Discurso durante a 35ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise sobre o contra-senso entre o Brasil rico e o Brasil pobre.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • Análise sobre o contra-senso entre o Brasil rico e o Brasil pobre.
Publicação
Publicação no DSF de 27/03/2007 - Página 6664
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • ANALISE, DESIGUALDADE SOCIAL, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, POPULAÇÃO, MUNDO, GLOBALIZAÇÃO, PREJUIZO, SOBERANIA, PATRIOTISMO, LIDERANÇA, ORGANISMO INTERNACIONAL, UNIÃO, CLASSE SOCIAL, RIQUEZAS, VALORIZAÇÃO, MERCADO, INCENTIVO, CONSUMO, EXCLUSÃO, POPULAÇÃO CARENTE, FALTA, ACESSO, PRODUTO, SITUAÇÃO, FOME, MISERIA, EXISTENCIA, MURO, DIVISÃO, AMBITO NACIONAL, AMBITO INTERNACIONAL, CRIAÇÃO, ALTERNATIVA, ESTADO, BUSCA, SEGURANÇA PUBLICA, CRESCIMENTO, PODER, CRIME ORGANIZADO, GRAVIDADE, SEPARAÇÃO, CIDADÃO, PROCESSO, DISCRIMINAÇÃO.
  • NECESSIDADE, ESTADO, RECUPERAÇÃO, VALOR, ETICA, MORAL, RESTABELECIMENTO, RELACIONAMENTO, AMIZADE, RELIGIÃO, TRABALHO, SOLIDARIEDADE, SOCIEDADE, INCENTIVO, AMPLIAÇÃO, ATIVIDADE, COMUNIDADE, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL.
  • DEFESA, GLOBALIZAÇÃO, PROMOÇÃO, INCLUSÃO, SOCIEDADE, GARANTIA, DIREITOS, CIDADANIA, DEMOCRACIA, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, VALORIZAÇÃO, SOBERANIA NACIONAL, CULTURA, HISTORIA, GEOGRAFIA, GRUPO ETNICO.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é muito comum, em discursos e em artigos publicados na imprensa, a tese de que existem dois Brasis: um, desenvolvido e rico; outro, subdesenvolvido e pobre. Criou-se inclusive uma expressão, Belíndia, um país com as mais belas características da Bélgica e outro com as mais tristes mazelas da camada mais pobre da população da Índia. Poderia ser uma parte França, outra Benim. Ou, uma parte Alemanha, outra Zâmbia. Ou, ainda, uma parte Inglaterra, outra Namíbia.

            Essas divisões são comuns em termos mundiais. É o caso, por exemplo, da apartheid, na África do Sul, motivada principalmente por conflitos raciais. Um pequeno grupo, branco e rico, e outra grande parcela da população, negra e pobre. Embora não se refira, com tanto vigor, à apartheid, ainda persiste na África do Sul algo parecido com a nossa Belíndia. Mais que isso: mesmo nos países desenvolvidos, com ares de Bélgica, todos têm o seu lado Índia, com grupos de população pobre, principalmente nas periferias das grandes cidades. É assim com a França, a Alemanha, a Inglaterra e tantos outros. Mesmo nos Estados Unidos, país considerado o mais rico do mundo, não há como negar a existência de uma apartheid social. Lá também existe.

            De repente, a gente se dá conta de que o mundo é uma imensa Belíndia. E que é dessa mesma tese que se pode extrair verdadeiramente a tão propalada idéia da globalização. É o planeta que se divide em grupos sociais, de acordo com as condições econômicas, independentemente de onde se localizem as populações. Há um traço de união, muito mais forte hoje, entre integrantes desses mesmos grupos, independente de onde se localizem.

            Há um grande país em escala mundial, a parte Bélgica, que pode ser chamada “Mercado”. Ele tem leis próprias, as leis do mercado. Ele tem, além de moedas localizadas, uma outra, mais forte, talvez duas: o dólar e o euro. Tem línguas igualmente locais, mas uma língua oficial quase obrigatória: o inglês. Tem um povo, mas não tem um território delimitado e contíguo. São enclaves, em territórios que mudam de nome, em função de pseudo-soberanias. Assim, o “Mercado”, na Bélgica, tem características semelhantes ao que se encontra na França, na Inglaterra ou na Alemanha. Mas, esse mesmo “Mercado” possui também “ilhas”, igualmente no Brasil, em Benin, em Zâmbia ou na Namíbia. Esse “Mercado” tem uma capital, os Estados Unidos, de onde emanam as principais decisões, e onde se localizam seus grandes exércitos, em defesa de suas leis. Tudo o que acontece nessa imensa capital repercute imediatamente nos outros enclaves ou nas outras “ilhas”.

            Tudo gira em torno das decisões do “Mercado”. Há um apelo constante no sentido do consumo. Programas de televisão e de rádio, jornais, revistas. A demanda por bens e serviços identifica o status das populações locais. Esse mercado também tem, portanto, uma religião: é o consumismo.

            Ai de quem se colocar fora desse “país-mercado”, quem não aderir a essa “religião”: são obrigados a sobreviver, muitas vezes, de sobras e migalhas, no chamado “lado escuro do mundo”. São verdadeiros “pesos mortos”, enquanto não migram para as “civilizações avançadas”, que consomem bens e serviços, que obedecem à lei que rege a oferta e a procura. A constituição desse imenso país que se espalha por todos os continentes, é a globalização, cujo ditame único é a internacionalização.

            É, assim, portanto, o mundo globalizado de hoje: uma parcela incluída, uma outra excluída, com características semelhantes, independentemente de onde estejam localizadas. O traço comum da parcela incluída é, portanto, o consumismo; enquanto o da parcela excluída é a fome e a miséria. O laptop do brasileiro, ou do namibiano é semelhante, quase sempre da mesma marca do utilizado pelo americano, pelo inglês, ou pelo francês. A fome é também igual em qualquer um desses mesmos países. O que distingue esse ou aquele grupo, portanto, é a inclusão, ou não, no acesso a mercadorias e serviços. A exclusão social não é uma característica de um país em particular. Há uma escala mundial no mundo dos excluídos.

            Essa exclusão, em escala internacional, cria um tipo ainda mais doloroso de exclusão local. É que população incluída construiu verdadeiros muros, a separá-la de seus semelhantes excluídos. Muros reais e virtuais. Reais, como o que separa os Estados Unidos do México. Ou como o que tenta impedir os palestinos de terem o seu próprio território. Ou o que se quer construir na fronteira do Brasil com o Paraguai. Ou, quem sabe, o que se imaginou erguer para isolar a maior favela do Rio de Janeiro da orla de suas praias mais famosas. Quem negaria que é esse o mesmo propósito de instalação dos condomínios nas grandes cidades? Fecham-nos de muros altos, longe do alcance, nem mesmo da visão de quem está fora. Criam-se novas ilhas de sossego e de segurança. Instituem-se governos paralelos. Criam-se leis próprias. Um Estado paralelo, à revelia do Estado legal. Tudo em nome da segurança. Tudo em razão da presença, cada vez mais precária, do Estado legal.

            Essa substituição do Estado legal por um paralelo, local, de interesses de grupos, não é exclusividade da população incluída. A sua ausência cria, também, governos paralelos nas localidades e entre as populações mais pobres. No caso, com características mais preocupantes, porque a maior fragilidade dessas populações incentiva o poder do narcotráfico, da milícia ilegal e de outros grupos igualmente sub-reptícios.

            Há, ainda, outros muros disfarçados em vidros de automóveis, em grades, em circuitos internos de segurança, verdadeiros “big brothers” do dia-a-dia, onde se confinam grupos de vizinhança nos prédios, de estudantes nas escolas, ou de trabalhadores, nos locais de trabalho. Igualmente, em nome da segurança.

            Mas o muro mais vergonhoso é o virtual. É o que separa corações e mentes. Chama-se isso de racismo, de discriminação, de segregação ou de outro nome qualquer. Por exemplo, é o que manda prender o pobre e o negro por delitos menores, enquanto inocenta o rico, muitas vezes o elege, embora com flagrantes de grandes falcatruas. É o que vê no excluído um ser menor, muitas vezes desprezível. É a apartheid social, aqui ou em qualquer outro lugar do planeta.

            Enfim, meus irmãos, há uma grande divisão, hoje, entre dois grandes grupos sociais: de um lado, quem ultrapassou as divisas do mundo do mercado; de outro, quem ficou fora desses muros.

            É aí que reside, nos dias atuais, o maior problema do planeta, gerador de diferentes tipos de conflitos: os valores do mercado nem sempre se regem pelo pudor. Ao contrário, eles se fundamentam pela competição. E, como se sabe, competir é sinônimo de disputar, ou rivalizar. O homem criou, portanto, com a globalização, um mundo de competição, de disputa, de rivalização.

            A globalização deu origem a uma espécie de gladiador dos novos tempos. As arenas modernas são os vestibulares, o mercado de trabalho, o mundo digital, a concorrência comercial, os concursos com todos os tipos e características: pela vaga na escola, pelo emprego, pela beleza e tantos ouros. Pior: pela vaga no hospital, pelo remédio, pela vida enfim!

            Esse mundo de competição gerou novos conhecimentos, tecnologias de ponta e, não há como negar, melhorou a qualidade de vida para a parte “incluída”: carros, redes de comunicação, computadores de última geração. Mas não se pode negar que, por outro lado, destruiu valores fundamentais do comportamento humano, gerou privilégios. E privilégio, segundo os melhores dicionários, é uma “vantagem que se concede a alguém com exclusão de outrem e contra o direito comum”. Incentiva o ter no lugar do ser. Exclui. Gera fome e miséria. Mata e fere.

            Esse mesmo mundo de exclusão incentivou o individualismo, no lugar do coletivo; o consumismo, no lugar dos valores interiores; a esperteza, no lugar da ética. O “mundo dos espertos” tomou o lugar da seriedade, da honestidade, da ética e dos então chamados “bons costumes”. Há, sempre, que se “levar vantagem” em tudo, mesmo que em detrimento dos mais nobres sentimentos dos nossos semelhantes. A falta de pudor criou um vácuo, no qual se sepultou a solidariedade.

            O homem passou a ser “um na multidão”. Muitas vezes, coberto por sentimentos paranóicos, de que há alguém a persegui-lo. Tudo isso porque as oportunidades de sobrevivência lhe são competitivas: é ele, no lugar de alguém, para não ser alguém no lugar dele. Repito: tudo isso porque as oportunidades de sobrevivência lhe são competitivas: é ele, no lugar de alguém, para não ser alguém no lugar dele. Sai de cena a figura do semelhante e dá lugar à imagem do concorrente. O resultado de tudo isso é o que já se chamou de esgarçamento do tecido social, cujas previsões sombrias dão conta de um verdadeiro caos social.

            Não importa se esse mesmo homem mora no Brasil, na Alemanha, na Inglaterra ou na França. Ou na Bélgica, ou na Índia. Ou mesmo em Benin, em Zâmbia ou na Namíbia. Ele sempre será uma espécie de contemporâneo e conterrâneo de alguém que também reside em qualquer desses países, desde que se submeta igualmente às leis de mercado. Ele terá dificuldades, por exemplo, de manter seu “passaporte”, se não falar inglês, ou se não conhecer minimamente a linguagem digital, se não navegar pela Internet, se não acompanhar a cotação do dólar, se não se vestir segundo a moda ditada pela televisão, se não estiver de acordo com as tendências do mercado. Quem sabe, se não conhecer ainda Nova York. Existe aí, portanto, uma contradição: ele tem de parecer igual a todos os incluídos, ao mesmo tempo em que tem de se mostrar, na competição do dia-a-dia, diferente, sempre melhor, com “cara” de empreendedor, sob pena de ser também mais um excluído. Tem de estar conectado no mundo, mas vive sozinho entre quatro paredes. O seu padrão social é ditado pela TV e, principalmente, pela Internet. Ele é um ermitão, conectado com a multidão.

            Esse “país-mercado” invadiu todos os demais numa guerra virtual. Quando se tenta impedir essa mesma invasão virtual, os senhores do poder apelam para a guerra real, para as invasões com mísseis de última geração. Defendem seus interesses disfarçados em falsos discursos, “em nome da democracia” e, sem medo do pecado, “em nome de Deus”. Invasão virtual, mortes veladas ou guerra real igualmente deixam vítimas. Na invasão virtual, mortes veladas, escamoteadas nas estatísticas da fome e da miséria. Na invasão real, mortes reveladas para demonstrar o poderio dos mandantes. Em ambos os casos, mudam-se as formas, mas são os mesmos os objetivos: o poder e a ganância, mesmo que tomando santos nomes em vão. Fala-se em democracia para ter o petróleo e o poder; fala-se em Deus para garantir o mercado e a ganância.

            Uma das maiores vítimas desta globalização é a soberania. Cai por terra o civismo, o patriotismo que se aprende na escola. A globalização não leva em conta a idéia de nação, pátria, país. Não há fronteiras para o mercado globalizado. Desmontam-se e demonizam-se estados-nações, derrubam-se governos, atacam-se moedas, desrespeitam-se símbolos nacionais. Privatização, endividamento, sucateamento de exércitos nacionais, desmoralização da representação política local, imposição de costumes alienígenas, usurpação de conhecimentos, tudo isso fundamenta as bases para ataques virtuais ou reais à soberania das nações. E para subtrair a “riqueza das nações”.

            Esses fundamentos da globalização não se construíram como um passe de mágica. Ao contrário, eles se desenvolveram nos organismos financeiros internacionais, nas universidades do mundo desenvolvido e nos principais gabinetes do poder.

            Quem não se lembra das missões internacionais do Fundo Monetário Internacional? Do Banco Mundial e do BID, com suas “pastas pretas” recheadas de cobranças e de receituários para países e para as nações pobres...

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Senador Mão Santa, há orador na tribuna.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - ...que são verdadeiras cartilhas. Repito, Sr. Presidente: quem não se lembra das missões internacionais do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial e do BID, com suas “pastas pretas” recheadas de cobranças e de receituários para países e populações pobres, verdadeiras cartilhas políticas para os governantes locais? Quem não se lembra da grande discussão sobre o chamado “pensamento único”, uma espécie de lavagem cerebral nas melhores cabeças de todo o planeta, por meio de teorias que, posteriormente, seriam colocadas em prática, não importa o nome e a localização do país? Quem não se lembra dos famosos “consensos”, como os de Washington, com sua pregação...

(Interrupção do som.)

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Já encerro, Sr. Presidente.

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Senador Pedro Simon, quero dizer que sempre que V. Exª assoma à tribuna tem o respeito da Mesa em lhe conceder o tempo de que V. Exª necessitar. V. Exª precisa de quantos minutos?

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB -RS) - Sr. Presidente, são mais quatro laudas.

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Então, concedo a V. Exª mais dez minutos.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Muito obrigado, Sr. Presidente.Quem não se lembra dos famosos “consensos”, como o de Washington, que, com sua pregação privativista e destruidora de Estados nacionais? Quem não se lembra do “Estado-Mínimo”, pregação contraditória dos “Estados-Máximos”?

            É evidente que não se trata, em princípio, de qualquer idéia de contra-ataque imediato a esse país-mercado. Seria em vão. Como, por exemplo, mudar, de imediato, corações e mentes, dando conta de que produzir pão é mais importante que produzir canhão? Ou o feijão, no lugar do míssil? Como, hoje, difundir a idéia de que as mais belas, e mais caras, embalagens encarecem o produto, se elas se tornam, de fato, instrumentos de concorrência? Como fazer entender que moda é, muito mais, manipulação do que estilo? Como dissuadir a indústria bélica de sua produção de dor e de morte?

            É evidente também que não se quer eliminar a idéia do supérfluo. O que se deseja é redistribuir o necessário - repito: o que se deseja é redistribuir o necessário. Que se propague uma luz no “lado escuro do mundo”. Não tenho esperança, porém, que esse venha a ser um “programa de governo”, do país- mercado. Este País trabalha com escalas de produção que permitem maiores lucros, como se depreende em suas mais básicas publicações de economia. No Brasil, por exemplo, se é verdade que a “parte incluída” da população soma 50 milhões, isso significa um mercado consumidor cativo equivalente a quase uma Argentina e meia! Há ainda outros quase 80 milhões que poderiam ser considerados “emergentes” no Brasil. Mas o que esse mesmo mercado estaria imaginando para os 50 milhões de brasileiros considerados “no escuro”?

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Senador Mão Santa, V. Exª não pode cochilar!

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB -RS.) - Eu falava que o Brasil tem um mercado cativo de 50 milhões, uma e meia Argentina, que estão dentro do mercado consumidor. Ainda quase 80 milhões poderiam ser considerados emergentes, porque estão entrando, mas o que esse mesmo mercado estaria imaginando para os 50 milhões de brasileiros considerados “no escuro”? Como potencial ou como fardo? Que perspectivas teriam esses mesmos 50 milhões, hoje pobres e miseráveis, de migrarem para o país-mercado? Qual o papel do Estado, ainda que desmontando por políticas ditas liberais, para esse grande país de excluídos? Políticas compensatórias ou degraus para galgar as portas do mercado?

            Há, portanto, um longo caminho a ser percorrido. O consolo é que parece tratar-se de um caminho de volta; e os caminhos de volta são, por definição, conhecidos. Já se passou por eles algum dia, em algum tempo. É história vivida.

            Em primeiro lugar, há que se resgatar valores. O ser humano não pode ser meramente um objeto de vitrine. Ele não pode ser visto tão-somente como consumidor em potencial, sob pena de exclusão. Neste caso, não vejo alternativa senão uma volta ao passado: restabelecer as relações de amizade, de vizinhança, de religião, de trabalho, de escola e de família; incentivar os eventos coletivos, para que possam ser discutidos os destinos da humanidade.

            Rever currículos, criar instrumentos legais incentivadores de ações cooperativas, buscar ações que permitam reverter as migrações internas que incharam cidades e potencializaram os efeitos da exclusão social, como o desemprego, o analfabetismo e a violência. Mapear e potencializar experiências bem-sucedidas de trabalho voluntário. Resgatar o verdadeiro sentido de comunidade. E, quem sabe, o significado de felicidade.

            Há que se resgatar, também, o chamado Estado-Nação, enquanto representante dos interesses coletivos, e que leva em conta a história, a geografia e a cultura de um povo. Quanto mais fortes os sinais da globalização, mais importante o papel do Estado. O que se viu, nos últimos tempos, é um Estado privatizado, controlado por interesses privados e longe das necessidades coletivas, principalmente da porção excluída da população.

            No caso brasileiro, por exemplo, estarão prontas as bases para um plano de desenvolvimento verdadeiramente nacional, não um mero apanhado de medidas, quase sempre desconexas, viabilizadoras, unicamente, dos interesses do mercado. Um plano legítimo por que concebido a partir das reais necessidades e dos interesses da população como um todo, e não sob pressão única de grupos que objetivam o benefício individual em detrimento do coletivo. O Brasil, pela sua riqueza natural, é, e sempre será, o território mais cobiçado pelos interesses do mercado globalizado. Por enquanto, é através da guerra virtual. Se necessário, o será pela guerra real.

            Quem sabe, então, estejamos no melhor dos momentos para reconstruir um só Brasil, com sua etnia, sua cultura, sua história e sua geografia? Quem sabe, também, um planeta com divisões geográficas demarcadas pela história de seus povos, cujas fronteiras sejam invadidas, aí sim, por sentimentos de humanidade, de respeito às diferenças e, sobretudo, pelos direitos mais fundamentais de todos os seus cidadãos? Nem “Belíndia”, nem “Alemâmbia”, nem “Inglamíbia”. A globalização, sim, porém, não a que provoque a exclusão social, mas a que promova a inclusão de todos os seres humanos no seu sagrado direito à cidadania, à democracia e à soberania. À vida, enfim, na sua plenitude.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/03/2007 - Página 6664