Discurso durante a 69ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre pesquisa divulgada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) a respeito da desqualificação do trabalho doméstico no País e a falta de amparo legal àqueles trabalhadores.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EXERCICIO PROFISSIONAL. ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.:
  • Comentários sobre pesquisa divulgada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) a respeito da desqualificação do trabalho doméstico no País e a falta de amparo legal àqueles trabalhadores.
Publicação
Publicação no DSF de 11/05/2011 - Página 15082
Assunto
Outros > EXERCICIO PROFISSIONAL. ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
Indexação
  • COMENTARIO, PESQUISA, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), SITUAÇÃO, INCLUSÃO, EMPREGADO DOMESTICO, POLITICA SOCIAL, GOVERNO FEDERAL.
  • ANUNCIO, REUNIÃO, ORADOR, PREFEITO, ESTADO DA BAHIA (BA), DISCUSSÃO, SOLICITAÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REVISÃO, DECRETO FEDERAL, LIBERAÇÃO, RESTOS A PAGAR, PREFEITURA MUNICIPAL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco/PSB - BA. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria de saudar, logo de início, a Marcha dos Prefeitos e, amanhã, nós estaremos em reunião de bancada com todos os prefeitos da Bahia aqui presentes, tanto eu, quanto o Senador Walter Pinheiro, para acompanhar essa luta do municipalismo brasileiro e a luta dos Prefeitos do nosso Estado. Já temos, tanto eu, quanto o Senador Walter Pinheiro, acompanhado a discussão e a necessária modificação do decreto que se refere aos restos a pagar, que ainda, no nosso entendimento, não está suficientemente atendendo às reivindicações e às necessidades, principalmente dos prefeitos do Brasil. Já que muitas das pequenas prefeituras, muitos dos Municípios brasileiros têm nas emendas parlamentares uma grande válvula de escape. Essas emendas representam, inclusive, neste ano pós-eleitoral, uma grande oportunidade de obra para os pequenos Municípios.

            Além disso, Sr. Presidente, o necessário contingenciamento de verbas que o nosso Governo precisa fazer para conter e equilibrar a economia pode ser feito em novos investimentos, e não naquilo que já está apalavrado pela Câmara dos Deputados, pelo Senado Federal, pelo próprio Governo Federal. Apalavrado, no sentido de dizer que são emendas que já percorreram caminhos, muitas delas chegaram à Caixa Econômica, algumas estão na porta de licitação... Realmente, é um clamor dos prefeitos brasileiros e do nosso Estado, em especial, que a Casa Civil, que a Presidente Dilma possa rever mesmo essa última negociação, esse último decreto, no que diz respeito aos Restos a Pagar de 2007, 2008 e 2009.

            Mas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o meu companheiro de bancada da Bahia acabou de falar aqui, dando dados alvissareiros em relação à inclusão social em nosso País da juventude, que demonstram o vigor da nossa economia, o vigor de uma economia que cresce, incluindo a sua população nesse crescimento, no seu desenvolvimento social, Senador Wellington Dias.

            E eu gostaria de acrescentar a essas informações que o Senador Walter Pinheiro trouxe a este plenário hoje, revelando os dados que demonstram a incorporação, o beneficiamento da nossa juventude, deste novo momento econômico e, principalmente, das políticas sociais do governo do Presidente Lula e, agora, da Presidente Dilma, com mais algumas informações sobre um determinado segmento.

            No último dia 27 do mês passado, estive aqui, na tribuna, parabenizando todas as trabalhadoras domésticas pelo seu dia, comemorado naquela data. Diversos Senadores também se pronunciaram, trazendo aqui os dados referentes às dificuldades do trabalho doméstico em nosso País e, como eu, na América Latina e no mundo.

            Hoje, volto a lembrar dessa categoria por conta da divulgação de uma pesquisa pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), com informações que não nos surpreendem. São dados que, infelizmente, condizem com a desqualificação dessa atividade, com a falta de amparo legal a essas trabalhadoras. É uma situação que atravessa séculos e, lamentavelmente, remonta aos tempos da escravidão. Mas que, no entanto, demonstra também mudanças nesse quadro da situação dos direitos, principalmente da situação da inclusão das trabalhadoras e dos trabalhadores domésticos no Brasil. Digo sempre trabalhadoras porque essa categoria é formada por mais de 90% de mão de obra feminina.

            Conforme o estudo, em 2009, a remuneração média dos empregados domésticos alcançou R$386,45 ao mês. No mesmo ano, o salário mínimo nacional era de R$465,00. No período analisado, percebe-se que o aumento da renda da trabalhadora doméstica não se aproxima do valor do salário mínimo, o que revela a desvalorização dessa atividade no Brasil.

            Além de não ter o mesmo rendimento do menor piso, há também uma diferença de valores por região. No Nordeste, em 2009, a renda média era de R$254,46, a menor do Brasil, e, na Região Sudeste, era de R$415,06, ou seja, 16,7% superior à média nacional.

            A situação das empregadas domésticas negras mostra-se ainda pior. Mesmo representando 62% do total de trabalhadoras domésticas no País, as trabalhadoras domésticas negras, recebiam, em 2009, uma remuneração média de R$364, 84, enquanto que as domésticas brancas recebiam R$421,58.

            Outro dado lamentável mostrado na pesquisa é o trabalho doméstico infantil - entre crianças e jovens de até 17 anos. Em 2009, existiam cerca de 49 mil crianças e adolescentes de 10 a 17 anos ocupadas nessa atividade, o que equivale a 5% do total das trabalhadoras declaradas naquele ano, apesar de seu exercício ser proibido em nosso País, conforme determina o Decreto nº 6.481, de 2008, que regulamenta a Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho, sendo considerada mundialmente uma das piores formas de trabalho infantil. Mas vale registrar que esse número vem caindo lentamente.

            Em 1999, eram cerca de 490 mil jovens ocupadas em emprego doméstico, correspondendo à proporção de 9,7% do total das trabalhadoras domésticas existentes.

            O estudo do IPEA aponta ainda para uma redução das jovens de 18 a 24 anos trabalhando como domésticas, aqui já revelando dados positivos. Em 1999, elas correspondiam a quase 22% do total de jovens ocupadas nessa atividade. Em 2009, esse percentual caiu para 11%, ou seja, as jovens de 18 a 24 anos que eram domésticas significavam 22% e agora, em 2009, caíram para 11%. Portanto, uma queda significativa. Uma das explicações para isso está no crescente aumento da escolaridade das jovens mulheres que, com maior qualificação, sentem-se capazes de buscar novas possibilidades de inserção no mercado de trabalho. Isso demonstra claramente o acerto das políticas públicas adotadas no Governo Lula e continuadas pela nossa Presidente Dilma.

            Em relação à escolaridade das trabalhadoras domésticas, há uma ampliação da escolaridade desse segmento, saltando de uma média de 4,7 anos de estudo em 1999 para 6,1 anos em 2009, um aumento médio de 1,4 ano de estudo no prazo de uma década. Esse crescimento não se aproximou do nível de escolaridade média para o conjunto de mulheres com outras ocupações. Houve até mesmo um distanciamento nessa relação. Entre 1999 e 2009, o conjunto de mulheres trabalhadoras ampliou sua escolaridade em 1,9 ano de estudo, passando de 7,4 anos em 1999 para 9,3 em 2009.

            Da mesma forma como nos dados anteriores, as domésticas negras possuem escolaridade inferior à das brancas. Em 2009, as domésticas brancas possuíam cerca de 6,4 anos de estudo, em média, contra 6 anos das domésticas negras.

            O estudo indica ainda uma redução de mais de 20 pontos percentuais na proporção de trabalhadoras residentes que tinham até 24 anos, que foi acompanhada pelo aumento, especialmente, das faixas etárias de 30 a 59 anos. Proporcionalmente, as trabalhadoras residentes negras são mais jovens: 37,6% têm até 24 anos contra 14,6% das brancas.

            Essa disparidade, de acordo com a pesquisa, reflete ainda uma maior migração de jovens negras de baixa renda para trabalhar e morar nas casas de famílias de renda mais elevada nas grandes cidades, em situação de maior vulnerabilidade e desamparo familiar. Completando esse quadro, verifica-se a possibilidade de outras oportunidades profissionais e perspectivas de vida para as trabalhadoras brancas mais jovens que, ou se inserem em outras ocupações, ou buscam uma relação mais profissional junto a empregadores e uma maior independência para as suas vidas.

            Outra discrepância apresentada pelo estudo refere-se ao crescimento da formalização dos contratos de trabalho, sendo expressivo em todas as áreas na década analisada. Mas, no caso das empregadas domésticas, em 2009, apresentaram índice de formalização de apenas 26,3%, o que significa que, do contingente de 6,7 milhões de ocupadas nessa profissão, somente 1,7 milhão possuía alguma garantia de usufruto de seus direitos.

            A formalização da relação de trabalho por região também apresenta desigualdades que impressionam. Enquanto as trabalhadoras do Sul e Sudeste apresentavam taxa de formalização de 32% e 33%, respectivamente, no Nordeste essa proporção é de 13,8% e no Norte alcança meros 12,5%. Isso significa que apenas 12 em cada 100 trabalhadoras nortistas são registradas. As trabalhadoras domésticas nordestinas foram, inclusive, as que menos ampliaram a formalização da relação de trabalho no período analisado: passaram de um total de 13%, em 1999, de trabalhadoras formalizadas para 13,8%, em 2009. No outro extremo, as que mais cresceram no período foram as do Centro-Oeste, que saíram de 16,3% para 26,4%.

            É preciso corrigir, o mais rápido possível, a falta de amparo legal, inexistente até mesmo na própria Constituição de 1988, que não contemplou esse contingente de trabalhadoras. Para se ter uma ideia dessa situação, as trabalhadoras domésticas não têm direito a uma jornada de oito horas diárias e 44 horas semanais, conforme está previsto em nossa Constituição.

            Essa questão permanece sem qualquer tipo de regulamentação e inviabiliza, entre outras questões, a demanda por pagamento de horas extras e dificulta as negociações entre trabalhadoras e empregadores sobre os limites para o tempo de trabalho.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é preciso que o Senado e a Câmara dos Deputados se debrucem sobre a necessária superação dessa realidade do emprego doméstico em nosso País, e que possamos nos esforçar para superar os limites que a Constituição Federal impôs ao emprego doméstico, através de diversas PECs já existentes na Câmara e no Senado. Eu, inclusive, apresentei um projeto para que possamos garantir um salário-família ao empregado doméstico, mas que possamos avançar muito mais.

            Não tenho dúvida de que essa circunstância específica da discriminação do trabalho doméstico no Brasil em relação às outras categorias tem raízes fortes, profundas na escravidão e na discriminação à mulher, a escravidão que relegou os negros brasileiros a esta situação e que, hoje, mantém a maior parte do emprego doméstico sendo de mão de obra negra, de mulheres negras. A situação de discriminação ainda é maior em relação às domésticas brancas, mas de discriminação da mulher também, porque o trabalho doméstico, invisível, que as donas de casa têm em nosso País, que não recebem nada por ele, é também pensada quando se tem um emprego doméstico e quando se avalia que é um emprego com menor nível de valorização em nosso País.

            Pagar um empregado doméstico é visto sempre como alguma coisa... Qualquer mudança na legislação que se propõe, logo se pergunta se as famílias serão penalizadas por ele. Um salário abaixo do salário mínimo é a média do que recebe o trabalhador doméstico no Brasil. Abaixo do salário mínimo é o que uma parte da classe média brasileira gasta num dia, ou num mês, num jantar, ou em jantares, ou em outras atividades de lazer em nosso País. E o trabalho doméstico significa justamente este trabalho invisível de lavar, de passar, de cuidar da mão de obra do trabalhador brasileiro e recompor a sua força de trabalho, quase gratuitamente ,para o grande capital e para o grande empregador em nosso País.

            Portanto, é preciso, sim, voltar ao tema, insistir no tema da valorização do trabalho doméstico em nosso País.

            Muito obrigada.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/05/2011 - Página 15082