrigando a coexistência de profundas divergências étnicas, religiosas, culturais. Para esse modelo, a referência seria a Índia.

E existe o caso de países onde o federalismo apareceu em substituição a experiências fracassadas de Estado unitário, que tem como referência histórica países como o Brasil e a Argentina. O Brasil era um Império Unitário; hoje, é uma República Federativa.

E, não se iludam V. Exªs, são poucas as experiências federativas, e menos ainda as efetivamente estáveis. O professor Otávio Dulci nos lembra que a lista de federações é composta, nos dias de hoje, apenas por Estados Unidos, Canadá, México, Brasil, Argentina, Venezuela, Austrália, Malásia, Índia, Nigéria, África do Sul, Áustria, Alemanha, Suíça e Rússia.

Desse modo, acaba sendo mais produtiva a análise do federalismo “à brasileira” do que a comparação com os outros paradigmas.

E qual é a história do federalismo em nosso País?

A idéia federal foi apresentada como uma das possibilidades já no momento da Independência. Fundamentalmente, os estudiosos apresentam duas razões para o federalismo não ter sido adotado no início de nossa vida autônoma: o risco de desagregação territorial, como efetivamente veio a acontecer em quase toda a América Colonial Espanhola; e a existência da escravidão, que era um foco permanente de tensão.

Como resultado disso, iniciamos nossa vida nacional como uma monarquia unitarista, que garantiu a integridade territorial e a manutenção dos direitos de propriedade da elite escravista.

Quando a questão federalista foi recolocada, na fase dos conflitos originados pela Regência, apresentou-se muito mais como manifestação de interesses prejudicados pelo centralismo monárquico do que como possibilidade de concertação dos diferentes interesses regionais.

O fracasso do regime monárquico em abrir espaço político para os novos grupos sociais que surgiram no Império - os cafeicultores capitalistas, as camadas médias urbanas, em especial os militares, e mesmo o trabalhador assalariado - resultou na sua extinção. Especialmente após sua base econômica ser paulatinamente corroída, com a eliminação gradual da escravidão, coroada pela Lei Áurea, em 1888.

Surgiu, assim, a oportunidade não só para a instituição do regime republicano, como também para um federalismo construído de cima para baixo, sobre uma base estritamente conservadora.

A federação foi adotada na medida em que o unitarismo monárquico era confundido com o “atraso”, com a estagnação política do final do Império.

A dinâmica política da nossa primeira República foi bastante peculiar, com a estabilidade sendo alcançada por meio de um pacto político estabelecido entre as várias elites locais, organizadas numa miríade de partidos de base estadual.

O pacto federativo pode ser entendido como as regras de coexistência entre poderes da base nacional e poderes da base regional. No nosso caso pioneiro, foi pouco mais do que um acerto entre setores mais tradicionais do Norte e do Nordeste e Governadores representantes de setores mais dinâmicos do Sul e do Sudeste, interessados no uso prático que poderia ser dado ao poder central, especialmente na viabilização do comércio exterior.

A descentralização de ações - característica essencial de um sistema federativo - acabou confundida com uma autorização para o uso indiscriminado do Estado, em nível local, pelas elites pactuantes. A partir daí, nota-se um caráter francamente pendular nas várias reorganizações pelas quais passou o Estado brasileiro.

Pobre federalismo... Acabou, na virada da década de 1920 para a de 1930, seguindo o mesmo caminho da monarquia. Incapaz de dar conta da nova dinâmica social, estabelecida pelo avanço da indústria e da urbanização, foi acusado, a partir do movimento tenentista, de ser responsável pelo “atraso”, pela estagnação política e econômica.

A Revolução de 1930 trouxe mais um elemento à vida política nacional. Getúlio Vargas representou o modelo mais bem acabado de estadista com visão nacional, capaz de reinventar-se a todo momento, conforme a conveniência dos seus projetos políticos. Foi assim que o Líder gaúcho viu-se à frente de um movimento de amplitude nacional para remoção da arcaica estrutura política da República Velha. Logo em seguida, aparece como pessoa capaz de conduzir o País na construção de uma sociedade mais democrática, dentro dos padrões da época, refletida na Constituição de 1934.

Do ponto de vista do nosso federalismo, Vargas estabeleceu um modelo absolutamente centralizado, que apostava na construção de um Estado indutor do desenvolvimento econômico. Assim, a regulamentação do comércio interno e externo - que, na fase anterior, era função dos Governos estaduais - passou ao Governo central. Apesar disso, foi mantida a capacidade dos Estados para aplicar e, eventualmente, criar novos tributos.

Inviabilizada a continuidade de Getúlio no poder, a redemocratização do País, em 1945, significou uma nova fase de descentralização federativa, uma vez que o centralismo, novamente, via-se confundido com o “atraso” das instituições políticas.

A República liberal instituída em 1946, mesmo reconstruindo e dando autonomia aos Governos subnacionais, pouco afetou a estrutura administrativa central montada por Getúlio Vargas. Tampouco foi revertida a concentração industrial no Sudeste, gerando grandes rivalidades políticas entre os Estados e colocando a União em um novo papel de combater as agravadas desigualdades regionais. Inaugura-se, aqui, a fase dos incentivos fiscais para o Nordeste, como fator fundamental de desenvolvimento, modernização e industrialização.

O Regime Militar puxou novamente o pêndulo político na direção da preponderância de um forte poder central, detentor quase exclusivo da capacidade de legislar e tributar. O aumento da carga tributária foi justificado pela necessidade de financiamento da modernização infra-estrutural, não sendo eliminada, entretanto, a competência tributária dos Estados, e sendo instituído mecanismo de partilha de receitas, viabilizando unidades subnacionais de base tributária estreita.

A nova democratização empurrou o pêndulo de volta aos Estados. A Constituição de 1988 foi francamente municipalista, em oposição ao planejamento excessivamente centralizador da tecnocracia do período anterior. O reforço da posição do Município foi colocado como panacéia para o combate do “atraso” advindo das desigualdades regionais, diante do fracasso tecnocrático em atingir os chamados grotões. Ademais, o Município foi alçado ao nível de ente federado, fato inédito no mundo.

Já podemos notar que as várias formas federativas, mais menos centralizadas, ainda não foram capazes de resolver, de forma permanente, os problemas e desigualdades que o Brasil apresenta.

É importante ressaltar, também, que nossa Constituição estabelece uma Federação estritamente simétrica, quando observada nas três esferas do poder público - União, Estados e Distrito Federal e Municípios. Isso significa dizer que não existe respeito às diferentes capacidades dos Estados, cobrando de todos as mesmas funções e serviços. Como resultado, a oferta de serviços públicos é bastante diferenciada, mesmo dentro das mesmas macrorregiões. O mesmo ocorre no nível dos Municípios, onde a questão se apresenta de forma ainda mais grave.

É necessário fazermos um balanço da situação atual do nosso pacto federativo, focando essencialmente a questão da sustentação dos entes federados. Para isso, existe farto material disponível no site do Banco Federativo do BNDES, com a análise da situação financeira e tributária da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

O que podemos constatar é isto: logo depois da Constituição de 1988, identificamos uma diminuição relativa da participação de Estados e da União no conjunto da receita, em favor dos Municípios.

A União saiu de uma confortável posição de representar 70% da carga tributária nacional, pré-Constituição, atingindo o nível mais baixo em 1991, com 63%. Entretanto, recolocou-se, nos últimos anos, num patamar bastante próximo ao original, 69%, graças ao expediente de criar contribuições de variadas ordens, como a CPMF e a Cide, que não distribui com os Estados nem com os Municípios.

Ao mesmo tempo, a carga tributária global passou dos 29,6% do Produto Interno Bruto (PIB), em 1988, para os 35,7% do ano passado, e a projeção, que infelizmente parece se confirmar, é de 36,2%, para 2004. Tudo isso bem acima dos pouco mais de 13% do pós-guerra e, mesmo, dos 25% ou 26%, de quase todo o período militar.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Ouço V. Exª, com o maior prazer.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Senador Pedro Simon, V. Exª faz uma análise que deixa a todos estarrecidos, porque é a verdade. Mas há um agravante em relação aos Municípios, que não apenas tiveram diminuição após a Constituição de 1988, como também receberam mais atribuições, como, por exemplo, os bloqueios de educação e saúde, que penalizam muito. E o INSS também passou a ser um outro problema sério. E mais séria ainda é a questão dos precatórios, porque, a toda hora e a todo instante, vem uma avalanche de precatórios sobre os Municípios. V. Exª fala que a União está realmente desequilibrada, mas, no caso dos Municípios, o desequilíbrio é ainda maior. As contribuições chegam a R$110 bilhões, que não entram na cesta a ser dividida com Estados e Municípios. Parabéns pelo pronunciamento!

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Obrigado pelo importante aparte de V. Exª, Senador Ney Suassuna.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Permite-me V. EXª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Com muita alegria, concedo-lhe o aparte.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Senador Pedro Simon, cumprimento V. Exª pelo pronunciamento. É extremamente constrangedor para esta Casa, que só existe para representar a Federação - porque, se não fosse para representar a Federação, não haveria razão para estarmos aqui, três representantes por Estado, tudo igual -, é vergonhoso para esta Casa não ter pensado em um modelo de federalismo como muito bem denuncia V. Exª, se federalismo competitivo ou cooperativo. Pelo menos dever-se-ia viabilizar esse debate para se fazer uma proposição concreta. Quero fazer uma referência não para ajudar V. Exª, porque o seu pronunciamento é extremamente completo, muito positivo e interessante, mas apenas para trazer também ao debate que foi justamente o aumento da carga tributária - causado pelo aumento do percentual de alíquotas ou pela ampliação da base tributária - naquele tributo que é centralizado no Governo Federal, e daí a gravidade do tema. Outra gravidade é justamente o percentual de comprometimento da receita líquida real que os Estados e Municípios estão tendo para financiar a agiotagem internacional, em função dessa política econômica do Governo Federal. Esse tipo de política econômica, que joga na lama da especulação 70% do Orçamento público, é financiada com o caos administrativo e com o caos da ausência de prestação de políticas públicas e de políticas sociais pelos Estados e Municípios. Por isso, seria bom que esta Casa fosse independente, porque, quando o Governo estabelece a promiscuidade entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional, os Congressistas acabam viabilizando a sua voracidade de se lambuzar no banquete farto do poder, em vez de, como V. Exª, ouvirem e terem sensibilidade para com os problemas gravíssimos que acometem hoje Estados e Municípios. Portanto, parabenizo V. Exª.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço o oportuno aparte de V. Exª, que veio se somar - e bem - ao meu pronunciamento.

Repito: ao mesmo tempo, a carga tributária global passou de 29,6% do Produto Interno Bruto (PIB), em 1988, para 35,7% no ano passado, e a projeção que infelizmente parece se confirmar é de 36,2% para 2004.

Os Estados, de sua parte, sofreram redução em sua participação, dos 26,5% de 1988 para os 26,1% estimados para este ano. Aumentando um pouco o horizonte de análise, de volta a 1960, por exemplo, enxergamos melhor o problema. Naquele ano, os impostos dos Estados representavam 31,3% da carga nacional e hoje representam 26%.

Por fim, a situação dos Municípios parece, a princípio, muito mais confortável. Em termos de arrecadação, representou respectivamente 4,8%, 2,9% e 4,8% nos anos de referência 1960, 1988 e 2004. Para a receita disponível, encontraremos uma variação que vai de 6,6%, passando por 10,8% e chegando aos 16,2% projetados para o corrente ano.

A Constituição de 1988 facilitou, até a edição da Emenda Constitucional nº 15, de 1996, o processo de criação de novos Municípios, muitos dos quais ainda são visíveis do ponto de vista de sustentação, visto que se agarram quase que exclusivamente ao FPM para sua sobrevivência.

A relativa demora em estabelecer um mecanismo de controle para os Entes Federados - representada hoje pela Lei de Responsabilidade Fiscal - permitiu a propagação dos efeitos deletérios da má gestão dos recursos públicos.

Sabemos, pelo noticiário, que existem cidades hoje que se sustentam sobre o binômio FPM, para os gastos públicos, e os programas de renda mínima do Governo Federal ou formas de benefícios de prestação continuada, no caso do consumo privado. Que sentido existe em dar ou manter a autonomia de tais Municípios?

O mesmo parece acontecer com alguns Estados, que se sustentam no respectivo Fundo de Participação. Entretanto, a estrita simetria de funções proposta no Texto Constitucional força Municípios e Estados menos aparelhados a oferecerem serviços no mesmo nível e responsabilidade de outros mais aparelhados, às custas, muitas das vezes, de sua estabilidade administrativa e fiscal.

Por outro lado, as regras de partilha das transferências da União muitas vezes não têm como base a questão populacional, repetindo o desequilibro, que já é sobejamente conhecido, na representação política.

Uma regra realmente interessante de partilha deveria ser baseada no cálculo de uma base orçamentária per capita, disponível para cada Estado e Município, rigorosamente equilibrada. A partir dessa base, seria permitida a introdução de um fator voltado para a diminuição das diferenças regionais, mas que não ultrapasse, como acontece hoje, um limite de, digamos, 30% da base per capita nos casos extremos.

A contrapartida dos que receberam valores diferenciados seria a obrigação de cumprimento de metas de atendimento de serviços públicos, por exemplo, e a definição de um horizonte temporal para demonstrar sua viabilidade de sustentação como Ente Federado - exceções apenas para atendimento de calamidades públicas.

Também é necessário definir as funções de cada nível federativo. Com mais de um século de experiência republicana, continuamos esbarrando no mais rasteiro primarismo administrativo de repetir funções nos três níveis, resultando não em cooperação, mas em competição entre os Entes Federados, agravada, em alguns casos, pela incompetência. 

Por que motivo os principais eixos rodoviários do País continuam sob a responsabilidade quase exclusiva do Governo Federal, servindo, inclusive, de pretexto para a instituição de mais uma contribuição? Será que não existe a confiança de que a função de gerenciar estradas ficaria mais bem localizada nos Entes Federados subnacionais? Deveria estar sob a tutela da União exclusivamente o planejamento macro do sistema rodoviário e, no máximo, a implantação de novas artérias. Da maneira que está, o orçamento fica na União e acaba não sendo utilizado, vitimado pelos freqüentes contingenciamentos destinados a “fazer caixa” para os superávits escorchantes.

Por último, cabe, certamente, nessa discussão sobre o federalismo “à brasileira”, a questão do desequilíbrio da representação e, mesmo, o nosso papel na Federação. Certamente, cabe ao Senado o papel da “Casa da Federação”. Mas um Senado de pauta permanentemente trancada pela avalanche de medidas provisórias do Executivo, com prazos exíguos para opinar, não desempenha bem sua missão. É preciso refletir sobre isso.

E a questão das emendas parlamentares? Freqüentemente são utilizadas como moeda de troca pelo Executivo, uma vez que, no atual sistema de execução orçamentária, apenas ele tem o condão de tornar realidade o atendimento das necessidades locais refletidas nessas emendas. Sem falar na maneira grotesca como a questão é tratada pelo próprio Executivo e por parte da mídia, que acabam passando a impressão de que os parlamentares embolsam esses recursos. No fundo é uma estratégia da ilusão. Qualquer um, com experiência na administração pública, sabe que a verba liberada em final de ano dificilmente é executada, especialmente se destinada a obras e programas de certo porte.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Parlamentares, nosso sistema federativo necessita de uma revisão urgente. Precisamos esclarecer e separar as funções e as ações, de forma que a Federação realmente se realize na prática. Precisamos garantir um nível de oferecimento de serviços públicos que resolva o problema do cidadão, e não dos que deveriam estar servindo a ele. Precisamos estabelecer sérios critérios de viabilidade econômica para admitir a criação de novos Estados e Municípios e para a continuidade da autonomia dos atuais. Precisamos restabelecer a justeza orçamentária voltada para o cidadão. E precisamos, ademais, rediscutir a questão da representação política, que deve ser refletida na composição, funções, atividades e formas de funcionamento das duas Casas do Parlamento.

É o apelo que faço aos meus Pares, em defesa da Federação.

Acredito, Srªs e Srs. Senadores, que a sobrevivência do pacto federativo e o reequilíbrio da Federação só será conseguido voltando um passo, quando recolocarmos a res publica - o trato da coisa pública - acima de projetos e ambições individuais. Restauremos a República e, com isso, salvaremos a Federação.

É o que falo hoje, pretendendo voltar aqui para mostrar a situação dramática que vive o meu Estado, o Rio Grande do Sul. A dramaticidade desta hora da política rio-grandense está a exigir um atendimento tanto por parte do meu Estado quanto por parte do Governo Federal.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/12/2004 - Página 44050