Pronunciamento de Pedro Simon em 30/11/2000
Discurso durante a 165ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Presta homenagens pelo transcurso do centenário de nascimento do ex-Senador Milton Campos.
- Autor
- Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
- Nome completo: Pedro Jorge Simon
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- Presta homenagens pelo transcurso do centenário de nascimento do ex-Senador Milton Campos.
- Publicação
- Publicação no DSF de 01/12/2000 - Página 23481
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
-
- HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, MILTON CAMPOS, EX-DEPUTADO, EX GOVERNADOR, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), EX MINISTRO, EX SENADOR, ELOGIO, VIDA PUBLICA, DEFESA, DEMOCRACIA.
SENADO FEDERAL SF -
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| O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente do Senado, Exmº Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal, Srªs e Srs. Senadores, estamos aqui reunidos para celebrar a vida e a obra de Milton Soares Campos, um dos maiores políticos de Minas Gerais e do Brasil.
Destacar-se como político em Minas Gerais é, sem dúvida nenhuma, um grande feito, já que aquele Estado sempre foi, desde os primórdios da Nação, um celeiro de íntegros e habilidosos homens públicos. Mas a verdade é que muitos, se não todos, os mais ilustres integrantes da geração de Milton Campos - que deu ao Brasil homens como Pedro Aleixo, Afonso Arinos, Gustavo Capanema, Carlos Drummond de Andrade, Rodrigo Melo Franco, Edgar Mata Machado e Cyro dos Anjos - o reconhecem como o maior de todos eles.
Quando do falecimento de Milton Campos, em janeiro de 1972, disse o então Governador de Minas Gerais, Rondon Pacheco, sintetizando o sentimento de perda dos seus conterrâneos: “A Milton Campos poderia aplicar-se agora à sentença de Lincoln: Só depois que as grandes árvores tombam é que é possível medir-se a sua altura”.
Outro mineiro ilustre, Gustavo Capanema, famoso por seu trabalho fantástico em favor da educação e da cultura brasileiras, quando Ministro de Getúlio Vargas, escreveu: “Como era alta, como era perfeita a personalidade de Milton Campos! A história mostra a diversidade de figura dos grandes homens, especialmente dos grandes homens de governo. Uns se notabilizaram pela obra extraordinária, conquanto menor tivesse sido a sua personalidade. Em outros, ao contrário, a personalidade é que avulta, pela grandeza e exemplaridade, ao passo que a obra não pode alcançar o mesmo nível. Em Milton Campos esse contraste não existiu. Nele o equilíbrio era o dom por excelência. Tudo nele era equilibrado, a começar pela importância da obra em confronto com a elevação da personalidade”.
Um outro grande mineiro, aquele que é considerado por muitos o maior poeta brasileiro deste século, Carlos Drummond de Andrade, também não economizou adjetivos elogiosos ao publicar uma corajosa crônica sobre Milton Campos, em 1972, quando atravessávamos a fase mais aguda dos anos de chumbo.
O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) - Eminente Senador Pedro Simon, permita-me interromper V. Exª para convidar o Sr. Raul Machado Horta para fazer parte da Mesa. Muito obrigado.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Dizia Carlos Drummond de Andrade: “Milton Campos era bom demais para Presidente da República. As forças políticas, que também poderiam chamar-se fraquezas políticas, nunca pensaram a sério em levá-lo ao cargo de Presidente da República. Deram-lhe no máximo a possibilidade de ser Vice-Presidente. Duas vezes o obrigaram a disputar esse tipo de suplência (uma delas, interrompendo a única viagem de recreio à Europa que se permitira fazer), e duas vezes foi derrotado. Se alguém não ficou amargurado com as derrotas, foi ele mesmo. Nunca percebi em Milton Campos - e há 50 anos o conheço - o menor sinal de ambição política. Vocação política, sim, ela a possuiu em alto grau e apurado. A ausência de ambição, articulada com a marca da vocação, definiu toda a sua carreira”.
Mais incisivo ainda foi um grande Senador brasileiro, o admirável Nelson Carneiro, que disse: “Milton Campos foi o melhor de todos nós. Porque foi humilde quando poderia ser vaidoso. Porque foi compreensivo quando poderia ser arrogante. Porque foi simples quando poderia ser fátuo. Porque foi forte quando outros fraquejavam. Porque foi constante num mundo cheio de indecisões. Porque havendo conhecido o poder, não se embriagou de suas tentações, nem dele se tornou escravo. Porque havendo conhecido o ostracismo, não palmilhou os atalhos da transigência, nem dele guardou ressentimento”.
Por fim, quero aqui reproduzir um pequeno trecho de um artigo publicado no jornal O Globo, por Luiz Gonzaga do Nascimento e Silva. Ele inicia o seu texto dizendo que Milton Campos tinha predileção pelo fragmento do Eclesiástico que diz: “Bem- aventurado o rico que foi achado sem mancha e que não se deixou ir atrás do ouro, nem esperou no dinheiro, nem nos tesouros; que pôde transgredir a lei e não a transgrediu, fazer o mal e não o fez”.
E, mais adiante, Nascimento e Silva acrescenta de Milton Campos: “Como o homem do Eclesiástico, nunca foi atrás do ouro, fosse esse o ouro da fortuna ou do poder. Combinava desambição com vontade de servir - combinação rara que qualifica os seres verdadeiramente superiores. Político o foi por toda sua vida, porque político é verdadeiramente aquele que se liga aos interesses da pátria, aos interesses públicos antes dos seus próprios. Há políticos por vocação e políticos por profissão, como nos lembra Max Weber: vivem os primeiros para a política; os outros, da política. Milton Campos foi, entre nós, o protótipo do político por vocação. Nunca postulou ou pleiteou coisa alguma, mas nunca fugiu ao dever de servir, por mais árdua que lhe fosse a missão imposta. E nunca desertou à luta, fosse ela muito áspera ou muito longínquas as metas almejadas. Assim, quase sem o querer, foi Governador do seu Estado; assim foi Ministro da Justiça do primeiro governo da Revolução, para recordarmos apenas dois momentos culminantes de sua longa vida de servir”.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, essas palavras, pronunciadas por homens tão díspares, mas todos eles merecedores do reconhecimento nacional, dão uma boa idéia do que foi Milton Campos e do que ele representou para o Brasil conturbado dos anos em que viveu. Nascido em Ponte Nova, em 16 de agosto de 1900, Milton Campos era filho do então Juiz municipal Francisco de Castro Rodrigues Campos e de D. Regina Soares Campos. Depois de atuar como Juiz em várias outras comarcas do interior, o pai de Milton Campos chegou a Belo Horizonte em 1912, onde seria, sucessivamente, Secretário de Finanças do Estado, Procurador-Geral do Estado e, por fim, Desembargador do Tribunal de Apelação. Do pai, magistrado íntegro, Milton Campos herdou a vocação jurídica.
Formado em 1922 pela Faculdade de Direito de Belo Horizonte, foi o orador de sua turma. Indicado Promotor de Justiça na cidade paulista de Mococa, Milton Campos acabou não assumindo o posto, em protesto por não ter sido recebido em audiência marcada com o Secretário de Justiça daquele Estado, quando pretendia agradecer a nomeação.(*) Foi agradecer a nomeação, e o Secretário não o recebeu; ele renunciou, não a aceitou, foi embora. (*)Voltou para seu Estado e, por indicação do pai, foi advogar na cidade Dores da Boa Esperança, onde permaneceu até 1924.
Naquele ano, ingressou no escritório de advocacia de Abílio Machado, onde já atuava Pedro Aleixo. Em 1925, a convite de Assis Chateaubriand, começou a colaborar em O Jornal. Os artigos que publicava mostravam, já no jovem articulista, o equilíbrio, a sensatez e a ponderação que marcariam toda a sua vida. Seu texto era leve, mas profundo e denso, demonstrando uma sólida cultura humanística.
Em 1931, Milton Campos foi convidado por Gustavo Capanema, então Secretário do Interior, para ser Advogado-Geral do Estado. Aceitou a nomeação, porque desejava reformar integralmente a Justiça mineira. Deixou o cargo depois de dois anos e meio e de uma magnífica gestão.
Em 1934, Milton Campos voltou a um cargo público, indicado membro do Conselho Consultivo do Estado, organismo criado pelo Governo Provisório para substituir as instituições parlamentares destruídas pelo Movimento de 1930. Na ocasião, Milton Campos disse que aceitava o desafio, porque ao Conselho competia colaboração, mas também “permanente vigilância” sobre os atos do Governo do Estado.
Eleito Deputado da Assembléia Constituinte estadual, exerceu seu mandato de 1935 a 1937. Atuou como Relator da Comissão Constitucional e foi líder da maioria. Com a dissolução dos organismos legislativos pelo Estado Novo, em dezembro de 1937, Milton Campos volta à advocacia. Atuou como advogado da Caixa Econômica Federal até 1944, quando foi exonerado por ter assinado o Manifesto dos Mineiros.
Em 1945, voltou à vida pública, de novo, como Advogado-Geral do Estado. Naquele mesmo ano, foi eleito Deputado da Assembléia Nacional Constituinte pela UDN. Como havia ocorrido em seu Estado, onze anos antes, trabalhou na Comissão Constitucional como sub-relator. Dois anos depois, em 1947, foi eleito Governador de Minas Gerais e, no exercício desse mandato, realizou uma das maiores administrações da história daquele Estado. Concentrou suas ações na melhoria da infra-estrutura, estradas e energia, para que Minas Gerais pudesse desenvolver sua economia. Investiu na agricultura, criando centros de pesquisa; desenvolveu uma política tributária preocupada em aumentar a capacidade investidora do Estado, mas sem sufocar as classes produtoras. No seu governo, predominou o liberalismo clássico, é verdade: os impostos deveriam ser mínimos, mas os serviços de cobrança e fiscalização deveriam ser eficazes.
A eleição de Milton Campos para o governo mineiro foi muito difícil, porque resultou de um acordo entre forças contrárias. Indicado pelo seu Partido, a UDN, aceitou a indicação apenas para defender os objetivos da renovação política, já que duvidava da vitória. Ele, Campos, sabia que o favorito era o PSD, herdeiro da estrutura de controle da participação política nos Municípios, montada durante o Estado Novo.
Em 1954, foi eleito Deputado Federal; depois, em 1958 e em 1966, Senador da República, falecendo no exercício do mandato. Em 1956 e em 1960, concorreu à Vice-Presidência da República e, nas duas vezes, foi derrotado por João Goulart.
Em 1964, instalado o Regime Militar, Milton Campos foi chamado pelo Presidente Castello Branco para assumir o Ministério da Justiça, a fim de “dar à Revolução o seu ordenamento jurídico”. Sua atuação naquela pasta foi pródiga na produção de códigos essenciais para a eficiente regulamentação do Poder Judiciário, com o devido resguardo dos direitos do homem e do cidadão. Entre esses documentos, destacam-se a Lei do Condomínio e Incorporações, a Lei de Ação Popular e a Lei da Estruturação da Justiça Federal de Primeira Instância.
No que se refere ao sistema político, cuidou da Lei Orgânica dos Partidos, da Lei do Domicílio Eleitoral e do Código Eleitoral.
Sua passagem pelo Ministério da Justiça corresponde ao período de vigência do Ato Institucional nº 1, que, segundo queriam os líderes do movimento militar, deveria ser o único instrumento de arbítrio, com duração limitada, para regular o período de exceção que se seguiu à derrubada de João Goulart. Milton Campos pediu exoneração em 1º de outubro de 1965, quando julgava cumprida sua missão. Não quis assinar o Ato Institucional nº 2, porque achava que o Movimento de 64 sairia de seus propósitos e atingiria outros objetivos que não eram os seus. Renunciou e não assinou o AI-2, de cuja elaboração, diga-se de passagem, também se negou a participar.
Em duas oportunidades, a seguir, o Presidente Castello Branco ofereceu-lhe uma cadeira do Supremo Tribunal Federal. Mas em ambas Milton Campos não aceitou o convite. Na primeira vez, recusou-se, porque, enquanto era Ministro da Justiça, o número de Ministros do Supremo havia sido aumentado. Na ocasião, ele havia discordado dessa decisão de governo, mas não conseguiu sustá-la. Poderia parecer que ele se beneficiaria de uma decisão do Governo que havia integrado, e isso seria algo insuportável para um homem de sua estrutura moral. No segundo convite, escusou-se, alegando que estava com uma idade muito avançada e que logo se aposentaria. Não aceitou ser Ministro do Supremo por um ou dois anos e aposentar-se depois; negou também, assim era sua personalidade.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em poucas palavras eis o que gostaria de dizer de Milton Campos. É importante homenagearmos um homem de sua grandeza e integridade, em um momento como este em que a vida pública brasileira vive uma etapa ruim, com a eclosão freqüente de denúncias e escândalos envolvendo a coisa pública. É importante elogiar um homem como Milton Campos.
Presto o meu testemunho, Sr. Presidente. Falei, desta tribuna, há dez dias e repito, porque o episódio envolve Milton Campos.
No auge do Movimento de 64, quando foi publicado o Ato Institucional que não tinha número - era para ser o único -, lá no Rio Grande do Sul, levas de edições do Diário Oficiai, inclusive edições extraordinárias, pura e simplesmente publicaram demissão de funcionários - funcionários da Brigada Militar, professores, etc.
Viemos a Brasília, Deputado Siegfried Heuser, Deputado Aldo Fagundes e eu. Chegando aqui, o que poderíamos fazer? O País estava naquela perplexidade - susto, dúvida, interrogação. Procuramos um homem, adversário, mas que sabíamos leal: o deputado gaúcho Britto Velho. Contamos a Britto Velho o absurdo que estava acontecendo: pessoas idôneas, só por serem do PTB ou porque o Sr. Meneghetti não gosta delas, estavam sendo demitidas às centenas. Britto Velho, com seu estilo conhecido por todos aqui, rebelou-se, disse palavrões, bateu na mesa e, na hora mesmo, levantou-se e telefonou para Milton Campos. Milton Campos marcou logo uma audiência. Cerca de 10 minutos depois do telefonema, estávamos no Ministério da Justiça Brito Velho, Siegfried Heuser, Aldo Fagundes e eu. Chegamos lá, e ele nos recebeu.
Relatado o fato, Milton Campos ficou profundamente irritado, e disse: “Isso é um absurdo. A Revolução não foi feita para isso, mas para moralizar, dignificar e colocar as coisas nos seus devidos lugares. É natural que, pelo movimento que foi feito, tenhamos uma fórmula, por meio da qual, fora até do Judiciário, punamos pessoas que sabemos devam ser punidas. É necessário, porém, o legítimo direito de defesa. Isso é um absurdo, e vamos encontrar solução”.
Quando saímos dali, Britto Velho ainda nos disse: “Ele vai fazer alguma coisa. Só não sei se ele vai ter força, mas vai fazer.”
Estávamos no Hotel Nacional, à noite, quando ouvimos na Voz do Brasil que o Governo baixara um ato complementar, determinando que todas as cassações e demissões feitas estavam anuladas e que era necessário publicar no Diário Oficial o nome do cidadão e as acusações que havia contra ele, concedendo-se um prazo para defesa. Ele podia constituir o seu advogado, fazer a sua defesa e havia um tribunal especial ou uma comissão - não me recordo bem qual - que fazia o julgamento.
Claro que isso estava muito longe da democracia e da defesa no Poder Judiciário, mas ficou muito melhor do que antes. Isso mudou completamente a situação. Anularam-se todas as demissões e, a partir do momento em que se fez necessário designar o nome do acusado, a acusação, e concedendo-se a ele o direito de defesa, alterou-se totalmente a situação. E as milhares de demissões previstas reduziram-se a algumas e muito poucas - justiça seja feita.
Esse era Milton Campos. E esse é o testemunho que eu presto.
Presto o testemunho do lado de cá. Nós, do antigo PTB, tínhamos na UDN os nossos maiores adversários. Tínhamos e temos da UDN, olhando para trás, uma história de mágoas e ressentimentos. Afinal, lá estava a UDN, em 1954, com o Sr. Lacerda na frente, pregando o golpe que derrubou o Dr. Getúlio Vargas. Está provado que o Dr. Getúlio Vargas não tinha absolutamente nada a ver com o atentado da Rua Toneleros. Conforme ele mesmo disse, quem deu o tiro que acertou no Lacerda, acertou nele, Getúlio Vargas. E ficou provada, depois, a integridade e a seriedade do Dr. Getúlio Vargas.
Quanto ao Movimento de 1964, achamos que ali também houve um movimento de derrubada de governo, e que poderia ser feito de uma maneira absolutamente normal, dentro da democracia.
Reconheço hoje que não votei em Milton Campos. Aliás, o Sr. Jânio Quadros, diabolicamente, apresentou duas candidaturas, a de Milton Campos e a de Fernando Ferrari. Ferrari teve uma vitória espetacular: ganhou de João Goulart no Rio Grande do Sul. No entanto, os votos que, no Rio Grande do Sul, iriam para Milton Campos terminaram todos indo para Ferrari. E a presença de Ferrari, instigado por Jânio Quadros, determinou a vitória de João Goulart. Ganhou João Goulart e perdeu Lott e ganhou Jango exatamente pelo movimento feito com dois candidatos à Vice-Presidência da República: um, Milton Campos, dentro da sua dignidade, dentro da sua correção; e o outro, Fernando Ferrari, correndo por fora.
Reconheço aqui o que foi dito nessa tribuna. Embora do Partido Trabalhista, eu acho que, se Milton Campos fosse Vice-Presidente da República Jânio Quadros não teria renunciado. Com toda a sinceridade, acredito que a sua loucura não chegaria a tanto, ele não teria renunciado. Também reconheço que não teríamos o Movimento de 1964, porque Milton Campos haveria de levar o seu governo até o final e, com a sua dignidade, o seu caráter e a sua seriedade, haveria de colocar as coisas nos seus devidos lugares.
O Brasil tinha tido o governo fantástico de Juscelino Kubitschek, com a revolução que fez - cinqüenta anos em cinco. Milton Campos colocaria a casa em ordem, recolocaria as coisas nos seus devidos lugares, seria o Presidente exato para aquela hora. Lamentavelmente, isso não aconteceu.
Não podemos deixar de reconhecer que é difícil encontrar uma pessoa como Milton Campos. Com toda a sinceridade, na História do Brasil, ele é uma das pessoas que mais aprendi a admirar e respeitar. Não discuto as suas idéias; era um homem liberal; sou um homem de idéias progressistas. Na verdade, ele era um homem de uma integridade, de uma seriedade, de uma dignidade e de uma correção!
No Brasil de hoje faltam referências. Para quem vamos nos dirigir? Para onde vamos olhar? Quem nos vai orientar? Quem pode indicar o norte de caminho? Sentimos a falta de uma pessoa como Milton Campos.
Milton Campos foi isso. Milton Campos foi Governador e Ministro. Teve que renunciar? Sim. Ele gostaria de ir para o Supremo, mas deixou de ir para aquela Casa porque quando aumentaram as vagas para o Supremo ele estava no Governo. Milton Campos não aceitou. Iria para o Supremo no final da vida, por pouco tempo, só para dizer que havia sido Ministro do Supremo? Não, não aceitou.
De certa forma, Milton Campos poderia ter feito política dentro de um pragmatismo, pensando: se não posso fazer o ideal, vou fazer o bom. Vou tentar fazer alguma coisa. Ele poderia ter ficado no Ministério da Justiça em 1965; poderia ter ficado ali com o AI-2, dizendo que ficaria porque iria tentar ajudar. E Castello Branco lhe pediu, quase que por misericórdia, que Milton Campos ficasse no Governo, porque precisava dele. Muitas pessoas foram a Milton e pediram que permanecesse, que seria muito ruim a sua saída, que a presença dele ali, apesar do AI-2, seria muito importante. Daria consistência e credibilidade.
Volto a repetir, pragmaticamente, ele poderia dizer: vou mudar a minha maneira de ser, para permanecer no cargo, mas não vou mudar no sentido pessoal, de vantagem pessoal. Vou fazer isso pelo bem do meu País. Não, não aconteceu assim. Milton Campos não era assim! Não!
Ele deve ter dito: “Eu saio. O Ato Institucional era único e não era para ser o primeiro. Era único. Houve uma eleição - e uma eleição democrática -, não vejo nada demais em que tenha ganho no Rio de Janeiro o senhor fulano de tal, ou lá em Minas Gerais o senhor fulano de tal. São homens tranqüilos, serenos. É verdade que a UDN perdeu; ganhou o PSD. Mas, e daí? Qual é o problema? Daí a inventar-se um AI-2, para se prorrogar isso até o final da posse do Sr. Castelo Branco? Não, isso não me serve”. E caiu fora.
Esse é o Milton Campos! Quantas pessoas na história do Brasil adotam essa postura, possuem esse temperamento, essa personalidade?
Por isso estou aqui. Não sou da UDN, sou do velho PTB. Essa equipe de homens notáveis da banda de música da UDN, que desempenhou papéis importantes, da maior credibilidade, cometeu equívocos, com todo o respeito. Equivocaram-se no momento em que foram bater às portas dos quartéis em vez de ficarem na firmeza da democracia. Em 1954 e em 1964, quando apelaram para o lado contrário em vez de seguirem o caminho da retidão da democracia, equivocaram-se.
Podemos divergir. Não estou dizendo que sou o dono da verdade. Estou apenas estou formulando, com muita humildade, um pensamento. Mas penso dessa forma, com relação a Milton Campos: este é um homem nota 10. Milton Campos é uma pessoa - não tenho nenhuma dúvida - que qualquer um pode ter inveja de não ter sido. Dele, com todo o respeito, pode-se dizer: este foi um grande homem.
Foi dito aqui - e é verdade - que ele não foi o maior orador de sua época, que até não era um grande orador. Expunha bem o conteúdo de suas idéias, mas não falava apaixonadamente como Baleeiro ou como Lacerda. Era um grande jurista, mas não especializado, não era obstinado como Baleeiro. Isso é verdade. Era um grande político, mas não era um fanático como Lacerda. Era tranqüilo e sereno. É difícil encontrar alguém com todas essas qualidades. É muito difícil. É muito difícil na história contemporânea do Brasil encontrarmos alguém como Milton Campos na hora da vitória e na hora da derrota, na hora em que ele tinha o poder e na hora em que abriu mão do poder. Tenho o maior respeito por ele.
Neste momento em que estamos vivendo, olhamos para os lados e nos perguntamos: quem são as nossas referências? A quem vamos nos dirigir? A que homem público? Qual escritor? Qual intelectual? Qual homem da Igreja? Aqui está uma referência permanente para a nossa história e para o nosso futuro: Milton Campos.
É com muita emoção, Sr. Presidente, que trago a minha saudação e o meu carinho à figura de um adversário, mas à figura de um homem notável da vida pública brasileira: a figura de Milton Campos.
Muito obrigado.
(Palmas)
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