Pronunciamento de Carlos Wilson em 16/08/2001
Discurso durante a 94ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
ANALISE DOS DADOS DO IBGE SOBRE O TRABALHO INFANTIL NO BRASIL.
- Autor
- Carlos Wilson (PPS - CIDADANIA/PE)
- Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA SOCIAL.:
- ANALISE DOS DADOS DO IBGE SOBRE O TRABALHO INFANTIL NO BRASIL.
- Publicação
- Publicação no DSF de 17/08/2001 - Página 17300
- Assunto
- Outros > POLITICA SOCIAL.
- Indexação
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- ANALISE, DADOS, PESQUISA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), DEMONSTRAÇÃO, AUMENTO, INDICE, TRABALHO, CRIANÇA, ADOLESCENTE.
- COMENTARIO, INEFICACIA, ATUAÇÃO, GOVERNO, COMBATE, EXPLORAÇÃO, TRABALHO, INFANCIA, ADOLESCENCIA.
O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que me traz a tribuna desta feita é um assunto que, definitivamente, não engrandece a Nação e envergonha o Estado: o trabalho infantil, uma grave ferida no nosso orgulho.
Recentemente tornou-se público pela imprensa o resultado de uma pesquisa do Ipec. E constatou-se que 364 mil meninas entre 10 e 16 anos são exploradas no trabalho de empregadas domésticas, sem qualquer direito trabalhista, com jornadas de trabalho semelhantes aos adultos, sem qualquer condição de freqüentarem a escola, ou de modificarem a realidade que se lhes impõem.
Esse número, 364 mil meninas, representa 8% do total de 4,48 milhões de trabalhadores no setor, segundo dados do IBGE tabulados em 1998.
Um dos aspectos mais graves, se é que pode haver gradação na exploração do trabalho infantil, é que esta condição ainda é camuflada por uma pretensa relação de parentesco dos patrões, normalmente tios ou padrinhos, entre outros. Até parece aquele cenário dramático da Inglaterra vitoriana, tão bem descrito por Charles Dickens.
A Constituição no Brasil proíbe o trabalho infantil. Entretanto, uma em cada 10 crianças de 10 a 14 anos trabalha. Trata-se de uma das três maiores taxas da América Latina, comparável ao que ocorre na Guatemala e em Honduras.
Entre outros dados revelados pela pesquisa do Ipec, destaco que das meninas exploradas para o trabalho doméstico, 98.249 estão na região Sudeste e 83.570 estão no Nordeste. Nada menos do que 32,8% destas meninas não freqüentam a escola; 78,4% trabalham na cidade e o restante em áreas rurais.
Alguém já disse que um governo que não cuida de suas crianças não tem razão de ser. E no Brasil nada menos do que 2,5 milhões de crianças trabalham, na maioria das vezes exploradas, em condições subumanas, em fornos de carvoaria ou plantações de sisal. Isso para não se falar nas 402 mil crianças de cinco a nove anos.
São números tremendos.
O governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso pode computar uma tímida ação nesta área. A proporção de crianças entre 10 e 14 anos que trabalham decresceu no período de 1992 a 1997. Entre 1997 e 1999 a ação do governo cessou. Estados como Tocantins, Maranhão, Piauí, Ceará, Pernambuco, Bahia, Paraná, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso tiveram aumento do contingente de crianças trabalhadoras. Minas Gerais e Rio Grande do Sul tiveram redução insignificante em seus índices.
Os dados são do IBGE, publicados este ano e se referem a um levantamento feito entre os anos de 1998 e 2000.
Continuo, Sr. Presidente. Também é verdade que o governo federal conseguiu reduzir os índices de adolescentes trabalhadores, meninos entre 15 e 17 anos. Mas, também, por alguma razão inexplicável, parou com seus programas e entre 1997 e 1999, os números recrudesceram em Tocantins, Ceará, Bahia, Santa Catarina, Mato Grosso e Distrito Federal.
No meu Estado, Pernambuco, os dados do IBGE , revelam que se houve uma expressiva redução percentual da taxa de atividade de crianças e adolescentes entre 1992 e 1997, passando de 30,1% para 19,9% entre crianças de 10 a 14 anos. E de 51,7% para 44,3% entre adolescentes de 15 a 17 anos. Registra-se um recrudescimento sério em 1999, quando a taxa sobe para 22,1% das crianças e praticamente estagna em 43,3% entre os adolescentes.
A verdade é que na metade dos estados brasileiros verificou-se ou o aumento da população adolescente ocupando postos de trabalho ou a diminuição inexpressiva destes índices.
Iniciativas do governo federal como o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e o Programa de Garantia de Renda Mínima mostraram a importância do Poder Público como instrumento para diminuir a pobreza e retirar crianças e adolescentes dos postos de trabalho e recolocá-los no lugar onde devem estar, na escola.
Srs. Senadores, não se trata de utopia. Trata-se de uma realidade, um círculo vicioso que marca a civilização brasileira. Crianças e adolescentes que fogem da escola, por uma ou outra razão, são empregados com baixa escolaridade e recebem baixos salários; ao se tornarem adultos, continuam recebendo salários insignificantes e se perpetuarão na pobreza.
Não são raros os casos em que crianças ou adolescentes trabalham sem remuneração, apenas complementando o trabalho do pai assalariado. Um exemplo claro ocorre na cultura de cana de açúcar na região Norte Fluminense. Na maioria dos casos, a própria criança funciona como assalariado e compõem a renda da família, como se verifica no caso das carvoarias, ou na produção de frutas na região irrigada do Vale do rio São Francisco.
Para se ter uma idéia de como esta prática de se colocar crianças e adolescentes torna-se cada vez mais arraigada nos hábitos e costumes brasileiros, mais de 20% dos trabalhadores que trabalham na produção de calçados no vale do Rio dos Sinos, no Rio Grande do Sul possuem menos de 17 anos de idade.
O governo Fernando Henrique Cardoso certamente diagnosticou o problema. Chegou mesmo a tratar da ferida, ainda que timidamente. Mas, apenas para usar um refrão popular, parou por que? Por que parou?
A verdade é que a situação de crianças e adolescentes ocupando postos de trabalho e ausentes das bancas escolares não sofreu mudanças de maior importância, desde o início dos anos 90.
Desde tempos imemoriais, setores arcaicos ou modernos da produção industrial ou agrícola, utilizam-se do trabalhador infanto-juvenil como forma de diminuir os custos da produção. Empresários sem escrúpulos, descendentes dos antigos fazendeiros que exploravam o trabalho escravo no Brasil, continuam impunemente a explorar a infância e a adolescência. E, infelizmente, não há que se esperar uma ação política mais efetiva e mais decidida deste governo. Até porque não consegue mais responder aos desafios para os quais foi eleito.
Era o que tinha a dizer.