03/12/2015 - 119ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

R
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Bom dia a todos e a todas!
Declaro aberta a 119ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública, nos termos dos Requerimentos nºs 177, de 2015, de autoria do Senador Paulo Paim, e 192, de 2015, de autoria do Senador Telmário Mota, para debater "A situação das comunidades quilombolas e indígenas e as fortes implicações da PEC 215, de 2000, que, gravemente, afeta a demarcação das terras indígenas no País".
Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Para isso, as pessoas que têm o interesse de participar com comentários ou com perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, pelo link www.senado.leg.br/ecidadania, e do Alô Senado, através do número 0800612211.
Há muita dificuldade para a entrada na Casa sempre que as audiências públicas se referem a questões dos movimentos populares, dos indígenas. Já reclamamos muito aqui sobre essa dificuldade de entrada na Casa, mas ainda não conseguimos resolver isso. Outras pessoas entram com muita facilidade aqui, mas, sempre que há audiência pública envolvendo movimentos, há essa dificuldade. Não podemos mais esperar. Talvez, ainda haja algumas pessoas para entrarem aqui.
Vamos formar a primeira Mesa.
Convido o Presidente da Funai, João Pedro Gonçalves da Costa.
Convido a Drª Úrsula Catarina Fernandes da S. Pinto, Promotora de Justiça da Comarca de Cavalcante, no Estado de Goiás.
O Dr. Arthur está aqui, mas me parece que será feito um revezamento. Não é isso? Vai haver uma troca depois. O Dr. Arthur José Jacon Martins, Promotor de Justiça de Goiás, virá depois, mas ele está aqui presente.
Convido Paulo Arletes Rios Barela, representante da Central Sindical e Popular (CSP-Conlutas).
Convido Antonio Nonato Santos Viana, representante do quilombo Gurutil-Mirinzal, no Maranhão.
R
Convido Paulo Celso de Oliveira Pankararu, advogado indígena.
Convido Givânia Maria da Silva, Secretária de Políticas para Comunidades Tradicionais da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir).
Quero dizer que os autores dos requerimentos não estão aqui presentes, por algumas razões outras desta Casa, e que coube a mim substituí-los.
Acho que muita gente que está aqui já participou de audiências públicas e já sabe que há uma campainha. Melhorou um pouquinho o som, que era muito estridente e assustava. Foi melhorado o som da campainha, mas ela toca, faltando um minuto.
Numa Mesa grande, começamos concedendo dez minutos a cada participante. Se alguém precisar usar o telão, o pessoal o providencia, para que ele seja usado. Então, inicialmente, a fala é feita por dez minutos.
Vamos começar com a Drª Úrsula, que vai precisar se retirar. Não é isso, doutora?
Vamos deixar o Presidente da Funai por último, para ele fazer um apanhado geral. Ele escuta todo mundo e, depois, faz uma fala geral.
Então, a Drª Úrsula Catarina Fernandes da S. Pinto, Promotora de Justiça da Comarca de Cavalcante, no Estado de Goiás, está com a palavra.
A SRª ÚRSULA CATARINA FERNANDES DA S. PINTO - Bom dia!
Quero iniciar, cumprimentando a Senadora Regina Sousa, Presidente dos trabalhos nesta manhã.
Quero dizer que, diversamente de muitos, esta é a primeira vez que participo de uma reunião como esta nesta Casa. Eu me sinto muito honrada pela nobreza do tema a ser tratado, por envolver índio e quilombola.
Falo representando o Ministério Público do Estado de Goiás, por ser promotora em uma região onde se encontra inserido o maior quilombo do mundo, o Sítio Histórico Kalunga. Por isso, estou aqui.
Qual a posição do Ministério Público? Sendo promotora dessa Comarca há 19 anos, vivencio as alegrias, as esperanças, mas também as dificuldades daquele povo sofrido. E a postura do Ministério Público é no sentido de tentar protegê-lo, levando em conta aquilo que a Constituição apregoa e assegura: a proteção dos vulneráveis, a proteção dos hipossuficentes. Os quilombolas são vulneráveis, os quilombolas são hipossuficientes.
Por isso, estou aqui. Espero contribuir para os trabalhos de hoje. Estou aberta a perguntas. Acredito que tenho a somar ao trazer algumas informações. Estou à disposição para responder as perguntas de quem quer que seja.
Sinto-me também muito à vontade - vou falar, porque sei que não vou usar todo o tempo, que já está correndo -, porque sou do norte de Tocantins. Estes olhos puxados nada têm a ver com oriental, não. São de índio mesmo. Então, ainda fico mais à vontade por isso, pelos apinajés de lá.
Se o meu colega também membro do Ministério Público quiser complementar minha fala, esteja à vontade, Arthur.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - É o Dr. Arthur.
A SRª ÚRSULA CATARINA FERNANDES DA S. PINTO - Dr. Arthur.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Há ainda o tempo de sete minutos.
Doutor, se o senhor quiser falar daí, pode trocar ideias com ela.
O SR. ARTHUR JOSÉ JACON MARTINS - Bom dia a todos!
Eu queria cumprimentar a Senadora Regina Sousa, na pessoa de quem estendo meus cumprimentos a todos os integrantes da Mesa e a todos os presentes neste ato, que representa e que demonstra a disposição do Senado de realizar um debate democrático acerca de temas relevantes para os destinos do Brasil.
Eu gostaria de, em nome do Procurador-Geral de Justiça, Dr. Lauro Machado Nogueira, do Estado de Goiás, de quem sou assessor, externar a enorme satisfação e honra com a qual o Ministério Público de Goiás se sente laureado, pelo fato de ter sido convidado pela Câmara Alta do Congresso Nacional a participar de um evento, como acentuado pela Drª Úrsula, de tamanha nobreza e envergadura.
R
O Ministério Público de fato se tem posicionado, e o Estado de Goiás, em particular se tem posicionado francamente a favor das causas dessas populações tradicionais que precisam, de fato, de especial proteção, pela sua situação de vulnerabilidade e de opressão histórica.
O Ministério Público do Estado de Goiás também externa a sua enorme satisfação de ter como uma colega alguém da envergadura e da cepa da Drª Úrsula, que há 19 anos ocupa o cargo de Promotora de Justiça Titular da Comarca de Cavalcante, o que é um fato raríssimo, em se tratando de comarcas do interior do Brasil: um promotor de justiça se dedicar e, realmente, ter um compromisso tão intenso e tão estreito com a comunidade na qual está inserido.
O Ministério Público é o defensor, por vocação constitucional, das populações em situação de vulnerabilidade, dos interesses sociais indisponíveis e, com toda a certeza, as populações quilombolas e indígenas pertencem a esse rol de protegidos, de pessoas que realmente merecem a tutela ministerial.
O Ministério Público fica muito feliz também pela realização desta audiência pública, por ter a oportunidade de participar dessa discussão democrática, dessa discussão que, com certeza, trará e coletará subsídios interessantes para eventuais mudanças legislativas e para a realização de políticas públicas que visam a conferir maior dignidade a essas populações.
Em nome do Ministério Público do Estado de Goiás, eu agradeço a esta Comissão, pela deferência, pela seriedade do evento e pelos bons propósitos aqui realizados.
Muito obrigado a todos.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Obrigada, Dr. Arthur.
Sabemos que esta audiência é motivada, principalmente, entre outras razões, pela tramitação da PEC 215, que aflige todo mundo. Já temos um posicionamento majoritário, no Senado, contra a PEC, mas ela ainda tramita na Câmara. Então, tem que haver todo um trabalho, porque vai ser votada lá. Eu acho é preciso nos voltarmos para a Câmara no sentido de barrá-la por lá também. Mas nunca é demais discutir a situação dos índios e dos povos tradicionais, porque não há só essa questão da demarcação das terras, como sabemos.
Vamos passar para o representante da Conlutas, Paulo Arletes Rio Barela.
Só um minuto. Paulo, eu vi o Senador Telmário passando. Ele está por aqui ainda? Por direito, esta Presidência é dele, se ele quiser assumir. Deixe-o voltar.
Então, Paulo, o representante da Central Sindical e Popular (CSP).
O SR. PAULO ARLETES RIOS BARELA - Primeiro, cumprimento a Presidente desta audiência, Senadora Regina Sousa; e, através dela, quero fazer um cumprimento também ao meu conterrâneo, Senador Paulo Paim, que não está presente, neste momento, mas que é membro também.
Nós da CSP-Conlutas, da Central Sindical e Popular, fomos um dos assinantes da convocação desta audiência. A CSP-Conlutas não é apenas uma central sindical comum, nós organizamos, para além dos trabalhadores assalariados, todos os movimentos que sofrem com a opressão capitalista, em nosso País. Portanto, nós representamos organizações indígenas; organizações de quilombolas; organizações de trabalhadores pela moradia, tanto pelas terras nas cidades quanto pelas terras no campo.
R
Nós organizamos os setores oprimidos, neste País, como as mulheres, os negros, os LGBT, os homossexuais, em uma sociedade que utiliza essas diferenças para superexplorar os trabalhadores.
Nós entendemos que a questão indígena e quilombola é um dos pontos mais sensíveis da situação política que nós vivemos no País, hoje. Primeiro, porque os negros foram escravizados durante mais de 350 anos, não tiveram direito igual ao dos brancos, organizaram-se nos quilombos. Após isso, por pressão dos interesses comerciais do sistema, suas terras foram griladas, foram ocupadas, e é preciso resgatar o direito a esse segmento da nossa sociedade.
Da mesma forma, os índios, que são povos originários. Aliás, diríamos que se fossemos perguntar para os índios mesmos se queriam ser chamados de índios, certamente não o quereriam, porque o termo "índio" tem a ver com uma nomenclatura estabelecida pelos brancos da Europa e diz respeito à Índia, quando lá faziam transações comerciais.
Mas vivemos uma situação bastante complicada, nesse momento, dramática. Pelo menos um exemplo podemos trazer, de tantos outros que estão aqui: as comunidades presentes, certamente, falarão sobre seus problemas, seus anseios e suas reivindicações, mas a ideia era que trouxéssemos para cá uma representação dos índios guarani-kaiowás, do Mato Grosso do Sul, da região de Dourados. Infelizmente, dada a crônica crise colocada lá - deve haver alguns outros companheiros, mas eu estou me referindo ao grupo da Valdelice Veron -, eles não puderam mandar ninguém, porque os assassinatos continuam, com frequência, os estupros, os espancamentos, as agressões, que são patrocinados não só pelos jagunços do agronegócio, mas se não, muitas vezes, facilitados pelos órgãos oficiais de repressão do Estado, o que é extremamente lamentável. O Estado, que deveria proteger os povos originários, muitas vezes, em conluio com essas milícias armadas, apoia o genocídio que está acontecendo, sobretudo no Mato Grosso do Sul.
Nós entendemos que esse tema precisa ser tomado pelo Congresso Nacional, mas, sobretudo, pela sociedade brasileira. As organizações da classe trabalhadora precisam se organizar para enfrentar essa realidade extremamente triste que vivemos no País. Aliás, queria chamar a atenção de todos vocês, minha querida Presidente Regina Sousa, pois nós comemoraremos - digamos assim -, aspas, "comemoraremos", no dia 10/12, o Dia Internacional dos Direitos Humanos. Aqui no Brasil, não há nada a comemorar em termos de direitos humanos.
Queria fazer uma referência, embora essa reunião não seja voltada para isso, ao caso do Movimento Resistência Popular - o MRP -, que realiza ações para organizar os sem-teto, aqui no DF, e teve presos sete companheiros, sete dirigentes da organização, sem qualquer justificativa e sem qualquer prova. Continuam presos. Enquanto isso, as famílias estão abandonadas. Temos presente aqui a companheira Solange, que é da organização, e mais duas companheiras que fazem parte da resistência.
A polícia do DF, junto com outros organismos, realizou uma operação e tenta criminalizar os companheiros, comparando-os a quadrilhas criminosas do País. Tudo porque eles se arvoram o direito de se organizar, para tentar ter direito à moradia em um País de dimensões continentais como o nosso, em que o agronegócio tem milhões e milhões de hectares; em que a exploração fundiária, através das grandes empresas imobiliárias, detém o controle da maioria dos principais terrenos; aqueles terrenos, inclusive, dos mais valorosos.
R
Há uma combinação da luta indígena, da luta dos quilombolas e a luta do povo, que busca também sobreviver nas grandes cidades.
Queríamos registrar que, na região do Mato Grosso do Sul, são 390 indígenas assassinados nos últimos anos; só no ano de 2014 foram 41 assassinatos, isso significa, na prática, um genocídio às comunidades indígenas. Os espancamentos, os estupros, tanto de mulheres adultas como de adolescentes e muitas vezes de crianças são situações comuns. O envenenamento da água e dos alimentos são situações que ocorrem cotidianamente, isso leva a uma situação em que a própria comunidade se desmoraliza. Temos um acúmulo, nos últimos anos, de mais de 700 suicídios, não só a agressão das milícias armadas, mas também a desmoralização a partir dessas situações - dos estupros, dos espancamentos constantes, das tentativas de envenenamento -, tudo isso leva a uma desmoralização. Esse é o respeito que a sociedade brasileira dá e os órgãos do Governo Federal, dos governos estaduais, dão às comunidades originárias no nosso País.
Há um abandono completo do Estado em relação a essas comunidades e, muitas vezes, o braço armado do Estado se locupleta com as milícias e os jagunços para cometerem essas atrocidades que estamos observando no dia-a-dia. É uma situação bastante dramática, não podia ter outra intervenção aqui que não fosse com esse conteúdo.
Não bastasse toda essa política que é adotada, não bastasse toda essa pressão, o verdadeiro genocídio que vivemos, ainda criaram a PEC 215 que, na verdade, dá o controle da demarcação de terras para os latifundiários, para o agronegócio, os representantes deles no Congresso Nacional. Imagine, é como colocar a raposa para cuidar do galinheiro. Vão fazer o que com isso? Massacrar ainda mais as comunidades indígenas e quilombolas - essa é a política que está colocada aí - e criminalizar cada vez mais os movimentos.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO ARLETES RIOS BARELA - A CSP-Conlutas está desenvolvendo uma ação pela não aprovação dessa PEC. Estamos contra essa PEC, e ao lado das comunidades indígenas e quilombolas, vamos fazer todos os esforços de organizar essa luta, para que possamos reverter a possibilidade de aprovação dessa PEC.
Por fim, queríamos fechar, já que nosso tempo está concluindo, solicitando à Comissão de Direitos Humanos do Senado para que sigamos fazendo audiências desse tipo e fazendo as mobilizações necessárias para tentar reverter esse quadro atroz que vivemos no País.
A CSP-Conlutas responsabiliza tanto o Governo da Presidente Dilma quanto responsabiliza os governos estaduais pela situação de extrema complexidade e complicação para as comunidades indígenas e quilombolas que vivem no nosso País.
Esperamos que esta audiência sirva para começar a reverter essa situação. Sabemos que vai depender muito mais das nossas organizações, da nossa unidade, para lutar, mas achamos que esse pode ser um marco importante para tentarmos reverter essa situação que estamos vivendo aqui. Pelo menos que saiamos daqui com uma exigência de que a Presidente Dilma e os governos estaduais se empenhem em, de fato, demarcar as terras indígenas e as terras quilombolas, para dar a eles, que são os verdadeiros donos, o direito de sobreviver nessa região. E também que não se criminalizem os movimentos sociais, como estão fazendo agora com o MRP, com o Movimento Resistência Popular, prendendo as suas direções e a Polícia, o tempo inteiro, fazendo ações, fazendo diligências na região, para aterrorizar as famílias.
Quero fazer a denúncia de que isso está acontecendo. Tanto a Polícia Civil quanto a Polícia Militar seguem cercando a região do Hotel Torre. Aliás, por conta de dívidas é que se fechou aquele hotel; está abandonado, por conta de dívida dos grandes proprietários dos hotéis, aqui em Brasília, que é uma coisa muito comum, porque não pagam o erário e os companheiros vão ocupar. É o que está acontecendo. Uma verdadeira pressão.
Queremos, inclusive, que a CDH tire algum posicionamento nesse sentido; que pelo menos apoiem a luta do MRP contra essas atrocidades que estamos vivendo aqui, inclusive contra a pressão que está sendo exercida pela polícia, pelos órgãos de repressão, contra o movimento, nesse momento.
Muito obrigado. (Palmas.)
R
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Quero registrar a presença do José Francisco dos Santos, que é do Sindicato dos Servidores Públicos Federais, aqui do DF, que gostaria de se inscrever.
A inscrição é com a secretaria da Mesa. Temos sempre o hábito de abrir para plenária, nesta Comissão, desde que haja tempo, três minutos, mas é no final das falas.
Registro aqui as etnias presentes: Terena, Xakriaba e Macuxi; e os servidores indígenas da ouvidoria da Funai, Sebastião, Wilson e Humberto.
Há outros para registrar, mas quero convidar o Senador Telmário a presidir a Mesa, porque é direito inclusive do autor do requerimento presidir, e ele é um dos autores juntamente com o Senador Paim, além do que a identidade dele com os indígenas, no Norte, é muito forte; acho até que tem origem. Portanto, nada mais justo do que ele presidir, além do que estou precisando, de vez em quando, sair, porque estou com uma bronquite que me atacou esta semana, vinda não sei de onde. Portanto, ficarei assistindo, aqui.
Obrigada a vocês. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Quero começar dando meu bom dia a todos, agradecer de coração a todos os nossos convidados aqui presentes, porque, naturalmente, os nomes já foram declinados pela Senadora Regina Sousa. Agradecer de coração, Senador Regina, a sua colaboração em ter vindo, mesmo meio enferma, abrir esta reunião tão importante para nós. Quero agradecer a todos os nossos convidados, em nome do Presidente João Pedro, que nunca tem faltado.
Um dia, quando cheguei aqui, o Senador Paim disse: "É um milagre o que está acontecendo aqui". Falei: por quê? "Porque sempre convidamos o presidente da Funai e ele nunca veio; e você o trouxe aqui." Eu não trouxe, ele que veio. O João saiu desta Casa, é um grande Senador, tem uma boa passagem, conhece esta Casa como ninguém e hoje nos honra com sua presença tão importante nesse momento tão crítico, novamente. Sempre digo que os povos indígenas e quilombolas, diariamente, apagam, matam um leão. Parece que as pessoas nunca os deixam avançar na escada em busca de outras lutas. As pessoas procuram sempre trazê-los para a estaca zero, para recomeçar a partir dali. Nesse sentido vivem os povos originários, como bem colocou aqui, há pouco, o Dr. Paulo. E como somos originários do Brasil, o Brasil também passa por isso. O Brasil todo dia mata um leão.
Ontem estávamos dando um grande passo em mais um reajuste fiscal, estávamos aprovando um PL, o PL 5, exatamente para dar a legalidade nos atos do Governo. É interessante. Queria aproveitar esse momento e colocar isso aqui, porque acho que sou o primeiro que está falando depois de ontem, dessas votações; depois dos acontecimentos. Nesse PL que aprovamos ontem, nessas chamadas pedaladas, nesses efeitos contábeis que Presidente Dilma fez não há nenhum crime, só tem crime para ela!
R
O Governo de São Paulo, do PSDB, faz; o Governo do Paraná faz; o Governo de Minas Gerais faz, citando só os do PSDB, os maiores; o governo do Fernando Henrique Cardoso fez e o Presidente da Câmara era o Aécio Neves, que aprovou. Para a Dilma é pecado; para a Dilma, é crime; para a Dilma, é pedalada; para a Dilma, tem que cassá-la.
Então, o que a gente viu agora? Vimos o Senador Delcídio. Eu queria colocar. Perdoem-me todos aqui, mas eu precisava fazer um desabafo, neste momento, que é importante. Ele foi preso porque estava, segundo o Supremo Tribunal Federal, prejudicando uma investigação. E o Cunha, não está prejudicando o Brasil com essas pautas bombas, com tudo? Não estava na hora de ir também para a cadeia? Então, de repente, um corrupto está inviabilizando o País como um todo e colocando o País em toda essa crise. (Palmas.)
Agora vamos ouvir... Esta audiência, naturalmente, vem exatamente por isso, porque esse Cunha, querendo se segurar de qualquer forma, agarrando-se como um afogado, agarrando-se em qualquer cabelo, como se fosse um ponto de segurança, está a todo custo querendo tirar esse direito, essa luta que foi a Constituição de 1988, no art. 238, que é mudar. Essa é uma das maiores causas de estarmos hoje nesta audiência ouvindo todas essas pessoas que têm, naturalmente, um vasto conhecimento.
Daqui, Presidente da Funai, vamos tentar... Procurador Arthur que também está ali e nos honra com sua presença, queremos sair daqui com um documento, não podemos deixar só no discurso vazio e perdido. Temos um objetivo fundamental que é evitar mais mortes, como colocou aqui o Dr. Paulo; evitar esse possível genocídio, esse direito adquirido.
Então, é preciso sair daqui medidas positivas. Aqui na Casa, já temos um documento assinado por 42 Senadores que são contrários à PEC 215, e Lideranças, como o Cássio, que é Líder do PSDB; o Eunício, que é Líder do PMDB; o pessoal nosso, do PDT. Enfim, temos vários Líderes que assinaram. Agora, vou fazer como o Juruna: não tenho o gravador, mas tenho o documento. Se tentarem mudar, e aí: de manhã, assinam uma coisa; de tarde, assinam outra?
Como já falei muito, já vi as pessoas com a cara feia, vou passar a palavra para o Antonio Nonato Santos Viana, representante do Quilombo Gurutil - Mirinzal, no Maranhão.
Com a palavra.
O SR. ANTONIO NONATO SANTOS VIANA - Bom dia a todos; bom dia a esta Mesa, presidida pelo Senador Telmário Mota. Já tive também a oportunidade, pelo Acampamento Terra Livre, de estar junto. A vinda do Movimento Quilombola do Maranhão, Moquibom, faz parte da articulação nacional dos quilombos, quero deixar bem claro isso, na luta com a CSP-Conlutas, que nos acompanha nesse trabalho. Gosto de deixar claro que o Movimento Quilombola do Maranhão não é representado pela Conaq, muito menos pela Coneruque, que repudiamos, porque eles ajudam a violar os nossos direitos.
A gente está vindo aqui justamente para fazer essas denúncias. Eles tiram os nossos direitos, matam o nosso direito à vida. A PEC 215, o que já foi falado pela Senadora Regina Sousa, e também pelo companheiro Paulo Barela, queremos justamente que essa PEC jamais seja passada para o Plenário, para ser votada. Essa PEC, além de ferir a Constituição, já no art. 68, no qual tem o Governo a responsabilidade e o compromisso de fazer a titulação das terras e entregar às comunidades quilombolas e indígenas. Agora querem reverter esse artigo e dizer que as terras têm que ser entregues ao agronegócio.
R
Essa PEC se acompanha de mais dois itens, um já não é mais debatido, porque está no Supremo, a 3239, que vai contra o Decreto 4.887, de 2003, que regulamenta o art. 68, que nos dá o direito de chegar à Fundação Cultural Palmares e fazer a nossa definição como comunidade quilombola. Justamente porque essa ADI 3239 é para dizer que as terras têm que ser entregues ao agronegócio, no Norte e Nordeste, através de Matopiba. Só o Maranhão entrou com 153 Municípios para serem destruídos pelo Matopiba, para plantar soja, eucalipto, mogno, criar boi, fazer mineração, com isso, expulsando as famílias das comunidades para as periferias das cidades, onde temos uma explosão de violência. Muitas vezes perguntam: por que a violência? Porque está lá no campo, onde as pessoas são expulsas para a periferia das cidades.
Venho também denunciar milícias armadas que vivem dentro dessas comunidades afrontando as pessoas, com isso, também expulsando-as, além das canetadas dos juízes, sem um pingo de juízo na cabeça. Se tivessem juízo na cabeça, eles jamais dariam liminares expulsando famílias para viver na periferia das comunidades, na mais pura miséria.
A gente fala também sobre os assassinatos de lideranças do Maranhão. A justiça do Maranhão simplesmente se nega a levar a julgamento os assassinos. Temos o exemplo agora do companheiro Flaviano Pinto Neto, que era uma das lideranças quilombolas da comunidade do Charco, em São Vicente Ferrer, onde existe um acampamento. A justiça alega que foi mais um crime por uma questão de disputa de terra, que esse crime não foi cometido pelo fazendeiro. A justiça do Maranhão simplesmente disse que ele não tem cumplicidade no crime. Tudo foi investigado e se comprovou o mandatário do assassinato do companheiro Flaviano Pinto Neto.
Por isso, no Maranhão, com relação a tudo isso que vem acontecendo contra os povos indígenas e contra os povos quilombolas, a gente vem se agrupando em acampamentos. Temos vários acampamentos hoje no Maranhão. Temos o Acampamento Negro Flaviano, no Charco São Vicente Ferrer; temos acampamento no Cruzeiro, em Palmeirândia, justamente contra a atrocidade que o Incra cometeu na conclusão do RTD, que deixou as terras todas fatiadas, dando uma média de 70 hectares para as famílias sobreviverem. Com isso, as comunidades se juntaram e formaram acampamento. Temos acampamento em Rio do Curral, em Mirinzal, Maranhão, onde há destruição total, pelo exploração de minérios, areia e seixo.
O Ibama, que tinha a responsabilidade de punir as pessoas que estão fazendo essa destruição, está dando licenças para as pessoas que se dizem donas de terras, sem comprovar a titularidade dessas terras. o Ibama está dando licença para que sejam explorados a areia e o seixo, deixando um rastro de destruição para as famílias sobreviverem. A gente se pergunta como.
Tivemos agora essa semana a retomada do povo gamela, no território de Taquaritiua, em Viana, onde um fazendeiro, que é justamente irmão do Secretário de Meio Ambiente do Estado do Maranhão, está destruindo as terras, os juçarais, os palmeirais, os rios. E diz com autoridade: "Eu faço isso porque sou irmão do Secretário de Meio Ambiente do Estado do Maranhão". Essa denúncia é ao Governo Flávio Dino, também fazendo aqui: fechar os olhos para tamanho crime dentro da nossa sociedade, dentro dos nossos territórios, dentro das nossas terras! Então, eles se colocam através da impunidade do direito de matar, do direito de destruir. Com isso, todas as famílias são atingidas, todos os povos indígenas e povos quilombolas.
R
Temos aqui companheiros que justamente nos acompanham nessa jornada. Nós temos as quebradeiras de coco, no Maranhão, que com a destruição do babaçual vêm sofrendo a consequência no sustento das suas famílias. E os geraizeiros, os pescadores artesanais, as colheitadeiras de flores sempre-vivas, os vazanteiros. Com a exploração das áreas para exploração de areia dos rios, os vazanteiros estão perdendo espaço para plantar.
Os ciganos são pessoas que dependem desse anonimato para sobreviver, como anônimos indo e vindo de uma comunidade para outra comunidade, porque além de ser a vida deles, eles não têm terra.
Com isso vem a exploração das nossas comunidades, dos nossos povos, tentando com isso matar a nossa cultura, porque tirando a nossa identidade nos tornam mais indigentes ainda, quando nos expulsam das nossas terras e nos colocam na periferia das cidades.
Eu gosto de lembrar sempre, e eu disse na última audiência para o Deputado Paulo Pimenta, que é Presidente da Comissão de Direitos Humanos na Câmara dos Deputados, que cada comunidade expulsa de suas terras e que vai para a periferia torna a pessoa insegura. Você vai fazer um muro alto, você vai botar vários seguranças, você vai botar todas as grades na sua casa, mas eles vão entrar na sua casa. E ele perguntou: isso é uma ameaça? Eu: não, isso é uma realidade. É o que estamos vivendo nas nossas periferias. É isso que está acontecendo nas periferias. Porque as famílias são expulsas da terra de onde elas trabalham e tiram o sustento. Eles ficam sem a terra e precisam sobreviver. E aí não se sabe o porquê. Não sabem o porquê da causa e se julga para encher os presídios.
(Soa a campainha.)
Eu queria também, nesse minuto, fazer uma denúncia da Universidade Federal de Goiás. O último vestibular feito pela Universidade Federal de Goiás, na questão nº 40, olhem o que ela considerou como correta a questão: "a classe trabalhadora do campo encontra-se organizada e está encerrada a luta por direitos, pois já existem políticas públicas que suprem as suas demandas".
Isso é um crime que a comunidade de Goiás está cometendo com a educação. Nós consideramos a questão correta: A violência na sociedade brasileira, acentuada pelo incremento do agronegócio, segue encontrando o parapeito camponês, que resiste, tirando e se organizando culturalmente". É isso que vivemos hoje.
Temos que nos reorganizar e viver culturalmente, reorganizarmos culturalmente para sobreviver dentro das comunidades. E a Universidade considerava a questão.
Nós arrolamos mais de 50 pessoas, fizemos manifesto, pedimos a anulação dessa questão. E dissemos que íamos para a luta, denunciar na imprensa esse crime.
Na terça-feira, a Universidade voltou atrás e considerou a questão de letra d como correta, porque o agronegócio no campo é o que está justamente fazendo com que nós possamos nos recriar culturalmente e resistir a todo tipo de violência que estamos vivendo. Porque nós indígenas e quilombolas não admitimos perder nossas terras para eucaliptos, para a soja, para a cana-de-açúcar, para o mogno, para o boi e muito menos para a mineração. Que a imprensa só voltou a falar do crime da mineração em Minas Gerais quando nós começamos a bater diretamente nas redes sociais, onde ela mudou o foco para a França. E deixou Minas Gerais com milhões e milhões de pessoas e famílias sem direito à vida e sem direito à sobrevivência.
R
Então, a imprensa resolveu se voltar para Minas Gerais e mostrar para o mundo o que está acontecendo.
Por isso que quando o Senador fala aqui que ninguém sai daqui com documentos... sem que documentos sejam incluídos, também eu digo não à PEC 215, também não ao Código de Mineradoras, de Mineração. Isso é um crime que está acontecendo.
Então essas palavras querem dizer que nós, Senador, vamos continuar lutando e que jamais... Enquanto existir um índio, enquanto existir um quilombola, nós vamos continuar lutando para ter o direito de nossas terras, para ter a promoção de direito de nossas famílias e nos recriar culturalmente, e viver com dignidade, e assim produzir o alimento que vai na mesa de todas as famílias deste País, inclusive na de quem tinha responsabilidade de cuidar das leis de nosso País.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Portanto, ouvimos o Antonio. E eu quero aqui pedir desculpas à Promotora Úrsula. Eu quero parabenizar a Promotoria da República, todas as promotorias, estadual, federal, pelo brilhante trabalho que vêm desenvolvendo e dando garantias às leis e aos direitos do povo brasileiro.
Você vê que muitas sujeiras que estão vindo com muita dificuldade, debaixo dos tapetes, são fruto dessa constante vigilância, dessa coragem, dessa determinação e dessa visão das leis brasileiras.
Quero parabenizar em nome dos dois promotores que aqui estão e quero uma salva de palmas para eles. (Palmas.)
Na ordem, iríamos passar a palavra ao Dr. Paulo, mas o Dr. Paulo vai ter um pouquinho de paciência, porque o Presidente João Pedro tem uma viagem em seguida, vai a Alagoas exatamente ver conflitos. Hoje é a vida dele. Deixaram Funai assim, presa, tiraram todos os recursos da Funai, engessaram a Funai sem dinheiro e ainda querem acabar com ela. Há alguns ruralistas que querem realmente acabar com a Funai.
Eu sempre dizia nas comunidades do meu Estado que a Funai, bem ou mal, é o esteio. Você sabe o que é esteio? Os parentes sabem, né? Esteio é...
O SR. ANTONIO NONATO SANTOS VIANA - Que segura a casa.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - ...que segura a casa. O Antonio conhece bem esse negócio.
Então, bem ou mal, é o esteio que segura a casa. Sem a Funai, acaba com tudo. Então, o que precisa é a Funai novamente ser fortalecida, e o Antonio e João Pedro sabem disso. E podem contar a gente. Foi tudo de afogadilho. Ainda tem o ano que vem para a gente começar a reconstruir.
Então, tiraram da Funai a educação indígena, tiraram a saúde, tiraram o filé mignon e deixaram a parte mais ruim dos ossos. Deixaram os ossos sem o tutano, porque se os ossos estão sem tutano, não tem nenhuma alimentação. Não é isso?
Então, o João está fazendo esse malabarismo, um bom trabalho. É difícil, muito difícil. Eu sei, João. Você por dia deve matar vários leões, várias dificuldades, suplantar várias dificuldades. Mas você sempre conta comigo.
E vou franquear a palavra agora para ele, que precisa pegar o avião e tomar o rumo para Alagoas, porque lá também está precisando da presença dele.
Com a palavra.
O SR. JOÃO PEDRO GONÇALVES DA COSTA - Bom dia a todos e a todas. Quero saudar os povos indígenas que estão aqui, os caciques, o povo terena que está aqui presente, o maxakali, tuxá, xakriaba.
Quero saudar as lideranças quilombolas, saudar aqui os meus parceiros de Mesa, os Senadores, os servidores da Funai, as organizações não governamentais, todos que estão aqui nesta reunião do Senado.
E este momento que estamos vivendo no nosso País, crise política, crise econômica, há uma pressão muito forte contra os povos indígenas, haja vista a PEC aprovada na Comissão, PEC 215, que a Funai é contra; haja vista a CPI aberta contra a Funai, contra o Incra.
R
Esta CPI foi articulada para constranger, para confrontar os movimentos sociais. E nós também somos contra a CPI.
Evidentemente que respeitamos o direito da Câmara dos Deputados de criar, constituir qualquer CPI. Mas nós não podemos nos calar frente a essa articulação política de tentar incriminar as ações da Funai, os relatórios antropológicos, e de negar o direito à terra. É verdade. Os processos foram acontecendo: tiraram a saúde, a educação, e a Funai ficou com a terra. E agora querem tirar a terra da pauta: a competência constitucional que a Funai tem de definir as terras indígenas.
Senadora Regina, Senador Telmário, a Funai não cria terra indígena, a Funai reconhece a terra indígena. Então, nós vamos resistir a esta CPI, junto com a sociedade civil, com os servidores da Funai, com o movimento indígena. Nessa conjuntura tão difícil, tão dura, o Poder Judiciário, nas suas várias instâncias, tem tido manifestações inovadoras, mas contrárias à tradicionalidade das terras indígenas. Precisamos tratar desta questão.
E nada mais importante do que espaços dentro do Congresso Nacional, como, por exemplo, nesta Comissão. Quero saudar a todos vocês, membros da Comissão de Direitos Humanos, por garantir permanentemente esse espaço, para que os povos indígenas, a sociedade civil, a Funai possam ter o direito de colocar suas ideias, suas opiniões, e travar, evidentemente, o melhor debate.
Então, nós estamos vivendo um momento muito difícil, com muita pressão contra os povos indígenas, contra sua história, contra o presente, mas é uma articulação que nós não podemos subestimar. E nós precisamos de muita unidade no movimento, nas entidades, na sociedade civil, com Parlamentares, Senadores e Deputados, para que possamos enfrentar agora os problemas e não comprometer o futuro dos povos indígenas.
Então, nós precisamos fazer essa articulação permanente. Daí a importância - eu poderia deixar para o final, mas já falando - da nossa conferência. Nós iremos realizar a 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista. Nós já vencemos duas etapas: as etapas locais - mobilizações das aldeias, nas terras indígenas por todo esse Brasil. Mobilizamos mais de 30 mil pessoas nas etapas locais -, e já concluímos, agora no final de outubro, as etapas regionais - estamos chegando em Brasília.
Nos dias 14 a 17 - todos estão convidados para participar da nossa conferência -, nós vamos concluir a conferência, que é um decreto da Presidenta Dilma que nós estamos executando de forma muito rica. E nós vamos concluir a conferência em dezembro, aqui, antes do recesso parlamentar.
R
E o Brasil vai ouvir as opiniões dos nossos representantes de todo Brasil, do povo Yanomami lá em Roraima ao povo Kaingang, no Rio Grande do Sul.
Nós vamos estar aqui - em torno de duas mil pessoas, dois mil representantes, convidados, servidores da Funai e povos indígenas - para chamar a atenção do Brasil, da Funai, da Casa, do Poder Executivo, do Poder Legislativo, do Congresso Nacional e do Poder Judiciário.
Então, esse é um momento importante, com toda a adversidade, com todas as pressões contra os povos indígenas. Nós vamos concluir a nossa conferência em dezembro, com essa expressiva participação dos povos indígenas.
Mas a pauta que trata da PEC tem deixado todo esse quadro, toda essa conjuntura, Presidente, Senador Telmário, Senadora Regina, Senadores da Comissão Direitos Humanos, e os povos indígenas extremamente preocupados, nervosos, por conta dessa pressão.
É verdade que a pressão contra os povos indígenas vem desde o século XVI, quando o europeu chegou aqui. A história dos povos indígenas, das nossas etnias - são 305 povos no Brasil, reconhecidos pelo IBGE - tem sido uma história de resistência.
Evidente que têm havido conquistas, nós temos referências. Mas precisamos avançar ainda mais nos direitos dos povos indígenas, no reconhecimento das etnias que compõem a sociedade brasileira, no respeito às suas artes, à sua cosmologia, no respeito que o Estado democrático de direito...
(Soa a campainha.)
O SR. JOÃO PEDRO GONÇALVES DA COSTA - tem que ter com a ancestralidade dos povos. É inadmissível, inconcebível, essa pressão e negação a terras indígenas.
Quero dar um exemplo aqui: em Mato Grosso do Sul, um Estado rico, grande, produtor de grãos, que nega terra ao povo Guarani Kaiowa, ao povo Terena. Como um Estado democrático de direito pode negar direitos que a Constituição garante? Foi uma conquista importante dos Constituintes de 1988, das lideranças, dos caciques, da sociedade civil, que pactuaram os dois artigos: os arts. 231 e 232.
Agora nós iremos parar e teremos uma grande mobilização, uma vigília contra essa tentativa da PEC 215, contra esta CPI, que vai na mesma direção. A CPI também tem essa estratégia de tentar desqualificar, de tentar desconstruir, criar confusão, inclusive entre nós e os povos indígenas. Mas o remédio da CPI é fazer valer a PEC 215.
Então, nós precisamos ter muita atenção, resistir, dizer não. E eu espero que a PEC não chegue ao Senado, que ela seja derrotada lá na Câmara dos Deputados, porque ela tem que ir duas vezes ao Plenário.
R
Mas há um compromisso político das assinaturas dos Senadores aqui no Senado - se ela conseguir chegar até aqui - para que o Senado honre as assinaturas e coloque na lata do lixo a PEC 215. (Palmas.)
Por fim, eu publiquei um relatório da terra kaxuyana, lá no Pará, lá na Amazônia, mas que é uma terra oriunda de um entendimento novo, um entendimento com os quilombos. Essa é uma terra que nós publicamos a partir de um entendimento com os quilombolas, com índios e negros. E essa é uma experiência inovadora em que nós podemos fazer uma gestão compartilhada em um território, respeitando a territorialidade e que diz respeito a esta audiência pública.
Nós podemos, sim, pactuar entendimentos e trabalharmos negros, sua história, povos indígenas, sua história, suas ancestralidades, trabalhar o presente e o futuro desses povos. Essa é uma experiência nova. Publicamos o relatório e ele está aí para ser contestado. Já sabemos que há articulações para contestar essa terra indígena. Mas nós confiamos nos nossos relatórios, nos nossos estudos e vamos enfrentar esse debate. Eu espero que nós possamos vencer mais essa batalha.
Eu vou para a terra indígena xucuru-kariri, em Cachoeira Palmeiras, e por isso vou ter que sair. Mas a Solange, que é nossa assessora parlamentar que cobre o Congresso Nacional, vai ficar aqui. Ficam aqui as minhas palavras. Eu ainda tenho alguns minutos. Vou ouvir o Paulo. Mas quero dizer da importância desta audiência pública e dizer ao Senador Telmário, que é de Roraima, que é de um Estado que tem uma presença de povos indígenas histórica, que compõe a resistência dos povos indígenas do Brasil, que nós possamos dar continuidade às mobilizações e às articulações para derrotar a PEC, mas também para fazer valer os direitos dos povos indígenas no nosso País. Não pode haver nenhum retrocesso, nenhum passo atrás daquilo que foi conquistado. Pelo contrário, nós precisamos avançar nas demarcações de terras, nas políticas públicas, com o PNGATI, porque a gente precisa trabalhar mais e com mais força, com mais articulações.
Muito obrigado pelo espaço e pelo convite à Fundação Nacional do Índio. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Ouvimos a palavra do Presidente João Pedro. Gostei muito. Inclusive, quero que depois a nossa assessoria, os universitários façam uma cópia da fala do João, porque ele colocou umas coisas interessantes. Ele diz, meio que filosofando, pois no Estado do Amazonas o povo filosofa mesmo; "A Funai não cria áreas indígenas, mas reconhece as terras que são tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas. Por isso, vamos resistir".
Não merecem palmas, isso? (Palmas.)
Quero registrar a presença do Vilmar Souza Costa, Presidente da Associação Quilombo Kalunga, do Município de Cavalcante, Teresina, e Monte Alegre, do Estado de Goiás.
Seja bem-vindo! Sua presença nos honra neste momento em que a gente está aqui.
Quero registrar também a presença da Thereza Alencar, executiva do Sindsep-DF.
Está aqui também o Senador Donizeti, que vem do Tocantins. Como lá o sol estava muito forte e os jogos foram realizados durante um sol quente, ele disse: "Eu vou usar um cocar". Mas ele se esqueceu de que o cocar não tem proteção em cima, mas mesmo assim ele se protegeu.
Donizeti, Senador aqui tem preferência. Por isso, se você quiser fazer uma ligeira fala ou quiser ouvir um pouquinho mais antes do próximo orador...
Bom, então vamos continuar com os nossos convidados.
Vamos ouvir agora o Paulo Celso de Oliveira Pankararu.
Qual a sua etnia?
R
O SR. PAULO CELSO DE OLIVEIRA PANKARARU - Pankararu.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - De qual Estado?
O SR. PAULO CELSO DE OLIVEIRA PANKARARU - Pernambuco.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Pernambuco? Há um rapaz lá que é vereador e é indígena. É Paulo também o nome dele?
O SR. PAULO CELSO DE OLIVEIRA PANKARARU - É.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Eu gostei muito de ouvi-lo um dia desses aqui. Um dia desses, nós conseguimos aqui quebrar esse preconceito que existia. O Congresso foi todo ocupado pelos povos indígenas. Até hoje as minhas roupas estão manchadas de urucum.
Mas, com muita honra, Paulo, advogado da Funai, tem a palavra.
O SR. PAULO CELSO DE OLIVEIRA PANKARARU - Bom dia, Senador Temário Mota!
Quero agradecer pela oportunidade de participar desta Comissão. Quero cumprimentar o Presidente da Funai, João Pedro, e agradecer-lhe por permanecer aqui alguns minutos antes da sua viagem, para escutar a minha fala.
Senhoras e senhores membros da Mesa, lideranças indígenas, quilombolas, apoiadores da causa indígenas e das comunidades quilombolas, quero começar dizendo que eu faço parte do povo pankararu, que habita a região do submédio São Francisco, no Estado de Pernambuco, na região do Sertão. Desde 1600, nós já habitávamos as ilhas do São Francisco, igualmente os tuxá e outros povos do Sertão.
Eu quero somar a minha fala à dos expositores que me antecederam e falaram sobre a questão indígena, a questão quilombola. O Presidente João Pedro colocou muito bem o quadro atual que vivemos. Colocou também essa questão da PEC, da CPI da Funai. Esses são temas que colocam em risco as conquistas dos povos indígenas e todos os avanços que tivemos a partir da Constituição Federal de 1988.
Então, os povos indígenas estão numa luta muito grande para não permitir que esse retrocesso aconteça. É verdade que as lutas indígenas são antigas e vamos continuar trabalhando firmemente para garantir o direito à terra, para garantir o fortalecimento da Funai, órgão que orgulha não só os povos indígenas, mas também o País. Nós temos mais de cem anos de tradição de políticas indigenistas, pois somando o período de existência do SPI com a Funai, em 2010, nós completamos cem anos de política institucional voltada aos povos indígenas. O Brasil é o País que mais tem antiguidade na tradição, na institucionalidade de ter um órgão de proteção aos povos indígenas.
Então, o trabalho que nós queremos desenvolver é fortalecer a Funai para fortalecer a defesa, a proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas. E essa Conferência Nacional, que o Presidente João Pedro mencionou, vai ser um evento muito importante para garantir esses direitos, como já vem sendo a partir da realização das etapas regionais.
No que se refere à questão da PEC 215, eu também tenho que mencionar que faço parte da Comissão Especial de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, vinculada ao Conselho Federal da OAB. E a avaliação é que essa PEC viola a Constituição Federal em dois sentidos: primeiro, quando a Constituição prevê que é possível apresentar emendas para modificá-la, essa previsão é no sentido de aperfeiçoar o texto constitucional para melhorar a realidade da população. Por isso, ela estabelece limitações, ou seja, aquilo que não pode ser modificado.
R
Quando o Poder Constituinte originário aprovou a Constituição, quando ela foi promulgada, em 1988, o fez muito bem reconhecendo os direitos originários dos povos indígenas, para garantir a continuidade da vida dos povos indígenas e suas terras, seus usos, costumes e tradições, e o Brasil vinha avançando muito bem nesse sentido. Portanto, o art. 231 expressa o direito à vida das comunidades indígenas. Quando o povo indígena não tem uma terra, ele passa a sofrer uma vulnerabilidade em todos os sentidos, porque é ali onde encontra agasalho, a proteção para continuar vivendo de acordo com seus modos próprios de vida, sua própria cultura.
Então, dizemos que esse é um direito fundamental dos povos indígenas e está aí o primeiro vício da PEC 215, que é a violação de um direito fundamental, e a Constituição não permite isso.
Outro aspecto é que essa PEC fere também o Princípio da Separação dos Poderes. Nós sabemos que, de acordo com os princípios que orientam a República, nós temos o Poder Judiciário, que tem a sua missão própria; o Executivo, que faz o cumprimento da legislação, executa o que está previsto na legislação e o Congresso Nacional, em resumo, produz a lei, tem sua função legislativa. Não é missão do Congresso Nacional demarcar terras indígenas, essa é uma função que historicamente pertence ao Poder Executivo, é uma competência do Poder Executivo e que está previsto em lei, na Constituição, em leis e decretos, e que há uma tradição que fez todo o reconhecimento das terras indígenas do País e que permitiu avanços nesse sentido. Há pendências, questões a serem resolvidas, mas nós temos uma legislação, uma forma de atuar e que deve ser respeitada.
Quando se pretende passar essa atribuição ao Congresso Nacional, fere-se toda a organização da ordem jurídica do País, portanto, ela é inconstitucional por ferir a repartição dos Poderes. Cada Poder tem sua competência; então, esse é um princípio, a separação dos Poderes, estabelecido pela Constituição Federal e o Poder Constituinte derivado; tínhamos ali o Poder Constituinte originário, que promulgou a Constituição e que permitiu que ela fosse mudada pontualmente, mas resguardando esses princípios, direitos fundamentais e a separação dos Poderes.
Portanto, o Poder Constituinte derivado não pode seguir além desse passo. Ele tem que se ater às questões que estão previstas na própria Constituição, por isso, nós vamos continuar lutando. Várias delegações indígenas têm vindo a Brasília e têm encontrado apoio aqui de outros movimentos sociais, os quais nós agradecemos, por exemplo, as comunidades Quilombolas, que também têm participado dessa luta. Então, o movimento tem vindo a Brasília, tem deixado isso muito claro para o Congresso Nacional.
Essa manifestação dos 48 Senadores é muito importante para os povos indígenas, no sentido de deixar claro que aqui no Senado os povos indígenas encontram apoio. Por isso, Senador Telmário Mota, nós agradecemos e solicitamos que o Senhor e os demais Senadores continuem nessa luta, nesse trabalho para que a PEC não venha a ser aprovada, que ela não venha a prosperar, porque o que está em jogo é a segurança jurídica dos povos indígenas também. Falam tanto na segurança jurídica e quando vai tratar da questão indígena querem mudar tudo ao avesso. Não vamos permitir e não se pode permitir isso.
(Soa a campainha.)
R
O SR. PAULO CELSO DE OLIVEIRA PANKARARU - Agradecemos muito o apoio do Senado e também devemos registrar esse apoio da presidência da Funai, que já se manifestou bastante firmemente favorável aos povos indígenas.
E, para finalizar, nós consideramos que é importante o Senado trabalhar também para a implementação da Convenção nº 69, que trata dos direitos dos povos indígenas, que foi ratificada aqui, em 2012, e representa um passo muito importante para os direitos indígenas, considerando que em todos os processos do Legislativo e do Executivo que estejam relacionados aos interesses dos povos indígenas, nós temos que ser ouvidos, deve haver a participação indígena.
Então, é importante que o Senado se dedique à implementação dessa convenção e que a pauta indígena, em vez de ser tratada criando problemas para as comunidades indígenas, passe a tratar da implementação desses direitos para melhorar a qualidade de vida das comunidades indígenas.
A Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial em terras indígenas, que foi construída pelos povos indígenas, Funai, Ministério do Meio Ambiente e organizações de apoio, contempla os interesses dos povos indígenas. Precisamos avançar na sua implementação e também, em especial, promover o etnodesenvolvimento, que é a promoção do desenvolvimento das comunidades indígenas de acordo com sua cultura, de acordo com suas aspirações.
Então, em vez de ter que vir a Brasília para a gente correr atrás do prejuízo, para superar ameaças, retrocessos, nós gostaríamos de estar discutindo a melhoria da qualidade de vida da comunidade: como se vai melhorar a educação? A saúde? A sustentabilidade? Como nós vamos poder continuar contribuindo para a preservação do meio ambiente? Nessas questões das mudanças climáticas que estão em pauta, nós contribuímos bastante para o País, não só para comunidade indígena; não é só a terra indígena que é beneficiada com isso. Nós precisamos trazer esse debate e ajudar os povos indígenas a garantir essa proteção, essa preservação, superar as pressões e colocar o País em outros rumos.
O Brasil tem um potencial muito grande para liderar esse processo internacionalmente, temos muito a contribuir, então, precisamos reverter esse quadro e melhorar essa situação.
Agradeço aqui por essa oportunidade e fico à disposição para responder perguntas também.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Todos nós ouvimos as palavras do Dr. Paulo. Ele trouxe conhecimento mais jurídico da situação e que, naturalmente, se essa PEC chegar até o Senado, nós temos que juntar forças, Presidente João Pedro, com a Funai, para nos municiar dessas orientações técnicas, jurídicas, para que a gente possa fazer um trabalho de convencimento de gabinete em gabinete, apesar de a gente já ter aí um manifesto. Mas nunca é demais e é nessa hora que, realmente, chega a grande pressão.
E antes de passar aqui a palavra ao Senador Donizeti, que vai já usar a palavra e a pressão começar dentro desta Casa, deixe-me ler aqui para você,s rapidamente:
Senado abre caminho para a lei que fragiliza licenciamento ambiental no País. [Deu no jornal esses dias aí] Foi uma surpresa, aproveitando o tenso clima político provocado pela prisão do Líder do Governo no Senado, nesta 4ª feira. A Comissão Especial do Desenvolvimento Nacional aprovou o Projeto de Lei nº 654, de 2015, do Senador Romero Jucá, de Roraima, que torna ainda mais frágil o licenciamento ambiental de grandes obras no País. A iniciativa cria um rito especial sumário de licenciamento ambiental para empreendimentos de infraestrutura no sistema viário, hidroviário, ferroviário, aeroviário, portos, energia, telecomunicações. Os Senadores tiraram da proposta a autorização de licenciamento especial para empreendimentos que explorem recursos naturais.
Ainda além dos que estavam havia os recursos naturais, onde entrava a pressão das mineradoras e ainda das barragens. Como eu não faço parte dessa Comissão, porque foi criada uma tal de Agenda Brasil - ou Afunda Brasil, pois às vezes tem acontecido isso -, eu fui lá, conversei com o Senador Cristovam, que é membro; com o Senador Reguffe, que também é membro.
R
O Senador Reguffe e o Senador Randolfe o pressionaram e conseguiram tirar desse projeto do Senador de Roraima essas duas proposições que eram de mineradoras, e também a da questão das barragens, usando um pouco, infelizmente, o acontecimento de Mariana. Ora, se com tudo que já havia tivemos essa tragédia em Minas Gerais, terra natal do Senador Donizeti, imaginem se fragilizarmos esse licenciamento? Mas logo adiante vemos uma matéria da Veja
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Deixe eu me despedir, senão perco o avião.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Vai com Deus.
Uma salva de palmas para o nosso Presidente. (Palmas.)
E, logo adiante, vemos porque o Senador Romero defende a exploração de ouro em terras indígenas. A revista fala de um projeto que tem pressionado tanto, até que retirou, mas estava metendo essas cascas de banana nesses outros lugares. Ontem, a Senadora Ângela Portela, também de Roraima, fez uma grave denúncia na tribuna; está aqui: Ângela Portela defende leis sobre mineração mais eficazes. Então, ela fala dessa fragilidade e diz aqui que só uma empresa em Roraima, mineradora, tem uma expectativa de exploração em áreas que somam 110 mil ha, mais de 5% do total das áreas potencialmente produtivas. Ora, só na área produtiva, esta mineradora tem pretensão de 110 mil ha, 5%, fora nas áreas indígenas.
E a filha do Senador tem uma mineradora, tomara que não seja essa. E isso, estamos combatendo. Então, a força, vocês sabem que é muito grande, ela começa, internamente, às vezes, porque o cara não é Parlamentar, mas usa o Parlamento para se locupletar. Por isso, muitos vão findar na cadeia ainda, porque ou você é político, ou empresário, ou minerador.
Com a palavra o Senador Donizeti.
O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Meu bom dia a todos e a todas, Senador Telmário, combatente guerreiro das causas dos povos indígenas, esta Casa é uma loucura, não dá para estarmos sempre, hoje, já estou na terceira Comissão, então, é muito corrido e tenho que viajar hoje, mas eu queria comentar duas coisas: primeiro, os jogos mundiais dos povos indígenas. Quem esteve lá teve oportunidade de se emocionar com a voz da cantora Margareth Menezes, madrinha dos jogos, que, só microfone e voz, calou toda a arena, que estava lotada com mais de 5 mil pessoas, e comecei a fazer uma reflexão: penso que essa poesia do Caetano Veloso chega a ser uma profecia e quero dizer que a profecia se cumpriu, em parte, nos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, quando diz:
Um índio descerá de uma estrela colorida, brilhante
De uma estrela que virá numa velocidade estonteante
E pousará no coração do Hemisfério Sul
Na América, num claro instante...
Se fizermos uma breve correlação aqui, precisamos perceber que esse momento dos I Jogos Mundiais dos Povos Indígenas é um momento extraordinário e precisamos, também, dar consequência ao resultado que cria de imediato. Penso que o primeiro resultado que cria é a oportunidade de reunir diversas etnias de diversos países e dá essa demonstração de que é possível reunir nas diferenças e construir convergência; segundo, os Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, para mim, reacende e traz para a agenda brasileira a pauta dos povos indígenas brasileiros. E esta questão de trazer para a agenda brasileira essa pauta precisa ter uma consequência. Então, penso que conseguimos esse legado.
R
Mas quais os legados, nos diversos aspectos, que os Jogos Mundiais dos Povos Indígenas podem e devem deixar para os povos indígenas no Brasil? Penso que poderíamos começar, Senador Telmário, fazendo, no início do ano que vem, na reabertura dos trabalhos, uma audiência pública, para avaliar essa questão do legado que os Jogos Mundiais dos Povos Indígenas está deixando ou precisa deixar.
Conversei com o Ministro do Esporte, com o FNDE, precisamos conversar com a saúde, mas temos que ter um grupo interministerial que vá, agora, levar esse legado em relação à educação, à saúde. Algo extraordinário que vi, tanto do ponto de vista do artesanato, mas sobretudo, da agricultura tradicional dos povos indígenas lá, na feira, é que vendeu tudo, até faltou. Então, essas questões precisam ser bem articuladas, e precisamos contribuir. Acho, de certa forma, hipocrisia dizer que nós, brancos, vamos reparar o prejuízo que os nossos ancestrais provocaram e causaram aos povos indígenas. Mas, se não podemos reparar este prejuízo, podemos ajudar a construir uma nova perspectiva fortalecendo a cultura, os costumes, cada etnia, cada tribo, cada pessoa indígena, para que comece esse processo de reconstrução.
Então, penso que o nosso papel aqui, no Parlamento... e eu, já em Palmas, tive oportunidade, durante a abertura da Feira da Agricultura Tradicional, de me posicionar contra a PEC 215, nem sei se assinei o Manifesto, não lembro, mas estou batendo nesta questão, contra a PEC 215, há bastante tempo. Certo?
Então, Senador Telmário, quero me somar a V. Exª para ver se fazemos essa audiência, conversando com as lideranças dos povos indígenas, para não deixarmos essa pauta esfriar. Foi um evento que mobilizou Palmas. Para vocês terem uma ideia, só houve uma vez na vida em que o Estádio Nilton Santos ficou lotado, que foi num jogo que o Atlético Mineiro fez lá, mas, durante os Jogos, todos os dias nas partidas de futebol, sobretudo na final, não se pode deixar todo mundo que queria entrar, por causa do controle muito rígido do povo da segurança dos grandes eventos, que, quando achava que estava lotado, parava de entrar. Mas ficou lotado o estádio, na final em que os xerentes foram campeões mundiais de futebol, e as mulheres xerentes, vice-campeãs, porque criou uma empatia com a Cidade: eram meninos, velhos, jovens, adultos tirando foto, comprando artesanato, e isso precisa continuar.
Então, para não esfriar essa pauta, quero, não sei se é o mais correto, propor que realizemos uma audiência pública aqui, no âmbito da Comissão de Direitos Humanos, no início do ano, para discutir a questão do legado dos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas. É muito fácil, eu já disse isso lá, em Palmas, algumas vezes, disse aqui, no dia em que houve uma audiência, dizer que vai ficar um espaço esportivo na Cidade de Palmas como legado, mas isso não significa nada, porque cada etnia, cada povo está lá no seu lugar; o que precisamos é levar essas condições para o lugar onde estão juntos.
Visitei a Aldeia dos Xerentes, junto com o Embaixador da Bélgica - há muito tempo eu não ia lá; sempre vou, mas já fazia um tempo que não ia -, e o que vi de crianças e jovens, na Aldeia Porteira e em outras aldeias que se reuniram lá, para receber o Embaixador, foi algo extraordinário. Então, precisamos deixar como legado apostar nessas crianças e nesses jovens, para que possam ser como o Paulo Celso de Oliveira Pankararu: advogado, engenheiros, engenheiros agrônomos, sobretudo, técnicos, cientistas, porque eles têm muito a contribuir.
R
Era essa a minha colocação aqui hoje, de dizer que estou junto nessa questão, para combater a PEC, estou junto nas causas, aquelas que eu der conta e tiver condições de contribuir, eu estou aqui à disposição, o gabinete está à disposição.
E muito obrigado pela oportunidade de estar aqui. Preciso continuar andando aí em outros trabalhos, mas deixo um beijo no coração de cada um e cada uma, um abraço na alma de todos, e viva o Brasil! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Obrigado, Senador Donizeti. Sei que V. Exª está em outras Comissões, como eu também estaria agora em outra e vim aqui.
Mas eu só queria, com relação ao futebol que é a parte do lazer... Eu morei onze anos dentro de uma comunidade; vivi onze anos e conheço como ninguém. Na comunidade joga o homem, joga a mulher. A mulher joga mais do que os homens, hoje. Não importa se ela está... Há delas que jogam até com um curumim no braço. Quando ele está muito pequeno, ela faz isso.
Mas eu vou lhe dar uma sugestão: eu, pelo menos, coloquei 500 mil para fazer um campeonato indígena regional no Estado. Faça isso, coloque recursos e faça também lá. Cada Senador fazendo isso, começa a ter integração; depois a gente faz uma grande integração. (Palmas.)
Bom, vamos ouvir agora a Drª Givânia Maria da Silva, Secretária de Políticas para as Comunidades Tradicionais da Seppir.
A SRª GIVÂNIA MARIA DA SILVA - Bom dia a todas. (Pausa.)
Bom dia a todos e a todas. Cumprimento a Mesa no nome do Senador.
Agradeço o convite feito ao Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, na pessoa da Ministra Nilma Lino Gomes, que por estar presidindo uma conferência junto com a ONU, do ano, da década, do afrodescendente, não pôde estar aqui e me delegou que eu estivesse aqui.
Cumprimento os companheiros quilombolas, o Vilmar, presidente da Associação do povo kalunga, que é um complexo de comunidades muito intenso e extenso, ao mesmo tempo bastante produtivo, de cultura, de conhecimento, e também de outros valores. E aos parentes, os indígenas aqui de várias etnias. Ao Paulinho em especial, porque somos conterrâneos, somos de Pernambuco, o Paulinho do povo pankararu, com quem nós, lá do Sertão de Pernambuco, mantemos uma relação bastante próxima, com as lideranças, sobretudo no campo da educação.
Orgulha-me muito poder estar aqui nesta Mesa, não só na condição de gestora, Senador, que sou, mas sou também descendente de um quilombo no interior de Pernambuco, que é parente de um povo indígena, do povo atikum, um povo lá do Sertão de Pernambuco, que tem muita aproximação com os povos indígenas do meu Estado.
Eu queria dividir minha fala, quis muito que o João estivesse aqui, para dizer a ele que para mim ele não é só o presidente, mas ele continua sendo Senador. Eu sempre o chamo de meu Senador.
Cumprimento a Senadora Regina. Essa gripe, Senadora, foi essa tensão que a senhora viveu junto com as mulheres, com todas as pautas do Senado, e ainda foi a grande força na construção da Marcha das Mulheres Negras, que cumpriu aqui em Brasília, Senador, talvez uma das tarefas mais importantes, que foi pôr um conjunto de mulheres - os números são divergentes -, mas um conjunto de mulheres - há quem diga que 50 mil mulheres, não sei ao certo -, mas de mulheres negras, dizendo "não" a todo tipo de discriminação e requerendo bem viver. E quando as mulheres negras falam isso, elas falam a partir de um território, de onde elas estão, seja no quilombo, seja na periferia, seja onde elas estiverem.
R
Então acho que essa intensa gripe, Senadora, também é do forte trabalho que já tem e que esteve mais alargado agora nesse período de fortalecimento das mulheres negras aqui na marcha.
Parabenizo a Funai pela realização da primeira conferência indígena. Eu acho que a conferência indígena traz para a sociedade brasileira um novo olhar sobre os povos indígenas. Coloco o nosso Ministério à disposição. Disse isso ao presidente da Funai aqui, estou fazendo isso publicamente, porque a ministra entende que o nosso papel, enquanto Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, é fortalecer o trabalho da Funai, porque a Funai é, sim, a base dessa política.
Podemos discutir como melhorar, mas não podemos imaginar a política indígena sem a Funai. Precisamos fortalecer a Funai e não acabar com ela.
Cumprimento também o Ministério Público pela atuação que tem tido, em vários Estados, junto às comunidades quilombolas. Acho que tem sido um parceiro com que contamos.
Rapidamente me dirijo à questão da PEC. O que eu vejo, o que nós do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos observamos sobre a PEC, Senador? Primeiro, ela não tem sentido, porque retoma uma política, um pensamento que em 2002 nós eliminamos quando elegemos o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Naquele período, o governo daquele momento tinha essa mesma concepção de temporalidade, de marco temporal, para dizer quem era quilombola e quem não era. E foi, meus companheiros e meus parentes aqui, a força do movimento social, liderado pela Coordenação Nacional dos Quilombos, a Conaq, que juntamente com outros setores do movimento social não só derrotou aquele pensamento, como também construiu, ainda no governo de transição, o caminho para a construção do Decreto nº 4.887.
Então, dizer isso é dizer que a PEC não é só uma afronta aos povos indígenas e aos povos quilombolas, mas é, sobretudo, a cassação de um direito que esses grupos, a duras penas, conquistaram a partir da Constituição de 1988. E ela não é mais nada do que um suporte para mostrar, querer dizer que...
E aí em seguida, esse grupo faz o mesmo, faz um outro movimento, que é a CPI; e a CPI é a base de sustentação da PEC, nós temos que ter isso em mente. Nós, os quilombolas, os indígenas, temos que saber que a CPI não tem outra razão a não ser mostrar que a Funai, que o Incra não servem, e por isso as terras indígenas e as terras quilombolas terão que ser demarcadas pelos Parlamentares, pelo Legislativo. Eu perguntaria... É certo que não é para os Senadores que aqui estão, porque esses são os aliados, mas os estudos de identificação de terra indígena e de terra quilombola são feitos por equipe multidisciplinar. Há antropólogos, há engenheiros agrônomos, há engenheiros de cartografia, há analistas. Será que ao pensar em trazer essa política para o Legislativo, o Legislativo está pensando em ingressar servidores com essas mesmas qualificações?
Eu não imagino que o advogado vá poder se pronunciar ou falar, ou tecnicamente construir ou desconstruir um pensamento do engenheiro agrônomo, assim como vice-versa também não seria possível. Um engenheiro de cartografia... Então no Legislativo vai ingressar uma carreira de perito federal agrário para análise das áreas, no caso das comunidades quilombolas, que já têm as áreas identificadas de particulares, avaliadas? Só quem avalia são os peritos federais agrários de carreira do Incra.
Então essas são questões que nós entendemos que ferem, sim, a Constituição, e é muito mais um retrocesso do que... É muito mais para atacar os direitos, muito mais com foco nos órgãos do Governo Federal, do Executivo, que cuidam com deficiência! Nós queremos dizer isso, Senador.
R
Eu não imagino que a Funai, que o Incra, que os outros órgãos estejam contentes com o tamanho de seu orçamento, com o tamanho do seu corpo técnico. Não, ainda é pouco para a demanda, temos esse entendimento, Nós, que coordenamos um dos programas, o Programa Brasil Quilombola, também temos esse entendimento e reconhecemos isso; mas não é destruindo a Funai, não é destruindo o Incra...
(Soa a campainha.)
A SRª GIVÂNIA MARIA DA SILVA - ...que nós vamos melhorar a política de identificação dos territórios indígenas e das comunidades quilombola. É uma afronta sim, é uma violação sim, ela fere frontalmente a Constituição, a Convenção 169, que já foi citada aqui pelo Paulinho; ela fere frontalmente decisões desta Casa.
Se a Convenção 169, hoje, é um instrumento de suporte para as populações tradicionais, especificamente para povos indígenas e quilombolas, não foi somente porque se teve uma convenção acordada entre os países, mas porque esta Casa aprovou. Portanto, ao não reconhecer, ela está desqualificando o seu próprio trabalho. Então, eu acho que nós temos, sim... Fico bastante feliz, Senador, porque o Senado do nosso País vem dando demonstração, apesar das dificuldades, de algumas questões que estão postas, que são públicas, mas nós temos encontrado nesta Casa, no Senado, companheiros, parceiros, parceiras que têm sido aliados na luta do povo negro, na luta das mulheres, na luta dos indígenas, na luta daqueles que historicamente, no nosso processo de formação no Brasil, foram deixados à margem dos benefícios.
Eu queria citar dois exemplos, para ilustrar o que estou falando. Nós tivemos, nos últimos doze anos, a maior cobertura de luz rural para o povo brasileiro. O pouco que ainda falta fechar está concentrado nos indígenas, nos quilombolas, principalmente nas Regiões Norte e Nordeste. Isso significa dizer que esses grupos têm, sim, mais dificuldade. E aí, Procuradora Úrsula, não é porque eles são incapazes, é porque a proteção e a defesa desses direitos não é por incapacidade; nós temos aqui um índio bem capacitado, advogado. Não é isso. A proteção desses direitos terá de ser dada porque a Constituição assim assegura e porque os Poderes precisam trabalhar sintonizados para garantir aquilo que a Constituição já definiu. Esse é o papel tanto do Parlamento, do Executivo executar, e do Judiciário e da Justiça, dos Poderes outros, de também assegurarem esses direitos.
Acho que temos demonstrado, os quilombolas indígenas, essa fortaleza. Eu não vejo um único dia nesta Esplanada, não consigo lembrar um dia em que não vi um índio, uma índia, um quilombola, uma quilombola circulando por aqui, o que mostra que eles estão, sim, acompanhando essa pauta, que estão fazendo movimentos em defesa de seus direitos. Essa capacidade de sair de um lugar só de barco - e o Senador conhece bem isso -, andar três dias de barco, dois dias de barco, para depois pegar um avião e chegar a Brasília, demonstra uma capacidade que talvez o povo da cidade e outras populações já não tenham mais; mas o povo indígena, o povo quilombola tem essa capacidade e vem resistindo exatamente para garantir os seus direitos.
Por fim, queria dizer que nós tivemos, finalizamos agora, na segunda-feira, o mês de novembro, um mês intenso para o povo negro, assim como o mês de dezembro será intenso para o povo indígena, em função da sua primeira conferência. Tivemos resultados, apesar dos adversários da política, dos contrários à democracia dizerem que nada melhorou para os povos indígenas e para os quilombolas. O que nós dizemos é que melhoraram muitas coisas, mas, um aumento de 100% quando o teto é muito baixo, Senador, não reflete.
R
Então, quinhentos anos de escravidão, quinhentos anos de exploração do povo indígena, quase quinhentos anos de escravidão do povo negro é impossível se superar em um período de doze anos. Estamos superando, sim, temos avanços, sim. O dia 19 de novembro foi marcado por várias entregas do Governo Federal ao povo quilombola, mas reconhecemos que é preciso fortalecer as instituições que lidam com essa política para que elas possam dar mais resposta, aumentando, assim, o orçamento da Funai, aumentando o orçamento do Incra, lutando para que a gente possa ter ingresso de servidores de carreira nesses órgãos, para que a gente possa cada vez mais aumentar a força de trabalho.
Uma questão que me chama muito a atenção, e eu certamente divido essa fala com o Paulinho, é a necessidade de uma aliança. Eu acho que a fala do João Pedro, que já saiu, nos mostra que temos a consciência de que neste momento lidamos com as três grandes ameaças aos quilombolas, aos indígenas, entre tantas outras que não dá para somar aqui. Eu não saberia somar quantos territórios ameaçados, mas eu estou falando em ameaças que afetariam de Norte a Sul do País.
Além da PEC, Senador, essa maldita PEC que temos aqui, que circula insistentemente, que os defensores dos não-territórios indígenas e dos não-territórios quilombolas insistem em manter, nós temos uma Adin no Supremo, que já teve votação iniciada duas vezes. Essa Adin foi proposta, na época, pelo PFL, hoje DEM, que queria retomar esse mesmo pensamento da PEC, a mesma coisa, demarcar a temporalidade e dizer quais seriam os critérios de autodefinição; aliás, não reconhecer a autodefinição. Então, quem deveria dizer quem é um quilombola, quem é um indígena seria um deputado ou senador, não ele próprio. É exatamente o que os povos indígenas e o povo quilombola não aceitam.
Além da Adin 3.239, nós temos a PEC 215, essa maldita, e agora a CPI, que nada mais é do que a base, o alimento desses dois instrumentos. O que eles querem com a CPI é dizer que a Funai não presta, que o Incra não presta. Então, vamos trazer para o Legislativo...
(Soa a campainha.)
A SRª GIVÂNIA MARIA DA SILVA - ...e aí legislar, muitos dos integrantes, em suas próprias causas. Eu acho que esse é o recado da CPI.
Por fim, eu digo que só uma aliança, como vem sendo construída, dos povos indígenas com o povo quilombola, com todos aqueles que defendem, com as pessoas que defendem um meio ambiente menos explorado, menos destruído, das organizações da sociedade civil que apoiam a causa indígena, que apoiam a causa quilombola. E este não é um momento para briga de ego, este não é momento para vaidade pessoal e setorial, este é um momento para alianças entre o movimento social, aliança entre os Parlamentares que são favoráveis, que são sensíveis e comprometidos com o povo, aliança com o Ministério Público, que tem sido um parceiro importante nesta discussão, aliança com todos aqueles que defendem os direitos dos povos indígenas.
Se nós nos perdermos neste momento conturbado, em querer demarcar quem é mais e quem é menos, só quem sai fortalecido disso são os nossos adversários. Nós sairemos perdendo. Então, este não é um momento de briga para saber quem é maior, quem é melhor, quem fala mais, quem fala menos, este é um momento de juntar forças, porque os nossos adversários são fortes.
O Senador sabe disso, a Senadora Regina sabe disso, todos os Senadores sabem disso. Eles têm gente não somente aqui, em todas as Casas, mas eles têm no Judiciário, eles têm no Executivo estadual, municipal e federal, e o povo indígena, o povo negro nem sempre têm a mesma força por dentro dessa instituição, por isso vive lutando insistentemente contra o racismo institucional, que nada mais é do que uma ação desses defensores por dentro das instituições públicas.
Então, fica aqui o meu apelo, o apelo desse Ministério, o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, dos Direitos Humanos.
R
Dizer que somos parceiros, somos coordenadores de uma parte dessa política, da política quilombola. Mas dizer que nós não podemos nos calar diante do momento tão perturbado que nós estamos vivendo de afronta, literalmente, aos povos indígenas e ao povo negro.
Eu queria, Senador, 30 segundos para dizer que tem nos preocupado muito um sintoma que vem se alargando aqui no Brasil e aqui no entorno muito forte, acho que há um mês e meio, Senadora. Houve uma audiência pública aqui, também chamada pelo Senador Paim, para discutir a questão da intolerância religiosa. Não parou isso. Só essa semana já foram dois terreiros aqui no entorno atacados, um destruído literalmente. É de uma liderança, de uma mulher negra que é gestora no Governo Federal. Não sabemos ler ainda o que quer dizer isso, Paulinho. O que é isso? É intolerância religiosa ou um ataque ao Governo? Nós não sabemos.
Antes de ontem, mais um aqui em Poço Azul.
(Soa a campainha.)
A SRª GIVÂNIA MARIA DA SILVA - Então, dizer que nós precisamos sim nos unir e não dispersar força, porque os nossos adversários estão em todos os lugares, inclusive em muitos lugares chamando pelo nome de Deus.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Então, a gente vai, antes de a gente chamar...
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Pois não, Senadora.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Só para dizer que eu tenho que respeitar os limites do corpo. Então, estou realmente mal. Vou me retirar. Mas dizer que...
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Esta Casa é comandada por um dos Senadores mais pontuais e que mais trabalha, que é o Senador Paulo Paim. Ele faz esta Casa acontecer quando ela não está acontecendo. E ele sempre diz, obedecendo a disciplina dele, que Senador aqui tem vez.
Então, V. Exª fala.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Então, só dizer para todos e todas que podem contar comigo, com meu gabinete, sobre esta questão. Quanto à PEC 215, para nós do Senado, eu acho que a gente freia por aqui. (Palmas.)
Dizer que o meu Estado já reivindicou. O Governador tem origem indígena. O Governador Wellington Dias já reivindicou os próximos jogos, em 2017, se não me engano, lá para o Estado. Serão todos bem recebidos lá.
Dizer que esta Casa aqui, este espaço de direitos humanos, é um espaço de a gente tirar algumas discussões do subterrâneo. Alguns insistem em esconder alguns temas, mas esta Casa, esta Comissão tem sido este espaço para a gente discutir todos os temas que ainda insistem em esconder. Mas eu acho que, com essas audiências interativas, que são reproduzidas depois, o Brasil inteiro começa a tomar conhecimento e a tomar partido em algumas causas.
Então, podem contar comigo.
Obrigada, viu? (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Obrigado, Senadora Regina. Uma salva de palmas.
Bom, olha o lembrete aqui: o povo Xerente é a única seleção olímpica do Brasil que foi campeã.
Uma salva de palmas para ela, né? (Palmas.)
O meu motorista veio também de Roraima. E ele foi professor. Nasceu próximo de comunidades indígenas. Lá todo mundo tem sangue de parente. E ele morou e foi professor lá muito tempo. E ele fica ali por baixo, ouvindo. Então, disse que ele ouviu um dia desses um segurança dizer assim "rapaz, depois que esse Senador de Roraima chegou aí, parece que os índios passaram a morar tudo aqui". Tem muito índio dentro desta Casa.
Então, eu fico feliz por isso. Eu quase que disse "ele não sabe lá em casa", né, Tião? Porque lá em casa, vai todo mundo para lá. Hoje saiu de lá o professor Rivanildo, que é Uapixana; saiu o Beto, que é Macuxi. E daqui a pouco vai entrar lá a Jane, que é Macuxi; e vai entrar o Telmo, que está ali. Eu queria que o Telmo ficasse em pé. O Telmo quando veio, eu fiquei alegre, porque o Telmo tem toda uma história de vida. Uma salva de palmas para o Telmo. (Palmas.)
O Telmo é professor, é de movimento, é uma pessoa que dedica a vida dele inteira a esse trabalho. E ver o Telmo aí me faz muito feliz, porque ele é do meu Município, de onde eu nasci, que é o Município de Normandia.
Então, as vitórias do povo de Roraima, dos povos indígenas devemos muito a pessoas iguais ao Telmo. Aqui quero saudar todos os outros em nome dele, porque ele está na terra Raposa Serra do Sol.
Bom, eu quero aqui agora também fazer a substituição da Mesa. Vai vir outra Mesa. Faltaram dois convidados. Aliás, não faltaram. Eu não sei se o Vilmar vai querer falar.
Vilmar, fique à vontade se quiser. Já foi anunciado.
E a Drª Deborah Macedo, que é Subprocuradora-Geral da República e, por uma questão de força maior, de trabalho, não pôde vir.
Antes de esta Mesa sair, eu quero dar um minuto ao Dr. Paulo, porque ele quer fazer um alerta aqui, rapidinho.
R
O SR. PAULO ARLETES RIOS BARELA - Eu agradeço a simpatia e a presteza do Senador Telmário em ceder mais um minuto aqui porque eu esqueci, na intervenção inicial, que nós temos uma atividade muito importante que vai ser realizada na região de Dourados e que está sendo organizada pela CSP-Conlutas, pela Central Sindical e Popular, em razão do genocídio, verdadeiro genocídio que está acontecendo com as nações indígenas guaranis kaiowás.
Então, nós vamos realizar uma caravana a que nós demos o nome de Tekoha, que significa terra sagrada, terra pertencente aos indígenas. Será de 10 a 13 de dezembro. Na verdade, vão ser duas caravanas. Essa primeira missão, de 10 a 13 de dezembro, e depois uma outra no início de janeiro. Tem a ver com as mobilizações que os guaranis kaiowás estão fazendo não em comemoração, mas em memória dos assassinatos que aconteceram, sobretudo do assassinato do Cacique Marcos Veron.
Então, fazer este registro aqui e convidar inclusive a Comissão de Direitos Humanos do Senado para, se puder, dar a honra da presença com algum representante. Seria muito importante para as comunidades indígenas daquela região.
E registrar, por fim, que nós da CSP-Conlutas reivindicamos, sim, a Funai como uma organização, mas nós achamos que a Funai tem que ser dirigida pelos indígenas e não por burocratas. (Palmas.)
Aí, sim, nós vamos estar de fato fazendo a demarcação das terras indígenas aqui no nosso País.
Grande abraço a todos.
Muito obrigado mais uma vez, Senador, pelo espaço concedido ao final. E vamos continuar organizando a luta dos quilombolas e indígenas, para que, de fato, a gente possa ter a demarcação das terras garantidas para quem de fato as possui.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Para a democracia ficar completa, o Antonio Nonato também quer falar um minutinho, não é, Antonio?
O SR. PAULO ARLETES RIOS BARELA - Desculpe, Senador. Para a próxima Mesa seria importante a presença do Daniel Vasques, que é um membro representante da comunidade - ele está aqui presente, pode levantar, Daniel - guarani kaiowá. Eles estavam na programação. Quem provavelmente faria a intervenção aqui seria a Valdelice Veron. Entretanto, em função dos problemas e da pressão dos jagunços na região, eles não se moveram. Acabaram pedindo para a gente para não vir. Mas seria interessante que o Daniel pudesse dar uma visão mais precisa de quem é da região e quem pertence à nação sobre a situação que estão vivendo lá em Mato Grosso do Sul.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Faz um minuto.
O SR. ANTONIO NONATO SANTOS VIANA - É só que, enquanto estamos falando aqui, chegou lá do Maranhão uma denúncia de que o povo gamela, que fez a retomada do seu território, está cercado por duas fontes, por dois braços. Estão cercados pela polícia e cercados pelos jagunços dentro da área. Quero registrar essa denúncia que chegou aqui para ser feita aqui. Uma denúncia para que o Ministério Público, que está aqui, possa olhar isso. inclusive, eu falei para o Dr. Paulo, da Funai, mostrei para ele aqui. Ele disse: "Infelizmente, já estou saindo".
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Isso no Maranhão?
O SR. ANTONIO NONATO SANTOS VIANA - No Maranhão.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Então, nós estamos ao vivo pela TV Senado. Eles querem fazer esse apelo às autoridades do Maranhão, querem fazer essa denúncia gravíssima de risco de vida, impedindo o ir e vir da comunidade quilombola...
É o povo quilombola? São os indígenas.
O SR. ANTONIO NONATO SANTOS VIANA - É indígena, o povo gamela.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Estão lá sendo reprimidos, coagidos e ameaçados. Então, queria fazer um apelo aqui às autoridades, à Polícia Federal do Maranhão, à Polícia Militar, ao Governador, enfim, a todas as autoridades que possam estar nos ouvindo através da TV Senado e que tomem as providências que são devidas.
Bom, eu quero aqui aproveitar e, na próxima Mesa, como faltaram dois, vou atender essa solicitação do Paulo e chamar o Daniel; e queria também chamar o Telmo.
Telmo, quero que você venha aqui também, pelo povo macuxi.
Uma salva de palmas para esta Mesa e para a próxima que virá. (Palmas.)
R
Quero aproveitar a presença do Paulo aqui. Queria que minha assessoria junto com a assessoria da Funai pegasse todos os depoimentos, uns se repetem, é natural, fizesse uma cadeia de informações e, junto com a nossa Taquigrafia do Senado, encaminhasse o resultado desta audiência pública a todos os Deputados. Não adianta mandar para a comissão que está julgando a PEC, porque eles são ruralistas, não têm nenhuma sensibilidade, a sensibilidade deles é o bolso. (Palmas.)
Então, vamos fazer um encaminhamento, quero fazer para todos, pegando nossos universitários, esta Comissão é altamente eficiente, a nossa diretora é uma futura juíza e ela tem muito conhecimento de causa, vai ajudar a todos, para que encaminhemos a cada Deputado o resultado desta reunião. Eu queria que o Paulo nos ajudasse e colocasse as partes da dor, do que é legal, do que não é legal, mostrasse a cadeia de prejuízo que isso causa, o desrespeito às leis e às normas, a legalidade, precisamos dar seguridade jurídica, e encaminhasse para todos os Deputados, na hora em que for possível fazer isso, e também para todos os Senadores.
Quero chamar para compor a próxima Mesa o Henyo Trindade Barreto Filho, representante da Associação Brasileira de Antropologia (ABA); Gilberto Vieira dos Santos, Secretário Adjunto do Conselho Indígena Missionário (Cimi); Telmo e Daniel. Queria reservar estas duas mesas aqui perto para o Telmo e para o Daniel. E vamos chamar mais um Terena para compor a Mesa. Quem virá? Você? Venha aqui meu amigo, meu parceiro. Acho que agora está composta a Mesa.
Terminada esta Mesa, vamos franquear a palavra para o auditório. É claro que o tempo será reduzido. Às vezes, o que você ia falar outro já falou. Queremos aproveitar para tirar desta audiência um documento que circule, como já falei, em todos os gabinetes de Deputados Federais e dos Senadores.
Vamos começar a fala com... Como eu falei, a Mesa vai falar - talvez não comporte mais pessoas, podemos imprensar um pouquinho mais aqui - e, quando todos falarem, respeitamos o tempo, vamos dar voz para que os demais que estão aqui peguem o microfone, se levantem e falem.
Vamos começar. Quero começar pelo Henyo Trindade, que é representante da Associação Brasileira de Antropologia (ABA).
Henyo, com a palavra.
O SR. HENYO TRINDADE BARRETTO FILHO - Bom dia a todos e a todas. Queria agradecer à Presidência da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado, ao Deputado Paulo Paim, saudar a Mesa, saudar o Senador Telmário Mota e, no nome dele, saudar todos os componentes da Mesa.
Falar da situação das comunidades indígenas e quilombolas no Brasil hoje é um tema bastante amplo, complexo para dez minutos. Vou concentrar mais em alguns aspectos relativos às ameaças que pesam sobre os direitos, os modos de vida dessas comunidades. Poderia falar sobre a agenda positiva, sobre um conjunto de políticas públicas que hoje existem e que são resultado da luta desses atores sociais, dos indígenas e dos quilombolas, políticas públicas que têm muita dificuldade de implementação, a escala local, o processo da Conferência Nacional de Política Indigenista, já referido pela Mesa anterior, um processo importante, que gerará subsídios, quem sabe, para transformação de muitos aspectos dessa política.
R
Mas falar sobre a situação das comunidades indígenas e quilombolas hoje é falar basicamente sobre um conjunto de ameaças que pesam sobre essas comunidades, ameaças que são a expressão das forças e dos interesses dominantes, que se expressam nas três esferas do Poder Público - no Legislativo, no Judiciário e no Executivo -, expressão dos setores ligados à expansão da fronteira agropecuária no Brasil, em particular, a chamada Frente Parlamentar Agropecuária, também conhecida como Bancada Ruralista, expressão também das empreiteiras interessadas na expansão da malha de infraestrutura no País, por meio dos grandes empreendimentos e obras civis e das chamadas indústrias extrativas, em particular, o setor de mineração.
Então, a expressão desses interesses hegemônicos e majoritários aqui no Congresso, sua pressão e articulações no âmbito do Executivo, inclusive no Judiciário, tem levado a uma situação bastante difícil.
Falou-se aqui antes, por exemplo, na Mesa que antecedeu a nossa, na Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a Funai e o Incra. Para vocês entenderem o grau de vulnerabilidade a que povos indígenas e quilombolas estão submetidos, porque afinal a Funai é a responsável pela demarcação de terras indígenas e o Incra, pelo reconhecimento dos direitos quilombolas, essa CPI estava numa fila e evidentemente a instalação dela bloqueou a instalação de duas outras CPIs que não eram de interesse desses setores. Refiro-me basicamente à Comissão Parlamentar de Inquérito da FIFA e da CBF e à Comissão Parlamentar de Inquérito que visava apurar propinas para manipular resultados de julgamentos sobre sonegação fiscal no Carf. Estou querendo chamar atenção para isso, para dizer que a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito da Funai e do Incra é uma clara expressão de como os direitos de povos e comunidades vulneráveis, como se mencionou na Mesa anterior, tem sido posto no altar sacrificial das barganhas políticas, para manutenção dos projetos de poder hoje.
Então, a corda está sempre arrebentando do lado mais fraco. Se tivermos que colocar alguma coisa para preservar as estruturas de poder dominante, isso que será colocado em jogo são basicamente os direitos desses povos, e é isso que vem acontecendo.
Falar também da situação dessas comunidades é falar, pelo menos, da articulação entre três dimensões. Primeira, fundamental, a terra; a segunda, os interesses que se projetam sobre essas terras; e a terceira, o modo como esses interesses se expressam e se articulam no âmbito dos três Poderes da República.
A Givânia, que participou da Mesa que nos antecedeu, chamou atenção para a situação dos quilombos. Não vou me referir aqui a isso, o tempo é pouco, mas para vocês entenderem como esse é um processo difícil, apenas em termos numéricos vocês entenderem o que é o funil do reconhecimento dos direitos territoriais, hoje em dia, isto são dados recentes, disponíveis no site da Fundação Cultural Palmares e no site do Incra, são 2.007 certificações expedidas pela Fundação Cultural Palmares, certificações de reconhecimento de comunidades rurais remanescentes de quilombos. Destas 2.007, 1.529 têm processos abertos no Incra, para reconhecimento de direitos territoriais. Destes 1.529, apenas 201 processos têm editais para elaboração de relatórios técnicos de identificação e delimitação publicados. Destes 201, apenas 104 ou 107, há um dado discordante lá, têm portarias de reconhecimento do território. Destes 104 ou 107, apenas 77 gozam de decretos de desapropriação de interesse social. Então, vocês veem o funil: de 2.007 comunidades certificadas, só 77 têm decretos de desapropriação por interesse social. E o número sobe um pouco, vai a 207 o número de títulos emitidos. De 1992 a 2002, 44, totalizando 773 mil hectares; de 2003 a 2010, 75, mas decresce o número de hectares reconhecidos, cai para 212 mil; e de 2011 a 2015, foram 88 títulos emitidos, mas para reconhecer apenas 54 mil hectares. Então, a situação de reconhecimento territorial dos direitos quilombolas é bastante afunilada.
R
No caso das terras indígenas, é pública e notória a paralisia completa dos procedimentos de demarcação. Embora recentemente alguns relatórios de identificação tenham sido publicados no Diário Oficial e algumas portarias declaratórias tenham sido assinadas pelo Ministério da Justiça por força de muita pressão e luta do movimento, o quadro de paralisia é grande. Então, isso para falar muito rapidamente sobre a questão de terra.
Quando a gente vai falar dos interesses que se projetam sobre essas terras, acho que as expressões maiores desses interesses - eu me refiro aqui ao agronegócio, ao hidronegócio, à mineração - são os recentes projetos de lei que visam a flexibilizar todo procedimento de licenciamento ambiental, um, inclusive, protagonizado por esta Casa, pelo Senador Romero Jucá, que cria a ideia de um licenciamento ambiental expedido rápido, em 90 dias, o que é um completo absurdo, se pensamos o drama que acabamos de vivenciar com o ecocídio perpetrado pela Mineradora Samarco e suas detentoras no Vale do Rio Doce.
Agora, esses interesses se expressam não apenas por meio do Poder Legislativo, mas também do Poder Executivo. Ontem mesmo, o jornal Estado de S. Paulo mostrou uma matéria de uma medida provisória, portanto, um ato normativo oriundo do Poder Executivo que se propõe a repartir lucros e benefícios de empreendimentos localizados dentro de terras indígenas, uma peça normativa que não foi objeto de nenhuma consulta, de nenhuma informação. Então, se os senhores quiserem ler, o que a gente sabe é o que está publicado no Estadão, que teve acesso ao conteúdo dessa medida, bem como ao memorando de resposta da Funai, que parece ter sido bem interessante.
E, para finalizar, um rápido panorama de como esses interesses se expressam nos três Poderes da República.
No caso do Judiciário, temos, entre outros, dois enfrentamentos muito importantes. O primeiro, no caso dos quilombolas, também já referido aqui pela Givânia, Secretária da Seppir, é a Ação Direta de Inconstitucionalidade promovida pelo Partido DEM contra o decreto que regulariza, que disciplina o procedimento de regularização fundiária dos quilombolas, que é o Decreto nº 4.887, de 2003. Há uma Ação Direta de Inconstitucionalidade movida por esse decreto.
(Soa a campainha.)
Já houve uma primeira rodada do julgamento, há um voto favorável à ação e outro contrário, e o Ministro Toffoli pediu vista.
No caso dos povos indígenas, a gente tem aí a tentativa de fazer consolidar a tese do chamado marco temporal. Então, duas ameaças concretas que a gente identifica no âmbito do Poder Judiciário.
No caso do Poder Executivo, já fiz referência ao funil a que está submetido o procedimento de reconhecimento de direitos territoriais dos quilombolas. Há a paralisia dos procedimentos de demarcação de terras indígenas, essa MP que foi apresentada ou, pelo menos, que veio a público ontem, o conhecimento sobre ela, que são indicadores de movimentos que fragilizam e vulnerabilizam ainda mais os povos indígenas.
E, no caso do Legislativo, pelo menos tive acesso ao banco de dados de monitoramento de medidas legislativas do Instituto Socioambiental, há coisa de alguns meses, para dar uma aula lá no mestrado do CDS, e um balanço conservador indica que existem hoje mais 180 medidas legislativas tramitando nesta Casa que afetam, de algum modo, direitos indígenas e quilombolas. Dessas 180, 85, ou seja, quase metade delas, têm repercussões claramente negativas para esses direitos. Afora essas, destaco especificamente o caso da PEC 215, na expectativa, como disse o Senador e a Senadora, de que ela seja barrada aqui, nesta Casa, caso chegue até aqui. Nós temos esta Comissão Parlamentar de Inquérito da Funai e do Incra, que é, de certo modo, uma tentativa de forjar evidências para justificar a aprovação da PEC; e, mais recentemente, esse projeto de lei do Senador Romero Jucá aqui, no Senado da República.
Então, em linhas gerais, são essas as anotações que eu tinha feito. Eu sabia que o nosso tempo aqui seria limitado, não mais do que 10 minutos, mas, para dar aqui um rápido panorama do que são as ameaças aos direitos indígenas e quilombolas contra os quais a gente tem lutado cotidianamente, como aliados e como defensores de um país justo e plural, era isso.
Muito obrigado. (Palmas.)
R
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Ouvimos a palavra do Henyo, com precisão. Ele trouxe até um fato novo aqui, que me surpreendeu: essa MP. Não estava nem sabendo dela. Temos de pedir à assessoria para levantar, para ver quem está fazendo parte dessa MP.
E quero aqui também registrar a presença do cacique xacriabá Domingos Nunes de Oliveira, representante do povo indígena xacriabá, de Minas Gerais. Convido para vir compor a Mesa conosco. Uma salva de palmas para ele. (Palmas.)
Bem, nosso próximo orador é Gilberto Vieira dos Santos, que é Secretário Adjunto do Conselho Indígena Missionário (Cimi).
Inclusive, Gilberto, quando saiu aquele relatório, fiz aqui uma fala, fizemos uma fala sobre a morte dos povos indígenas. Não sei se hoje o foco é falar dos quilombolas ou falar também dos povos indígenas.
Com a palavra.
O SR. GILBERTO VIEIRA DOS SANTOS - Queria cumprimentar o Senador Telmário, que já demonstrou a que veio nesta Casa, aliado fortíssimo das lutas dos povos, em especial, dos povos indígenas; também os demais componentes desta Mesa, os povos indígenas, o Henyo, os parceiros também de outras lutas e os representantes dos vários povos presentes, que aqui vieram.
Alguns deles estiveram participando, durante esses dias, de um encontro de professores e professoras, educadores e educadoras indígenas, que estão articulando, que estão iniciando, praticamente, mas configurando um fórum de educadores e educadoras indígenas, por isso também há uma representação de indígenas de vários lugares do Brasil.
Eu queria só, meio telegraficamente, por conta do tempo, apontar algumas questões. Com relação à PEC 215, por exemplo, muitos elementos já foram trazidos para esta Mesa, importantíssimos, inclusive. Eu só queria talvez pontuar algumas questões que são relativas justamente ao processo e que culminaram com a situação que encontramos hoje, dos povos indígenas.
Por exemplo, no antigo Estado do Mato Grosso, hoje Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, desde a década de 1940, nós seguimos governos, passando pela ditadura militar até à atualidade, e passamos por um processo de expulsão dessas comunidades de seus territórios. Isso está muito bem configurado num relatório feito por Jader Figueiredo, na década de 1960, também no relatório na Comissão da Verdade, que tem um capítulo sobre os povos indígenas. Também estão muito configurados os dados históricos desse processo de expulsão das comunidades.
Há, inclusive, Senador, um relato que consta no relatório da Comissão da Verdade, em que uma indígena descreve a forma como eles foram retirados de uma dessas terras no Mato Grosso do Sul, na região de Dourados. Dizia assim essa senhora: "Daqui nos levaram em gaiola, gaiola mesmo, vieram três gaiolas, na gaiola que nós fomos". Esse é o modelo que utilizaram para retirar a comunidade. "Pelo caminho dormíamos, nos alimentaram, nos davam pãozinho para não morrermos de fome, tampavam da gente a gaiola para não vermos nosso rastro." Essa é a descrição que uma indígena já idosa faz do processo de retirada dos indígenas da região do Mato Grosso do Sul, onde hoje é o Mato Grosso do Sul, ou seja, retirados em gaiolas como animais.
Esse processo hoje permanece talvez com a mesma dureza ou com a grande diferença de que estamos num processo de avanço da chamada democracia. Então, em tese, nós hoje teríamos uma sociedade brasileira, um Governo, um Parlamento, os Poderes respeitando os direitos desses povos, duramente conquistados e ali cravados na nossa Constituição de 1988.
Mas queria lembrar, por exemplo, que, nos meses de setembro e outubro, diversos atentados... Certamente as lideranças do Mato Grosso do Sul que estão aqui vão poder trazer esses dados com a informação de quem está por dentro, sofrendo esses ataques. Pelo menos nos meses de setembro e outubro, mais de 15 ataques a diversas comunidades, com duro poder de fogo, de grupos paramilitares, e há informação da presença inclusive de policiais nesses ataques, fazendo o que eles chamam de retirada, para impedir que a posse se configurasse nas retomadas que esses povos têm feito naquela região.
R
Então, o que a gente percebe? Que o Estado de direito vem sendo mortalmente ferido, num processo de avanço de uma violência que já praticamente vai se institucionalizando naquela região. Só que, infelizmente, ali já é um dado extremamente perverso desses ataques. Nós tivemos nos últimos anos um aumento significativo dos assassinatos de lideranças naquela região, mas esse quadro não se configura infelizmente só naquela região. Nós temos, por exemplo, ataques que foram realizados recentemente contra o povo pataxó, na Bahia, contra o povo tupinambá, também naquele mesmo Estado. Nós temos nos últimos meses acompanhado um processo de crimes ambientais, e digo aqui que são os incêndios criminosos que têm acontecido, por exemplo, na terra indígena dos guajajara, dos tenetehara e também dos awá, que inclusive há grupos de indígenas isolados lá naquela região.
A terra indígena Arariboia, Senador, agora em dados que foram publicados há poucos dias pelo Greenpeace, até aquele momento, pelo menos 45% da área, estou falando aqui de 185 mil hectares, foram queimados por esses incêndios criminosos. E agora recentemente, há pelo menos um mês, também a terra do povo awá e a terra caru vêm sofrendo com esses ataques de pessoas que querem atentar contra o direito desses povos que têm os seus territórios inclusive já demarcados.
A gente falava da PEC 215, e eu queria trazer só mais um dado: é que ela foi aprovada na comissão especial no dia 27 e, poucos dias depois, no dia 1º de novembro, a terra indígena Morro dos Cavalos, próxima a Florianópolis, em Santa Catarina, foi invadida por não indígenas, sob o argumento de que, com a aprovação da PEC 215, a terra deixaria de ser indígena.
Na realidade, a gente percebe que esse clima de violência que vem se configurando ao longo dos séculos contra os povos indígenas vai encontrando respaldo, por um lado em ações parlamentares como essa e como as outras que foram citadas aqui, mas também pela ausência do Poder Público, pela ausência dos Poderes nessas situações. Ou seja, a gente tem lugares em que comunidades são atacadas de forma intensa por paramilitares e não há nenhum processo de investigação profundo de pessoas que estejam envolvidas. E há inclusive denúncia de indígena dizendo, e cremos nisso pelos dados que nós acessamos, de um envolvimento inclusive de Parlamentares daquele Estado e até daqui do Congresso Nacional.
Esse clima que se criou de que os povos indígenas podem ser atacados, os seus direitos rasgados na Constituição, esse ambiente tem tomado várias regiões do Brasil.
Para nós é extremamente importante que nós possamos aqui ouvir as comunidades indígenas aqui presentes, que são as pessoas que sentem na pele o dia a dia dessas violências, que são as pessoas que sentem na pele as ameaças. Em regiões como a região de Cocos, do povo xacriabá, onde as pessoas ficaram durante muito tempo, e imagino que perdure ainda, sem poder sair da sua área, ameaçadas, há uma campanha contra os xacriabás, feita inclusive pela mídia local.
Então a gente percebe que esse é o ambiente que se criou contra os povos indígenas. E esta Casa oferece um espaço que no nosso entender é privilegiado para que elas possam trazer as suas palavras, dizer daquilo que elas têm sentido, e chamar a atenção evidentemente para o Estado brasileiro que, a partir do Parlamento, a partir do Executivo, também não homologa. Temos pelo menos nove terras indígenas que poderiam ser homologadas e também não o foram pela Presidente Dilma, infelizmente. Mas devemos trazer então para esses segmentos da nossa sociedade, para esses Poderes, essa preocupação de que não é simplesmente algo que esses povos indígenas poderiam estar inventando.
R
É dura a realidade do dia a dia de pessoas que vêm sendo assassinadas, como Simeão, como Marçal, como várias outras pessoas que têm sido assassinadas nesse processo, e, infelizmente, do ponto de vista do Estado brasileiro, as investigações profundas, como deveriam estar fazendo, não são efetivadas.
Eu queria agradecer, mais uma vez, por este espaço. E encurto inclusive a minha fala para que a gente possa ouvir aqui os verdadeiros artífices desse processo, que são os povos indígenas.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Obrigado, Gilberto. Você trouxe informações importantes, faz uma recapitulação do que está acontecendo, lamentavelmente, em todo o Brasil, que é tudo isso que a gente precisa condensar para poder tentar sensibilizar o nosso Parlamento.
Agora vamos ouvir o Daniel Lemes Vasques, representante do povo kaiowá.
O SR. DANIEL LEMES VASQUES - Bom dia a todos.
Cumprimento a Mesa. Obrigado, Senador, por essa oportunidade, em nome do guarani kaiowá, de Mato Grosso do Sul.
Cumprimento a todos os parentes que estão aqui por uma causa justa, cumprindo o seu papel de liderança, cumprindo o papel de estar aqui, deixando a base para pedir ao Governo e mostrar ao mundo como o Brasil, o próprio Congresso Nacional, o próprio Supremo, a própria esfera governamental interministerial tratam a população indígena, violam o seu direito, não cumprem o que eles assinaram perante a Organização das Nações Unidas. Isso é uma vergonha para o Governo.
Hoje, estou aqui para falar. O guarani kaiowá hoje está lá em Mato Grosso do Sul sofrendo. As crianças não têm dignidade de vida para poderem viver. Os direitos das crianças em Mato Grosso do Sul são esquecidos. Os direitos dos idosos são esquecidos em Mato Grosso do Sul. Os direitos das mulheres... Maria da Penha não existe em Mato Grosso do Sul. Em Mato Grosso do Sul, hoje, quem manda são aqueles que têm dinheiro, ruralista, produtor, importador de soja e de cana-de-açúcar. São eles que ditam o que tem que ser feito em Mato Grosso do Sul. (Palmas.)
O Mato Grosso do Sul se destacou muito bem, a partir desse segundo semestre de 2015, em violência, na tentativa de terminar com a população daquele Estado. E, a partir dessa denúncia de violência em Mato Grosso do Sul, resulta a morte de pessoas que denunciam o que está acontecendo. Eu não sei se daqui, depois dessa denúncia, eu terei a continuidade da minha vida. Está marcado que eu possa morrer a qualquer momento. Então, eu registro aqui a minha fala, mas essa morte será uma morte de honra, como foi recentemente com a nossa liderança Simeão Vilhalva, que só queria dar dignidade de vida para o seu povo, para os seus filhos e para seus parentes. Ele foi assassinado cruelmente e hoje, ou amanhã, ou depois de amanhã, não ficarão impunes esses assassinos.
R
Infelizmente esse é o Brasil em que estamos vivendo, o Brasil que faz isso com essas pessoas. Quando chegaram aqui em 1500, esses europeus foram recebidos de braços abertos, receberam esse progresso de braços abertos. Cederam o espaço para esse progresso, para essa exploração de minérios e para a exploração de ouro, que foi parar na Inglaterra.
E hoje o Brasil quer, nesse pouco tempo, até esse recesso de 2015, aprovar essa maldita PEC que está aí, e demais PECs que estão tramitando no Congresso. Eles são não seres humanos, eles são seres humanos vestidos de demônio, a própria Bíblia fala isso, não sou eu que estou falando. Então, eu aqui denuncio mais uma vez.
Hoje nós estamos passando uma semana de chuva lá no Mato Grosso do Sul. A nossa lona não está aguentando mais essa chuva. Nós estamos passando fome não por preguiça. Nós estamos morrendo sem saúde lá, não sabemos o nosso remédio, por falta de o Governo reconhecer as nossas terras tradicionais, onde nós podemos plantar para poder comer aqueles alimentos... (Palmas.)
... sem agrotóxico, fora remédios transgênicos, que depois prejudicam os nossos ouvidos, quando a gente toma para dor de cabeça, depois prejudicam a nossa visão, tomando aquela vacina. E o Governo nega, não demarca a nossa terra e não homologa.
Meu apelo ao Governo, Senador. Falta vontade de pegar essa simples caneta e assinar, reconhecer e demarcar que essas terras pertencem aos guarani kaiowá e pertencem a todas as comunidades indígenas e quilombolas. Será que uma caneta dessa é tão pesada para o Governo assinar, para reconhecer essas vergonhosas dívidas que o Governo tem com a população brasileira, as legítimas populações? (Palmas.)
O Governo não tem vergonha hoje de ter trazido os negros da África para que o Brasil tivesse progresso nas exportações e não reconhece a terra quilombola hoje. Se nega a fazer isso, a assumir que o Brasil escravizou o indígena e a população negra, não no passado, mas agora, até hoje, e vai ser assim amanhã.
Não venham dizer que hoje, à tarde, eles irão assinar e dizer: "Basta". Eles não irão fazer isso, irão fazer o contrário. Recentemente o parente denunciou o que o próprio poder do Estado está lá cheio de jagunços, e é quem deveria proteger esses parentes que estão lá, que resolveram retomar a sua terra, a terra dos seus antepassados, a terra em que um dia lhe deu a felicidade. Serão expulsos de lá pelas próprias forças governamentais.
Aqui, Senador, eu, diante das mulheres guarani kaiowá que choram pelos seus filhos, por não poderem dar alimentos a eles, denuncio o Estado de Mato Grosso do Sul. Eu fico feliz porque vocês irão, esta semana, na outra semana, para lá. Eu não estou fofocando, isso é fato real que a mídia de Mato Grosso do Sul não mostra.
(Soa a campainha.)
R
O SR. DANIEL LEMES VASQUES - A mídia de Mato Grosso do Sul, as rádios de Mato Grosso do Sul não cumprem o juramento que fizeram quando se formaram, que iriam trabalhar dignamente. Eles trabalham por dinheiro.
E agradeço, parente. Vamos à luta, vamos nos unir. Vamos, guarani kaiowá, juntos, com os parentes do Brasil, de Norte a Sul, de Leste a Oeste. Nós lutaremos até a última gota de nosso sangue pingar nesta terra do Brasil, dizendo para o Governo que essa terra é nossa.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Engraçado que a gente ouve muito isso, o Telmo está do meu lado e sabe, lá em Roraima, que eles pensam, eles subestimam a inteligência dos povos originários, dos povos indígenas.
Talvez, o Daniel não tenha um diploma universitário, não sei nem até que série o Daniel estudou, mas, para saber a tua dor, para saber a tua necessidade, para saber a tua sobrevivência, o parente encontra palavras que tocam no nosso coração, que mexem na nossa alma, que nos motivam a ter esse espírito guerreiro que é muito peculiar dos povos indígenas.
O índio quando cala não consente, ele rejeita. E quando ele fala, ele quer uma alternativa. É isso que o Daniel está pedindo nesta Casa.
Uma salva de palmas para ele. (Palmas.)
Quero agora ouvir aqui o Telmo Ribeiro, macuxi, da minha terra.
Fiquei tão feliz, Telmo, com a tua presença aqui.
Quero também registrar, antes do Telmo fazer uso da palavra, a presença dos professores indígenas do 1º Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena. Aqui temos representantes de dez Estados. Inclusive, eu fui convidado para ir.
Cadê as palmas? (Palmas.)
O Prof. Rivanildo, que também está lá, de Roraima, me convidou para ir lá. Mas ontem nós estávamos naquela questão do PLN nº 5, que é muito importante para o Brasil, para destravar os programas que possivelmente travariam, e que descaracteriza totalmente esses crimes que querem imputar à Presidente Dilma. Isso nos ocupou muito e eu não pude ir. Então, quero registrar aqui a presença deles.
Quero também aqui destacar a presença do Itamar, krenak, atingido pelo crime ambiental de Mariana, em Minas Gerais, o desabamento naquela barragem de lama, no Rio Doce, por dentro da aldeia. Krenak está sofrendo com toda a prática cultural que dependia do Rio Doce. Então, quer dizer, nesse desastre ecológico, e mais do que isso, que houve em Mariana, não houve só o dano direto das vidas que foram cerceadas, como também um prejuízo à cultura da sobrevivência.
Vocês ouviram - rapidamente aqui - quando o Adriano dizia: "Nós estamos morrendo. Nós estamos passando fome e não é por preguiça". Não, não é por preguiça.
Nós temos várias comunidades que possuem alguns estágios, uns já estão no processo econômico, outros vivem da sobrevivência. Mas qual é a importância da terra para os povos indígenas? É a vida. Quando você quer comprar uma água mineral, você vai ao supermercado e compra. Quando o parente quer beber água sem contaminação, ele bota a boca no igarapé ou enche a mão no igarapé, enche e bebe direto na fonte. Por isso que ele precisa de uma água...
O Antonio sabe como é o jogo, não é, Antonio? É desse jeito.
R
Quando o parente... Quando o branco quer comprar a alimentação dele, ele vai ao supermercado. Está enlatada, está de todas as formas. Sabe, Davi, ele compra todo tipo de alimentação que ele quer. O parente tem de pegar o arco e a flecha dele e ganhar a mata, diuturnamente, para buscar ali a sua alimentação e sobrevivência. Quando o branco quer construir a casa dele, ele vai a essas casas de materiais e compra ali o cimento, o tijolo, a telha, a ferramenta, os ferros, enfim, e faz. Quando o parente quer construir a tapiri dele, a casa dele, ele tem de buscar palha no mato, ele tem de buscar. O branco tem prego; ele tem o cipó para amarrar. Ele precisa da natureza para ter uma vida sem a guerra, sem o egoísmo, sem ambição. Ele vive e protege essa natureza que é Brasil, que hoje é o pulmão do mundo.
Telmo, com a palavra.
Vocês nem batem palmas, não é? Está bem. (Palmas.)
O SR. TELMO RIBEIRO - Quero agradecer pela oportunidade.
Não vim para fazer parte, nem fazer algumas colocações, mas agradeço muito, não representando apenas o povo de Roraima, mas sim todos os povos indígenas de onde nós estamos passando.
Gostaria de deixar aqui a esta Casa que exigimos que os nossos direitos sejam respeitados, porque a cada segundo eles estão sendo violados - seja no sul, no norte, no oeste. Em todos os lugares onde há indígena, os nossos direitos estão sendo violados. Estão nos exterminando, criando diversos programas dentro de terras indígenas. Isso, muitas vezes, nós não conhecemos.
Eu gostaria, também, de dizer ao companheiro guarani kaiowá que a sua luta, a sua dor não está só na sua região, companheiro, mas está em todas as regiões deste Brasil. Todo mundo sente que estão nos matando. E nós perguntamos: onde estão as nossas autoridades competentes, que possam, de fato, nos defender, fazer com que nossos direitos sejam cumpridos? Isso é uma vergonha para nós, para um Brasil onde há tantos representantes que nada fazem por nós. A cada momento, não só os direitos estão sendo violados, mas o nosso povo está sendo exterminado!
Eu gostaria, também, de dizer ao Senador Telmário Mota, que é de Roraima e que levantou essa bandeira neste Senado, que continue a defender os povos indígenas brasileiros, que são os verdadeiros brasileiros. Nós sabemos que o Brasil deve muito aos povos indígenas, desde a sua invasão, que aconteceu há muitos anos.
Gostaria também de pedir que esta Casa reconheça, ouça as reivindicações dos povos indígenas de todas as regiões. Só assim poderão ver um caminho para solucionar esses nossos problemas. Chega! Até quando? Até quando viremos encaminhar as nossas reivindicações?
Roraima tem um lema: vamos lutar até o último índio! Não dá para vivermos massacrados o tempo inteiro! Não dá para estarmos pedindo esmola ao Governo! O pouco direito que nós temos está sendo violado a cada momento.
Gostaria de pedir que o Senador fizesse acontecer, que desse continuidade, que chegasse a todas as instâncias esse nosso clamor, porque um sangue derramado não é qualquer tipo de líquido: é o sangue de um ser humano, é um sofrimento, é uma dor. É uma pena que não seja da família desses que dizem ser representantes, seja no Senado, seja na Câmara Federal. Não é a família deles que está lá sofrendo, que está lá morrendo. Com certeza, se fossem as suas fazendas, se fossem seus filhos, já teriam tomado as devidas providências. Mas, quando é o povo indígena, fica a desejar, o sofrimento continua.
R
Então, que o Senador Telmário Mota não faça com que o nosso Estado, o Estado de Roraima, venha também cair nessa situação, porque nós não estamos bem.
Quero, também, pedir que um Senador, eu tenho o vídeo no celular... Nós temos a terra indígena Raposa Serra do Sol, onde foi feita a desintrusão, e um dos Senadores deixou uma mensagem, dizendo que iria fazer uma emenda, iria, novamente, armar aqueles que saíram de terras indígenas e, em 2019, estariam fazendo uma barragem no Rio Cotingo. Senador, que isso seja analisado, porque chega de sofrimento!
Nós temos aí a situação de Mariana, onde houve a destruição da natureza, do meio ambiente, dos rios, de onde nós sobrevivemos. A nossa mata, a nossa terra é a nossa mãe, de onde tiramos a nossa alimentação. Como vai ser se fizerem essas barragens dentro de terras indígenas, como vem acontecendo? Por que desrespeitar a mãe terra, que dá a alimentação, o sustento, a vida para o nosso povo?
Nós temos como exemplo para o Brasil inteiro e para o mundo que mataram um rio que alimentava aquele povo, que matava a sede. A água é vida! Não queremos que esses rios que cortam as terras indígenas morram. Os grandes empresários, acredito, não pensam nisto: eles não vão comer dinheiro, eles não vão comer minério. Se não houver água, não teremos vida na face da Terra, ou neste País em que hoje vivemos! (Palmas.)
Então, quero deixar esta mensagem, dizendo assim: a PEC é uma das violações históricas contra os povos indígenas brasileiros. Que as nossas autoridades tomem providências! Que aqueles que são contra vão para outro lugar nesse mundo, porque não são brasileiros! Os brasileiros estão lutando por uma vida, e não por um minério. Então, aquelas terras indígenas, companheiro, assegurem, lutem até onde der. Acredito que, juntos, vamos vencer.
Quero fazer uma pergunta ao Senador: foi feita a assinatura, acredito que em todas as regiões, das terras indígenas. Onde foi parar essa lista de assinaturas contra a PEC nº 215?
Então, aproveitando esta oportunidade, gostaria de convidar o companheiro que está com o documento que foi feito no Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena para que pudéssemos entregar e, aqui nesta mesa, ser registrado. Esse fórum também foi criado com o objetivo de buscar, junto às autoridades, que aconteça, que tenhamos uma educação de qualidade, porque só é assim na fala, na propaganda do Governo, seja ele Federal, estadual ou municipal. Então, o fórum foi instalado e, com esse fórum, acreditamos que vamos alavancar e vamos lutar por uma educação de qualidade neste País.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Então, tivemos a fala do Telmo reclamando, mostrando.
O que me preocupou agorinha, eu estava lendo a MP que vai sair, é que é exatamente para fazer hidrelétricas. Então, o Telmo toca num assunto... O Telmo está falando da Hidrelétrica do Cotingo, que pode... Fique atento, pessoal da Funai, a esse aspecto, nossa assessoria também, porque essa PEC vai permitir hidrelétricas em comunidades indígenas. Então, vai vir aí. A sorte é que jabuti não pode mais, mas vai vir muita coisa pertinente que você pode, a partir dessa PEC aí, já indicar.
R
O SR. HENYO TRINDADE BARRETO FILHO - Só um esclarecimento: é uma regulamentação de um artigo da Constituição por via de medida provisória. Então, é gravíssimo para o nosso entendimento.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - O que é um perigo!!
O SR. HENYO TRINDADE BARRETO FILHO - Exatamente.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Nós vamos ficar muito atentos, porque ela vem ninguém sabe com que força e com qual objetivo.
Bom, então, vamos receber esse documento aqui, protocolado, original. Vamos fazer aqui a entrega simbólica, que é para podermos mostrar...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Sim, tirar a cópia. Já está protocolado, e esse documento vai fazer parte do documento que vamos encaminhar para cada Deputado e para cada Senador da Comissão.
Eu queria que o pessoal da Funai nos ajudasse, junto com a Comissão e com a minha assessoria, para que fizéssemos com que esse documento saísse o mais rápido possível.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Então, a assessoria da Funai, com muita eficiência, já se manifestou contrariamente a essa MP. A Funai não está dormindo no ponto, não; a Funai está acordadinha fazendo o papel dela!
Graças a Deus, ouvimos a palavra do Telmo. Agora, vamos ouvir a do Claudesi, que também é terena.
O SR. CLAUDESI VICENTE PIU - Bom dia a todos os presentes, parceiros, Senadores, principalmente ao povo originário da nossa terra indígena. É um prazer estar aqui falando de novo.
Houve uma fala de um Deputado uma vez, que escutei do plenário do Senado - eu estava vendo de casa -, e ele disse bem assim: "Os indígenas que são originários desta terra estão lá nas terras deles; não são estes que estão aqui, reivindicando essas ações. Estes que estão aqui são genéricos." Eu digo a ele que estas lideranças e estes caciques aqui são originários, sim. (Palmas.)
Nós estamos aqui brigando pelos nossos direitos, que estão sendo violados pelos políticos fazendeiros, como foi a fala do Daniel.
Eu vou chegar a Mato Grosso do Sul. Eu posso descer do avião e ser alvejado de bala, mas vou morrer com dignidade, porque estou brigando pelo meu povo, não só da etnia terena, mas do Brasil inteiro, das etnias xacriabá, tupinambá, pataxó. Estamos aqui brigando pelos nossos direitos, mas vou morrer com dignidade. Não como eles, que se escondem atrás do papel que eles mesmos fazem.
Outra coisa: essa PEC, se for aprovada, vai começar a matar esta liderança que está aqui hoje. Deus me pôs na Terra para viver ou para morrer. Eu estou para as duas coisas.
Não tenho medo de fazendeiro nenhum! Tenho medo só dAquele lá de cima.
Lá, na nossa região do Mato Grosso do Sul, havia uma terra que era demarcada. Hoje, em Mato Grosso do Sul, existem os guaranis kaiowás, terenas, kinikinaus. Nenhuma terra é demarcada. Todas estão para ser demarcadas.
Estamos aqui de novo, hoje. Acho que, para cá, nós não viemos para tirar foto, para ficar fazendo mídia para a imprensa, não. Nós viemos para cá para eles resolverem esse direito nosso. Já era para terem resolvido em 1995, se não me engano. Era para todas as terras indígenas estarem demarcadas. E até hoje não estão. Por quê? Quando o Governo vê os indígenas chegarem aqui, sabem o que eles fazem? Pegam a tropa e ficam cercando os indígenas, ameaçando os indígenas. Por quê? Para amedrontá-los. Mas, assim que nos amedrontam, nós chegamos com mais força ainda para brigar pelos nossos direitos. (Palmas.)
R
Eu fui visitar uma aldeia, a dos guaranis kaiowás - não tenho uma foto aqui, acho que não tirei -, e se vocês vissem como foi alvejada de bala, de doze, uma casa, uma mãe com um filho! Ela falou que foi por Deus que ela se salvou. A casa foi destruída.
E está acontecendo com meu amigo terena, ali. Está sendo caçado pelos pistoleiros.
Nós, indígenas, não só de Mato Grosso do Sul, como de todo o Brasil, não podemos reivindicar nada? Eles são caçados pela própria polícia, pelo próprio jagunço, que ameaça. Na semana passada, meu companheiro ali foi procurado, num distrito, por uns jagunços. Perguntaram onde ele estava.
Quando nós falamos em "uma liderança", não; todos nós somos lideranças, porque todos os guerreiros são líderes da sua aldeia, porque têm responsabilidade de cuidar da própria área e da própria reserva, o que não está acontecendo. Água poluída.
O que tem na região de Mato Grosso do Sul é isto aqui: soja, álcool, carne, milho. É derramado todo dia sangue indígena de uma criança, de uma mulher! E isso é exportado. (Palmas.)
Nós fizemos uma campanha e estamos com essa campanha, contra soja, milho, álcool, porque está sendo derramado muito sangue de criança, que é violentada; mulheres, homens, senhores e senhoras também.
Essa PEC vem violar todos os direitos dos povos indígenas, tanto dos quilombolas quanto dos povos indígenas, todos originários, que nasceram nesta terra.
E vamos morrer por esta terra, sim, Senador; seja demarcada ou não, mas nós não vamos entregar para ninguém. O que é nosso é nosso.
Nós estamos lutando pelos direitos daqueles pequenininhos que estão lá e que ainda não sabem o que é, mas não estão podendo viver, porque são mortos no outro dia. Não os deixam viver. Na região de Mato Grosso do Sul está acontecendo isso. Todos os dias está havendo ataques. Todos os dias está sendo atacado o povo garani kaiowá, e o povo terena também já não está ficando.
Nós temos retomadas nossas e vamos fazer mais ainda. O que é nosso é nosso. E nós vamos fazer. Nós não vamos ficar calados e olhar de braços cruzados os fazendeiros fazerem o que fazem com as nossas lideranças. Nós vamos, sim, lutar. Como o meu companheiro Daniel acabou de falar, até o último sangue, eu vou lutar.
Deixo um abraço a todas as lideranças que estão aqui. Nós somos, sim, um povo guerreiro e lutador.
R
Há uma fala de um amigo meu, que é a fala de uma senhora, bem doída: "Hoje, eu não tenho o que comer. Amanhã, nem sei se vou estar vivo. Porque, cada dia que passa, minhas crianças não têm o que comer. Só tem soja, milho e álcool sendo exportado para fora."
(Soa a campainha.)
O SR. CLAUDESI VICENTE PIU - O Brasil é rico em terras, mas não está sendo cumprida a lei de demarcação das nossas terras indígenas. E eu não estou aqui falando apenas dos terena e dos guarani kaiowá, eu quero a demarcação de todas as terras indígenas do Brasil.
Obrigado, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Sem dúvida, a fala do Claudesi foi extremamente forte e sentimental. As entrelinhas deixam muito claro que as terras que seriam para alimentar, dar vida, sobrevivência e continuidade ao povo originário, hoje são exploradas para alimentar o infinito desejo econômico daqueles que as utilizam para, cada dia mais, concentrar renda, dividir as classes sociais, matar os pobres e se perpetuarem no poder.
Mas nós vamos lutar, sim. Eu sempre digo que esse é um dos meus compromissos com o povo de Roraima.
Eu tive 90% dos votos dos povos indígenas. Em Roraima, isso representa 18% dos votos. Roraima talvez seja um dos poucos Estados que têm condições de eleger de quatro a cinco Deputados estaduais, e até hoje não elegeu nenhum por falta de organização. Falo isso para o Telmo porque ele vai levar essas informações, e é preciso.
Nós tínhamos uma pessoa preparada, o Presidente do CIR, Mário Nicácio, advogado, técnico agrícola, preparadíssimo, que, por questões de não comprar voto, ficou de fora. Nós tínhamos bons nomes para Deputado Federal. Roraima tem condições de eleger dois Deputados Federais, mas não o faz. Eu tenho contribuído e tenho levado, exigido isso deles. Na minha candidatura para o Senado, claro, uma candidatura humilde, pobre, eu tive esse sonho deles. Eles acreditaram em mim, me apoiaram, e eu vim para cá com esse compromisso.
Diariamente, o grupo dos meus adversários tenta me ridicularizar. Nas redes sociais, colocam minhas fotos, com cocar ou sem cocar, dizendo que sou o Senador dos índios, o Senador que trava o progresso, o Senador que freia o desenvolvimento, o Senador que afunda o Estado de Roraima. É claro que a mídia, repito, é dominada, muitas vezes inclusive, pelos laranjas dos políticos. No meu Estado não é diferente. Sou atacado de forma sórdida, covarde. Diariamente eles fazem isso, como a água mole em pedra dura, que tanto bate até que fura, não pela força, mas pela insistência. Eles tentam passar para o povo de Roraima que eu não represento o desenvolvimento, o crescimento, e que trabalho contra o Estado, uma pura mentira, uma pura enganação, pois o que destrói o Estado de Roraima é a corrupção, que é um mal que hoje assola o País como um todo. O que destrói o Estado de Roraima é a irresponsabilidade de políticos que ocupam cargos relevantes, que só se preocupam com o umbigo deles e com o bem-estar da família deles. O que destrói Roraima é a ganância desses corruptos. E a cela fria de uma cadeia ainda vai ser o seu destino. (Palmas.)
Vamos agora ouvir o Davi. O Davi é terena. O Davi já usa paletó.
R
O SR. DAVI - Em primeiro lugar, quero dirigir as minhas palavras ao nobre Senador Telmário Mota, autor do requerimento desta audiência pública da Comissão de Direitos Humanos do Senado.
Mais uma vez, quero dizer para o senhor, Senador, que é louvável a atitude que V. Exª tomou. V. Exª já ouviu todas essas dificuldades. E ainda mais os que estavam presentes aqui, como a Senadora Regina Sousa, o Procurador Arthur e o Presidente da Funai.
Quero dizer aos meus irmãos: meus abraços a vocês, todos que estão presentes aqui.
Eu quero nominar os índios que estão aqui em Brasília: Sebastião Terena, Mateus Terena, Humberto Apodi Xavante, que são servidores da Funai, da ouvidoria daquela instituição. Esses índios, aqui em Brasília, sempre estiveram atentos em relação às articulações contra o nosso povo aqui em Brasília, dentro desta Casa. Não deixando de fora, também temos dois amigos presentes aqui, que estão sempre juntos com os movimentos indígenas, quando precisamos, estão presentes: o Sr. Francisco, o Chico, e a Tereza, também funcionária da Funai.
Nós acabamos de ouvir, Senador, a respeito desse massacre relacionado à PEC 215, de um companheiro que esteve aqui na Mesa, lá do Mato Grosso do Sul, o Dr. Paulo. Falou-se sobre crimes. A intenção dos Parlamentares ruralistas, com a chamada PEC 215, é um crime. (Palmas.)
É um massacre, é uma barbaridade, é um assassinato, é um genocídio que estão querendo fazer com o índio brasileiro, que é o dono desta terra, que é o dono do Brasil.
Então, é uma discriminação que estão querendo fazer. Segundo a nossa Constituição, é um crime inafiançável. Não é porque são Parlamentares que vão se esconder atrás da sua imunidade. Lei é lei. Direito é direito. Está havendo, Senador, uma subjugação e uma eliminação dos índios brasileiros, e extermínio do Direito Civil. Racismo de inteligência, de cor e de economia, porque não deixam os índios se desenvolverem. E temos que combater isso.
R
A proposta da PEC 215, Senador, fere vários princípios constitucionais, leis do Direito Civil e Constitucional, princípios fundamentais e o Estado democrático de direito.
É impossível a gente deixar como eles querem fazer. Eu quero dizer para V. Exª, Senador Telmário Mota, que o meu povo heroicamente vai vencer essas dificuldades. (Palmas.)
E a Constituição não deve conter preceitos de aplicação impossível ou que venham a contrariar a realidade desse povo. Todo mundo sabe que o direito dos índios, juridicamente, é legal sobre as terras que estão sendo reivindicadas neste momento, porque eles querem cobrar as terras daqueles que são invasores das terras indígenas, sendo que aquelas terras onde estão os índios são domínio da União, segundo a Constituição, de acordo com o art. 20, item XI, da nossa Constituição de 1988. Ele diz também que são inalienáveis, que não podem ser transferidas para outras pessoas - nem vender, nem ceder. Ele diz também que são indisponíveis e imprescritíveis, segundo o nosso artigo que é considerado o capítulo do índio, o art. 231, §4º. Então, a União não pode destinar a qualquer outra finalidade, que seja do seu uso e fruição.
Eu quero dizer para o meu povo que está presente neste momento: nós vamos brigar, no bom sentido, mesmo que a gente seja impedido de entrar nesta Casa. Dizem que esta Casa é do povo?! Mas quem comanda aqui é a força econômica. Não é por isso que a gente vai ajoelhar e deixar como está. Eu tenho certeza de que somos corajosos, somos heroicamente...
(Soa a campainha.)
O SR. DAVI - E ainda mais para justificação dessa CPI da Funai: eles querem fragmentar os nossos direitos, mas a gente não vai deixar isso. Essa colonização que vem desde o começo continua.
Eu quero parabenizar - posso dizer aqui: meu amigo - o Senador Telmário Mota, o autor do requerimento para esta audiência aqui, nos Direitos Humanos do Senado.
Muito obrigado. (Palmas.)
R
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Vejam que essa PEC já tem dois nomes bem colocados pelos povos indígenas - é o sentimento -: a PEC do Genocídio ou a PEC do Crime, a PEC daqueles que massacram os povos mais humildes.
Vamos ouvir agora o Cacique. Em seguida, há dez pessoas inscritas. Nós estamos aqui quebrando rito. E nós estamos ao vivo agora.
Eu quero mandar um abraço para o pessoal de Portugal que está nos ouvindo através da internet. (Palmas.)
O Brasil inteiro nos acompanha ou pela TV Senado ou pela Rádio Senado ou pelo Alô Senado ou pelas redes sociais, pela internet.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Estou recebendo mensagens. Estão chegando mensagens pela internet, pelas redes sociais. Ali, estava havendo a votação do Embaixador - inclusive, faltava um voto, e eu tive de ir lá rapidinho para completar essa votação.
Vamos ouvir aqui, agora, completando a segunda Mesa, o Cacique Xakriaba Domingos Nunes de Oliveira, representante da Liderança Indígena Xakriaba, de Minas Gerais. (Palmas.)
O SR. CACIQUE XAKRIABA DOMINGOS NUNES DE OLIVEIRA - Um bom dia a todos, aos parentes e à Mesa, na pessoa do Senador Telmário Mota.
Eu quero agradecer ao nosso Pai Tupã por esta oportunidade e dizer que a gente está feliz por ter este espaço aberto para discussão tão importante que é relacionada aos nossos direitos, à nossa vida, à nossa terra, ao nosso povo.
Eu sou Domingos Xakriaba, do norte de Minas Gerais, São João das Missões, e estou aqui para, junto com o nosso povo, junto com as nossas comunidades tradicionais, o povo quilombola, declarar a nossa posição contrária a essa peste - coloco mais um nome aqui - que veio para afligir o nosso povo. Ela vem violando os nossos direitos e, principalmente, violando um bem maior que o nosso País conquistou, que o nosso povo conquistou, que é a Constituição Federal.
Digo a todos que, na Constituição Federal, existem muitos e muitos capítulos dentro dela, mas existem dois itens dentro da Constituição Federal, que são os arts. 231 e 232, que foram escritos com tinta diferente: eles foram escritos com tinta de sangue do nosso povo indígena deste País. As nossas lideranças, o nosso povo, os nossos antepassados, que lutaram para conseguir colocar esses dois itens na Constituição, que garantiria, em parte, os nossos direitos, sofreram, foram exterminados, foram mortos.
As nossas crianças, as mulheres, o nosso povo sofreu um extermínio muito grande desde que o Brasil foi invadido. Muitos dizem que o Brasil foi descoberto. Não, ele foi invadido. Quando chegaram aqui esses portugueses - e hoje a descendência deles são os mesmos que querem tirar os direitos dos verdadeiros donos do País -, eles já não acharam. Nós éramos mais de 5 milhões de indígenas que já estávamos presentes, que já tínhamos descoberto este nosso País.
R
Nós sabemos o quanto foi sofrido chegar a 1898 com a população indígena do nosso País praticamente extinta. Um sertanista chegou a publicar que, no ano 2000, não existiriam mais índios neste País.
Eu falo que esses itens da Constituição foram marcados de sangue, foram carimbados de sangue, porque, um ano antes da aprovação da Constituição Federal, o nosso povo xacriabá, ali no norte de Minas, no dia 12 de fevereiro de 1987, sofreu uma das piores chacinas que já tivemos na nossa existência. Um grupo de pistoleiros, naquela ocasião, fez uma emboscada na nossa casa, arrombou a nossa casa por volta de duas horas da madrugada. Era um grupo de 16 pistoleiros. Nesse dia, o grupo matou o Cacique Rosalino, que era meu pai, o meu tio Manoel Fiúza, um outro indígena que morava com a gente; além disso, baleou minha mãe. E nós escapamos porque Deus, o nosso pai Tupã, nos protegeu, porque também, ainda criancinha, levei muitos tiros quando fugi pela mata.
Tivemos a infelicidade de sofrer um genocídio, ou seja, tivemos a infelicidade de ter a primeira chacina qualificada como crime de genocídio no País. O primeiro genocídio no Brasil foi contra o nosso povo xacriabá, quando morreu aquele grupo de indígenas.
Felizmente também, com o sangue do meu pai, como ele já dizia, e daqueles indígenas que morreram ali, foi homologado aquele pedacinho de terra que a gente tinha e estava ocupando naquele momento.
O que a gente vê hoje? Se essa PEC passar, a gente sabe que está decretada a morte e o extermínio do nosso povo neste País. Mas existe uma coisa: eu disse aqui que esses dois itens foram escritos com tintas diferentes, foram carimbados com tintas diferentes, foram carimbados com sangue; para eles serem apagados, também vai ter que ser com tinta diferente. Eles não podem ser apagados com outra tinta. (Palmas.)
E o nosso povo vai lutar até o fim, para garantir os nossos direitos, para garantir à nossa futura geração aquilo que os nossos antepassados lutaram para nos dar oportunidade de estar aqui. Nós vamos lutar para dar oportunidade à nossa futura geração de também sobreviver, e sobreviver com dignidade.
Eu não sei se vai ser possível chegar aqui uma liderança - eu estou com várias lideranças xacriabás jovens aqui, que não tiveram oportunidade de acompanhar aquela luta, mas estão tendo oportunidade de estar aqui neste momento, ocupando este espaço de discussão que estamos tendo -, no dia de amanhã, para falar pelo nosso povo, pelas nossas crianças.
Tenho acompanhado de perto também o noticiário sobre nossos parentes guaranis kaiowás. Não há como não se emocionar, não ter um sentimento pelo que vem acontecendo com eles, assim como vem acontecendo com outros parentes no nosso País.
Nós sabemos o quanto vêm sofrendo as comunidades tradicionais para garantir o seu espaço, para garantir o seu território, para garantir a sua vida. Isso é triste para o nosso Brasil.
Eu hoje componho também o Comitê Indígena de Mudanças Climáticas. A gente vem discutindo as mudanças climáticas, como colocou aqui nosso parente Paulo Pankararu. E a gente vem discutindo justamente isto: hoje é comprovado que as Unidades de Conservação, que os territórios indígenas são os que mais preservam, são os que mais são preservados e são os que mais vêm contribuindo para a diminuição dos efeitos negativos das mudanças climáticas no País.
R
Prega-se lá fora que o Brasil está contribuindo para a diminuição dos gases, dos efeitos negativos. Na verdade, se realmente estivesse contribuindo, estariam valorizando esse povo que vem contribuindo, que vem preservando; estariam garantindo os territórios indígenas, estariam demarcando as nossas terras e dando suporte para que esse povo pudesse sobreviver, porque são os verdadeiros cooperadores para a diminuição dos efeitos negativos das mudanças climáticas.
Nós temos vários indígenas hoje na França, também discutindo as mudanças climáticas. Nós sabemos que esse povo não tem nem sequer oportunidade de falar ali, para defender o nosso País.
Então, Senador, é um recado que a gente deixa também ao Governo, ao Senado, a todos que defendem a causa...
(Soa a campainha.)
O SR. CACIQUE XAKRIABA DOMINGOS NUNES DE OLIVEIRA - ... para que a gente tenha esse reconhecimento também. Se realmente o Brasil quer viver o que se prega lá fora, tem de reconhecer os territórios indígenas, tem de reconhecer os direitos do nosso povo, daquelas comunidades que lutam, que preservam, que brigam pela defesa dos nossos direitos.
Nós temos muita gente sofrendo. Nós temos muita gente morrendo. Nós estamos tendo a falta de chuva, mas o nosso território está sendo regado de sangue indígena, de sangue daqueles que defendem os seus direitos, que defendem os nossos territórios.
Então, eu deixo o meu apelo: vamos lutar em prol dos nossos direitos e declarar a nossa luta perante todo o Brasil, porque, se o Brasil é nosso, esse Brasil é regado com sangue nosso, e as nossas lideranças que partiram, que morreram, nossos parentes guaranis podem ter a certeza de que eles foram plantados e vão gerar muitos e muitos frutos mais, para que este Brasil possa ser um país digno. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Fechando aqui a fala dos convidados que compõem esta 2ª Mesa, nós ouvimos o Cacique, inclusive dando o testemunho da sua própria família, do sangue derramado nessa luta dos povos indígenas no Brasil. Que isso naturalmente o fortifique para que ele continue passando esses sentimentos aos novos caciques, aos novos membros da comunidade; que ele continue passando que o espírito de luta não pode nunca morrer, nunca pode se exaurir.
Nós vamos agora passar... Antes, eu quero, Francisco e Teresa, agradecer a presença de vocês. Obrigado. Eu vi aqui no rostinho da Teresa e do Francisco sempre a expressão de uma participação, de um sentimento. (Palmas.)
Eu estava vendo aqui e, de acordo com os povos, vou pular a lista, para não ficar só os terenas, só os guaranis kaiowás. Eu vou dar um salto. Então, vou franquear a palavra por três minutos. Daqui a pouco, nós vamos ter sessão plenária, e já ouvimos as duas Mesas que estavam previstas. Mas vamos ouvir mais dez pessoas que hoje compõem nosso fórum de debate nesta audiência. Eu vou ouvir cada pessoa por três minutos - eu queria que a Mesa acompanhasse -, e que elas concentrem seu recado naquilo que realmente está doendo. Assim, você dá um recadinho bom, porque, num minuto na televisão, a turma vende coisas que ninguém imagina. Em três minutos bem falados, você coloca com propriedade. Sei que ninguém aqui é especialista em comunicação, mas deixe o seu coração falar em cima daquela sua dor.
Então, vamos começar logo com o Tiago Anacé, que é do Fórum Nacional de Educação em Escolas Indígenas.
Tiago, pode usar o microfone aí mesmo. Fique à vontade. Não se preocupe em baixá-lo, não, porque, quando eu cheguei aqui, eu faltava quebrar o pescoço, mas ele pega a certa distância.
O SR. TIAGO ANACÉ - Boa tarde a todos e a todas.
Nós estivemos reunidos agora no fórum. Houve representação de 11 Estados, 33 povos, um total de 120 participantes, entre professores, gestores e pessoas ligadas à educação escolar indígena. Estivemos em Luziânia desde terça até hoje. Tivemos esse momento político. Dividimos os participantes em dois grupos: um ficou com a mobilização no MEC, e o outro, veio acompanhar esta audiência.
R
Entendemos que a luta pela educação escolar indígena diferenciada, específica, passa, também, pelo direito à terra. Não temos como ter educação escolar indígena se não tivermos essa definição da defesa do nosso território. Gritamos, como professores, como participantes desse Fórum de Educação Escolar Indígena, que tem representatividade nacional: "Não a esse crime! Não a essa barbárie!"
Entendemos que devemos avançar no sentido de garantir direitos e não de retroceder direitos. Que concepção é essa que esses Parlamentares têm, uma vez que não conseguem avançar nos direitos constitucionais e vamos ter um retrocesso?
Então, como povos indígenas, lamentamos muito isso e dizemos: olha, o nosso sangue cai na terra e, por isso, além de sermos originais donos, quando regamos a terra com o nosso sangue, estamos nos tomando cada vez mais donos e legítimos dela.
Só para constar também, registro que nós, indígenas do Nordeste, sou do povo anacé lá, do Ceará, temos enfrentado processos que são massacrantes, a exemplo do povo tapeva também, que, há 30 anos, num processo de demarcação, agora, de repente, se vê ameaçado mais ainda por conta de um projeto, uma proposta como essa, inteiramente com fins econômicos. A nossa pergunta é: até quando vamos continuar pensando que dá para comer dinheiro?
Então, agradecemos a oportunidade de participar, contamos com os Senadores, ficamos, de certa forma, empolgados com esta manifestação dos Senadores a favor desta nossa luta e contra essa PEC, e queremos estar sempre contando com essa participação em defesa dos nossos direitos.
É isso, parentes. É bom que estejamos aqui, é salutar. E quero dizer que temos condição de discutir, propor nesta arena política também, pautar as nossas demandas.
Não à PEC 215! Cada vez mais avancemos nos direitos constitucionais garantidos!
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Obrigado.
Uma salva de palmas para o Tiago. (Palmas.)
As mulheres reclamaram, disseram que só fala homem, mas o culpado foi você, Antonio. Então, vamos mudar agora. Vai falar a Lourdes Francisco da Costa, que é representante do Movimento Geraizero, de Minas Gerais. Fale aí, Lourdinha. Três minutos.
A SRª LOURDES FRANCISCO DA COSTA - Sou Lourdes Francisco da Costa. Represento aqui o Movimento Geraizeiro, do norte de Minas, região de Grão Mogol. Estou, aqui com meus parentes, os xakriabás. Nunca tive uma oportunidade desta de estar falando num lugar como este e com gente minha. Às vezes, a gente está num lugar em que a maioria das pessoas é contra, então, a gente fica até meio envergonhado e com medo de falar, mas, aqui, estou me sentindo mais ou menos em casa, não pelo lugar, porque eu não me sinto em casa aqui, mas pelos meus parentes que estão aqui, que são iguais a mim. Então, venho fazer algumas denúncias.
A indignação do nosso povo Geraizeiro lá está demais. Estamos sofrendo ameaça, estamos sendo despejados, temos ação de juízes contra nós, sou fruto disso, outras pessoas do meu lugar também são, e não temos como, porque a gente está vendo um Judiciário que não está a nosso favor.
Outra coisa que eu teria que fazer antes é agradecer ao Senador Telmário por esta oportunidade, porque não estamos tendo oportunidade, são pouquíssimas, de expressar repúdio e indignação contra tudo o que eu estou vendo em desfavor nosso.
R
A primeira coisa que tenho que falar, entre outras, é que o sistema de defesa nacional e a rede de informação se mostraram e se mostram omissos frente a nossas denúncias sobre ameaças e assassinatos que estão acontecendo com o nosso povo. (Palmas.)
Nota-se um pessimismo entre nós, mas é porque a gente está lutando contra forças que a gente até desconhece, mas a gente está firme e não vai arredar o pé enquanto a gente não conseguir o que quer.
Nota-se a negligência das autoridades ante as responsabilidades dos órgãos públicos. Nota-se que os órgãos públicos são ineficientes, e mesmo empresas não parecem se interessar por investimentos estratégicos como prevenção, fiscalização e controle mais eficazes - estou falando isso aqui por causa do acidente de Mariana - para que possamos viver com um mínimo de dignidade.
A todo o momento, fere-se de morte a nossa Constituição, quando se coloca o nosso povo, o nosso território à mercê de empresas inescrupulosas, diante de três Poderes elitistas, ineficazes, que tudo compram com dinheiro e com recebimento de multas e outros investimentos disfarçados de obrigações sociais, que não visam fortalecer a Nação, nem ao menos tirar da miséria em que vivem os povos explorados e expulsos de seus territórios. Isso é apenas mais um meio de cooptar e comprar, retirar licenças ambientais, juízes ambientalistas, governantes, para que vendam o nosso povo como escravo ao capital nacional e internacional. São os chamados grandes investimentos com baixos custos e altos benefícios para eles. Isso não nos interessa mais. Estamos cheios disso aí, queremos uma mudança radical, não estamos de brincadeira com mais ninguém. Viemos, aqui, justamente para mostrar este repúdio que a gente está sentindo.
Há muito, os nossos Governantes não nos reconhecem como filhos da Pátria, teimam em negociar com empresas de mineração, agronegócio etc., que alavancam o lucro para outros, não para nós. Somos, a todo o momento, assaltados, roubados em nossos direitos, através de leis que não garantem qualidade de vida para a maioria, e sim, para uma minoria. Essa maioria vive na miséria e quem lucra são os grandes.
É só isso a minha fala.
Muito obrigada, gente.
Bom dia. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Eu queria aproveitar, aqui deve estar a Ouvidoria da Funai, não está? Quem é da Ouvidoria da Funai aí? Há alguém, algum servidor da Ouvidoria? Viu, Tião, precisamos rever isso aí, aproveitar - aqui está também a nossa querida assessora - para melhorar essa Ouvidoria da Funai para que ouça essas reclamações e tome providências, porque, se a Ouvidoria não estiver à altura, não há para quem gritar. Veja, ela está reclamando do Judiciário, da polícia. Estão sendo assaltados. Como é que vão assaltar comunidade indígena? O que tem lá para ser assaltado? Então, há alguma coisa errada, ou as terras não estão marcadas, ou está misturado, alguma coisa estão confundindo. Então, pode-se levar isso à Ouvidoria, são pontos.
E quero dizer que estamos aqui para gritar essas dores. Então, o que a Ouvidoria da Funai constatar, se alguma providência precisar ser tomada e não for possível, se precisar da nossa força, do nosso apoio aqui, no Senado, a nossa Casa está à disposição: o João, que trabalha nisso, e todo o meu gabinete estão à disposição.
Bom, então, vamos agora ouvir Sebastião Coelho, indigenista da Ouvidoria. Seria bom deixar o Tião por último porque ele vai ouvir muita reclamação e vai ter que falar um pouco sobre isso. Tião, espere um pouco aí, então.
Vamos colocar outra mulher. Solange de Oliveira Soares da Silva, do Movimento Residência Popular, MR...
A SRª SOLANGE DE OLIVEIRA SOARES - Bom dia.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Bom dia, Solange.
R
A SRª SOLANGE DE OLIVEIRA SOARES - Agradeço pelo espaço.
Estou aqui, hoje, para apelar para o Senador Telmário Mota, porque estamos precisando muito de ajuda. O movimento funciona aqui no DF, atua aqui no DF. Oito militantes do movimento foram presos. E nós acreditamos que foi por motivos políticos, porque, nos últimos oito meses, ocupamos cinco lugares aqui no Plano Piloto, no centro de Brasília. Então, nós mexemos com quem não devíamos, né? Pobre não pode morar no centro, no centro de Brasília, no centro do poder. Então, eles acusaram a gente de extorsão, de vários crimes, forjaram provas, tanto que, no inquérito que a advogada passou para nós, que leu, não existe prova nenhuma contra eles. Eles estão presos e deram entrada nos habeas corpus, mas não conseguiram sair porque nenhum juiz quer decidir, quer liberar ou não. Nenhum juiz decide. Fica um jogando para o outro. Então, queríamos uma colaboração, uma ajuda do senhor, porque temos como provar que não fizemos nada, tanto que já levamos as provas, mas nenhum juiz decide. Um joga para o outro. Nenhum resolve nada.
No final de maio passado, nós estivemos aqui e protocolamos documentos, já prevenindo contra atuais acusações, como, de fato, estão acontecendo. Temos documentos protocolados aqui mesmo na Comissão de Direitos Humanos. Nós sabemos que são presos políticos porque não há prova nenhuma, e juiz nenhum decide o que fazer. Nós estamos acuados, porque a Polícia Militar do DF e a Polícia Civil estão nos ameaçando 24 horas, nos perseguindo. Prenderam-nos saindo de emprego, prenderam-nos em casa, com a família. São pessoas que nunca foram presas as que estão presas lá. A gente está muito preocupado, porque não sabe como é uma prisão, não sabe o que acontece, o que pode acontecer com eles. Podem até matar um de nós e forjar, dizer foi um assalto. A gente não sabe o que está acontecendo.
Então, a gente queria uma ajuda.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Está bom.
Palmas para ela. (Palmas.)
Solange, estamos aí, com o gabinete, para discutir aquilo que for também dentro da legalidade, deixar isso bem claro.
Outra coisa: se você fosse esses políticos que assaltaram e assaltam o meu Estado, você não estaria tendo esse problema. O povo pobre é assim mesmo.
A SRª SOLANGE DE OLIVEIRA SOARES - Com certeza.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Botam os cachorros e tudo em cima. Para prender um rico, é helicóptero; para prender um pobre, é camburão da polícia.
A SRª SOLANGE DE OLIVEIRA SOARES - É fácil prender um pobre.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Pode falar.
ORADOR NÃO IDENTIFICADO (Fora do microfone.) - A presença da companheira Solange tem a ver com tudo isso que nós estamos vivendo aqui neste momento, porque a luta dos indígenas e a luta dos quilombolas se complementam com a luta de todo o povo da cidade também, que tenta moradia para sobreviver, para poder viver. Por isso...
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Bom, vamos continuar ouvindo os nossos parentes.
Adalto Barbosa de Almeida, representante da Liderança Indígena Terena, por três minutos.
Cadê o Adalto?
ORADOR NÃO IDENTIFICADO - O Adalto não veio.
ORADOR NÃO IDENTIFICADO - A Valdelice também não veio.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - A Valdelice também não veio. Está bom.
O Estevinho Terena Tiago está aí?
Estevinho, por três minutos.
O SR. ESTEVINHO TERENA TIAGO - Eu queria dar bom dia a todos, nossos amigos, companheiros e parentes. Também falar, em nome do Conselho Terena, lembrando também do Conselho Aty Guassu e do Conselho Kinikinau, que, em Mato Grosso do Sul, estamos sofrendo esse genocídio.
Os Deputados também criam a CPI do Cimi e algumas polêmicas para atrapalhar a vida dos parentes. E nós somos colaboradores ao Brasil também. Nós temos direito. Parentes lutaram na guerra, na Segunda Guerra Mundial, na Guerra do Paraguai, em Mato Grosso do Sul. Vários parentes lutaram. Mas nunca tivemos retorno. Nunca obtivemos resposta positiva. Essa resposta que deram para nós agora, esse genocídio que está sendo praticado pelo não índio em nossas aldeias... Então, crianças, nossos avôs, anciões estão sofrendo devido à questão.
R
Participamos da luta do Brasil. Fizemos parte deste Governo. Nós fomos parceiros, mas estão colorindo a Bandeira com o sangue do indígena. Cantamos o Hino Nacional também, levantamos o nome de herói, mas não sabíamos o que a letra da música brasileira falava de nós, porque mataram muitos índios no ano de invasão. Eu li um livro do Frei, quando disseram: quase 40 mil quilômetros de praia cheios de corpos colocados lado a lado, todos corpos indígenas. Esse é um fato. Esse é um genocídio verdadeiro. Até hoje, até agora, no Brasil, há essa contaminação que veio dos ancestrais desses povos invasores.
Eu creio que hoje, nesta década, época de CPI também... Aliás, é a CPI que serviria para a proteção dos índios, mas não foi protetora nossa, porque titulou as nossas terras para ruralistas, para os fazendeiros terem uma terra normalizada. E hoje o Governo está caindo fora. Parece que a caneta está mais pesada, não é, Daniel? Porque não quer assinar, não quer, em nenhum momento, assinar a portaria declaratória, não só para Mato Grosso do Sul, mas a terra para os indígenas do Brasil.
E ainda, em nome do Conselho Aty Guassu, em nome do Conselho Terena e do Kinikinau, de Mato Grosso do Sul e do Brasil, repudiamos a PEC 215, porque esses Deputados querem legitimar a matança indígena. Na verdade, eles querem esconder atrás de uma lei um direito que queriam implantar nessa PEC 215.
Até o momento, nenhum foi indiciado pela morte dos nossos parentes, nenhum foi preso. Há alguns parentes presos lá só porque fizeram alguma coisa, colocaram alguém em risco de vida. Foi preso de uma hora para outra.
Nós estamos aqui relatando essa questão...
(Soa a campainha.)
(Interrupção do som.)
O SR. ESTEVINHO TERENA TIAGO - ... que o Deputado sobre a PEC 215.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Não é nem que o parente colocou a vida de alguém em risco. As pessoas colocaram a vida do parente, e ele se defendeu.
Bom, Itamar Krenak. Itamar, fala para nós o que está acontecendo. O Itamar foi vítima de Mariana.
O SR. ITAMAR KRENAK - Bom dia a todos os parentes. Eu sou Itamar Krenak, sou da região do leste de Minas, Município de Resplendor. Estou aqui também para compartilhar com os parentes e com esta Casa a situação dos krenak hoje.
Nós fomos vítimas desse crime ambiental que a empresa Samarco causou. O nosso povo está sofrendo muito. Hoje, foi tirado o costume das nossas crianças, nossos velhos, o nosso costume da caça, da pesca, do peixe. O ritual que temos com relação ao rio foi tirado de nós. O rio está morto. Isso é muito triste, porque as nossas crianças, o nosso povo não consegue entender como vamos estar vivendo com essa situação.
A gente está sem água. Foi montada uma entrega de água, um plano emergencial, água mineral, água através de caminhão, mas isso não resolve o nosso problema. O nosso problema é muito amplo. A gente tem a parte religiosa do Uatu. E hoje o Uatu está morto. (Palmas.)
Desculpe-me, porque é triste falar dessa situação. Mas eu busco força aqui, com os parentes aí, os guaranis. A situação deles é igual a nossa, também é complicada.
R
Hoje, precisamos ampliar o nosso território. Mais do que nunca, o nosso território precisa se expandir até para termos água, caça. E não sei quando a gente vai voltar a pescar. Não temos mais o rio, não temos mais essa parte que é importante na nossa vida, que foi tirada de nós.
Quero registrar aqui também a nossa vontade. E esta Casa pode se empenhar e nos ajudar a demarcar nossa terra, ampliar o nosso território.
E quero agradecer este espaço. É um espaço importante para a discussão, para garantir os nossos direitos como indígenas. Nós somos cidadãos brasileiros e precisamos ser respeitados. Somos os donos dessa terra.
Como o parente falou, nós vamos lutar até a última gota de sangue. Não vamos abrir mão do nosso território.
Essa PEC 215 vem para nos extinguir do mapa. Acho que, pelo contrário, estamos cada vez mais nos fortalecendo em nível de Estado, em nível de Brasil, para lutarmos por nossos direitos. E a luta vai ser firme, parente. Não vai achar que vai ser fácil daqui para frente, porque a bancada ruralista está aí. A gente vai bater forte, vai bater de frente - (expressão indígena) - para seguir em frente, para a gente seguir a nossa luta.
Acho que queria compartilhar um pouco isso, Senador, apoiar essa situação. De que maneira, sob a ótica dos direitos humanos, está-se pensando esse crime que foi cometido com o nosso território?
E quero compartilhar também com os nossos parentes que estamos juntos na luta, os guaranis kaiowás, os quilombolas. Estamos para somar, para lutarmos juntos e caminhar, sem baixar a cabeça. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Eu queria aproveitar para falar para o pessoal da nossa assessoria e da Funai que, infelizmente, o prejuízo ambiental e tudo mais que aconteceu em Mariana vai ter um reparo. A empresa vai ser multada, vai fazer uma compensação. Então, seria importante que os povos, vocês sejam compensados também porque, às vezes, há reclamações do Ibama, e vocês foram sacrificados na existência, no básico da alimentação, da vida dos povos de lá. Então é preciso que a Funai coloque isso como prejuízo, para que conste desse reparo que vocês estão sofrendo. É importante ter esse cuidado, porque, às vezes, eles não estão vendo o quanto isso prejudicou diretamente quem vive só daquilo, como é o caso de vocês. Então, é importante fazer essa colocação.
Élida Machado, representante dos povos guaranis kaiowás.
A SRª ELIDA MACHADO - Bom dia a todos, porque ainda não almoçamos.
É impossível a gente relatar os nossos problemas em três minutos, mas eu vou falar mais do que dói em mim. Até me emociono ao falar, porque a gente, na aldeia Nhanderu-Marangatu, sofreu, a gente foi muito visto na mídia, tudo o que aconteceu com a gente.
E eu estou aqui pedindo ajuda aos Senadores e às demais autoridades para que tomem uma providência imediatamente em relação às nossas terras.
Acho até engraçado, eu lembro que meu pai falava que, quando os europeus vieram aqui para Brasil e encontraram a nós, deram presentinhos, espelhos, pentes, e os recebemos de braços abertos, nenhum deles morreu. Nós já estávamos aqui. Não foi preciso vir antropólogos e demais especialistas para falar: "Essa terra é dos europeus, vocês podem ficar aqui". E por que agora precisa de antropólogos em nossas aldeias estudando anos e anos para ainda chegar e nos falar: "Essa terra não é de vocês?" Naquela época, não foi preciso ninguém estudar para falar: "A terra não é de vocês". A terra é nossa, nós já estávamos aqui. E agora a gente tem que estar derramando sangue para conseguir pelo menos um pedacinho de terra para que os nossos filhos vivam com dignidade.
R
Estou falando aqui como mãe. Eu sofri nesses tempos, vendo as crianças correndo para lá e para cá, por causa de bala, quando o Simeão morreu e me deixou um filho de quatro anos. Quem vai manter essa criança agora?
Então, a gente precisa dessa terra para conseguir viver com dignidade. Tem muitos que falam assim: porque índio quer tanta terra? Quando eu fui lá, vi os meus aluninhos, eu também sou professora nessa área, e eles estavam lá tomando banho no rio, pescando, carregando passarinho para lá e para cá, carregando peixe que esses pescaram com tanta felicidade. E ainda perguntam por que o índio quer ter terra. A gente quer porque a gente precisa dela para sobreviver.
É isso que tenho para falar com vocês.
Muito obrigada pela oportunidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Eles acham que os índios querem muita terra, e os fazendeiros têm 100 mil hectares.
Bom, vamos ouvir agora a Daiara.
A SRª DAIARA - Boa tarde a todos.
Sr. Senador, a PEC 215 já está nos causando muito mal. Ela é uma campanha de ódio contra os povos originários; a campanha de ódio que vemos aqui toda vez que, entrando nesta Casa, a polícia legislativa nos impede de entrar com os nossos maracás sagrados, porque na visão do branco até o maracá é arma; a campanha de ódio da Empresa Brasileira de Comunicação, que tem uma orientação de não tratar da pauta indígena nos jornais, nas rádios, para silenciar todos esses assassinatos; a campanha de ódio promovida por esses formadores de opinião, que estão na Casa vizinha, na Câmara dos Deputados, dizendo que nós que estamos aqui somos genéricos, somos falsos, somos mentirosos, somos ladrões, criminalizando nossos movimentos por nossos direitos, desmentindo a nossa história, a nossa verdade, a nossa luta.
Fazemos aqui, reunidos, essa denúncia, porque nós, como cidadãos brasileiros, não podemos aceitar que o Brasil continue perpetuando o maior genocídio da história da humanidade, que é o genocídio dos povos indígenas deste Continente.
É responsabilidade desta Casa não se calar, parar de andar em cima de nossos cadáveres, parar de envenenar nosso próprio povo. Pedimos ajuda para que o Senado denuncie o silêncio da mídia brasileira. A cooptação promovida pelos mesmos empresários que mandam, que acham que mandam na democracia brasileira não pode silenciar a mídia, o jornal.
Precisamos informar o nosso povo, politizar todos nós, politizar os povos indígenas, os negros, as mulheres, o pessoal do campo e da cidade para construir uma democracia de verdade, que respeite a vida e a dignidade humana, porque nossa luta não é mais do que isto: a luta por dignidade.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Você falou uma frase que eu vou copiar: luta do ódio que eles estão implantando contra os povos indígenas sem nenhuma motivação.
Bom, já estamos chegando ao final. Eu vou franquear a palavra ao Francisco, que pediu há muito tempo, e, em seguida, ao Sebastião, para concluir.
Inclusive, Sebastião, queria que você respondesse para a gente sobre essas mortes que acontecem, acidentes e tal. A Funai está catalogando isso através da ouvidoria? Ou é o Cimi? Porque o relatório que chegou aqui, que eu denunciei, foi do Cimi.
R
Não é para responder agora; é para responder depois, porque é uma coisa que nós temos que ver, rever e aproveitar com o pessoal da Funai esse aspecto. Essa ouvidoria pode ser, assim, um grande.... Está bom? Encaminhe isso para a gente, querida, para a gente apontar.
Francisco, depois você fala, antes do Sebastião, porque havia aqui o Vilmar, que eu tinha esquecido. Vilmar era para estar na Mesa, mas ele ficou quietinho.
Eu quero, também, fazer um outro anúncio aqui, aproveitando o companheiro ali, Itamar, do povo Krenak - ouviu, Itamar? Dia 14, aqui, vai haver uma audiência sobre a questão de Mariana. Então, eu queria que tu deixasses ali com o pessoal da Funai ou com a minha assessoria tudo que é de danos, a composição das comunidades hoje, quantas pessoas foram atingidas, como é a área de vocês, o que se tirou da alimentação, da sobrevivência e tal, para a gente estar aqui no dia da audiência. Eu quero vir para essa audiência - cadê o meu pessoal? Já foi embora todo mundo? Não estou vendo ninguém...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Não.
Qual é o teu nome?
O SR. CÍCERO FERREIRA DE LIMA - Cícero.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Cícero Ferreira de Lima. Aguenta aí, Cícero, porque eu pulei aqui.
Então, fala o Chico; depois fala o Cícero; depois, o Vilmar; depois, o Sebastião; e encerra - está bom?
O SR. JOSÉ FRANCISCO DOS SANTOS - Boa tarde, componentes da mesa.
Eu fico muito honrado com o convite que me foi feito pela Ouvidoria da Funai. Lá me reuni com os companheiros e nós começamos a pensar o que é que tínhamos que fazer da vida, porque essa empreitada não vai ser muito fácil.
Eu gostaria de estar colocando aqui, neste momento, para o Sr. Senador e para os demais presentes - quilombolas e outros povos indígenas - que eu sou servidor do Ministério da Justiça, e a Funai é uma fundação dentro do Ministério da Justiça - V. Exª sabe do que eu estou falando. E, neste momento, não existe fato determinante para nós estarmos tratando aqui desse assunto que é a CPI da Funai.
Em primeiro lugar, o João Pedro assumiu agora, e por lá passaram outras direções. Como não há fato determinante, eu costumo dizer para os companheiros lá na Funai que essas coisas são distintas: que eles querem começar pela CPI da Funai, acabar com a Funai para exterminar com os povos indígenas, e acabar com os rios.
Então, eu aprendi com a finada minha mãe, que é descendente de índio - eu também sou descendente dos tapuias de Sergipe -, estar colocando aqui neste momento o seguinte: eu quero me ater a quem falar sobre essa PEC 215. Como dirigente sindical que fui e que sou, junto com a companheira Tereza, da Funai, nós estamos fazendo de tudo na nossa vida para ajudarmos a encaminhar a esta questão que ora é tão crucial na vida de todos os povos, em especial os índios: dos parentes. E gostaria de estar colocando aqui, de público, que os sindicatos dos servidores públicos federais vão mais além: nós queremos discutir se essa PEC - não citarei o nome do Deputado aqui que é criador de zebu em Uberaba, da terra da minha esposa....
(Soa a campainha.)
O SR. JOSÉ FRANCISCO DOS SANTOS - Gostaria de estar colocando aqui o seguinte: esse outro empresário, aqui, do gado e esse outro fazendeiro lá de Rondônia, eles precisam repensar isso aqui. Porque essa PEC 215 é um dos maiores crimes que eles estão colocando neste momento. Isso está sendo colocado na Ordem do Dia, começou lá em 2000, e retornou essa discussão.
E que nós povos indígenas, nós afrodescendentes e o povo brasileiro não vamos aceitar isso que está aí, porque essa PEC vem na linha de arrendar as terras dos índios. E eles têm algum compromisso com o povo brasileiro ou com os índios? Não têm! Os índios vão morrer de fome lá na aldeia e ficar desassistidos. E nós não vamos deixar os nossos parentes desassistidos de forma alguma, porque eu já vi lá trás - e o Barela está aqui e sabe muito bem do que eu estou falando - uma tal de PEC 136, que aconteceu aqui, que cassou o direito de todos os aposentados do Brasil e das pensionistas do Brasil, e que atinge os senhores.
Porque nós queremos discutir saúde suplementar para os índios. Houve índio que falou aqui e chorou - correto? - porque a situação dele lá na aldeia não é a minha aqui, pois estou hoje mais adequado, com um emprego aí, para ir tocando a minha vida.
R
E quero dizer para todos escutarem aqui - o Sr. Senador e os demais - que educação e saúde são deveres do Estado, mas só para dar satisfação lá fora. E para os povos indígenas é preciso, sim, ser repensado: recurso para educação dos índios, recurso para todas as nações brasileiras.
E quero colocar, para concluir, Sr. Senador e demais presentes, o seguinte: se chover, existe planta, existe remédio, existe oxigênio puro; se não chover, não existe planta, não existe remédio, não existe oxigênio puro. Vamos morrer todos aí!
Quero reafirmar aqui que eu, a companheira Tereza, da Funai, o Tião e a...
(Interrupção do som.)
O SR. JOSÉ FRANCISCO DOS SANTOS - ... para nós chegarmos no objetivo desejado que é barrar essa PEC criminosa. Como a companheira ainda há pouco falou aqui - e eu tive que vir aqui para negociar com o senhor, porque o senhor me encontrou lá embaixo com os demais -, índio não pode entrar aqui. Se isso aqui é Casa do povo, estudante brasileiro é o povo; estudante brasileiro é o amanhã. Os estudantes índios e os estudantes brasileiros são os povos que representam este País, pois foram os primeiros que aqui chegaram.
E quero dizer a todos que eu me sinto muito feliz e honrado por estar fazendo esta fala aqui, Sr. Senador. O senhor pode contar comigo. Estarei lado a lado dos quilombolas, dos companheiros índios e da sociedade brasileira para a gente barrar essa PEC desses dois que estão aqui e dos demais aqui dentro, a PEC desses empresários do gado, porque eles não têm pátria! A pátria deles é o lucro! E nós não vamos aceitar isso! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Obrigado, Francisco.
Então, nós vamos ouvir agora o Cícero - não é, Cícero?
O Cícero já estava agoniado: olhem a mão dele lá. (Risos.)
O SR. CÍCERO FERREIRA DE LIMA - É isso aí. Comecei a ficar até nervoso aqui, já.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Fique, não, porque ladrão usa microfone aqui dentro nem treme. Tu és honesto... (Risos.)
O SR. CÍCERO FERREIRA DE LIMA - Bom dia a todos e a todas.
O meu nome é Cícero. Eu sou vazanteiro - poucas pessoas conhecem o que é vazanteiro -, eu sou Presidente da Associação dos Vazanteiros do Norte de Minas, que está lá no finalzinho de Minas Gerais, e também faço parte da Articulação Vazanteiro em Movimento e de uma articulação que nós temos no Norte de Minas que se chama Articulação Rosalino.
Então, a gente quer agradecer a oportunidade, em nome de todo o povo Xakriabá, que sempre arrasta a gente para esses movimentos. E há muito tempo a gente tem uma parceria muito boa e vamos continuar sempre essa parceria. E eu agradeço muito a esse povo que sempre transporta a gente, porque a gente ainda está tão pequenininho. Mas a gente pega uma carona com eles e vamos que vamos! Estamos na luta aí!
É o seguinte: nós somos vazanteiros, e o problema nosso lá é que o nosso rio, como todo mundo sabe, o Chicão, o São Francisco, está morrendo - não é? A gente vê sempre falar em revitalização do Rio São Francisco, com milhões em dinheiro, e ninguém não vê nada, não vê ninguém fazendo nada pelo Rio São Francisco. E, após isso, existe o Projeto Jaíba, que foi criado naquela região, que fez um absurdo: desbravou as matas, nem carvão se fez. O que se fez foi queimar tudo - eu lembro disso, eu era menino ainda. E, hoje, eles fizeram os seus projetos sem planejamento, e as nossas áreas de vazante, onde a gente vive, eles tomaram como área de compensação, para compensar o crime ambiental que o Projeto Jaíba causou àquela região.
(Soa a campainha.)
O SR. CÍCERO FERREIRA DE LIMA - E a gente vive sofrendo muito como o pessoal do meio ambiente - que se diz IEF e o próprio Ibama - que querem nos tirar de dentro daquelas áreas que eles tomaram, como fizeram como pacto de compensação pelo Projeto Jaíba.
E nós estamos fazendo a nossa retomada lá. Já temos mais de dez retomadas no nosso território. E vamos continuar retomando as nossas terras, porque nós vimos que eles não são protetores da natureza: eles não protegem a natureza, eles querem ganhar dinheiro e dizer que estão protegendo a natureza. E os verdadeiros protetores da natureza somos nós, povo e comunidade tradicional.
E para os companheiros, os parentes, a gente quer dizer que o sangue seu não vai ser derramado sozinho. (Pausa.)
Desculpem-me... (Palmas.)
R
Em nome da Articulação Rosalino, nós dizemos a vocês que nós temos mais umas oito comunidades que estão em nossa luta, junto conosco e, se tiver que derramar, vai derramar todos juntos. E vamos conseguir mais pessoas para que isso... Se tiver que derramar, vamos derramar muito! Porque existe um ditado que diz: "Se é para morrer de fome, vamos morrer lutando!".
Obrigado. (Palmas.)
(Interrupção do som.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Cícero, você é indígena ou quilombola? Porque eu não estou... O cocar está impedindo aqui um pouco.
Indígena?
O SR. CÍCERO FERREIRA DE LIMA - Não, nós somos vazanteiros - povos e comunidades tradicionais. Trabalhamos nas várzeas da beira do Rio São Francisco.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Entendi.
Bom; então vamos agora aqui ouvir o Vilmar. O Vilmar eu o coloco e a Promotora vai entrar com uma ação, porque ela aqui, desde o início, trouxe aqui o Vilmar. (Risos.)
Fala Vilmar.
O SR. VILMAR SOUZA COSTA - Bom dia, desculpa por chegar atrasado. Saímos de casa às três horas da manhã. Eu vim em outro carro e cheguei um pouco atrasado, peguei uma fila.
Estou aqui também, sou da comunidade de Kalunga, do Quilombo Kalunga - hoje o maior quilombo do Brasil -, que ocupa o território de três Municípios: Cavalcante, Teresina de Goiás e Monte Alegre. E quero dizer que a gente está, também, pedindo socorro aqui. Acho que nos Direitos Humanos foi um lugar em que a gente nunca tinha vindo para nos colocar, mas estivemos agora, várias vezes, na Ouvidoria, com o Dr. Gercino Filho.
Nós estamos passando por dificuldades muito grandes. Além daquelas questões de pedofilia, quantas crianças menores em nosso Município de Cavalcante... E até o Deputado Paulo Pimenta foi lá e fez uma audiência pública. Mas foram colocadas muitas coisas, mas nada avançou muito não. Nunca tivemos resultados concretos para fazer justiça contra essas pessoas que acabaram, na verdade, desestruturando famílias. Crianças de dez anos, de 12 anos, que foram violentadas. Foi matéria de mídia no Brasil todo, acho que muitas pessoas viram. A Record foi até premiada com essa reportagem feita lá em Kalunga, mas é, assim, algo que nos coloca sempre na mídia de forma a só ver o lado errado, sendo que o nosso processo de luta não é visto. Hoje vivem lá, quase oito mil quilombolas nesses três Municípios, sofrendo bastante. Bem próximo de Brasília - a 320km de Brasília.
Há cinco meses, foram uns supostos fazendeiros até lá e derrubaram casas, derrubaram cerca de roças. Por último, agora, queimaram as sacas de arroz do pessoal. São 16 famílias na Comunidade Engenho II que estão sem alimentos para comer. Foi feito um Termo de Conduta junto com a Palmares e a Promotora, mas não foi cumprido e nada foi feito!
Vim à Ouvidoria nesta semana agora, sexta-feira dia 27, e o ouvidor não estava lá. Eu deixei registrado. Falei que agora a gente vai para dentro. Fomos aconselhados a sair para não dar conflito...
(Soa a campainha.)
O SR. VILMAR SOUZA COSTA - ... mas a justiça não foi feita. Mas, como as pessoas estão passando necessidade, não tem o que fazer; nós temos que lutar!
Então, supostos donos de terra fazem isso tudo. Fui ameaçado lá em casa por supostos fazendeiros. Foram lá em casa me ameaçar, que eu não poderia... Eles disseram que nem me reconheciam como presidente de um associação. E, se eu fosse lá, que eu não voltaria.
Então, onde estão os direitos humanos? A gente quer pedir justiça. Nós não temos juiz, nós temos a Promotora, que muito tem tentado fazer em nossa cidade. A gente reconhece o trabalho dela, que esteve aqui. Mas, não tem como fazer. Nós não temos delegado, não temos juiz, então está uma terra sem lei.
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR. Fora do microfone.) - Goiás?
O SR. VILMAR SOUZA COSTA - Goiás.
Então, a gente pede justiça para isso.
As terras - estou até com fotos aqui -, as fazendas que dizem que foram pagas, mas não foram praticamente entregues para a gente. A Presidenta Dilma agora entregou umas fazendas, mas precisa entregar de verdade, porque os fazendeiros estão tirando tudo o que tem lá. Eu tenho fotos aqui na máquina que mostram o tanto de madeira que estão tirando. O peixe que a gente comia lá... A gente está comprando peixe na cidade, porque os pescadores de fora vão lá e pegam todos os peixes para vender. Tem tralha muito sofisticada que passa no Rio Paranã, que arrasta tudo, e a gente pesca de anzol.
Então, nós precisamos de justiça. Nós precisamos que o Ibama cumpra, também, o seu papel. Quando a gente ligar, não digam: "Não, tem que gerar um protocolo. Daqui a 45 dias..." Em 45 dias, quando chega lá, não tem mais nada.
Então, a gente pede ajuda nesse sentido: que se faça cumprir a lei, que nos enxerguem, porque nós somos companheiros, estamos juntos com as comunidades indígenas, com todas as comunidades tradicionais lutando. Nossa luta é uma só!
Eu quero agradecer aqui a oportunidade e dizer que a gente está firme e forte na luta também, mesmo não conseguindo vencer. Porque a lei, hoje, para nós quilombolas... Se fosse um quilombola que tivesse cometido qualquer um crime desse aí, já estava preso! Mas, como é, então a gente só tem a reclamar, chorar e pedir ajuda.
Muito obrigado pela oportunidade. (Palmas.)
R
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Eu tenho muito cuidado, porque, até vocês chegarem aqui, é uma peregrinação, é um Calvário! Passam fome, passam necessidades, não têm dinheiro, vêm no sangue e na raça! Aí chega aqui, senta, dá um depoimento, no Senado Brasileiro, e, se não vem uma resposta, você perde a fé.
Vocês não deixaram que o medo tirasse a sua esperança. Aí chega aqui, e essa esperança não vai? Então, quero aqui pedir à minha assessoria, pedir aos companheiros de trabalho desta comissão, que eu quero ficar debruçado sobre essas causas. Porque há causas aqui que nós vamos direcionar com relação à PEC. Mas temos uma causa, como a do Vilmar - que foi uma sessão conjunto do Senador Paulo Paim, que deve estar nos ouvindo a essa hora, Senador tão ilustre, tão ativo nessa luta pela pelas causas humanas...
No teu caso, Vilmar, eu quero fazer um vídeo da tua fala e, depois, fazer um procedimento de encaminhamento - Marcondes, você está nos ouvindo, não é? -, para que a gente encaminhe a quem de direito, pedindo essas providências. Porque, senão, as palavras se perdem e vão apenas fazer parte de um volume morto e arquivo aqui do Senado.
Então, nós vamos tomar as providências que são cabíveis a este Parlamento no que diz respeito a esses encaminhamentos. No teu caso e no caso lá do companheiro do São Francisco, o Vicente, que também é um caso específico, porque eles são como ribeirinhos, então tem que ver a questão do Ibama lá no Rio São Francisco para ver essas providências, está certo?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Sim, também.
Então, vamos direcionar para a gente ter uma resposta e responder, dar um retorno! Porque é a mesma coisa de chover no molhado se não fizermos isso, não é? Passar por tanto sacrifício para, depois, não ter uma verdadeira resposta disso.
Bom, então, para concluirmos hoje aqui esta audiência, nós vamos agora ouvir o Sebastião. Ele parece chinês. Você, olhando para, vê que, fisicamente, parece aqueles chefões chineses. (Risos.)
Uma salva de palmas para o Sebastião, que vai nos falar agora. (Palmas.)
O SR. SEBASTIÃO DE SOUZA COELHO FILHO - Boa tarde!
Eu quero saudar primeiro os parentes de todas as etnias do Brasil. Em primeiro lugar, também, agradecer o convite do Senador Telmário Mota, reconhecendo o trabalho do Senador em defesa do direito dos povos indígenas aqui no Senado, principalmente nesta audiência pública, que trata da PEC nº 215, que é um genocídio para os povos indígenas do Brasil e também o extermínio total.
Quero também saudar aqui o companheiro do Cimi, que sempre está conosco nesta caminhada. Eu também quero dizer que eu sou constituinte. Desde 1988, aqui nesta Casa, eu sempre participei da mobilização da questão indígena. Eu também ajudei a emplacar os arts, 231 e 232 da Constituição de 1988. Então, eu, como acadêmico, funcionário da Funai há 30 anos, indigenista, também fui constituinte dos povos indígenas.
Então, aqui nós só temos aliados hoje: aliados do Cimi, as ONGs que também estão dando apoio à questão indígena, e, principalmente, o nosso Presidente da Funai agora, o João Pedro, que está iniciando um trabalho agora nesta caminhada, a questão da PEC, a questão das terras. Eu vejo o Presidente da Funai empenhado e somando com os servidores da casa, da Funai. Nós temos hoje quase dois mil funcionários, a Funai passou por um momento difícil, perdeu muitos funcionários com problemas de doenças e outras situações. Então, eu quero saudar também os funcionários da Funai que estão aqui hoje, na pessoa da Tereza e também da Fátima - acho que ela não está mais aqui, foi embora, também uma grande guerreira que sempre mobilizou a Funai, dentro e fora, sobre a questão indígena.
Eu quero dizer aqui aos parentes Kaiowá-Guarani...
(Soa a campainha.)
O SR. SEBASTIÃO DE SOUZA COELHO FILHO - ... que estamos sempre junto com vocês. Em Mato Grosso do Sul nós somos a segunda maior população do Brasil, quase 80 mil indígenas hoje. Eu vou combater também, junto à Funai, essa questão do agronegócio. Nós vamos combater juntos, porque agronegócio não é conosco. Vamos demarcar nossas terras sim, vamos lutar juntos, está bem? Vamos lutar junto com vocês, Kaiowás-Guaranis, Xakriabás, Pankararus, todas as 305 etnias do Brasil.
R
Eu sou um dos que fala a língua também. Também sou terena do Pantanal. Eu vou falar um pouquinho em meu idioma, os parentes terenas vão entender.
(Pronunciamento em língua indígena.)
O SR. SEBASTIÃO DE SOUZA COELHO FILHO - Eu falei o seguinte, Senador: que sou um grande guerreiro também, que estou aqui no meio dos purutuia, que são os brancos, mas que sou um grande aliado, também, de vocês.
Quanto à questão da ouvidoria, Senador Telmário, a ouvidoria tem um link dentro do site da Funai, para quem quiser acessar, os companheiros do Cimi, os companheiros aliados dos povos indígenas: www.funai.gov.br, e é só acessar o link da ouvidoria. Nós temos todos os dados, relatórios de assassinatos, denúncias, podemos passar para vocês também.
Só para finalizar, Senador, também gostaria de ter uma cópia do relatório de V. Exª aqui, na Comissão de Direitos Humanos, e que nos informasse também na ouvidoria.
Também queria agradecer à minha companheira, há 30 anos que está comigo, Senador, minha esposa Ione, hoje considerada terena também, sangue indígena.
Aos companheiros terenas, Davi, Estevinho, meu parente ali, guerreiro da nossa região, aos funcionários da Funai também, assessora parlamentar Solange, estamos juntos, Solange, vamos fazer essa caminhada junto com você, com João Pedro, nosso Presidente, e também com o Senador e o pessoal do sindicato, o Sindsep, que sempre apoiou nossa causa na Funai.
Só para finalizar, Senador, eu queria perguntar se é possível, não quebrando o protocolo aqui no Senado, na Comissão de Direitos Humanos, a nossa companheira de trabalho, Thereza, falar pelo menos dois ou três minutos, porque também é uma grande guerreira nossa, sempre foi aliada nossa na Funai.
Então, quero agradecer a vocês aqui.
(Pronunciamento em língua indígena.) (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Eu fui dizer que ele era chinês, e ele respondeu na língua dele que ele não é. Vocês já viram, não é? (Risos.)
Cortou no baixo. Tião não é só não.
Você quer falar, Thereza?
Muita gente quer falar. Tenho muitos pedidos aqui e não quero que os outros se zanguem, porque nós extrapolamos todos os limites. Por que fiz isso? Porque sei a dificuldade de acesso, das oportunidades, que são raras. A gente sempre oportuniza. Tivemos oportunidade de abrir uma reunião para os povos indígenas, onde todo mundo ocupou a Mesa, foi um momento histórico.
Por Thereza ser essa parceira, ninguém vai se zangar, que ela é branca, dos olhos verdes ou azuis, estou vendo daqui, uma bela mulher, e ela vai falar.
Dois minutos para você, Thereza, para a gente concluir.
Quando terminar, eu queria que todos que estivessem de cocar viessem fazer uma foto, que todos viessem, mas os de cocar principalmente, porque este é um momento histórico. É assim que a gente faz a construção da nossa vida...
Quero também registrar a presença da Isa Tapuia, do Pará, terra do Paulo, terra dos Senadores...
De quem é isso? Rosimeire, de Roraima? Não, é outra. Um recado que estamos recebendo, pede a fala para um jovem tuxaua, "eles estão em um processo de ocupação muito perigoso, falar com o Senador é muito importante para ele". Está bem.
Então, rapidamente, Thereza, para concluirmos. Depois, a foto.
A SRª THEREZA CHISTINA DE ALENCAR SILVEIRA - Para quem não me conhece, meu nome é Thereza Alencar, sou da Executiva do Sindsep-DF e da CUT Brasília. Eu queria agradecer ao Senado Federal, à Comissão de Direitos Humanos por esta audiência pública, que acho que é muito importante para os povos quilombolas e para os índios brasileiros.
Queria só registrar aqui, rapidamente, porque o tempo é muito pouco, que nós, servidores da Funai, que sempre trabalhamos em prol dos direitos dos índios, sentimo-nos desonrados com essa CPI da Funai porque vem desqualificar o trabalho dos servidores da Funai, que trabalham diuturnamente nas áreas indígenas, defendendo as tradições, os costumes e os territórios dos índios brasileiros. Portanto, por que só agora eles inventaram de fazer essa CPI para desqualificar o trabalho dos servidores da Funai?
R
Então, somos contra a CPI, somos contra a PEC nº 215, que retira o direito dos índios, que fere a Constituição brasileira, o artigo que garantiu a territorialidade dos índios, o artigo de garantia dos índios na Constituição de 1988.
Infelizmente, o tempo é curto. A gente queria falar mais, mas a gente agradece aqui a oportunidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Telmário Mota. Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Uma salva de palmas. Eu fico solidário aos servidores da Funai, que, sem nenhuma dúvida, Thereza, trabalham com muito amor e muita dedicação, e muito mais por amor. A causa indígena se torna causa deles. Eu sei disso. Eles abraçam com muito amor, com muita responsabilidade. Só vimos um presidente da Funai envolvido em rolo. Infelizmente, mandaram para Roraima, e a desgraça ficou lá. (Risos.)
Mas, tirando isso, a Funai sempre deu bons frutos, sempre teve bons servidores, pessoas comprometidas com a realidade, com as necessidades e com as causas indígena. Isso aí é uma coisa orquestrada; para justificar a PEC, eles fazem, paralelamente, essa CPI, para mostrar que a Funai perde a razão de ser, que a demarcação tem que ser via Congresso, quando sabemos que o Congresso é composto, hoje, em grande parte, pelas forças do poder econômico.
Eu quero aqui agradecer a todos e a todas que vieram hoje fazer parte desta audiência pública, que encerramos com os seguintes encaminhamentos: 1) encaminhar relatório da audiência pública para os Deputados Federais e Senadores, com cópia anexa da carta oriunda do I Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena, direcionado aos Parlamentares do Congresso Nacional, com as reivindicações decorrentes; 2) encaminhar depoimento do Sr. Vilmar Souza Costa, Presidente da Associação Quilombo Kalunga, dos Municípios de Cavalcante, Teresina de Goiás e Monte Alegre, do Estado de Goiás, às autoridades executivas do Estado de Goiás, ao Ministério Público Federal e estadual e ao Ibama; 3) encaminhar o depoimento do Sr. Cícero Ferreira de Lima, da liderança dos povos vazanteiros da várzea do Rio São Francisco, em Minas Gerais, às autoridades do Executivo do Estado de Minas Gerais ao Ministério Público Federal e estadual e Ibama.
Então, declaro encerrada a presente reunião.
Muito obrigado a todos. (Palmas.)
(Iniciada às 9 horas e 49 minutos, a reunião é encerrada às 14 horas e 14 minutos.)