Discurso durante a 235ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Destaque para a trajetória dos gaúchos rumo ao Estado do Mato Grosso.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Destaque para a trajetória dos gaúchos rumo ao Estado do Mato Grosso.
Aparteantes
Gilberto Goellner, João Pedro, Serys Slhessarenko.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/2008 - Página 51302
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • CONTINUAÇÃO, HISTORIA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), MIGRAÇÃO, POVO, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), ESTADO DO PARANA (PR), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ESTADO DO TOCANTINS (TO), ESTADO DA BAHIA (BA), ESTADO DO PIAUI (PI), ESTADO DO MARANHÃO (MA), ESTADO DE RONDONIA (RO), ESTADO DE RORAIMA (RR), BUSCA, TERRAS, CONTRIBUIÇÃO, COLONIZAÇÃO, TERRITORIO NACIONAL, DIFUSÃO, TRADIÇÃO, CULTURA, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO AGRARIO.
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, POPULAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ORIGEM, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ESPECIFICAÇÃO, FAMILIA, BLAIRO MAGGI, GOVERNADOR, SERYS SLHESSARENKO, GILBERTO GOELLNER, SENADOR, ANALISE, LIDERANÇA, AMBITO, POLITICA, ECONOMIA, CULTIVO, SOJA.
  • REGISTRO, BIOGRAFIA, GILBERTO GOELLNER, SENADOR, AGRONOMO, DIVULGAÇÃO, TECNOLOGIA, CULTIVO, SOJA, UTILIZAÇÃO, CALCARIO, PARTICIPAÇÃO, PROCESSO, MIGRAÇÃO, EMPRESARIO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), DESTINO, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), SEMELHANÇA, SERYS SLHESSARENKO, CONGRESSISTA, VIDA PUBLICA, UNIVERSIDADE, LUTA, DEFESA, REFORMA AGRARIA.
  • ELOGIO, PROCESSO, FORMAÇÃO, POVO, BRASIL, COMENTARIO, CRESCIMENTO ECONOMICO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), APRESENTAÇÃO, DADOS, ARTIGO DE IMPRENSA, ZERO HORA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ANALISE, MIGRAÇÃO, OCORRENCIA, CANDIDATURA, MIGRANTE, ELEIÇÃO MUNICIPAL.
  • REGISTRO, INICIATIVA, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), CRIAÇÃO, SEMANA, HOMENAGEM, MIGRANTE, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), DETALHAMENTO, MUNICIPIOS, SUPERIORIDADE, RECEBIMENTO, MIGRAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, dou seqüência a uma série de pronunciamentos que comecei. E pretendo ir adiante, mostrando a história do Rio Grande do Sul e dos milhões de rio-grandenses que saíram do Rio Grande do Sul, primeiro, para Santa Catarina e Paraná; depois, para Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Tocantins; depois, para Bahia, Piauí, Maranhão, Rondônia, Roraima, e que escreveram uma história diferente da história deste País, que o mundo inteiro inclusive analisa. Não há na história do mundo o caso que está acontecendo no Brasil com os migrantes gaúchos que formaram uma nova civilização pelo interior do Brasil e que, com seus CTGs, com a sua história e com a sua biografia, mostram realmente algo que é digno de respeito e de admiração.

Já fiz extensos pronunciamentos sobre o que venho chamando de “a diáspora do povo gaúcho”, o monumental processo de migração que, desde o início do século passado, fez com que centenas de milhares de famílias de agricultores gaúchos fossem buscar terra em outras Unidades da Federação.

Estima-se hoje que são milhões de gaúchos. Um em cada dez gaúchos saíram do Rio Grande e foram viver no território brasileiro.

Nos meus pronunciamentos anteriores, fiz questão de realçar a importância desses nossos conterrâneos que, com seu trabalho árduo e amplo conhecimento de agricultura, transformaram em celeiros todos os Estados para os quais se transferiram. Aliás, não só para os outros Estados brasileiros. O mesmo fizeram as dezenas de milhares de gaúchos e seus descendentes de Santa Catarina ou do Paraná que migraram para o Norte da Argentina, Oeste da Bolívia e para o Paraguai.

No primeiro pronunciamento, esbocei em traços largos a migração dos sul-rio-grandenses para todo o País; no segundo, tratei especificamente de Goiás, Minas Gerais, Tocantins, Maranhão, Piauí, Bahia e Distrito Federal.

Quando me preparava para elaborar um estudo sobre a presença dos gaúchos na chamada Amazônia Legal, deparei-me com um fato que me surpreendeu: a participação maciça dos meus conterrâneos no extraordinário progresso de desenvolvimento vivido pelo Estado de Mato Grosso nas três últimas décadas.

O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Senador Pedro Simon, eu gostaria que V. Exª me concedesse um aparte.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Já lhe dou.

O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Senador Pedro Simon, já que V. Exª está falando da história, da cultura e da coragem, da audácia dos brasileiros gaúchos, quero fazer o registro da existência de um centro de cultura que há no sul do Estado do Amazonas, no Município de Apuí. Apuí é resultado da migração, desse deslocamento ocorrido no final dos anos 70, início dos anos 80, de um número expressivo de gaúchos que formaram esse Município. É um Município rico na produção de grãos, está ali colado com o sul do Pará e com o norte de Mato Grosso, compõe-se de brasileiros que desbravaram pelo Incra, e é uma cidade muito importante hoje. Lá existe um centro, um CTG atuante, e eles têm uma dança expressiva no Município. O Município faz a sua festa principal com a presença do grupo, da dança desse povo que hoje tem uma produção de grãos significativa no Estado do Amazonas. Lá não vivem só gaúchos, mas predominou o deslocamento dos gaúchos. A cidade começou com um pequeno projeto de assentamento que se transformou em importante Município no sul do Estado do Amazonas.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço muito o aparte de V. Exª, que melhora meu pronunciamento. Digo a V. Exª que também estou fazendo um estudo especificamente sobre o Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima, onde os gaúchos também exerceram uma presença muito impressionante.

Quero dizer que a história da diáspora gaúcha, eu já tinha noção do seu papel em Mato Grosso, mas fiquei surpreendido, minha querida Senadora, com a grandeza dos números a que tive acesso. Para começo de conversa, basta dizer que moram hoje naquele Estado cerca de cem mil rio-grandenses. Repito: cem mil rio-grandenses.

No dia de hoje, concentrar-me-ei em Mato Grosso e na migração dos gaúchos que para lá foram, gaúchos que saíram do Rio Grande do Sul e gaúchos e filhos que primeiro foram para Santa Catarina e Paraná e, de Santa Catarina e Paraná, foram para Mato Grosso.

Segundo o IBGE, no ano de 2000, 340 mil gaúchos moravam em Santa Catarina e 310 mil gaúchos moravam no Paraná.

Os sulistas, os gaúchos catarinenses e paranaenses, por sua vez descendentes de sul-rio-grandenses, formam uma comunidade numerosa bem sucedida em Mato Grosso.

A força política dessa gente está provada pela eleição de vários Senadores, Deputados Federais e Estaduais nascidos num destes três Estados do Brasil: Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul. Um dos maiores exemplos do que estou afirmando aqui é justamente o Governador de lá, Blairo Maggi. Ele saiu do Paraná e a família dele saiu do Rio Grande do Sul, inclusive lá da minha cidade de Caxias do Sul e de Torres. A família Maggi é do Rio Grande do Sul, com ramificações em Caxias e Torres.

O pai do Governador, André Antônio Maggi, e sua esposa, D. Lúcia Borges Maggi, agricultores pobres, migraram do Rio Grande do Sul para o Paraná. Lá, na cidade de São Miguel do Iguaçu, nasceu em 1956 o atual Governador. No começo da década de 70, os Maggi partiram e, mais uma vez, deixaram o Paraná e se dirigiram a uma região inóspita e pouco ocupada no Mato Grosso.

Em 1973, fundaram uma empresa de produção de sementes de soja. O negócio prosperou, dando origem ao atual Grupo Amaggi, grande produtor e exportador de soja do País, com atuação em diversas atividades.

Blairo Maggi, que herdou a vocação empresarial e política do pai, é hoje um grande plantador de soja, um dos maiores do mundo, e foi eleito Governador em 2002. Formado em agronomia pela universidade federal, na década de 70, chegou a Mato Grosso acompanhado dos pais, que haviam decidido investir no potencial agrícola do cerrado brasileiro.

No comando do Governo de Mato Grosso do Sul, Maggi colocou em prática uma nova filosofia de gestão pública, inspirada em sua experiência. Foi reeleito em 1º de outubro de 2006.

Já que estamos falando em líderes políticos de Mato Grosso, quero destacar que, aqui mesmo, no Senado, neste exato momento, temos dois representantes de Mato Grosso que são naturais do Rio Grande do Sul. Estou me referindo à querida Senadora Serys Slhessarenko, que nasceu em Cruz Alta, Rio Grande do Sul, e ao Senador Gilberto Goellner, natural de Não-Me-Toque.

Mas a verdade é que há ainda outros integrantes da diáspora do povo gaúcho que têm assento nesta Casa: Casildo Maldaner, que nasceu Selbach; Neuto de Conto, Senador natural de Encantado; e o ilustre Senador Raimundo Colombo, também do Rio Grande do Sul, Senador de Santa Catarina.

O Senador Gilberto Goellner teve participação efetiva no processo que levou centenas de milhares de gaúchos a deixarem o Sul, porque tem sua vida ligada ao início da cultura da soja no Rio Grande do Sul. Em 1967, quando estudava Agronomia na URGS, ele assistiu aos primeiros testes de uso de calcário em plantações de soja, executados por professores americanos que vinham para cá através de convênios.

Diante do uso de calcário, havia dois grupos antagônicos de estudantes: os que eram de esquerda, porque não gostavam de americanos, eram contra o uso de calcário; o atual Senador Gilberto, como conhecia os resultados da pesquisa, era a favor. Ele já havia trabalhado com soja na Cotrijal (Cooperativa de Não-Me-Toque). Por essa época, acabou sendo eleito vice-prefeito do diretório central de estudantes da Universidade do Rio Grande do Sul; um ano e meio depois, assumia a presidência.

Formado em 1970, ele trabalhou, depois, por sete anos, para pequenos agricultores da região de Não-Me-Toque, cidade que foi um dos maiores pólos de exportação de gente gaúcha para o Centro-Oeste. O Senador disseminava conhecimento sobre plantio de soja em lavoura mecanizada. Com esse trabalho, ele acredita que retribui ao Governo Federal por lhe ter dado, de graça, o curso de Agronomia. Depois de trabalhar, inicialmente, por um ano, como assistente técnico da Cooperativa, abriu um escritório particular de assistência técnica, no qual atuou por seis anos.

Em 1972, começou a fazer incursões pelo Mato Grosso do Sul, na região de Dourados e Ponta Porã. Trabalhava com um caminhão preparado para distribuir calcário pelas lavouras. Chegou a ter cinco desses veículos. Também orientava os agricultores no uso do fosfato natural junto com o calcário.

Em 1975, participou, efetivamente, do processo de migração dos gaúchos para Mato Grosso do Sul, orientando empresários gaúchos da área de calçados que estavam interessados em adquirir grandes propriedades na região de Chapadão do Sul.

Em 1977, o Senador Gilberto resolveu plantar por conta própria. Como muitos gaúchos, decidiu investir em Minas Gerais. Comprou 50 hectares em Patrocínio. Nessa época, muita gente de Não-Me-Toque foi para a região de Patos de Minas. Por lá, o Senador plantou soja e café por cinco anos. Quando perdeu a plantação de café, por causa da geada, decidiu ir para Mato Grosso.

Em 1981, ele se mudou para a região de Rondonópolis, onde passou a plantar em 1,2 mil hectares - terra adquirida com a ajuda de parentes. Cultivava 900 hectares com soja, o restante com trigo. Mais adiante, passou a produzir sementes também. Foi o primeiro Presidente da Associação dos Produtores de Sementes, sucedido no cargo por Blairo Maggi, o atual Governador.

Sempre envolvido com questões agrícolas, em especial com a transferência de tecnologia de produção, o nosso Senador nunca exerceu cargo eletivo até ser convidado para ser suplente do Senador Jonas Pinheiro. Agora ocupa o lugar daquele grande Senador de Mato Grosso, um dos líderes da luta em defesa da nossa agricultura.

Também a nossa querida Senadora Serys Slhessarenko - complicado o nome dela - conhece bem a diáspora do povo gaúcho, porque fez parte dela, como personagem. A Senadora deixou o Rio Grande do Sul, partindo de sua cidade natal, Cruz Alta, em 1966. Sua motivação foi o casamento com um Oficial do Exército que havia sido transferido para Mato Grosso.

Naquela época, lembra a Senadora Serys, o preço da terra era muito elevado no Rio Grande do Sul, de modo que era difícil comprar até mesmo uma pequena propriedade no Rio Grande do Sul. Assim, os produtores gaúchos perceberam que o Mato Grosso poderia ser uma saída, uma vez que poderiam adquirir propriedades muito maiores por um valor significativamente menor. Em propriedades maiores, naquele Estado, poderiam mecanizar suas lavouras e, conseqüentemente, alcançar rendimentos melhores.

No entanto, disse a nossa Senadora Serys, que, naquele tempo, o Estado de Mato Grosso não tinha uma boa infra-estrutura e muitos dos pioneiros gaúchos passaram por grandes dificuldades. As estradas eram precárias. E muitos morreram em função de doenças, especialmente a malária, pois não havia um bom sistema estadual de saúde.

Em Mato Grosso, a nossa estimada Senadora Serys construiu sua vida profissional e familiar. Lá criou os quatro filhos, todos mato-grossenses, e hoje possui quatro netos, embora não pareça. A gente olha para ela, parece uma menina. E quando diz que tem os netos, é difícil acreditar. Construiu também a sua vida profissional, lá se formando em Direito e Pedagogia, pela Universidade Federal de Mato Grosso.

Diferente dos colonos que buscaram vastas extensões de terras do novo eldorado, a Senadora Serys enveredou pela vastidão do conhecimento e da cultura. Por mérito, tornou-se professora na Universidade Federal de Mato Grosso, onde começou sua militância política como estudiosa da questão agrícola e da questão agrária: lutando contra o trabalho escravo em favor da reforma agrária, e também exigindo a reforma urbana. Nas suas diversas eleições, sempre teve como centro de apoio, na cidade, os sindicatos. No campo, tinha simpatia pelos militantes do MST.

A Senadora entrou para a vida pública quando assumiu a Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá, em 1986, onde desenvolveu profícua gestão. Em 1988, passou à Secretaria Estadual de Educação. Foi eleita pela primeira vez em 1990 como Deputada Estadual para a Assembléia Legislativa de Mato Grosso, onde exerceu dois mandatos consecutivos. Em 2002, foi eleita Senadora da República, pelo PT, de Mato Grosso.

Na opinião da Senadora Serys, os imigrantes gaúchos foram os responsáveis pela atual conformação econômica do Estado de Mato Grosso, principalmente na área agrícola, onde contribuíram e foram grandes colaboradores de forma incisiva.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Pedro Simon, quanto à Serys quero dizer que a sua batalha foi mais dura que a de Bento Gonçalves. Ela venceu um ícone, um mito na política, Dante de Oliveira, das Diretas Já.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É verdade.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Isso mostra o prestígio e a inteligência da professora Serys Slhessarenko.

O Sr. Gilberto Goellner (DEM - MT) - Senador Pedro Simon, felizmente ou não, eu fiz parte desse grupo de produtores do Rio Grande do Sul, que o senhor tem, incansavelmente, citado em plenário, fazendo registro da epopéia da contribuição da colonização gaúcha em todos os recantos do nosso País. O senhor falou de pessoas que realmente fizeram parte desse grupo, mas a passagem dos gaúchos também se deu inicialmente passando por Santa Catarina e, depois, pelo Paraná, ficando lá, criando gerações, seus filhos, às vezes, que migraram para outros Estados fronteiriços. Agradeço a análise que o senhor tem feito de toda a agricultura brasileira, de toda essa epopéia, que é a contribuição de nossos companheiros, assim como da minha cidade Não-Me-Toque; diversos, centenas de produtores daquela região, fizeram parte da colonização de todo País. Cito também que, durante o período em que estivemos trabalhando na extensão rural, na Cidade Não-Me-Toque, também participamos da colonização do ex-Deputado Federal Norberto Schwantes, que foi a colonização do Vale do Araguaia. Cidades como Canarana, Água Boa, e muitas outras daquela região foram colonizadas já em 1972, muito antes da minha saída do Estado do Rio Grande do Sul. Então, é dentro dessa epopéia que hoje nós vemos a pujança de cidades de todo o Estado do Mato Grosso. Todas elas têm a contribuição de um gaúcho, e não é apenas uma; são centenas, milhares de famílias que migraram para o Estado do Mato Grosso, para o Estado do Tocantins, para o Piauí, para o Maranhão, para a Bahia, para Goiás, para o Mato Grosso do Sul, entre outros. Então, meus parabéns, Senador, pelo excelente trabalho que o senhor tem feito registrando toda essa epopéia do povo gaúcho.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Muito obrigado a V. Exª. Muito obrigado mesmo a V. Exª.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda para comprovar a força da presença dos gaúchos na vida política de Mato Grosso, o Estado para cujo progresso contribuíram em empenho...

A Srª Serys Slhessarenko (Bloco/PT - MT) - Um aparte, Senador.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Pois não, dou a palavra a nossa querida conterrânea.

A Srª Serys Slhessarenko (Bloco/PT - MT) - Senador, em primeiro lugar, quero dizer da alegria por essa epopéia, como disse o nosso Senador Goellner, que o senhor está fazendo aos gaúchos, aos sulistas de um modo geral, mas especialmente aos gaúchos. Ela feita, contada, é importante, mas feita e contada pelo senhor, essa figura ímpar no nosso País - não no Congresso Nacional; o senhor é uma figura ímpar do Brasil, é uma figura que não é do Rio Grande; Pedro Simon é do Brasil -, tem mais importância ainda. Por onde andamos, recebemos elogios por esta personalidade: Pedro Simon. Realmente, Senador, eu costumava brincar que, em Mato Grosso, encontrávamos mais gaúchos do que brasileiros de outras terras. Agora, claro, lá temos muitos sulistas: do Rio Grande, de Santa Catarina, do Paraná. Mas muita, muita gente mesmo do Rio Grande do Sul, muita gente contribuiu muito para Mato Grosso. Essa contribuição, meu Senador, ela se deu também mais lá do que em outros Estados, e o senhor já disse isso inclusive, pela necessidade da desconcentração da terra no Rio Grande, onde era já muito pequena. Alguns queriam desconcentrar. Torná-las um pouco maior. E, valorizando a terra, muitos foram para outros Estados e lá encontraram esse espaço gigantesco no nosso Mato Grosso, um Estado de extensão territorial gigantesca, de terras maravilhosas e de um povo espetacular. O povo mato-grossense, a hospitalidade, a seriedade, a generosidade com que recebe as pessoas, com que nos recebeu é impressionante. Sei que o senhor conhece Mato Grosso, mas realmente queremos que o senhor vá lá para ser homenageado, porque lá há muitos gaúchos, mas há também muitos mato-grossenses que amam o senhor, com certeza.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Muito obrigado. Nós todos temos um carinho muito especial pela Senadora Serys. Ela é de uma simpatia; ela é de um carinho. Acho que é a mistura, modéstia à parte. Ela já saiu formada do Rio Grande do Sul: doutora, casada. Mas, no Mato Grosso, naquela mescla... Se digo que o povo gaúcho está-se formando, que o povo brasileiro está-se formando e a raça brasileira está aparecendo, Mato Grosso está ainda mais, porque Mato Grosso não é apenas o que Darcy Ribeiro falava do Brasil, que são o negro, o índio, o europeu e o asiático que estão formando o povo brasileiro. Mato Grosso era isso, mas, além disso, é o que veio do Rio Grande, o que veio de Santa Catarina, o que veio do Paraná, o que veio de Minas Gerais, o que veio do Nordeste, o que veio da Amazônia e que ali se formaram. Então, o povo de Mato Grosso, essa espetacular desenvoltura de Mato Grosso fazem com que realmente a gente esteja vendo uma criação especial. E a Serys tem isso. Ela tem muito do gaúcho, mas ela já é uma gaúcha muito mais civilizada, parece até que estudou em Paris. Ela tem o desenvolvimento, uma mescla do paulista, do carioca. Realmente, ela é o símbolo de aonde a gente pode chegar, com a presença extraordinária dela, que tem o carinho absolutamente de nós todos.

Está aqui o Chico Sartori, que hoje está em Rondônia. Também sulista. Está aqui nos honrando. Foi Senador conosco, desempenhou mandato aqui. Receba o meu abraço muito carinhoso.

Reparem que estamos aqui o bravo gaúcho de Mato Grosso; a brava gaúcha de Mato Grosso; o bravo companheiro Chico, lá de Rondônia, também do Sul; eu; o Senador Neuto de Conto, que não está aqui; o Senador Colombo, de Santa Catarina, que não está aqui; o Zambiasi e o Paim, que também são gaúchos...

Eu não posso me esquecer de quando se criou Mato Grosso do Sul. Mato Grosso chorava de tristeza; não queria, porque achava que, saindo Mato Grosso do Sul, eles iriam parar no tempo. Que coisa impressionante: saiu Mato Grosso do Sul, Estado que está crescendo muito, mas Mato Grosso está crescendo ainda mais do que Mato Grosso do Sul. Aquele povo que ficou no Mato Grosso arregaçou as mangas e teve uma capacidade... Eu não sei por que, mas os líderes do grande Mato Grosso eram do Sul e, na verdade, na verdade, levavam para o Sul - era uma coisa interessante; com eles isolados, cresceu, progrediu. E, hoje, o maior rebanho bovino, a maior reserva, o maior centro de agricultura do Brasil é o Mato Grosso. E, modéstia à parte, os gaúchos contribuíram muito para que isso acontecesse.

Para mostrar a força da presença dos gaúchos na política de Mato Grosso, eu me socorro de uma reportagem do Zero Hora, jornal de Porto Alegre.

A reportagem é de 28 de setembro do corrente ano. Aquele importante jornal gaúcho publicou uma reportagem na qual informa que 458 cidadãos nascidos no Rio Grande do Sul concorreram, na última eleição, a cargos de prefeito e de vice-prefeito em 22 dos Estados brasileiros. Em apenas quatro Estados - Espírito Santo, Acre, Amapá e Sergipe - não havia gaúchos postulando cargos de prefeitos municipais.

Esse número mostra a força eloqüente não apenas da grande dispersão do povo sul-rio-grandense pelo solo brasileiro, mas especialmente a sua impressionante incorporação à vida política das terras que escolheram para viver.

A candidatura dos gaúchos reproduz o movimento da nossa migração. Nos Estados onde a presença gaúcha é mais marcante, o número de candidatos é mais expressivo.

Assim, no Paraná, concorreram às eleições municipais 145 gaúchos. Em Santa Catarina, 132 gaúchos concorreram às eleições municipais. Em terceiro lugar, está Mato Grosso: 62 candidatos gaúchos concorreram às eleições, o que corresponde a 8% dos postulantes aos governos municipais naquele Estado.

         A reportagem do Zero Hora percorreu 800 km do território de Mato Grosso e entrevistou muitos dos candidatos nascidos no Rio Grande do Sul, mostrando a sua rápida assimilação na nova comunidade e o papel de liderança que lá exercem.

Nessa reportagem, somos informados ainda de que os candidatos a prefeito e vice no Sudeste eram: 11 em São Paulo, 7 em Minas Gerais e 3 no Rio de Janeiro. No Centro-Oeste, eram 24 em Mato Grosso e 13 em Goiás. Na Região Norte, eram 15 no Pará, 15 no Tocantins, 13 em Rondônia, 2 em Roraima, e 1 no Amazonas. Por fim, no Nordeste, eram 5 na Bahia, 2 no Rio Grande do Norte, 2 em Alagoas, 2 no Ceará, 1 em Pernambuco, 1 no Maranhão, 1 na Paraíba e 1 no Piauí. Dois que concorreram a prefeito em sua terra, Sr. Presidente, são gaúchos.

Eu gostaria de emendar mais sobre este assunto, mas preciso fixar-me no tema de Mato de Grosso.

O progresso, em ritmo acelerado, de Mato Grosso começou há pouco mais de três décadas, quando se intensificou a migração para lá de brasileiros vindos de vários Estados do Sul. Hoje, aquele Estado é uma potência no que se refere à produção de grãos e de carne. Aquele Estado tem hoje o maior rebanho do Brasil: mais de 27 milhões de cabeça de gado. Segundo dados da Conab, a produção de grãos de Mato Grosso, na safra 1976/1977, foi de três milhões de toneladas. Na safra 2005 e 2006, o total ultrapassou 22 milhões de toneladas, em um crescimento de 740%! Não há nenhuma dúvida de que os gaúchos contribuíram muito para esses números.

Recentemente, para homenagear a grande colônia gaúcha naquele Estado, o Presidente da Assembléia, Deputado Sérgio Ricardo, que nasceu em Herval do Oeste, Santa Catarina, numa família vinda do Rio Grande do Sul, apresentou projeto que institui a Semana Farroupilha naquele Estado, em homenagem aos gaúchos que “colonizaram dezenas de municípios mato-grossenses.

Na defesa de seu projeto, ressalva o Deputado que a trajetória dos gaúchos de Mato Grosso foi marcada por muitas dificuldades, “como o desconhecimento quase absoluto da nova realidade a ser enfrentada, o isolamento geográfico, as doenças, a inexistência de qualquer infra-estrutura de apoio e a saudade, que, sem dúvida, engrandecem e abrilhantam as forças desses guerreiros”.

É verdade. São impressionantes os depoimentos dos meus conterrâneos que migraram para as regiões mais afastadas e enfrentaram todo tipo de dificuldades. Mas o certo é que o sacrifício dessa gente rendeu frutos para a Nação brasileira.

         O superávit que o Brasil vem obtendo nas suas contas com o exterior deve-se, em grande parte, ao trabalho dos agricultores gaúchos espalhados pelo País. No ano passado, o superávit dos produtos agropecuários representou 80% do superávit total das contas externas. Em outras palavras, o País só registra superávits porque a nossa agropecuária é altamente eficiente e competitiva.

Srs. Senadores, depois da ocupação do meio-oeste e do oeste de Santa Catarina a partir dos anos 20, e do oeste e do sudoeste do Paraná, depois de 1940, os gaúchos continuaram subindo pelo mapa do Brasil. A partir de meados dos anos 70, começou a mudança...

(Interrupção do som.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - ... para as terras virgens de Mato Grosso.

Em poucos anos, milhares de pessoas venderam suas terras no Sul e compraram propriedades maiores em remotas regiões daquele Estado. Atravancaram velhos caminhões com suas posses e partiram pelas estradas poeirentas. Levaram no peito esperanças de um futuro melhor, mas já sentiam saudades da querência que deixavam para trás.

Essa história renderia um filme épico, Sr. Presidente.

É impossível traçar um painel cronológico exato da migração dos gaúchos para Mato Grosso, porque várias regiões daquele Estado foram desbravadas simultaneamente. Mesmo assim, vou esboçar aqui uma pálida idéia do que foi essa bela epopéia. Para isso, decidi fazer um trajeto que nos levará pelas cidades mato-grossenses que são consideradas como as que têm maior presença de sul-rio-grandenses na sua população.

A respeito desse tema, disse Anélio Mazzoco, morador de Cuiabá, que trabalha na Assembléia Legislativa de Mato Grosso: “O difícil aqui é saber qual é a cidade que não tem gaúchos!”

(Interrupção do som.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Anélio Mazzoco, como tantos outros habitantes de Mato Grosso, faz parte da segunda geração dos gaúchos no exílio. Ou seja, ele já nasceu em Concórdia, no meio-oeste de Santa Catarina, de uma família oriunda de Encantado, no Rio Grande do Sul. Chegou há 30 anos àquele Estado como comprador de gado de um grande frigorífico catarinense. Hoje, totalmente adaptado ao clima, dificilmente voltaria ao Sul.

Pois bem, no nosso passeio, começaremos pelo sul do Estado. As três cidades daquela região com as maiores colônias gaúchas são: Primavera do Leste, Campo Verde e Rondonópolis.

Eu fiz demais, Sr. Presidente. Estou vendo os companheiros querendo falar e eu vou reconhecer. Vou pedir a transcrição.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - V. Exª será atendido de acordo com o Regimento. Brilhante pronunciamento. Tem uns que vão pegar vôo ainda.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Deixe-me terminar, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Pois não.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Eu vou pedir a transcrição e dizer apenas aos telespectadores da TV Senado que, na minha página, eu colocarei o texto de todo o discurso, e os companheiros que desejarem tomar conhecimento do que foi essa epopéia terão oportunidade de fazê-lo.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR PEDRO SIMON.

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            O SR PEDRO SIMOM (PMDB - RS Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr Presidente. Srªs e Srs Senadores, recentemente fiz extensos pronunciamentos sobre o que venho chamando de “A Diáspora do Povo Gaúcho”, o monumental processo de migração que, desde o início do século passado, fez com que centenas de milhares de famílias de agricultores gaúchos fossem buscar terras em outras unidades da federação.

Estima-se que, hoje, um milhão e duzentos mil gaúchos - um em cada dez dos nossos cidadãos - vivam fora do território sul-rio-grandense.

Em pronunciamentos anteriores, fiz questão de realçar a importância desses nossos conterrâneos que, com seu trabalho árduo e amplo conhecimento de agricultura, transformaram em celeiros todos os Estados para os quais se transferiram. Aliás, não só para outros Estados brasileiros. O mesmo fizeram as dezenas de milhares da gaúchos e seus descendentes de Santa Catarina ou do Paraná que emigraram para o Norte da Argentina, Oeste da Bolívia e Paraguai.

No primeiro discurso, esbocei em traços largos a migração dos sul-rio-grandenses para todo o País. No segundo, tratei especificamente de Goiás, Minas Gerais, Tocantins, Maranhão, Piauí, Bahia e Distrito Federal.

Quando me preparava para elaborar um estudo sobre a presença dos gaúchos na chamada Amazônia Legal, deparei-me com fato que me surpreendeu: a participação maciça dos meus conterrâneos no extraordinário progresso de desenvolvimento vivido pelo Estado de Mato Grosso nas últimas três décadas, que o transformou numa das mais pujantes unidades da nossa federação.

Conheço bem a história da diáspora gaúcha e tinha noção do papel de destaque ocupado pelo Mato Grosso pelos gaúchos. No entanto, fiquei surpreendido com a grandeza dos números a que tive acesso. Para começo de conversa, basta dizer que moram hoje naquele Estado cerca de cem mil sul-rio-grandenses. Repito: cem mil!

Assim, no dia de hoje, concentrar-me-ei naquele Estado porque a migração de gaúchos para lá foi a mais intensa, depois de Santa Catarina e Paraná. Aliás, segundo o IBGE, no ano 2000, 340 mil gaúchos moravam em Santa Catarina e 317 mil, no Paraná.

Os sulistas - gaúchos, catarinenses e paranaenses, por sua vez, descendentes de sul-rio-grandenses - formam uma comunidade numerosa e bem sucedida no Estado de Mato Grosso. A força política dessa gente está provada pela eleição de vários senadores, deputados federais e estaduais nascidos num dos três Estados do Sul. Um dos maiores exemplos do que estou afirmando aqui é justamente o governador do Estado, Blairo Maggi.

            A família Maggi é do Rio Grande do Sul, com ramificações em Caxias do Sul e Torres. O pai do governador, o senhor André Antônio Maggi e sua esposa, dona Lúcia Borges Maggi, agricultores pobres migraram inicialmente para o Oeste do Paraná. Lá, na cidade de São Miguel do Iguaçu, nasceu, em 1956, o atual governador. No começo da década de 70, os Maggi partiram mais uma vez: deixaram o Paraná e se dirigiram a uma região inóspita e pouco ocupada de Mato Grosso. Em 1973, fundaram uma empresa de produção de sementes de soja. O negócio prosperou, dando origem ao atual Grupo Amaggi, maior produtor e exportador de soja do País, com atuação em diversas atividades, como transportes, pecuária e produção de energia elétrica.

            Blairo Maggi - que herdou a vocação empresarial e política do pai e é hoje o maior plantador de soja do mundo - foi eleito Governador, em 2002. Formado em Agronomia pela Universidade Federal do Paraná, na década de 1970 chegou a Mato Grosso acompanhando os pais que haviam decidido investir no potencial agrícola do Cerrado brasileiro, até então uma região inóspita e pouco ocupada.

            No comando do Governo de Mato Grosso, Blairo Maggi colocou em prática uma nova filosofia de gestão pública, inspirada na sua experiência na iniciativa privada, na qual se destacam a transparência na aplicação dos recursos públicos, a busca constante da eficiência e a realização de obras e ações de grande alcance social.

            Reeleito em 1º de outubro de 2006 com 65,39% dos votos, o governador estabeleceu como prioridades para o novo mandato educação, saúde, meio ambiente, investimentos em infra-estrutura para promover o desenvolvimento e projetos de inclusão social, como qualificação profissional, incentivos a pequenos empreendedores e programas de geração de emprego e renda.

Já que estamos falando de líderes políticos de Mato Grosso, quero destacar que, aqui mesmo, no Senado, neste momento, temos dois representantes de Mato Grosso que são naturais do Rio Grande do Sul.

Estou me referindo à Senadora Sherys Slhessarenko, que nasceu em Cruz Alta, e o Senador Gilberto Goellner, natural de Não-me-toque.

Mas, a verdade é que os integrantes da diáspora do povo gaúcho que têm assento nesta casa são quatro: ainda temos o Senador Casildo Maldaner, que nasceu em Selbach, e o Senador Neuto de Conto, natural de Encanado, ambos representantes de Santa Catarina.

Vamos agora falar um pouco dos nossos senadores de Mato Grosso.

O senador Gilberto Goellner teve participação efetiva no processo que levou centenas de milhares de gaúchos a deixarem o Sul, porque tem sua vida ligado ao início da cultura do soja no Rio Grande do Sul. Em 1967, quando estudava Agronomia na URGS, ele assistiu aos primeiros testes do uso de calcário em plantações de soja, executados por professores americanos, que vinham para cá através de convênios.

Diante do uso do calcário, havia dois grupos antagônicos de estudantes. Os que eram de esquerda, porque não gostavam de americanos eram contra o uso do calcário. O hoje Senador Gilberto, como conhecia os resultados da pesquisa, era a favor. Ele já havia trabalhado com soja, na Cotrijal (Cooperativa de Não-me-toque). Por essa época, acabou sendo eleito vice-presidente do diretório central de estudantes da universidade. Um ano e meio depois, assumiu a presidência.

            Formado em 1970, ele trabalhou depois, por sete anos, a pequenos agricultores da região de Não-me-toque, cidade que foi um dos maiores pólos de exportação da nossa gente. O senador disseminava conhecimentos sobre plantio de soja em lavouras mecanizadas. Com esse trabalho, ele acredita que retribui ao governo federal por lhe ter dado, de graça, o curso de agronomia. Depois de trabalhar inicialmente por um ano, como assistente técnico da cooperativa. abriu um escritório particular de assistência técnica, no qual atuou por seis anos.

Já em 1972 começou a fazer incursões pelo Mato Grosso do Sul, nas regiões de Dourados e Ponta Porá. Trabalhava com um caminhão preparado para distribuir calcário pelas lavouras. Chegou a ter cinco desses veículos. Também orientava os agricultores no uso do fosfato natural junto com o calcário.

Em 1975, participa efetivamente do processo de migração dos gaúchos para Mato Grosso do Sul orientando empresários gaúchos da área de calçados que estavam interessados em adquirir grandes propriedades na região de Chapadão do Sul.

Em 1977, o senador Gilberto resolveu plantar por conta própria. Como muitos outros gaúchos, decidiu investir em Minas Gerais. Comprou cinqüenta hectares em Patrocínio. Nessa época, muita gente de Não-me-toque foi para a região de Patos de Minas. Por lá, o senador plantou soja e café, por cinco anos. Quando perdeu a plantação de café, por causa da geada, decidiu ir para Mato Grosso.

Em 1.981, ele se mudou para a região de Rondonópolis, onde passou a plantar em 1.200 hectares, terra adquirida com a ajuda de parentes. Cultivava 900 hectares com soja, o restante com trigo. Mais adiante passou a produzir sementes também. Foi o primeiro presidente da Associação dos Produtores de Sementes, sucedido no cargo por Blairo Maggi, o atual governador.

Sempre envolvido com questões agrícolas, em especial com a transferência de tecnologia de produção, o nosso Senador nunca exerceu cargo eletivo até ser convidado para ser suplente do Senador Jonas Pinheiro. Agora ocupa o lugar daquele grande senador de Mato Grosso, um dos líderes na luta em defesa da nossa agricultura.

            Também a nossa querida Senadora Serys Slhessarenko conhece bem a diáspora do povo gaúcho, porque fez parte dela, foi personagem. A Senadora deixou o Rio Grande do Sul, partindo de sua cidade natal, Cruz Alta, em 1966. Sua motivação foi o casamento com um oficial do Exército que havia sido transferido para o Mato Grosso.

            Naquela época, lembra a senadora Serys, o preço da terra era muito elevado no Rio Grande do Sul, de modo que era difícil comprar até mesmo uma pequena propriedade. Assim, os produtores gaúchos perceberam que o Mato Grosso poderia ser a saída, já que lá poderiam adquirir propriedades bem maior por um valor significativamente menor. Em propriedades maiores, naquele Estado, poderiam mecanizar suas lavouras e, conseqüentemente. alcançar rendimentos melhores.

No entanto, diz a nossa Senadora, naquele tempo o Estado de Mato Grosso não tinha um boa infra-estrutura e muitos dos pioneiros gaúchos passaram por grandes dificuldades. As estradas eram precárias. E muitos morreram em função de doenças, especialmente a malária, já que não havia um bom sistema estadual de saúde.

Em Mato Grosso, a nossa estimada Senadora Serys construiu sua vida profissional e familiar. Lá criou os quatro filhos, todos mato-grossenses, e hoje possui quatro netos, nascidos lá. Construiu também sua vida profissional lá se formando em Direito e Pedagogia, pela Universidade Federal de Mato Grosso.

Diferentemente dos colonos que buscaram vastas extensões de terras no novo eldorado, a Senadora Serys enveredou pela vastidão do conhecimento e da cultura. Por mérito, tornou-se professora na Universidade Federal de Mato Grosso, onde começou sua militância política, como estudiosa da questão agrária: lutando contra o trabalho escravo e em favor da reforma agrária, e também exigindo a reforma urbana. Nas suas diversas eleições sempre teve como centro de apoio, na cidade, os sindicatos. No campo, tinha a simpatia dos militantes do MST.

A senadora entrou para a vida política quando assumiu a Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá, em 1986, onde desenvolveu profícua gestão. Em 1988, passou à Secretaria Estadual de Educação. Foi eleita pela primeira vez em 1990 como deputada estadual para a Assembléia Legislativa de Mato Grosso, onde exerceu dois mandatos consecutivos. Em 2002 foi eleita Senadora da República, pelo PT, de Mato Grosso.

Na opinião da Senadora Serys, os imigrantes gaúchos foram os responsáveis pela atual conformação econômica do Estado de Mato Grosso, principalmente na área agrícola, onde contribuíram de forma decisiva.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores:

            Ainda para comprovar a força da presença dos gaúchos na vida política de Mato Grosso, o estado para cujo progresso contribuíram em empenho, eu me socorro de uma reportagem do jornal Zero Hora.

Na sua edição do dia 28 de setembro do corrente ano, aquele importante jornal gaúcho publicou uma reportagem na qual informa que 458 cidadãos e cidadãs nascidos no Rio Grande do Sul concorrem, na última eleição, a cargos de prefeito ou vice em 22 dos Estados brasileiros. Em apenas quatro unidades da federação - Espírito Santa, Acre, Amapá e Sergipe - não havia gaúchos postulando cargos nos executivos municipais.

Esse número mostra de forma eloqüente não apenas a grande dispersão do povo sul-rio-grandense pelo solo brasileiro, mas especialmente a sua impressionante incorporação à vida política das terras que escolheram para viver.

As candidaturas dos gaúchos reproduz o movimento da nossa migração. Nos Estados onde a presença gaúcha é mais marcante o número de candidatos é mais expressivo.

Assim, concorreram às eleições no Paraná 145 conterrâneos nossos, sendo 77 a prefeito e 68 a vice, representando 6,7% do total de candidatos do Estado.

Em segundo lugar, vem Santa Catarina, com 132 candidatos, sendo 66 a prefeito e 66 a vice, mas com uma participação maior em termos proporcionais: 9 por cento dos candidatos no Estado.

Em terceiro lugar, surge o Estado ao qual este pronunciamento é dedicado: Mato Grosso, que teve 62 candidatos, sendo 26 a prefeito e 36 a vice. Os gaúchos correspondiam a 8 por cento dos postulantes aos governos municipais naquele estado. A reportagem de Zero Hora percorreu 800 quilômetros do território de Mato Grosso e entrevistou muitos dos candidatos nascidos no Rio Grande do Sul, mostrando a sua rápida assimilação na nova comunidade e o papel de liderança que lá exercem.

Nessa reportagem somos informados, ainda, que os candidatos a prefeitos e vice no Sudeste eram: 11 em São Paulo, 7 em Minas Gerais e 3 no Rio de Janeiro. No Centro-Oeste, além de Mato Gross, eram 24 em Mato Grosso e 13 em Goiás. Na região Norte os concorrentes eram: 15 no Pará, 15 em Tocantins, 13 em Rondônia, e 2 em Roraima e 1 no Amazonas. Por fim, no Nordeste eram: 5 na Bahia, 2 no Rio Grande do Norte, 2 em Alagoas, 2 no Ceará e 1 em Pernambuco, 1 no Maranhão, 1 na Paraíba e 1 no Piauí.

Eu gostaria de estender ainda mais sobre esse assunto, mas preciso me fixar no tema de hoje, que é a migração dos gaúchos para o Mato Grosso.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores:

O progresso em ritmo acelerado de Mato Grosso começou há pouco mais de três décadas, quando se intensificou a migração para lá de brasileiros de diversos estados, mas especialmente de sulistas. Hoje aquele Estado é uma potência no que se refere à produção de grãos e de carne. Aquele Estado tem hoje o maior rebanho do Brasil: mais de 27 milhões de cabeças de gado. Segundo dados da Conab, a produção de grãos em Mato Grosso, na safra 1976/1977 foi de 3 milhões de toneladas. Na safra 2005/2006, o total ultrapassou 22 milhões de toneladas num crescimento espantoso de 740 por cento! Não há nenhuma dúvida: os gaúchos contribuíram muito para esses números.

Recentemente, para homenagear a grande colônia gaúcha naquele Estado, o presidente da Assembléia, deputado Sérgio Ricardo - que nasceu em Herval do Oeste, Santa Catarina, numa família vinda do Rio Grande do Sul - apresentou projeto que institui a Semana Farroupilha naquele Estado em homenagem aos gaúchos que “colonizaram dezenas de municípios mato-grossenses”.

Na defesa de seu projeto, ressalta o deputado que a trajetória dos gaúchos em Mato Grosso foi marcada por muitas dificuldades “como o desconhecimento quase absoluto da nova realidade a ser enfrentada, o isolamento geográfico, as doenças, a inexistência de qualquer infra-estrutura de apoio e a saudade que, sem dúvida, engrandecem e abrilhantam a força desses guerreiros”.

É verdade. São impressionantes os depoimentos dos meus conterrâneos que migraram para as regiões mais afastadas e enfrentaram todo tipo de dificuldades. Mas o certo é que o sacrifício dessa gente rendeu frutos para a nação brasileira.

O superávit que o Brasil vem obtendo nas suas contas com o exterior deve-se, em grande parte, ao trabalho dos agricultores gaúchos espalhados pelo país No ano passado, o superávit dos produtos agro-pecuários representou 80 por cento do superávit total das contas externas.

Em outras palavras: o país só registra superávits porque a nossa agropecuária é altamente eficiente e competitiva.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores:

Depois da ocupação do Meio Oeste e do Oeste de Santa Catarina, a partir dos anos 20, e do Oeste do Sudoeste do Paraná, depois de 1940, os gaúchos continuaram subindo pelo mapa do Brasil. A partir de meados dos anos 70, começou a mudança para as terras virgens de Mato Grosso.

Em poucos anos, milhares de pessoas venderam suas terras no Sul e compraram propriedades maiores em remotas regiões daquele estado. Atravancaram velhos caminhões com suas posses e partiram pelas estradas poeirentas. Levavam no peito esperanças de um futuro melhor, mas já sentiam saudades da querência que deixavam para trás.

Essa história renderia um filme épico!

É impossível traçar um painel cronológico exato da migração dos gaúchos para Mato Grosso, porque várias regiões daquele estado foram desbravadas simultaneamente. Mesmo assim, vou esboçar aqui uma pálida idéia do que foi essa bela epopéia. Para isso, decidi fazer um trajeto que nos levará pelas cidades mato-grossenses que são consideradas como as que têm maior presença de sul-rio-grandenses na sua população.

Aliás, a respeito desse tema, disse Anélio Mazzoco, morador de Cuiabá, que trabalha na Assembléia Legislativa de Mato Grosso:

- O difícil aqui é saber qual é a cidade que não tem gaúchos!

Anélio Mazzoco, com tantos outros habitantes de Mato Grosso, faz parte da segunda geração dos gaúchos no exílio. Ou seja, ele já nasceu em Concórdia, no Meio Oeste de Santa Catarina, numa família que era oriunda de Encantado, no Rio Grande do Sul. Chegou há trinta anos àquele Estado como comprador de gado de um grande frigorífico catarinense. Hoje, totalmente adaptado ao clima diz que dificilmente voltaria ao Sul.

Pois bem, no nosso passeio começaremos pelo Sul do Estado. As três cidades daquela região com as maiores colônias de gaúchos são: Primavera do Leste, Campo Verde e Rondonópolis.

            Vamos iniciar nossa viagem por Rondonópolis, cidade-pólo da zona meridional do Estado que tem uma população estimada em mais de 180 mil pessoas, Aquele município começou a desenvolver-se a partir do final dos anos 40, com a instalação de colônias agrícolas incentivadas pelo governo do estado. Recebeu então grande fluxo de migrantes, sendo a maioria dos Estados do Sul: gaúchos ou seus descentes , nascidos em Santa Catarina e Paraná.

            O processo de expansão se acelera nos anos 80 e Rondonópolis passa por um dos mais impressionantes processos de desenvolvimento do Centro-Oeste. Fica conhecida como "Capital Nacional do Agro-negócio". Sua economia passa a ser ancorada nas lavouras de soja e algodão e na pecuária de leite. Sua indústria é ligada ao campo: esmagadoras de soja, indústrias têxteis, químicas e de fertilizantes, curtumes.

            Viajando 200 quilômetros chegaremos a Primavera do Leste. Fundada há pouco mais de vinte anos, em 1.986, a cidade conta hoje com cerca de 65 mil habitantes. É a quinta economia de Mato Grosso, devido a sua produção agrícola, que tem como destaque soja, algodão, milho, sorgo, arroz, feijão e uva. Lá se produz até mesmo vinho, embora o clima seja muito quente quando em comparação ao da serra gaúcha. Distando apenas 240 km de Cuiabá, é um município muito bem estruturado e de bela aparência, que lembra bastante as cidades da zona de colonização italiana ou alemão no Rio Grande do Sul.

                  Dali nos transferimos para Campo Verde, hoje com cerca de 23.000 habitantes. Na década de 1970, com a chegada de migrantes vindo do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, o município passou a acrescer num ritmo acelerado. Inicialmente, o produto mais cultivado era o arroz, que depois cedeu lugar à soja. Emancipado como município em 1988, Campo Verde já figura em sétimo lugar no ranking econômico do Estado. É o maior produtor do país de um algodão em pluma cuja qualidade atrai compradores de todo o mundo. Atualmente conta com 17 indústrias algodoeiras de médio e grande porte. A criação de frangos de corte é feita por um sistema de integração dos produtores. Anualmente são abatidas 36 milhões de aves, com um abate diário de 136 mil frangos. Esses números garantem a Campo Verde o título de Capital Estadual do Frango.

            Deixando o Sul, marcharemos para o Oeste do Estado.

            No Oeste de Mato Grosso as cidades que têm mais migrantes vindos da Região Sul são Tangará da Serra, Campo Novo do Parecis e Sapezal. Esses três municípios estão situados no chamado Chapadão do Parecis.

            Naquela região, tentando refazer o trajeto dos gaúchos pioneiros, começaremos nossa viagem por Tangará da Serra, município criado em 1976 e que hoje tem cerca de 80 mil habitantes, sendo que cerca da metade deles tem origem nos Estados do Sul.

            Tudo começou em 1959, quando foi aberto um loteamento. Nos anos 60, aos poucos passaram a chegar os primeiros moradores, que eram obrigados a abrir picadas na mata para chegar ao núcleo inicial. A partir dos anos 70, o crescimento foi acelerado. Tangará é um exemplo do estrondoso o crescimento do Estado de Mato Grosso. Em pouco mais de 30 anos a cidade chegou a 80 mil habitantes!

            Henrique Alves Ballejo, morador de Tangará da Serra desde 1978, é o presidente do Movimento Tradicionalista gaúcho do Estado de Mato Grosso. Como centenas de outros filhos da diáspora gaúcha, Henrique nasceu em Francisco Beltrão, no Paraná, filho de agricultores que haviam saído de Santa Rosa. Bisneto de uruguaios, que, por sua vez, tinham ascendentes espanhóis, Henrique não se interessava pelo movimento tradicionalista quando residia no Sul.

            No entanto, quando migrou para Mato Grosso sentiu necessidade de compartilhar suas lembranças do Sul, de dividir com alguém a saudade que sentia da terra. Ingressou no CTG de sua cidade que, em julho último, reuniu 1.500 tradicionalistas de todo o Estado.

            Deixando Tangará da Serra, cuja riqueza vem da soja, cultivada há mais tempo, e da cana de açúcar, seguiremos para Campo Novo do Parecis, município criado em 1988, mas que já tem cerca de 25.000 habitantes. A cidade formou-se em torno de um núcleo onde foram assentadas diversas famílias. A ocupação efetiva da região deu-se a partir da década de setenta, com abertura de fazendas e a instalação de migrantes vindos dos estados sulistas.

            A seguir, passaremos por Sapezal, cujo núcleo urbano desenvolveu-se a partir de uma proposta de colonização de André Antonio Maggi, pai do governador Blairo Maggi. No início, as distâncias entre as fazendas da região variavam de 40 a até 100 Km. As estradas que ligavam as fazendas eram, na verdade, picadas abertas no cerrado pelos próprios colonos.

            Os pioneiros eram sulistas, na sua maior parte vindos do Norte do Rio Grande do Sul, Oeste de Santa Catarina e Oeste do Paraná. A atual zona urbana começou a ser povoada com a abertura da estrada em meados de 1987. Seu primeiro prefeito foi André Antonio Maggi.

            Agora nos locomoveremos ao Norte do Estado. Nessa região, as cidades com mais forte presença de gaúchos são Sorriso, Lucas do Rio Verde e Nova Mutum.

            Como outras cidades fundadas na mesma época em Mato Grosso, Sorriso também nasceu em decorrência de incentivos do Governo para colonização e ocupação da chamada Amazônia Legal no final dos anos 70. A colonização da área teve forte presença de gaúchos, paranaenses e catarinenses, atraídos para lá pela Colonizadora Feliz. Estima-se que 80 por cento dos moradores sejam sulistas, sendo os gaúchos os mais numerosos, correspondendo a 35 por cento dos habitantes. Mas, sempre é bom lembrar que os migrantes catarinenses e paranaenses com os quais tive contato eram sempre descendentes de gente que saiu da nossa terra.

            Pois bem, elevada à condição de Município em 1986, Sorriso tem hoje oficialmente 45 mil habitantes. Mas, estudos da prefeitura, apontam a existência de 65 mil moradores. Sua explosão demográfica deu-se a partir da pavimentação da BR-163, que barateou o escoamento da produção. Atualmente, o município é considerado o maior produtor de soja do País. Também se destaca pela produção de algodão e milho. É o município que, individualmente, mais produz grãos no Brasil: 3% da produção nacional e 17% da produção estadual.

            A seguir, viajaremos para Lucas do Rio Verde. Hoje, com 35 mil habitantes, é um município modelo, que ocupa um lugar de destaque no ranking dos melhores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do País. No entanto, foi somente a partir 1981, quando o Incra começou a implantação do projeto de assentamento de 203 famílias de agricultores sem-terra oriundas de Encruzilhada Natalino, interior do município de Ronda Alta (RS), que se formou a comunidade que deu origem a Lucas do Rio Verde.

            Quando, em julho de 1988, conquistou sua emancipação político-administrativa, a cidade já contava com 5.500 habitantes. Poucas famílias dos assentados de Ronda Alta ainda continuam de posse de suas terras. Pressionadas pelas dificuldades do período inicial, muitas delas perderam terreno para a agricultura extensiva que começava a ocupar o cerrado.

            Passaremos, depois, pelo município de Nova Mutum que, com 24.000 habitantes, é um dos maiores produtores de soja de Mato Grosso e do Brasil, contando com muitas indústrias ligadas ao agro-negócio.

            A cidade nasceu de um projeto privado de colonização, levado adiante por uma empresa de Porto Alegre. Os cem mil hectares do projeto foram vendidos para agricultores do Sul em lotes que variavam de 150 a 400 hectares. A colonizadora construiu no início dez casas na vila aberta provisoriamente por trator de esteira. Em seguida, vieram escola, centro comunitário, posto de saúde e alojamento para abrigar os compradores de terra. Quem adquirisse um lote rural, recebia de bonificação dois terrenos no núcleo urbano, que media 551 hectares. Nem todos os compradores ocupavam os lotes de imediato. Iam chegando de acordo com a venda de suas posses no sul do país.

            Por fim, iremos até a divisa de Goiás para visitar duas cidades: Canarana e Água Boa.

            Hoje com 30 mil habitantes, Canarana surgiu quando por lá se instalaram os primeiros agricultores recrutados em Tenente Portela, pela Cooperativa Colonizadora 31 de Março.

            Água Boa, com cerca de 18.000 habitantes, tem sua economia baseada na agropecuária, sendo que na agricultura destacam-se soja e do arroz. É referência em comercialização de bovinos, sediando um dos maiores leilões de gado do mundo.

            Chegando ao final dessa larga viagem, eu não poderia deixar de mencionar ainda três cidades cujos nomes deixam patente a presença da nossa gente em Mato Grosso: Porto Alegre do Norte, Porto dos Gaúchos e Gaúcha do Norte.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores:

Em função de pronunciamentos anteriores sobre este assunto, venho recebendo correspondências de gaúchos que hoje moram nos Estados mais distantes do torrão natal. São cartas comoventes de gente que deixou o Rio Grande do Sul nas condições mais dramáticas.

Quero destacar aqui, hoje, uma carta me foi enviada pela senhora Gertrudes Schwantes, atualmente residente em Brasília. No documento, ela me agradece a menção do nome de seu falecido esposo, Norberto Schwantes, como líder de um movimento de colonização que, nos anos 70 e 80, levou milhares de agricultores pobres do Rio Grande do Sul para o Estado de Mato Grosso.

Junto com a carta, a senhor Gertrudes enviou-me um livro, intitulado “Uma Cruz em Terranova”, escrito por seu esposo pouco antes de falecer aos 53 anos, em 1998.

A leitura desse livro é importante para que se conheça melhor o formidável êxodo de gaúchos para aquele Estado, certamente um dos capítulos mais importantes da diáspora do povo gaúcho.

Norberto Schwantes fundou dezenas de projetos de colonização e três grandes cidades de Mato Grosso: Canarana, Água Boa e Terranova do Norte.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores:

Nascido numa família de agricultores pobres de Lagoa dos Três Cantos, localidade no interior do município de Carazinho, Norberto Schwantes sonhava em ser mecânico. Certo dia, porém, seu pai lhe perguntou se não gostaria estudar no seminário luterano em São Leopoldo. Havia a possibilidade de obter uma bolsa. O garoto gostava mesmo era de caçar, mas, mesmo sem sentir inclinação pela vida religiosa, aceitou a sugestão do pai.

Para grande parte dos filhos de agricultores do Sul, de origem alemã ou italiana, os seminários eram um dos poucos caminhos para escapar da miséria. Posso lembrar aqui o caso de inúmeros grandes prelados sul-rio-grandenses de origem alemã que alcançaram os mais altos cargos da igreja católica, como dom Vicente Scherer e os primos dom Aloísio Lorscheider e dom Ivo Lorscheiter, filhos de gente humilde do nosso interior.

Para manter-se enquanto trabalhava, Norberto trabalhava como barbeiro dos colegas de seminário. Mais tarde, passou tirar fotografias. Desde jovem já mostrava os traços do empreendedor que seria mais tarde.

Antes mesmo de ser ordenado, foi enviado ao interior de Santa Catarina, para auxiliar o pastor da cidade de Mondaí, que atendia os colonos gaúchos que haviam fundado cidades como São Miguel do Oeste e Cedro. Foi lá que conheceu sua esposa, dona Gertrudes, filha de migrantes gaúchos.

Ordenado, Norberto Schwantes foi enviado para uma das mais pobres paróquias luteranas do Rio Grande do Sul: Tenente Portela, a última região a ser colonizada em nosso Estado, já nos anos 40. Começa então o primeiro de seus empreendimentos: uma escola para atender aos filhos de colonos de origem alemã, que não tinham acesso ao ensino público na cidade.

Mais adiante, Norberto conseguirá no exterior os recursos para a construção de uma Escola Normal para a preparação de professores - caingangues e guaranis - para as reservas indígenas da região. Foram esses professores índios que lideraram, mais tarde, seu povo na luta para recuperar as terras de seus ancestrais.

Nesse trecho do livro, Norberto assume que o fato de ter criado a escola para os índios, na qual eles adquiriam uma consciência política, acabaria por ser o estopim da grande crise de 1978, quando milhares de agricultores foram expulsos de todas as reservas indígenas do Estado.

Em sua primeira viagem à Alemanha, em 1969, o pastor luterano descobre o alto grau de sofisticação a que havia chegado a agricultura daquele país. Na volta, instala uma estação de rádio para transmitir, aos agricultores de Tenente Portela, informações sobre avanços técnicos no cultivo de produtos agrícolas e no gerenciamento de propriedades rurais.

Mais adiante, em outra estada na Europa, num acampamento de voluntários, conhece jovens de toda América Latina e, por meio deles, fica sabendo dos problemas políticos que desconhecia: perseguições, torturas e assassinatos. Entra então em crise política e religiosa. Na sua volta, começa a ajudar pessoas perseguidas politicamente no Brasil, levando-as à Argentina.

Certo dia, na emissora de rádio de Tenente Portela, quando eram debatidos os graves problemas dos agricultores pobres da região, um jovem agrônomo levanta uma idéia: por que não emigrar?

A migração, como se sabe hoje, foi a maneira que os países europeus encontraram de diminuir seu problemas sociais. Cidadãos da Alemanha, Itália, Espanha e Portugal recorreram a esse amargo remédio por décadas durante os séculos XIX e XX. A verdade é que, com o envio seus pobres para a América e Austrália, essas nações conseguiram evitar a convulsão social e política.

Lançada a idéia da migração entre as pessoas de Tenente Portela, Mato Grosso surgiu como o destino ideal. Imaginava-se que, naquele Estado, os colonos poderiam, mais uma vez, voltar a ter lotes maiores de terra. Naquele época, pelo fracionamento sucessivo, as propriedades da região tinham em média 7 hectares. Não proporcionavam ganho suficiente para a manutenção de uma família.

Norberto Schwantes avaliou inicialmente que mais de 2 mil famílias poderiam emigrar. Com dois amigos, um que estudaria os solos e outro que verificaria o custo das terras, voou para Mato Grosso no início de 1970. Lá, decidiram-se os três pela região próxima a Barra do Garças. Na volta a Tenente Portela, criaram uma cooperativa de colonização, Coopercol. Deram a ela o nome de Cooperativa 31 de Março para afastar a desconfiança do regime militar. Na época de sua fundação, a cooperativa contava com 400 associados.

Escreve Norberto em seu livro: “A fundação da cooperativa foi um enorme sucesso e assustou muita gente. Principalmente os políticos, ao perceberem que seus votos emigrariam. Assustou também os comerciantes, temeroso de perderem seus clientes. E, não menos, assustou os religiosos, que logo constaram que boa parte de suas almas estavam dispostas a ir para os confins dos Inferno Verde, como era chamada a Amazônia.”

Logo em seguida, Moura Cavalcanti, presidente do Incra, em visita ao Rio Grande do Sul, empolga-se com a Cooperativa de Colonização e se propõe a levar agricultores para Altamira, na Amazônia paraense.

Norberto Schwantes ficou tão fascinado pelo projeto da Transamazônica que não percebeu que a abertura de mais de 3.500 quilômetros de estradas no meio da selva, em grande parte através de terras de baixíssima fertilidade, era um absurdo. E comenta “Quem visita a Transamazônica hoje - intransitável pelo menos seis meses por ano, no período das chuvas mais intensas e sem condições de ser asfaltada pelos grandes aclives - constata que o projeto teve por pais demagogos e irresponsáveis”.

Depois de alguns percalços, foram enviadas para Altamira e Itaituba cerca de 480 famílias de “colonos totalmente pobres”. Para os agricultores que “tivessem algum recurso”, a Cooperativa tinha seu próprio projeto em Mato Grosso. O maior perigo era os compradores serem enganados pela “máfia dos corretores picaretas de terras”.

A cooperativa comprou então os primeiros 40 mil hectares de terras a 300 quilômetros de Barra do Garças, perto da divisa com Goiás. O nome dado ao loteamento é Canarana, nome do capim mais conhecido da Amazônia.

“Gostei do nome porque lembrava Canaã, a Terra Prometida”, escreve Norberto Schwantes.

Os pioneiros chegam no local em setembro de 1972. Os problemas eram muitos. As pessoas padeciam com doenças que desconheciam totalmente. Os pioneiros ficaram isolados por longo tempo em função de estradas intransitáveis. Numa região sem agências bancárias, faltava até mesmo dinheiro. Antes das primeiras colheitas, não havia onde comprar comida. Os acampamentos iniciais eram extremamente rústicos. Pela junção de tantos fatores adversos, muitos agricultores queriam voltar atrás.

Para que o projeto desse certo era preciso atrair mais gente, de forma a adensar a população na área. Assim, surge o projeto Canarana 2, com dez mil hectares. Em 1974, é criado o projeto Garapu 2 - com 10 mil hectares, vendidos rapidamente - que os agricultores pagariam com a safra de soja do Sul. Porém, o preço do produto cai vertiginosamente no mercado internacional. A cooperativa fica à beira da falência, mas é salva por um fato extraordinário: agricultores alemães, que estavam dispostos a investir no Brasil, colocam o dinheiro necessário e a terra é paga. Três anos depois a cooperativa devolveria o dinheiro aos alemães.

Em 1975, Canarana torna-se o primeiro projeto de colonização particular aprovado pelo Incra. Como a Cooperativa já conhecia o quase invencível cipoal da burocracia estatal, os projetos seguintes ganham velocidade. Ainda em 1975, surge Água Boa, cujos compradores na sua quase totalidade eram do município de Não-Me-Toque.

Escreve Norberto Schwantes: “Assim rápida e sucessivamente fomos adquirindo terra e elaborando novos projetos de colonização. Sempre tínhamos um bom cadastro de possíveis compradores de lotes no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. Logo que abríamos as primeiras estradas vicinais, os compradores vinham, olhavam os lotes, voltavam ao Sul, vendiam suas terras - quando as tinham - e aguardavam o nosso aviso para virem receber as escrituras e passarem pelo Banco do Brasil, para fazer o financiamento não só dos lotes , como também das máquinas e custeio”.

Em 1976, com os projetos de colonização andando a todo vapor, a cooperativa de colonização dispunha de aviões para transportar os interessados em adquirir terras em Mato Grosso.

Em maio de 1978, a imprensa brasileira informava que os índios guaranis e caingangues estavam expulsando os agricultores de todas as reservas do Sul do país. Mais de duas mil famílias de trabalhadores rurais estavam à beira das estradas, esperando uma solução.

O então ministro do Interior, Rangel Reis, convocou Norberto Schwantes ao seu gabinete e pediu-lhe ajuda. Argumentou o ministro que só sua cooperativa teria estrutura para transferir para áreas de colonização os expulsos das reservas indígenas.

Norberto aceita o desafio e envolve-se de corpo e alma no empreendimento que o levaria à falência. No livro, ele conta, detalhadamente, como preparou o núcleo de colonização solicitado pelo governo numa reserva do Exército em Mato Grosso, quase na divisa com o Pará. E fala do imenso trabalho que teve para convencer os colonos gaúchos a irem para lá. No final, o governo não cumpriria a palavra, apesar da assinatura do presidente Geisel nos documentos. O trato seria descumprido no governo Figueiredo.

“Uma Cruz em Terranova” nos ajuda a entender os delicados meandros da epopéia que é retirar seres humanos de seu habitat e levá-los para um meio totalmente diverso.

O impacto negativo dessa tentativa frustrada levou o colonizador a abrir mão da empresa que havia criado. Aos quarenta e cinco anos, teve que começar uma vida nova, como agricultor. Com a esposa e os filhos deixou Brasília e voltou para uma fazenda em Mato Grosso.

Por esta época, começa o envolvimento de Norberto Schwantes com a política partidária, algo de que nunca havia cogitado. A aproximação começa através de seu conterrâneo Leonel Brizola que, em visita a Canarana, mostra interesse em conhecer o ex-pastor luterano que lhe enviava perseguidos políticos pelo regime militar. Na ocasião, Brizola convida Norberto a integrar-se ao partido que estava fundando, o PDT.

Foi amarga essa primeira experiência política. Boicotado pelos dirigentes do PDT em Mato Grosso, Norberto Schwantes acabaria se filiando ao nosso PMDB.

Há um fato curioso relatado no livro. Norberto nos conta que foi ele quem apresentou a Leonel Brizola aquele que seria um dos maiores fenômenos eleitorais nas eleições de 1982, pelo PDT do Rio de Janeiro: o cacique xavante Mário Juruna.

A incorporação de Mário Juruna só fez aumentar a hostilidade dos caciques do PDT em Cuiabá contra Norberto Schwantes.

Escreve ele: “Fui me desgostando... Levava a política a sério, queria mesmo era ajudar a mudar as coisas. Não tinha maiores pretensões. Mas não é possível militar na política sem mandato... Comecei a estudar o assunto...”

Filia-se ao PMDB e enfrenta a primeira eleição, quando sua esposa concorre à prefeitura de Canarana e perde por apenas 120 votos.

Por esta época, um exame clínico mostra que ele estava com câncer. A origem da doença estava na exposição permanente ao sol forte durante sua vida de colonizador. Decidiu vender sua fazenda, já que não poderia mais trabalhar ao ar livre.

Trabalharia ainda numa tentativa fracassada de colonização levada adiante por uma grande empreiteira. Foi um vultoso investimento, que consumiu fartos recursos, mas não foi adiante por erros básicos de planejamento. Pela primeira vez, Norberto trabalhou com dinheiro farto, mas o projeto Tucumã, de 400 mil hectares, no Pará, acabou com uma invasão de sem-terras.

Nos últimos capítulos de “Uma Cruz em Terranova”, Norberto Schwantes nos conta como, na eleição de 1986, conseguiu ficar como primeiro suplente de deputado federal pela bancada do PMDB de Mato Grosso.

Para fazer sua campanha, vendeu sua fazenda. Visitou todo o Estado e filmou seus principais problemas. Depois comprou um caminhão e nele montou uma espécie de cinema, no qual passava para os cidadãos do interior os filmes que havia feito sobre as grandes questões estaduais.

Em 1988, ele acaba assumindo o mandato de deputado federal, quando um colega elege-se prefeito. Participa então com interesse dos debates sobre agricultura, embora já estivesse doente. Morre em 1988, dez dias antes de cumprir seu último sonho: assinar a constituinte.

            Senhor Presidente, Senhoras e Senhores:

Perdoe-me a extensão desse pronunciamento. Mas a verdade é que tudo que eu disser sempre será pouco para descrever a grandeza da migração dos gaúchos para Mato Grosso.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/2008 - Página 51302