Discurso durante a 141ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Diáspora do povo gaúcho e sua participação na história do Brasil.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Diáspora do povo gaúcho e sua participação na história do Brasil.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 09/08/2008 - Página 29829
Assunto
Outros > HOMENAGEM. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, BRASILEIROS, ORIGEM, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), MIGRAÇÃO, ESTADOS, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, DISTRITO FEDERAL (DF), ESTADO DE GOIAS (GO), ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), ESTADO DO TOCANTINS (TO), ESTADO DA BAHIA (BA), ESTADO DO MARANHÃO (MA), ESTADO DO PIAUI (PI), ELOGIO, BRAVURA, EMPENHO, SOLUÇÃO, OBSTACULO, PROMOÇÃO, AGRICULTURA, PECUARIA, SUPERIORIDADE, QUALIDADE, DESCRIÇÃO, HISTORIA, CIDADÃO.
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, PERIODO, INICIO, MIGRAÇÃO, DIFERENÇA, PREÇO, TERRAS, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), COMPARAÇÃO, INFERIORIDADE, VALOR, REGIÃO CENTRO OESTE, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, SUPERIORIDADE, QUALIDADE, SOLO, INCENTIVO, MIGRAÇÃO INTERNA.
  • COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, MIGRANTE, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO, CIDADE, REGIÃO METROPOLITANA, ATUAÇÃO, COMERCIO, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, APOIO, AGRICULTURA, PRESENÇA, POLITICA.
  • IMPORTANCIA, PESQUISA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), APOIO, PRODUTOR RURAL, ORIGEM, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), PLANTIO, AREA, CERRADO, ADAPTAÇÃO, SEMENTE, ESPECIFICAÇÃO, SOJA, COMENTARIO, DADOS, Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), SUPERIORIDADE, CRESCIMENTO, SAFRA, ESTADO DO MARANHÃO (MA), ESTADO DO PIAUI (PI), ESTADO DO TOCANTINS (TO).
  • ELOGIO, CONDUTA, MIGRANTE, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), EMPENHO, MANUTENÇÃO, TRADIÇÃO, VALORIZAÇÃO, FAMILIA, RELIGIÃO, TRABALHO, EDUCAÇÃO, CULTURA.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Prezado Presidente, Senador Paulo Paim, Srs. Senadores, fiquei emocionado com o seu pronunciamento. Foi, realmente, emocionante o pronunciamento de V. Exª, Senador Paim. Fez muito bem V. Exª em salientar a beleza da abertura dos jogos da Olimpíada em Pequim. Confesso que foi o espetáculo cênico mais bonito que vi na minha vida em televisão. Acho que vai marcar época, um marco novo na televisão do mundo, porque tenho certeza de que os Estados Unidos e outros países vão querer seguir o exemplo e tentar, inclusive, superá-lo.

Pois venho falar aqui neste momento, exatamente quando uma Olimpíada mundial se inicia. Volto ao tema - que bom que V. Exª esteja na Presidência - da diáspora da nossa nova fronteira hoje; a história dos gaúchos e a epopéia dos gaúchos na história do Brasil.

Eu venho fazendo ao longo desses anos uma série de pronunciamentos, Senador Paim, sob a diáspora do povo gaúcho, a monumental dispersão do sul-rio-grandenses pelo território nacional, processo que teve início já nas primeiras décadas do século passado, como quando começou a migração para o oeste de Santa Catarina e para o Paraná de descendentes de alemães e italianos instalados e nascidos no Rio Grande do Sul.

Hoje vou examinar, continuando a minha análise, a questão das novas fronteiras agrícolas, expandidas principalmente pelos migrantes gaúchos a partir de meados do ano 70. Como é sabido, os agricultores do Rio Grande do Sul, os catarinenses e paranaenses, por sua vez, descendentes de gaúchos, foram os protagonistas da monumental epopéia, que foi a incorporação dos cerrados à produção da agropecuária brasileira.

Apresentei aqui cerca de duas dezenas de depoimentos de migrantes gaúchos, espalhados por vários Estados do Centro-Oeste, do Nordeste e da Amazônia. Acredito que a reprodução, nesta tribuna, desses depoimentos de certa forma mostrará um quadro bastante aproximado do que foi essa fantástica aventura. E, quando falo em aventura, estou usando a palavra exata, porque a diáspora do povo gaúcho foi plena de episódios dramáticos de enormes dificuldades e de grandes sobressaltos.

Foram os migrantes sulistas que levaram adiante a colossal tarefa de transformar os cerrados - uma área tradicionalmente desprezada, considerada imprópria para a agricultura - num dos maiores celeiros do Brasil. Ora, a incorporação desse ecossistema, por sua vez, determinou que o Brasil viesse assumir uma posição preponderante em termos globais que tem hoje a produção de alimentos. É bom levar em consideração que o Brasil atinge o status de potência produtora mundial de alimentos justamente na época em que o mundo enfrenta a primeira escassez de alimentos em nível planetário.

Concentrarei meu pronunciamento de hoje na migração maciça de agricultores gaúchos para seis Estados: Distrito Federal, Goiás, Tocantins, Minas Gerais, Bahia, Maranhão e Piauí e, oportunamente, falarei de Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e dos outros Estados, como já falei de Santa Catarina e do Paraná.

Assim, porém, quero aprofundar algo que mencionei ligeiramente no pronunciamento anterior: os gaúchos são os bandeirantes do século XX.

Da mesma forma que os desbravadores gaúchos e paulistas, a partir do século XVI, indo em busca de pedras preciosas e também para o apressamento de indígenas expandiram o território brasileiro até seus limites atuais. Os migrantes gaúchos ou seus descentes nascidos em Santa Catarina, Paraná ou Mato Grosso mais do que desdobraram, mais do que dobraram a área agricultável deste País. Na sua busca de metais preciosos, em especial a prata e também as pedras preciosas, os aventureiros paulistas enfrentaram o clima inóspito dos sertões desconhecidos, sofreram ataque de animais selvagens e tiveram que lutar com índios que bravamente reagiram à invasão de suas terras.

Na mesma intensidade, os agricultores do Rio Grande do Sul e do Sul tiveram que afrontar ecossistemas bastante diversos daqueles a que estavam habituados quando deixaram o clima temperado da terra natal. Nos primeiros tempos da migração, a maioria desses homens e mulheres teve que se instalar em habitações precárias, tendas de lona ou de plástico ou ainda toscos casebres de madeira. Sem sementes adequadas à nova terra e ao clima desconhecido, tiveram colheitas ruins, que levaram muitos à falência.

Como as pesquisas oficiais sobre os cerrados apenas engatinhavam, nós, agricultores gaúchos, precisamos estudar por conta própria o solo e o regime das águas e foram obrigados a investir seus escassos recursos para tornar o solo produtivo.

Além disso, nas novas áreas de fronteiras agrícolas, esses pioneiros ergueram suas casas em regiões remotas, sem estradas, sem assistência médica e sem escolas para os seus filhos.

Como ensinam os nossos livros de História, a conquista dos nossos sertões se deve às bandeiras das expedições particulares e, em menor escala, às entradas e empreendimentos governamentais. Tendo isso em mente, digo sem medo de errar que os agricultores gaúchos foram os nossos bandeirantes do século XX. A verdade é que as iniciativas oficiais de colonização do Brasil, especialmente durante o regime militar, foram poucas e quase sempre malsucedidas. O que garantiu o sucesso da nossa gente foi o espírito empreendedor, a coragem, a capacidade de superar os mais duros obstáculos.

Tanto os paulistas, do passado remoto, quanto os gaúchos, já no século XX, prestaram serviços dos mais relevantes à Nação. Sem os bandeirantes e os agricultores que migraram do Sul, o Brasil não seria o que é. No entanto, preciso fazer aqui uma ressalva. Os bandeirantes foram em busca da riqueza, mas, ao final de sua jornada, voltavam para o lugar de onde haviam partido. Fundaram, é verdade, muitas cidades, muitas vilas. Abriram rotas pelo interior do Brasil. Mas voltaram, depois, para São Paulo. Os gaúchos não. Os meus conterrâneos foram aos lugares mais distantes e lá fincaram suas raízes. Fundaram cidades, abriram estradas e principalmente expandiram a produção de alimentos. Muitos deles morreram nas novas terras sem poder retornar ao Sul nem para uma visita.

Nesse ponto, não posso deixar de mencionar que o Centro e o Oeste do Brasil só passaram a interessar ao País em meados do século passado, quando aquele que foi o nosso maior estadista republicano, o sul-rio-grandense Getúlio Vargas, iniciou a grande marcha para o Oeste. Antes disso, os brasileiros viviam presos ao litoral, como caranguejos. A grande maioria da nossa população vivia a menos de cem quilômetros do mar.

Passado pouco mais de meio século do nosso avanço para o Oeste, aquilo que se chamava de “sertão”, com um certo tom de desprezo e de angústia, transformou-se em uma das regiões mais produtivas do mundo. É disso que vou falar. Narrarei aqui, ainda que de forma breve e fragmentada, a trajetória de alguns dos homens e mulheres que deixaram o nosso torrão natal para, arriscando tudo, construir a grande nação agropecuária que o Brasil é hoje.

Querido Presidente Paim, Srs. Senadores, não tenho pretensão de ser historiador, mas a minha já extensa carreira política me faz um observador atento da evolução das grandes questões nacionais, dentre as quais me interessa particularmente a diáspora do povo gaúcho. Nesse ponto, quero formular uma pergunta aos estudiosos da História brasileira: não teria sido a expansão da nossa fronteira agrícola a grande epopéia brasileira do último quarto do século passado? É a pergunta que faço.

Vou dar aqui o testemunho de quem acompanhou com um misto de tristeza e orgulho a dispersão do povo rio-grandense pelo Brasil. Quando uso a palavra triste, refiro-me à melancolia de sentir e ver tanta gente de garra capaz de deixar a nossa terra. Mas é preciso contrabalançar esse sentimento com o imenso orgulho que sinto pelo que nossos conterrâneos fizeram pelo Brasil afora.

Iniciarei falando de um programa de assentamento realizado em Brasília, e, a seguir, mostrarei o que ocorreu nos demais Estados que citei no começo do pronunciamento.

Para muitos estudiosos, o programa de assentamento dirigido no Distrito Federal, mais conhecido pela sigla Padef, de certo modo, acabou servindo de modelo para outras iniciativas oficiais da incorporação dos cerrados. Com a criação do Padef, o Governo do Distrito Federal pretendia formar um cinturão verde ao redor da recém-criada, fundada Capital da República. O então Secretário da Agricultura do Distrito Federal, o baiano Pedro Dantas, foi buscar no Rio Grande do Sul os agricultores que iriam concretizar aquilo que não passava de um projeto ousado. Do Rio Grande do Sul e Paraná, Estado cujos agricultores em grande número descendem dos gaúchos, vieram para Brasília em 1977. As treze primeiras famílias que receberam lotes de chácaras, com 10, 12 ou 15 hectares, e de grandes áreas, de 280 hectares. Na maioria gaúchas, eram de Tapera, querido Senador Paim, de Passo Fundo, de Marechal Rondon, no Paraná, esses descendentes de gaúchos.

Todos os agricultores assinaram um termo de compromisso e obrigação pelo qual deveriam tornar produtivas as suas propriedades em apenas dois anos. Todos eles trouxeram do Sul máquinas e implementos para tocar suas plantações. Mas a verdade é que desconheciam totalmente o clima e a terra. Agricultores antigos da região acharam que os gaúchos estariam de volta ao Sul em muito pouco tempo, no final do prazo, desiludidos por não conseguirem dominar a produção do cerrado.

Prezado e brilhante Governador de Brasília, Senador Cristovam, mas ocorreu justamente o contrário. De uma produção de 30 sacos por hectare, por ano, nos primórdios, os gaúchos aqui do Planalto Central estão obtendo, em nossos dias, de 70 a 80 sacos. Trata-se de um extraordinário crescimento de 130%.

Com o sucesso do Padef, os gaúchos começaram a chegar em grandes levas às cidades goianas que cercam Brasília, como Cristalina, Luziânia e Formosa. Logo em seguida, passaram também a comprar terras nas cidades mineiras próximas, como Unaí e Paracatu.

Quero transcrever aqui breve depoimento de um agricultor gaúcho que integrou a primeira leva dos migrantes para o Distrito Federal. Nascido em Tapera, Nei Schneider mudou-se ainda criança com os pais para Carazinho. Em 1976, estava em Balsas, no Maranhão, em busca de novas terras. Foi numa viagem para o Maranhão que acabou sabendo do Padef. Inscreveu-se para comprar um lote.

Morando a apenas 60 quilômetros da Estação Rodoviária do Plano Piloto, Nei Schneider considera-se hoje totalmente adaptado à região. Segundo ele, os gaúchos que vieram para o Centro-Oeste há mais de trinta anos não se adaptariam mais ao Sul, caso tivessem que retornar: “A gente não ia mais se acostumar a viver com uma propriedade colada na outra. Aqui as propriedades são muito maiores, a gente tem muito espaço”.

Falo agora, Sr. Presidente Paim, da aventura dos gaúchos no Estado de Goiás, que começou pela migração para a cidade de Formosa, a apenas 75 quilômetros de Brasília.

A chegada dos migrantes rio-grandenses à Formosa deu-se a partir de 1985. Estima-se que, atualmente, os gaúchos e seus descendentes na cidade sejam cerca de 500. Quase todos vieram por conta própria, isoladamente, mas a seguir reuniram-se em uma cooperativa. Na sua grande maioria, os sulistas têm propriedades entre 300 e 1.000 hectares, embora alguns possuam áreas inclusive bem maiores.

Nos anos 80, o hectare de Goiás custava menos de 10% do que valia o hectare lá do Sul. Vendendo uma colônia no Rio Grande do Sul, que tem, em média, 21 a 28 hectares, o agricultor podia comprar de 200 a 300 hectares em Formosa, Goiás.

Como ocorreu em outros municípios para os quais se transferiram os gaúchos, logo em seguida à implantação das fazendas de Formosa, também passaram a trabalhar no comércio e nos serviços ligados à agropecuária. Hoje, a produção agrícola local está centrada na soja e no milho. Nas propriedades de terreno mais irregular, explora-se a pecuária; há também a criação de suínos.

Sérgio Jantsch, patrão do CTG Querência Formosa, é um típico migrante gaúcho do Centro-Oeste. Nascido em Santa Rosa, foi levado pelos pais, ainda garoto, para a cidade catarinense de São Miguel do Oeste, onde estudou. Adulto, mudou-se para São Paulo, e, em 2000, abriu comércio em Formosa.

Entre as cidades goianas que cercam Brasília, as que reúnem mais migrantes gaúchos, segundo Sérgio Jantsch, são Cristalina, Alto Alegre, Formosa, Luziânia e Flores de Goiás.

Passo, agora, a falar da ida dos gaúchos para o sudoeste de Goiás, a partir da metade da década de 70. Esse movimento foi uma conseqüência natural do avanço das levas de migrantes sulistas que subiam pelo Mato Grosso do Sul, onde sempre foram em busca de terras, ainda baratas por aqui.

As terras do sudoeste goiano, extremamente férteis, custavam, à época, cerca de 20 sacos de soja por hectare.

Hoje, uma propriedade bem posicionada pode ter o hectare avaliado em até 500 sacos de soja. Quando vieram os gaúchos, repito, um hectare valia vinte sacos de soja; hoje, um hectare vale 500 sacos de soja.

Não houve colonização planejada na região. As famílias vinham por livre iniciativa, embora, como é comum, muitos deles tratassem de arregimentar, a seguir, os seus parentes, formando-se logo uma comunidade e logo criando uma cooperativa.

As cinco cidades do Sudoeste goiano que mais acolheram sul-rio-grandenses são Jataí, Rio Verde, Mineiros, Chapadão Gaúcho e Montividiu. Estima-se que Rio Verde e Jataí tenham entre 400 e 500 famílias de gaúchos. Em Mineiros, seriam 200 famílias. Já em Chapadão Gaúcho pode haver um número muito, muito maior. O nome dessa última cidade deriva de um Município de Mato Grosso do Sul, com o qual faz divisa, chamado Chapadão do Céu. Em Rio Verde, estima-se que os catarinenses vindos do Oeste daquele Estado, portanto descendentes de gaúchos em grande maioria, também somem cerca de 400 famílias.

Ainda hoje continuam a chegar migrantes sulistas à região, mas num ritmo bem menos intenso, por causa do alto custo da terra, que agora aumentou muitíssimo mais. Os que desembarcam agora vêm para trabalhar com criação de aves, já que uma grande empresa avícola se instalou recentemente naquela região.

Embora grande parte dos gaúchos do Sudoeste goiano esteja ligada à agricultura ou à pecuária, as famílias em geral residem nas cidades. O principal produto regional é a soja, seguida pelo milho.

Reparem V. Exªs que hoje são milhares de CTGs espalhados pelo Brasil afora, porque, em cada Município dessa região, há um CTG - Centro de Tradições Gaúchas. O Presidente do CTG de Rio Verde é Luiz Zeni, gaúcho de Frederico Westphalen, que chegou a Goiás em 1982. Ele conheceu a região, quando veio a trabalho, de caminhão, para entregar um frete. Gostou do clima, com muita chuva e pouco frio, e decidiu ficar. Segundo Zeni, os gaúchos de Rio Verde, na maioria, são originários das cidades de Colorado, Ibirubá e Tapera.

O tradicionalismo é forte na região. No final de julho, os integrantes dos CTGs de todo o Planalto Central partiram em direção à cidade de Luís Eduardo Magalhães, na Bahia, para o encontro dos tradicionalistas do Planalto Central. Num final de semana de disputa, os gaúchos do Centro-Oeste participaram de provas de laço, bocha e bolão, para indicar seus representantes nas provas do certame nacional.

Também o patrão do CTG (Centro de Tradição Gaúcha) da cidade de Mineiros, Paulo José Tavella, pode ser considerado um dos típicos migrantes do Sul. Filho de um casal de Sarandi, nasceu em Joaçaba, Santa Catarina, onde sua família, gaúcha, trabalhava com agricultura. No começo dos anos 60, quando começou a ocupação do Oeste do Paraná pelos gaúchos, seus pais mudaram-se para Cascavel. E foi de lá que ele saiu, no ano de 1983, em direção a Mineiros.

Vejam que coisa fantástica que deve ser analisada: primeiro, vieram os imigrantes da Itália e da Alemanha e se instalaram no Rio Grande do Sul; a segunda geração saiu do Rio Grande do Sul e foi para Santa Catarina e Paraná; e a terceira geração saiu de Santa Catarina e Paraná para o Oeste do Brasil. É algo fantástico o espírito empreendedor e a garra dessa gente!

Hoje dedicado à metalúrgica, Paulo José Tavella destaca a completa adaptação dos gaúchos a Mineiros, Município que, além de ocupar a maior parte do Parque Nacional da Ema, foi uma espécie de encruzilhada na diáspora gaúcha, já que fica a 80 quilômetros de Mato Grosso e a 150 quilômetros de Mato Grosso do Sul.

Meu querido Presidente Paulo Paim, Srs. Senadores, quero, agora, falar um pouco sobre a presença de agricultores gaúchos no grande Estado de Minas Gerais.

Vou começar por um fato curioso. Existe em Minas Gerais uma cidade chamada Chapada Gaúcha. Isso mesmo: Chapada Gaúcha. Nela fica a entrada para o Parque Grande Sertão Veredas, que tem como um dos objetivos preservar aquelas terras e rios que serviram de cenário para o formidável romance de João Guimarães Rosa.

Hoje, com dez mil habitantes, Chapada Gaúcha teve origem num programa de assentamento criado em 1976 pela Fundação Rural Mineira (Ruralminas), que cuidava de colonização e titulação de terras. A escolha dos agricultores sulistas para ocupar essa extensão de terras devolutas no Norte de Minas se deu por intermediação de um cidadão gaúcho que trabalhava no Incra. Foi ele quem sugeriu à empresa mineira que recorresse a agricultores pobres do Rio Grande do Sul.

Foi assim que, pelo Programa de Assentamento Dirigido da Serra das Araras (PADSA), foram instaladas no local, inicialmente, cerca de dez famílias. Ao final do programa, já havia 60 famílias, originárias principalmente das cidades de Espumoso, Ibirubá, Não-me-Toque e Passo Fundo.

A produção inicial foi restrita à soja. Hoje, além de grãos, Chapada Gaúcha é uma importante produtora de sementes de capim, vendidas para todo o País. O clima é agradável, porque a cidade fica 900 metros acima do nível do mar.

Ao falar de sua passagem por Chapada Gaúcha, Sérgio Abranches escreveu no sítio RepórterBrasil:

No trajeto medi uma plantação de soja com 15 quilômetros de frente. Não dava para ver o fundo. Os retões de 5 quilômetros ou mais são comuns. Tudo plano, tudo grande e tudo coberto de soja. Tratores e colheitadeiras novinhos alinhavam-se à espera da hora da colheita. São campos irrigados onde antes era cerrado.

Segundo Narciso Elói Barão, um dos agricultores sulistas da Chapada Gaúcha e patrão do CTG Chama Crioula, as cidades mineiras que mais contam com agricultores gaúchos são: Unaí, Bonfinópolis de Minas, Formoso, Buritis e Paracatu. Com ele concorda Pedro Jari Taborda, agricultor natural de Santo Ângelo, que veio de Itaqui para Buritis em 1984.

Integrante do CTG - Centro de Tradições Gaúchas - Nova Querência de Buritis e ex-prefeito da cidade, Taborda conhece bem os gaúchos que se instalaram naquelas cidades mineiras, nas proximidades de Brasília. Ele acredita que entre 40 e 80 famílias vivem em cada um desses Municípios: Unaí, Bonfinópolis de Minas, Formoso, Buritis, Arinos e Paracatu.

Arrendatário de 300 hectares de terras no Sul, Taborda resolveu comprar uma propriedade de 600 hectares em Buritis, Minas Gerais. Em 1982, pagou pela terra o mesmo que gastava, em um ano, com um arrendamento lá no Sul. Com o que gastava para arrendar no Sul comprou a sua terra, para plantar soja e arroz. Dois anos depois, quando se instalou em Minas Gerais, começou a incentivar os irmãos a se mudarem para o Estado. Em poucos anos, nove irmãos, Taborda e seus pais adquiriram propriedades na região, que tem a soja como principal produto, além do arroz e do milho.

Sr. Presidente Paim, Srs. Senadores, deixando Minas Gerais, vamos passar ao Estado de Tocantins. Criado em 1988, como desmembramento de Goiás, o novo Estado contou, a partir de então, com um grande número de migrantes gaúchos, não apenas na área rural, como é mais comum, mas também na nova capital que surgia, a cidade de Palmas.

Planejada e construída em pouco tempo, como Brasília, Palmas foi fundada em 1990. Por essa época, recebeu uma grande leva de profissionais liberais do Sul, como informa o advogado Carlos Vieczorek, atual patrão do CTG da capital tocantinense, que reúne mais de mil associados.

A entrada dos gaúchos em Tocantins começou pela cidade de Gurupi, em meados dos anos 70, quando as primeiras levas chegaram, para explorar a agricultura. Eram cerca de 50 as famílias pioneiras. Especulava-se à época que Gurupi seria escolhida para capital do novo Estado a ser criado. O maior grupo desses migrantes pioneiros era originário de Palmeira das Missões, no Rio Grande do Sul. O sonho deles, porém, afundou, quando o Brasil praticamente quebrou nos anos do Governo Sarney. Muitos desses pioneiros foram obrigados a mudar de ramo, transferindo-se para outra cidade.

O segundo grande fluxo de migração sulina ocorreu durante a construção de Palmas, mas, naquela ocasião, a maioria dos que chegavam era formada por profissionais liberais. Os médicos, dentistas, advogados gaúchos são numerosos na capital tocantinense. Também é elevado o número de professores, em todos os graus, e de funcionários públicos.

Como as terras ao redor de Gurupi e de Palmas não eram as mais adequadas à agricultura, os gaúchos que se dedicavam às lides do campo começaram a abrir novas frentes de produção no Estado.

Entre as cidades com forte presença de agricultores vindos do Sul, destacam-se Pedro Afonso (perto da divisa com o Maranhão), Campos Lindos (centro do Estado), Lagoa da Confusão (Sul), Dianópolis e Taguatinga do Tocantins (divisa com a Bahia), Porto Nacional e Dueré.

Carlos Vieckzorek, um típico migrante gaúcho em Palmas, é natural de Seberi, mas formou-se em advocacia em Cruz Alta, quando ainda morava em Três Passos. Em 1989, mudou-se para o novo Estado e, nos anos seguintes, trouxe irmãos e cunhados. Hoje, na maioria, os Vieckzorek exercem funções públicas em Tocantins.

A presença dos gaúchos também é muito forte no campo. Segundo Silvio Sandri, considerado o primeiro produtor de soja do Tocantins, que reside na cidade de Pedro Afonso, a sua região - que engloba ainda os Municípios de Santa Maria (onde há forte presença de gaúchos), Bom Jesus e Guaraí - é responsável por um terço da produção de soja, milho e sorgo do Estado.

A mudança de Silvio Sandri, natural de Colorado, para o interior tocantinense é bastante peculiar. Em 1980, ele comprou uma pequena propriedade em Tocantins. Passou a viajar entre os dois Estados. Durante nove anos, ele ficou procurando sementes de soja que se adaptassem ao clima da zona, que é quente e úmido, com chuvas intensas.

Em 1989, quando uma entidade japonesa financiou a aquisição de 40 propriedades de mil hectares na região de Pedro Afonso, Sandri foi contemplado. Diz ele: “O interessante é que já naquela época os japoneses estavam preocupados com a falta de alimentos no futuro”.

É assim que Sílvio Sandri descreve sua luta para plantar na nova terra:

Pesquisei sozinho, sem financiamento de bancos, sem ajuda de técnicos, porque não havia agrônomos na região nem vendedores de adubos. Tive que comprar calcário no Maranhão, a 580 quilômetros daqui. O Banco do Estado de Tocantins mandou seus técnicos filmarem todo o meu processo de produção. Só depois que comecei a ter boas safras foi que o banco passou a financiar plantações de soja em Tocantins.

         Os gaúchos que tentaram produzir na região com sementes trazidas do Sul, adequadas ao clima frio, não tiveram sucesso. Em 1992, Sandri já conseguia uma produtividade de 52 sacas por hectare, bem maior do que a produtividade à época no Rio Grande do Sul.

As perspectivas agora são excelentes. A partir de 2010, a produção da região de Pedro Afonso será levada por trem ao Porto de São Luís. Também em breve começará a ligação por hidrovia com a capital maranhense.

No Sul de Tocantins fica Lagoa da Confusão, cidade de 8 mil habitantes, que também conta com uma presença muito grande de gaúchos. Comerciante na cidade desde 1992, o gaúcho Moacir Ferri diz que a migração para a região foi feita de forma autônoma. Estima-se que o primeiro gaúcho a chegar à área - um senhor chamado Ari Mota, de Santiago - teria desembarcado ainda na década de 60, quando a região pertencia a Goiás.

Segundo o folclore local, o nome da cidade teria origem em uma luta terrível entre um jacaré e uma anta na margem da lagoa que banha a cidade.

A trajetória de Moacir Ferri é bastante encontrada entre os migrantes gaúchos. Nascido em Tapera, no Rio Grande do Sul, mudou-se para São Nicolau a fim de trabalhar na agricultura. De lá foi a Mato Grosso, de onde se transferiu, mais tarde, para a Bahia e, a seguir, para o interior de Tocantins, onde está há 18 anos. Depois de ter tido grande prejuízo com a agricultura, Moacir Ferri dedica-se hoje ao comércio de produtos para agricultura e ao aluguel de máquinas agrícolas. “No Rio Grande do Sul, penei com geada e com seca. Aqui, não quero saber de agricultura”. Quando chegou à Lagoa da Confusão, a cidade não contava com quase nenhuma infra-estrutura. “Isso aqui era um poeirão só”, diz ele. Segundo o comerciante, que foi Vereador por seis anos na cidade, os gaúchos de Lagoa da Confusão vieram, principalmente, da cidade de Ijuí, Santiago e São Francisco.

Lagoa da Confusão fica a 56 quilômetros da Ilha do Bananal, a maior ilha fluvial do Brasil e a cerca de 200 quilômetros de Palmas, capital do Tocantins.

Sr. Presidente Paim, Srªs e Srs. Senadores, passo agora a falar da presença determinante que os gaúchos tiveram na inclusão do Estado da Bahia entre os maiores produtores de grãos do País.

Quando se fala em gaúchos da Bahia, temos que, obrigatoriamente, pensar em duas cidades. Uma delas é Barreiras, emancipada em 1891, que recebeu os primeiros migrantes sul-rio-grandense. A segunda cidade tem hoje o nome de Luís Eduardo Magalhães, em homenagem ao nosso querido e ilustre líder político, também conhecida como LEM - Luís Eduardo Magalhães -, que tem menos de dez anos de criação, mas que apresenta hoje uma das mais elevadas taxas de crescimento do Brasil, tanto no que se refere à produção agrícola quanto no quesito população.

Estima-se que a chegada dos gaúchos ao extremo Oeste da Bahia se deu a partir do final dos anos 70. Instalaram-se inicialmente em Barreiras e mais tarde transferiram-se para LEM, cujas terras eram mais férteis. Pouco depois, o avanço dos sul-rio-grandenses atingiu todo o Oeste da Bahia, transbordando para o Sul do Piauí e do Maranhão.

Os agricultores gaúchos que se instalaram em Luís Eduardo Magalhães, em boa parte, vieram através de cooperativas agrícolas do Sul que compravam as terras. As cooperativas que mais enviaram gente para o Oeste da Bahia foram as de Panambi, Ijuí e Erechim.

O motivo da viagem para a Bahia era o mesmo de sempre. Como no Rio Grande do Sul possuíam pequenas propriedades, esses agricultores não tinham perspectivas de crescimento. Partiram, então, em busca de terras mais baratas, onde poderiam construir e conseguir propriedades maiores e mais rentáveis.

Além dos agricultores, logo começaram a chegar à região também migrantes que vinham se estabelecer nas cidades com empresas de prestação de serviços à agricultura, vendas de insumo ou mesmo criando indústrias de apoio ao agronegócio.

Segundo a gaúcha Daniela Ponsoni, que participa do CTG de Luís Eduardo Magalhães, inicialmente a produção local era apenas de soja. Porém, depois, passou ao algodão, ao milho e ao café. Hoje, também é forte a produção de hortifrutigranjeiros.

Para se ter uma idéia do crescimento espantoso da cidade, basta citar que Luís Eduardo Magalhães, embora fundada no ano 2000, registrou mais de 45 mil habitantes, num levantamento em março de 2007. Embora os gaúchos sejam a colônia mais numerosa, há brasileiros de outros Estados, com forte presença de nisseis vindos do Norte do Paraná, e estrangeiros (na maioria, norte-americanos).

De acordo com Daniela Ponsoni, quando ainda estavam no Sul, os agricultores gaúchos tinham uma visão distorcida do que seria o cerrado. Achavam que o solo era pobre. Porém, quando chegaram à Bahia, com o uso de tecnologia e boa adubação, obtiveram alta produtividade. Muitos dos primeiros a chegar à região enfrentaram grandes dificuldades, mas a adaptação não foi difícil. Logo a seguir, muitos outros pecuaristas e agricultores do Sul do País passaram a chegar, atraídos não só pela topografia plana, mas também pela abundância de água.

A cidade de Luís Eduardo Magalhães é hoje a décima economia do Estado da Bahia. A região a que pertence é responsável por 60% da produção de grãos do Estado. A renda per capita da cidade é uma das maiores do interior do Nordeste. Seu parque industrial é composto por grandes empresas, inclusive quase 20 multinacionais. Fica em LEM a sede da maior esmagadora de soja de toda a América Latina. Sua pecuária é de alta qualidade tanto na área genérica como na tecnologia.

Já na cidade de Barreiras, a geografia divide a produção. Na região de vale, prevaleceu a pecuária. Na parte mais alta e plana, concentrou-se a produção de grãos, algodão e café.

Segundo o jornalista Eduardo Lena, do jornal Nova Fronteira, os primeiros gaúchos sofreram um choque tanto cultural quanto em relação ao meio ambiente. A cidade de Barreiras, que não tinha uma boa infra-estrutura, não soube enfrentar o crescimento acelerado, e os problemas se aprofundaram.

Para se ter uma idéia dos problemas gerados pelo crescimento acelerado, Eduardo Lena, gaúcho que há 22 anos mora em Barreiras recorda que a cidade, que tinha 70 mil habitantes em 1985, reúne hoje cerca de 180 mil moradores. A população mais do que dobrou em apenas 20 anos.

Como em outras frentes de migração, os gaúchos pioneiros se instalaram precariamente - em barracões de lona ou de plástico - nos primeiros anos, até conseguirem construir boas residências. Outra grande dificuldade nos primeiros tempos era o escoamento da safra. Praticamente não havia estradas. Os sulistas tiveram que abrir picadas com os seus tratores.

Hoje a exportação do oeste da Bahia sai para o exterior pelos portos de Ilhéus e Aratu, Salvador. Espera-se que, em 2010, comece a construção de uma ferrovia de 1200 quilômetros até o litoral.

Em Barreiras, muitos gaúchos compraram suas terras através de cooperativa. Um fato curioso levantado por Eduardo Lena é o seguinte: enquanto os homens permaneciam nas propriedades, tocando as plantações, as esposas se instalavam na cidade e davam início a empresas comerciais ou de serviços e se profissionalizavam em outras áreas, a fim de fortalecer o orçamento familiar.

Editor do jornal Nova Fronteira, Eduardo Lena chegou à região em 1989. Sua família, que tinha propriedade em Javari, veio para a Bahia em busca de terras mais baratas para produzir. No entanto, um dos seus irmãos acabou fundando o jornal quinzenal que ele hoje edita. Eduardo Lena estima que 10% dos moradores de Barreiras sejam gaúchos ou seus descendentes.

Ainda no oeste da Bahia, há grande concentração de gaúchos no distrito de Roda Velha, na cidade de São Desidério, que fica a 90 quilômetros de Luís Eduardo Magalhães.

Sr. Presidente Paim, Srs. Senadores, eu passo agora ao Maranhão.

Segundo o agrônomo Dirceu Klepker, natural de Teutônia, que trabalha na unidade da Embrapa em Balsas, a chegada dos gaúchos ao sul do Maranhão, começou há cerca de 30 anos. A meta comum dos agricultores que desembarcavam era a produção de soja. A maioria desses migrantes vinha do Planalto Médio, principalmente das cidades de Não-Me-Toque, Carazinho, Panambi, Sarandi, Chapada, Ijuí e Passo Fundo.

Passadas três décadas, ainda existe um fluxo de gaúchos para a região, mas bem menor do que o inicial. Os pioneiros do Maranhão vinham isoladamente e traziam depois seus familiares. Aberto o caminho, hoje, além das fazendas particulares, há um grande número de empresas que exploram imensas propriedades, com milhares de hectares.

A Embrapa, que já estava pesquisando na região desde o final da década de 70, apresentou, em 1986, a primeira variedade de semente de soja específica para a região, chamada “Tropical”. As variedades produtivas, desenvolvidas pela estatal ao longo dos últimos vinte anos passam agora de 25.

De acordo com Dirceu Klepker, a soja continua sendo a principal cultura da região, mas existem outras associadas a ela, como milho, feijão, algodão, e arroz. Atualmente, o sul do Maranhão responde por 80% da produção de soja no Estado.

Em declaração publicada na página eletrônica da Embrapa, o pesquisador Milton Kaster, que era chefe de pesquisa na época de criação do Campo Experimental, em 1986, disse que o trabalho que se vê hoje em Balsas corresponde plenamente às melhores expectativas que foram geradas no princípio do projeto. Diz Milton Kaster:

O fato de todo o trabalho realizado lá ter se expandido para outros Estados como o Pará, Piauí, Roraima, Tocantis e Bahia mostra que foram desenvolvidas cultivares de soja produtivas e outras tecnologias que viabilizaram seu cultivo.

Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Maranhão, Piauí e Tocantins cultivaram, na última safra, um milhão de hectares de soja, produzindo 2,4 milhões de toneladas de grãos.

Antídio Sandri, gaúcho de Iraí, foi um dos migrantes do Sul a desembarcar no Maranhão, em 1976, ano em que chegaram as oito primeiras famílias pioneiras. Como em outras frentes, os que se instalavam traziam depois os seus parentes. Todos os irmãos Sandri, em número de quatro, compraram propriedades em cercanias do Município de Balsas.

As áreas mais distantes da sede, mesmo sendo ótimas para a agricultura, como na Serra dos Penitentes, à época eram vendidas ao custo de uma carteira de cigarros por hectare. As terras eram vendidas, Senador Paim, ao preço de uma carteira de cigarros por hectare, lembra Antídio Sandri.

No começo, as condições de vida para os pioneiros eram péssimas. Era comum a falta de energia elétrica. Havia um só posto de gasolina na cidade, e, certa vez, na falta de combustível, os moradores de Balsas tiveram que viajar 250 quilômetros para abastecerem seus veículos, porque não havia telefone.

Antídio Sandri conta que, no começo, os maranhenses procuravam os gaúchos para vender suas posses. Mas, logo depois, quando viram as boas colheitas, se animaram a plantar também. As fazendas adquiridas na época pioneira tinham, em média, de 300 a 1000 hectares.

Antídio Sandri, que começou a plantar em 30 hectares, em 1980, não conhecia bem nem o clima e nem o solo. As variedades que eram trazidas do Sul não davam resultado. Mas a deficiência logo seria suprida pelas pesquisas da Embrapa, em busca de sementes próprias para a região.

A cidade de Balsas que, em 1977, tinha 35 mil habitantes, hoje conta com 90 mil habitantes. O Município tem crescido nos últimos anos ao ritmo de 20% ao ano. Em outras palavras, Balsas cresce num ritmo que é o dobro do registrado na China.

Moram em Balsas muitos produtores gaúchos que têm propriedades em cidades próximas, como Riachão, Sambaíba e Mangabeiras. Principal cidade do extremo Sul do Maranhão, distante 800 quilômetros da capital daquele Estado, Balsas tem uma boa rede de assistência à saúde, boas escolas e grandes lojas.

A soja produzida na região tem três destinos: é vendida às esmagadoras da região; é exportada pelo porto de São Luís; ou é vendida aos criadores de aves do Nordeste (especialmente Ceará e Pernambuco), sendo essa última venda a mais rentável para o produtor. “Essa é a melhor região do Brasil para plantar soja. E olha que eu conheço todo o Brasil”, diz Antídio Sandri.

Sr. Presidente Paim, Srs. Senadores, para encerrar o pronunciamento de hoje, quero falar agora do Estado do Piauí, ou como diz o meu querido Mão Santa: o Estado do Piauí!.

A migração dos gaúchos para o Piauí é a mais recente, e uma das mais bem sucedidas.

Bom Jesus e Uruçuí, os dois Municípios piauienses que contam com grande presença de produtores agrícolas originários do Rio Grande do Sul, são responsáveis por 80% da soja produzida naquele Estado.

Nova Santa Rosa, distrito da Cidade de Uruçuí, tornou-se hoje um grande produtor de soja depois da instalação ali, a partir de 1999, de cerca de 50 famílias gaúchas, na sua maioria, originárias da região de Santa Rosa.

Essas famílias chegaram à região apoiadas pela Cotrirosa, que deu a eles assistência jurídica para verificar a validade das escrituras da terra e assistência técnica no plantio.

Atualmente, são mais de 100 famílias sulistas morando naquele distrito. As propriedades que, no começo, variavam entre 150 hectares a 1000 hectares, hoje chegam a milhares de hectares. Como em outras áreas da fronteira agrícola, os agricultores que chegavam ao Piauí adquiriam a terra com o dinheiro de venda das suas pequenas propriedades no Sul.

Para se ter uma idéia da valorização dessas terras, basta lembrar que um hectare em Nova Santa Rosa, há dez anos, valia dez sacas de soja. Hoje o preço chega a 40 sacos de soja, em se tratando de terra virgem, mato fechado. Mas os gaúchos pioneiros tiveram que investir muitos recursos para abrir suas propriedades para a plantação, bem como para a correção dos solos. No Rio Grande do Sul, na região de Santa Rosa, atualmente, um hectare pode valer 500 quilos.

Como ocorre desde o início do século passado, os primeiros a chegar a Nova Santa Rosa tiveram que morar em barracas de lona. As ruas da sede foram abertas com tratores dos cidadãos. O distrito dista 120 quilômetros de Bom Jesus e 165 quilômetros de Uruçuí.

Já na cidade de Bom Jesus, onde as propriedades em geral são maiores, os migrantes são majoritariamente gaúchos que passaram por outros Estados, como Goiás e Mato Grosso, e, depois, foram para o Piauí.

O gaúcho Evandro Tonel, que trabalha numa empresa processadora de soja, chegou a Nova Santa Rosa há quatro anos, vindo do Maranhão. Nascido em Horizontina, de uma família de pequenos proprietários rurais, mudou-se com os pais para a cidade goiana de Mineiros. De lá, foi ao Maranhão e, hoje, reside em Nova Santa Rosa com a esposa e os filhos. Gosta da região. Diz que o clima é bom: “Nas noites de frio, temos até que usar uma cobertinha”.

Sr. Presidente Paulo Paim, Srs. Senadores, ao encerrar este meu pronunciamento, quero estender o meu abraço aos milhares de agricultores gaúchos espalhados por todo este País.

Graças a essa gente trabalhadora e digna, o Brasil vem conseguindo manter no azul as suas contas externas. O superávit nacional dos últimos anos tem sido garantido pelo campo, pelas nossas exportações de grãos e de carne.

No ano passado, o País teve um superávit de US$40 bilhões nas suas contas externas, sendo que o superávit agrícola foi de US$49,7 bilhões. Ou seja, sozinho garantiu o saldo positivo.

Agora, em pronunciamento recente, o Ministro Reinhold Stephanes, da Agricultura, estimou que, em 2008, o superávit agrícola chegará a US$60 bilhões.

O que eu disse aqui em alguns parágrafos pode ser resumido em poucas palavras: os nossos produtores rurais estão levando este País nas costas.

A essa gente eu mando a minha saudação. Entre os produtores rurais deste País, os gaúchos ocupam lugar de destaque, porque foram eles que estenderam a produção agrícola por todo o nosso território brasileiro.

Nos anos 20, os gaúchos foram para o Oeste de Santa Catarina e o transformaram no celeiro que é hoje. Nos anos 40 e 50, começou a colonização do Oeste do Paraná por gaúchos e por filhos de gaúchos nascidos em Santa Catarina. Nos anos 70, os migrantes chegaram a Mato Grosso e Rondônia - são gaúchos ou catarinenses e paranaenses filhos de gaúchos. A partir de meados dos anos 70, começou a anexação do Cerrado, que hoje relatei, levada adiante pelos nossos novos bandeirantes.

Falarei do Norte, de Estados como Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Ouço V. Exª com o maior prazer.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Simon, V. Exª mostra que não é apenas Senador do Rio Grande do Sul: é Senador dos gaúchos, além de ser hoje um Senador querido em todo o Brasil. Felicito-o por vir aqui defender essa saga, essa diáspora, essa aventura de ocupação de todo o território nacional, nas mãos, na cabeça, nos pés dos gaúchos. O Distrito Federal, que as pessoas vêem apenas como a Capital da República, possui um setor agrícola dinâmico, o que as pessoas aí fora não sabem. Há o Padef, programa que trouxe os gaúchos, deu apoio aos gaúchos para que apresentassem uma considerável produção agrícola. Como Governador do Distrito Federal, freqüentei constantemente os gaúchos que estão tão perto de onde estamos, dentro do quadrilátero do Distrito Federal, e que estão transformando Brasília em algo maior do que a Capital da República: além de capital, tem um setor agrícola e industrial ativos. Nós temos uma grande dívida com esses gaúchos que estão fazendo o Distrito Federal maior do que a Capital da República. Circulo com eles, que me apoiaram muitas vezes, e fico feliz que V. Exª tenha trazido o nome deles. Mas quero pegar um gancho no discurso de V. Exª para defender um projeto meu de reforma da Constituição. V. Exª é gaúcho, representa o Rio Grande do Sul. V. Exª está aqui defendendo os gaúchos, mas nenhum Senador vem aqui defender a diáspora brasileira no exterior. É por isso que apresentei um projeto, que está na Mesa desde janeiro, para criar parlamentares representantes dos brasileiros no exterior. Não é uma idéia minha: isso já existe na Espanha, já existe em Portugal e na França, países de emigrantes. O Brasil era um país de imigrantes, mas agora é um país de emigrantes: tem mais gente saindo do Brasil para residir fora, não para passear, do que gente de fora vindo morar no Brasil. Temos três milhões de brasileiros hoje no exterior, e não há ninguém no Congresso que os represente formalmente, por obrigação do cargo que ocupa. Esse projeto está na Mesa, e o seu discurso em defesa dos gaúchos mostra o quanto é importante termos, se não um Senador, um Deputado que represente os brasileiros desse 28º estado que é hoje formado pelos brasileiros que moram no exterior. Esse projeto não foi votado, mas insisto em dizer que deveria ser votado aqui. Um dos argumentos que os Líderes com os quais conversei apresentaram é que, se o projeto for aprovado, vamos aumentar gastos no Congresso. Eu penso só em quatro parlamentares. Isso não vai aumentar significativamente nossos gastos, porque os custos fixos continuam os mesmos, e são estes os que realmente pesam. Seriam quatro pessoas apenas, mas, se for necessário, podemos reduzir esse tiquinho de dinheiro com o corte de outros gastos, como, por exemplo, aqueles relativos ao ar condicionado tão frio que temos nesta manhã de sexta-feira. Se fizermos isso, teremos os recursos necessários para dar cidadania aqui dentro para os brasileiros que estão no exterior. Os problemas deles são muito grandes, sobretudo aqueles que dizem respeito à educação de seus filhos. Especialmente os nossos emigrantes no Japão, quase trezentos mil, precisam que a gente olhe por eles. Alguns perguntam: “Mas o que a gente tem a ver com eles?”. V. Exª cita os Centros de Tradição Gaúcha - existem diversos CTGs no exterior -, e a gente vê que é importante manter o vínculo cultural com esses brasileiros, especialmente seus filhos falarem português, seus filhos manterem a ligação conosco. Mas não esqueçamos que esses brasileiros estão mandando o que se calcula hoje em US$5 bilhões por ano. Isso representa pouco mais do que produz a soja se não me engano. V. Exª está aqui demonstrando a importância de termos parlamentares que representem os brasileiros da diáspora, sejam os gaúchos dentro do território, sejam os gaúchos ou brasileiros de outros Estados que tiveram de ir para o exterior em busca de uma alternativa de vida. Fico feliz que haja aqui um Senador gaúcho representando os gaúchos.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Eu agradeço, primeiro, a gentileza das referências que V. Exª fez aos gaúchos de Brasília. Essas referências são importantes, porque V. Exª foi um grande Governador desta terra e, como Governador, teve oportunidade de conhecer, ver, sentir e dar o seu testemunho, que eu considero da maior importância.

Em segundo lugar, quero dizer que acho significativo o seu projeto. Realmente, hoje a situação está invertida: o Brasil, que esteve entre os países que mais acolheram de braços abertos emigrantes de todas as regiões do mundo, hoje vê brasileiros irem para o exterior. Esses emigrantes brasileiros precisam de uma representação sim, o seu projeto é da maior importância. Eu vejo alegria no Rio Grande do Sul e no Brasil pela votação que houve agora para o Senado italiano, votação da qual participaram cidadãos italianos residentes no exterior: eles puderam votar e escolher o seu Senador.

Termos essa representação é algo muito positivo e muito significativo. Acho que o argumento baseado em gastos apresentado pelos Líderes é muito sem significado, é até meio fraco esse argumento. Eles podem dizer que são favoráveis ou não ao projeto por essa ou por aquela razão. Se o projeto é importante, se é significativo, não devemos pensar em economia. Há tanta coisa para economizarmos das quais os Líderes não se lembram de economizar, há tanta coisa para cortar... E vão agora se lembrar disso por causa dessa representação?

Sr. Presidente, eu me esforcei muito para que houvesse uma capela ecumênica aqui no Senado. Até consegui isso de certa forma: no Salão Negro havia uma, mas desapareceu. Quando falei e insisti nesse assunto, vieram me dizer que tinham tomado uma decisão: no novo anexo que o Senado iria construir, haveria um lugar especial para a capela. Eu disse então: “Pelo amor de Deus, se é para fazer um novo anexo por causa da capela, eu retiro, por aí não”.

Então, há tantas coisas que a gente faz, que acho que esse argumento é muito infeliz. Mas a sua tese é realmente muito importante e muito significativa.

Vejo a decisão que a Europa tomou agora como uma decisão cruel. Por exemplo, os estrangeiros que foram pilhados de lá sem o registro legal e ficaram não sei quantos meses presos antes de vir para cá. Não há explicação, não há justificativa.

E o interessante é que países como a Itália e a Alemanha sempre foram bem recebidos em todos os lugares do mundo. Mas os brasileiros que porventura queiram ir para lá são recebidos com grande restrição. E outra coisa muito interessante: durante muito tempo, quem estimulou a ida de brasileiros e estrangeiros para lá foram eles próprios. Quando começaram a ficar ricos, estar bem, começaram a não querer sujar as mãos. Antes, o trabalho pesado e duro era feito pelo imigrante. Mas agora já há uma fórmula diferente, e eles não querem que isso aconteça mais.

Acho muito importante o projeto de V. Exª.

Pois não, Senador Mozarildo Cavalcanti.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Pedro Simon, já falei várias vezes a V. Exª que o considero verdadeiramente um Senador da República.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Muito obrigado.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Especialmente com relação à Amazônia, poucas pessoas do Sul, o chamado “sul maravilha”, conhecem tanto e se dedicam tanto à Amazônia como V. Exª. Embora V. Exª tenha dito, no início do pronunciamento, que iria abordar a migração dos gaúchos para alguns Estados e que, só no próximo, contemplaria Roraima, quero, como um Senador de Roraima, dizer a V. Exª, em primeiro lugar, que admiro muito esse patriotismo de V. Exª. Em segundo lugar, quero dar um testemunho. A Amazônia, por exemplo, de Plácido de Castro, no Acre, que comandou - digamos assim - a grande revolução, juntamente com inúmeros nordestinos. Eu diria que os grandes migrantes do Brasil foram os nordestinos e os gaúchos. Lá no meu Estado devemos muito aos gaúchos no que tange à produção, à produtividade, especificamente; à tecnologia que levaram. E quero até fazer um registro, aproveitando esse pronunciamento de V. Exª, em que falou na diáspora. Os gaúchos saíram do Rio Grande do Sul para levar a todo Brasil a sua experiência, o seu trabalho, o seu amor à produção. Em Roraima, na borda da famosa Reserva Raposa Serra do Sol, que não era reserva na época, os gaúchos que foram para lá compraram fazendas com dinheiro do seu bolso, não foi com financiamento público. E eles não foram levados para lá por nenhum tipo de ação governamental. Hoje, produzem 25% do PIB de Roraima. E estão, Senador Pedro Simon, ameaçados de serem expulsos de lá porque o Governo brasileiro acha que eles devem sair, uma vez que resolveu demarcar uma reserva indígena de 1,7 milhão de hectares. E o Governo alega que o problema deles seria resolvido com 21 mil hectares, apenas. E o problema de todos as 458 famílias de lá seria resolvido com 320 mil hectares. Mas quero, por meio de V. Exª, cumprimentar os gaúchos de Roraima e dizer que realmente me sinto feliz de ver que nós, de Roraima, somos frutos, em primeiro lugar, de uma migração nordestina, depois sulista; notadamente com uma grande colaboração dos gaúchos, inclusive dos CTGs que lá estão.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Eu agradeço a V. Exª e quero dizer que realmente voltarei a esta tribuna para abordar temas sobre os Estados nortistas.

Sei da presença dos gaúchos em Roraima, inclusive na política. Eles avançaram, desenvolveram, cresceram. E quero dizer uma coisa a V. Exª, que considero muito importante, muito importante: esses gaúchos que saíram do Rio Grande, Santa Catarina, Paraná, Brasília, Goiás, Mato Grosso, Bahia e, agora, o Norte, eram famílias que tinham suas terras no interior do Rio Grande do Sul. Viviam muito bem, obrigado! Mas eram famílias que tinham 10, 12 filhos, e a distribuição da terra não lhes permitia permanecer ali. O Governo do Estado do Rio Grande do Sul - e sou a favor do que estou falando, considero uma coisa fantástica - fez uma coisa: houve migração para todo o Brasil e os gaúchos fizeram milagres em todo o Brasil. Só não deixaram esses gaúchos irem para a fronteira do Brasil, para uma metade do Rio Grande do Sul que é a terra do grande latifúndio, a terra das grandes propriedades. Assim como esses gaúchos foram para as outras regiões, eles poderiam ter ido para o nosso sul, poderiam ter ido para a Região Sul, para a Região Norte, porque nas cidades de onde eles saíram, hoje há um vazio enorme.

O que é importante e que eu quero dizer, Senador Paulo Paim, Senador Mozarildo Cavalcanti, é que esses gaúchos que vieram do interior tinham uma formação espetacular. Viviam na terra, mãos calejadas, mas havia uma formação. Desde o primeiro imigrante alemão, o italiano, ao longo do tempo, eles tinham o sentido de família, eles tinham o sentido de fé, eles tinham o sentido da educação, de escola, de cultura. Eles tinham o sentido de trabalho e, principalmente, de trabalho comunitário. As cooperativas do Brasil nasceram no Rio Grande do Sul, nessa zona de colonização. A primeira cooperativa que se formou no Brasil foi a Nova Petrópolis. Essas famílias, a maneira como elas chegavam, como cresciam... É uma epopéia fantástica na minha terra e a terra do Senador Paulo Paim - nós somos de Caxias - o que foi a ocupação daquela região. Era morro, mato. Não tinha nada. O Rio Grande do Sul que cresceu e se desenvolveu, do Getúlio, do Jango, o grande Rio Grande da História era lá na fronteira, extensões de terras riquíssimas, planícies e mais planícies. O Rio Grande do Sul era um grande produtor de gado. As famílias eram milionárias. Os filhos de toda aquela gente estudavam na Europa, na França, nas universidades, uma cultura enorme.

Na região de colonização italiana não, nem alemã. Primeiro vieram os alemães. Tiveram sorte, pegaram o vale dos rios. Quando os italianos vieram, tiveram que subir a montanha. Mas eles fizeram isso. Fizeram com sangue, com suor, com luta, com garra! É uma coisa fantástica ver o que eles fizeram. Mas tinham o sentido de amor, o sentido da seriedade, o sentido da dignidade, o sentido da pureza.

E a primeira coisa que eles faziam era construir uma igreja. A família era algo sagrado, a organização familiar, o respeito pelo pai, pela mãe, pelos irmãos.

A escola era a coisa mais importante que eles tinham. A colonização alemã ia além, além da escola, havia o coro, a orquestra, a cultura e o trabalho cooperativo de organização. E essa gente com essa pureza - ainda não tinha entrado a televisão com suas novelas, não havia essa violência, esse arbítrio, essa loucura que é hoje o Brasil -, essa gente com esse espírito é que foi lá para o interior.

            Isso é muito importante. Eu não sei se estou sendo claro no que estou querendo dizer. Esse espírito, essa organização, essa beleza de organização, esse amor, esse carinho, esse afeto, pai, mãe, filho, família, a Igreja, a fé, a cultura, o trabalho, a criança... Com dez anos, por exemplo, a criança está trabalhando, ajudando na organização, mas também está estudando. Primeiro estudar para depois poder trabalhar.

Esse espírito foi junto. Esse espírito foi junto. É por isso que é uma coisa fantástica.

Se chegarmos em Roraima... O Senador Cristovam Buarque pode verificar isso aqui em Brasília. Lá está o Centro de Tradições Gaúchas (CTG), que é uma organização cultural, de beleza, de dança, de música, de amor pela Pátria, de entretenimento, de alimentação, de roupa, de vestuário.

E aqui em Brasília, o CTG, aos domingos, duas vezes por mês, convida-nos para comer aquele costelão. E eles nos recebem de bombacha, de bota, de lenço vermelho, com o chimarrão e a cuia. Isso eles estão preservando. E, com todo o respeito ao Brasil, os gaúchos têm de fazer isso. A colônia nordestina é fantástica, cheia de valor, de brio, mil por cento, bem como a paulista. Porém, os gaúchos conservam suas tradições.

Então, é isto que eu digo: quando se vê um gaúcho no Paraná ou em Roraima, em primeiro lugar, ele é apaixonado pela terra dele, Paraná ou Roraima - pelo amor de Deus! -, dedica-se de corpo e alma, mas o seu coração é um pouco maior, tem um lugarzinho para as saudades da terra dele, tem um lugarzinho para a música, para a dança, para o churrasco, para a polenta, para as cantorias. Isso é a mais, não é a menos. Então, isso é que importante e que cria esse sentido e essa beleza.

Em nosso País, temos de valorizar nossa cultura popular. A Bahia tem o seu folclore fantástico! Achei espetacular - não sei se foi exibida na TV Bandeirantes - a festa da Amazônia. Pretendo, no ano que vem, ir lá. Todo mundo me falava que era espetacular, que era espetacular, mas eu não tinha tido a chance de ver. Vi na televisão, não sei se o Senador Cristovam viu, acho que foi a TV Bandeirantes que mostrou toda a festa. Achei qualquer coisa de sensacional aquilo que eles fazem. Quer dizer, um dia desfila uma escola; no outro dia, outra escola. O povo está todo nas ruas. O torcedor de uma escola alucina-se de bater palmas, de gritar, de bater por sua escola. O da outra escola assiste - não tem uma vaia, mas não tem um aplauso - num silêncio total. No outro dia, é o contrário.

É uma coisa que vem ao longo da história. É por isso que, com toda sinceridade, tenho uma mágoa lá do Rio Grande do Sul. Usei muito a tribuna do Rio Grande do Sul e, como Governador, quis fazer isto, não mudo uma vírgula da ida dos gaúchos, acho que é um belo trabalho, é um fato novo no Brasil, mas eu não perdôo não terem olhado para a nossa fronteira, não terem olhado para a zona norte do Rio Grande do Sul, onde há áreas enormes que esses gaúchos também poderiam fazer crescer, desenvolver.

Foi muito bom, durante o meu pronunciamento, ter V. Exª na presidência, Senador Paulo Paim. V. Exª hoje é gaúcho, brilhante gaúcho, representando o Rio Grande do Sul, mas, se há um Senador nacional, é V. Exª. Além das nossas causas do Rio Grande do Sul, V. Exª defende as causas nacionais, em relação ao menor, à injustiça, ao aposentado, à questão racial, à cultura. V. Exª é indiscutivelmente um grande nome, é um Senador da República e temos muito orgulho de V. Exª.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/08/2008 - Página 29829