Discurso durante a 24ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre as desigualdades regionais, com reflexos substanciais para o desenvolvimento do Nordeste. Repúdio às soluções assistencialistas propugnadas pelo Governo, destacando a importância de iniciativas que promovam transformações sócio-econômicas estruturais.

Autor
César Borges (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: César Augusto Rabello Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Considerações sobre as desigualdades regionais, com reflexos substanciais para o desenvolvimento do Nordeste. Repúdio às soluções assistencialistas propugnadas pelo Governo, destacando a importância de iniciativas que promovam transformações sócio-econômicas estruturais.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares, Eduardo Azeredo, Eduardo Suplicy, Garibaldi Alves Filho, José Agripino, Marco Maciel, Ney Suassuna, Rodolpho Tourinho, Tasso Jereissati.
Publicação
Republicação no DSF de 10/04/2003 - Página 7070
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • ANALISE, HISTORIA, BRASIL, AUMENTO, DESIGUALDADE REGIONAL, PROCESSO, INDUSTRIALIZAÇÃO, CRIAÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A (BNB), COMPANHIA HIDROELETRICA DO SÃO FRANCISCO (CHESF), REGISTRO, DADOS, SUBDESENVOLVIMENTO, REGIÃO NORDESTE.
  • APREENSÃO, MIGRAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO, TRABALHADOR, REGIÃO NORDESTE, COMENTARIO, PROGRAMA, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, FOME, ASSISTENCIA SOCIAL, NECESSIDADE, PLANEJAMENTO, POLITICA DE EMPREGO, CRESCIMENTO ECONOMICO, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO.
  • CRITICA, POLITICA DE DESENVOLVIMENTO, PAIS, AUMENTO, CONCENTRAÇÃO, REGIÃO SUDESTE, EXPECTATIVA, REFORMA TRIBUTARIA, DIFERENÇA, SUBSIDIOS, REGIÃO NORDESTE.
  • EXPECTATIVA, INTEGRAÇÃO, ATUAÇÃO, SENADOR, EX GOVERNADOR, ESTADOS, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO NORTE.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 09/04/2003


*************************************************************************

DISCURSO PRONUNCIADO PELO SR. SENADOR CÉSAR BORGES, NA SESSÃO DELIBERATIVA ORDINÁRIA DE 25-03-2003, QUE SE REPUBLICA PARA SANAR INCORREÇÕES.

*************************************************************************

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo esta tribuna hoje para falar de um tema que, infelizmente, tem sido recorrente na nossa história. E nada melhor do que citar um autor consagrado para demonstrar o quão pouco avançamos na questão.

Celso Furtado, no último capítulo do seu clássico Formação Econômica do Brasil, já alertava, em finais da década de 1950, para uma das conseqüências perversas do processo de industrialização brasileiro: a volta das tensões de caráter regional.

O processo de industrialização gerou em nosso País, assim como em outras nações desenvolvidas, entre elas, Itália, França e mesmo os Estados Unidos, a tendência à concentração regional de renda.

Celso Furtado alertava que, uma vez iniciado esse processo, sua reversão espontânea era praticamente impossível. E mais, a preocupação central da política econômica, daquele momento em diante, deveria ser buscar a solução do problema de como barrar o aumento das desigualdades regionais.

Celso Furtado escrevia num momento em que o Nordeste brasileiro apresentava uma tendência a forte queda do nível de renda da população em geral, com economia baseada em uma agricultura de baixa produtividade e na exportação de produtos primários.

Este setor exportador, como o Cacau na Bahia, contribuiu decisivamente para a acumulação de divisas para o país que financiaram a importação dos bens de capital e supriram a nascente industria nacional, instalada no Sudeste do País, mas esta contribuição não foi suficiente para que o Nordeste fosse incorporado à política de substituição de importações, tendo perdido, de certa forma, o “bonde” da industrialização.

A receita encontrada para buscar a minoração do problema veio com a criação, em 1959, da SUDENE, de tantos serviços prestados ao desenvolvimento econômico do Nordeste brasileiro e que posteriormente serviu de modelo para as outras superintendências regionais de desenvolvimento.

Graças a ações como a criação da SUDENE, do Banco do Nordeste e da Chesf, já estamos discutindo a questão da desigualdade de outro patamar. A indústria cresceu e se desenvolveu em Estados localizados fora do Centro-Sul.

Da mesma forma, assistimos a um firme processo de modernização das práticas agropecuárias, permitindo ganhos de produtividade e crescimento dos volumes produzidos e exportados a partir dos Estados nordestinos.

Entretanto, Celso Furtado estava certo quando apontou a tendência à disparidade econômica regional como uma marca distinta da economia moderna, de forma que, mesmo com todo o esforço industrializante e modernizador, a situação do povo nordestino ainda não se compara a de seus compatriotas das outras regiões.

O sucesso do Nordeste, portanto, é absoluto em si, mas quando relativizado a outras regiões, não temos muito o que festejar.

A participação do Nordeste na formação do PIB, por exemplo, vem apresentando pequena variação nos últimos 15 anos. Em dados do IBGE, o Nordeste oscilou de uma participação de 14,10%, em 1985, para 13,09%, em 2000 ou seja, tivemos uma perda relativa de 7,16%. No mesmo período a participação do Norte cresceu 19,79%, o Centro-Oeste cresceu 44,49%, o Sul cresceu 2,74% e o Sudeste diminuiu 3,92%.

Outro indicador importante é o do PIB per capita. Entre os anos de 1997 e 2000, em que pese a performance de 22,47% no crescimento do PIB per capita nordestino - que superou o aumento das regiões Sudeste e Sul - em números absolutos minha região ainda tem o pior valor per capita.

Ela apresentava, em 2000, um valor de 3.014,00 reais, contra 8.774,00 do Sudeste, 7.692,00 do Sul, 6.559,00 do Centro-Oeste e, finalmente, 3.907,00 reais do Norte do País. Ou seja: o PIB per capita da Região Norte é maior do que a do Nordeste em quase 30%, com a Região Sudeste apresentando quase o triplo do valor nordestino.

Ora, senhoras e senhores, se considerarmos que a população economicamente ativa do Nordeste está na média do país, isto significa que o trabalho do nordestino gera menos riqueza para a Nação. Forma mais cruel de exclusão social e econômica do trabalhador não existe.

Do ponto-de-vista da Seguridade Social, senadores e senadoras, 45,7% dos trabalhadores brasileiros contribuem de alguma forma para a previdência social. Mas, se nos preocupa a quantidade de trabalhadores sem qualquer proteção social no país, no Nordeste, a situação é ainda mais alarmante: apenas 27,7% dos trabalhadores, pais e mães de família, contribuem para o INSS, demonstrando que as condições de emprego lá são ainda mais precárias.

Se esta realidade continuar, serão mais trabalhadores que, quando perderem a condição de trabalho, devido a idade, ou também prematuramente, por doença, não terão autonomia e vão depender da família e de políticas públicas compensatórias.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Concedo um aparte ao Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Solidarizo-me com o discurso de V. Exª, ele é mais do que verdadeiro, pois aborda a crueza do tratamento que recebem os nordestinos, que são um terço deste País e que sofrem a cada seca. A estrutura é exatamente a que V. Exª está demonstrando em seu discurso, sem contar o êxodo de milhares e milhares - por que não dizer centenas de milhares - de nordestinos que saem da Bahia, da Paraíba, de Alagoas para procurar emprego temporário, deixando suas famílias inteiramente desprotegidas. Envergonha-nos andar pelas estradas da região e ver meninas de 12, 14 anos se prostituindo para comer ou levar alguma coisa para casa. Isso é desumano. Há anos dizem que vão tentar melhorar essa situação. No entanto, o problema agrava-se a cada ano. A Bahia de V. Exª já se encontra em melhores condições e por várias razões, entre elas o petróleo. O mesmo não acontece com outros Estados do Nordeste! Além do mais, a Bahia abrange grande área do semi-árido brasileiro. É um quadro desolador o que V. Exª está pintando! Dá-nos vergonha ser brasileiro, quando vemos uma situação dessas. Parabéns!

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Senador, agradeço o aparte de V. Exª, que incorporo ao meu discurso. Embora 30% da população do País resida na Região Nordeste, ela produz apenas 15% da riqueza nacional.

Há, com certeza, um débito da Federação com o Nordeste que precisa ser corrigido rapidamente, e o meu discurso se prende exatamente a isso.

Quanto aos números absolutos atinentes à renda, o Nordeste apresenta o menor valor nacional de rendimento médio do trabalhador, na ordem de R$204,00, contra R$365,00 da média nacional e R$452,00 do Sudeste, mais de 2,2 vezes o rendimento médio nordestino.

Com tamanhas disparidades, é natural que apareça o desejo de mudança rumo aos grandes centros, especialmente nas regiões que apresentam economia mais dinâmica e includente, tendo, portanto, melhores oportunidades de emprego.

Mas a migração, evidentemente, não resolve sua vida, porque, para o nordestino pobre, sem qualificação profissional, sem grau avançado de escolarização, as oportunidades são poucas. E, mesmo migrando, o nordestino acaba se confrontando com outro grande problema gerado pela desigualdade: o preconceito.

Sua sustentação lógica está na rejeição ao trabalhador menos qualificado, o mais desesperado pela busca de melhores condições de vida. Esta migração, que durante muito tempo foi bem-vinda pelos produtores do Centro-Sul do País, que se beneficiavam da mão-de-obra barata numa ocasião em que a qualificação profissional não era tão necessária, agora representa uma ameaça na mentalidade de muitos que dela se aproveitaram.

Esse preconceito está no subconsciente até das melhores e mais bem intencionadas cabeças, como ficou demonstrado no infeliz episódio no qual o Ministro José Graziano associou o aumento da violência em São Paulo com a migração nordestina, justificando dessa maneira, para empresários paulistas, o combate da fome e da pobreza no Nordeste.

A própria existência de um programa nas condições do Fome Zero se revela um preconceito contra a região. Se no Governo passado não havia qualquer política de desenvolvimento regional estruturada, agora neste Governo, quando se fala na pobreza nordestina, se apresenta o Programa Fome Zero, que é mais um programa assistencialista, quando o Nordeste não quer apenas comida, quer a possibilidade de emprego e de crescimento econômico.

E é nesse ponto que eu gostaria de incluir mais um elemento para reflexão. Como muito bem apontou Celso Furtado, há mais de quarenta anos, a diminuição das desigualdades regionais só se dá por meio da ação e do planejamento.

Concordo com o Ministro José Graziano, filtrada sua conclusão preconceituosa, quando diz ser necessário criar empregos, dar educação e garantir o exercício da cidadania no Nordeste. Acrescento que essas ações são fundamentais também para as vastas áreas carentes que existem mesmo dentro dos Estados mais desenvolvidos. Entretanto, se queremos atacar a pobreza do País e as desigualdades entre pessoas, precisamos atacar as desigualdades regionais, porque essa diferença guarda todas as outras diferenças entre brasileiros.

O resgate da dívida social, tão presente no discurso do novo Governo, é quero lembrar. Mas esse resgate não deve ser feito apenas com espírito de caridade. Não se deve dar o peixe, mas ensinar a pescar. Até o peixe está ficando raro.

As políticas de geração de emprego devem ser colocadas em prática logo, pois tão importante quanto a renda que elas podem propiciar ao trabalhador brasileiro será a reconstrução da auto-estima do povo mais sofrido deste País, em especial do Nordeste.

Também será necessário um maior investimento em educação básica e profissional. É interesse do Nordeste, e mesmo do Brasil, capacitar melhor o seu trabalhador, de forma a atrair maiores e melhores investimentos de empresas interessadas em deixar de atuar nos grandes centros, porque há uma “deseconomia” pela concentração de empresas em determinadas regiões e cidades do País, trazendo toda uma problemática que conhecemos, inclusive da violência dos grandes centros urbanos.

Por enquanto, a arma quase exclusiva que os Estados mais pobres têm para garantir a atração de novos investimentos é a redução de impostos e a concessão de incentivos fiscais para que essas empresas possam se instalar nos nossos Estados criando emprego. Os Governadores do Nordeste - e aqui tem vários - sabem do enorme esforço necessário para atrair uma empresa para seu Estado. O Governador da Bahia, Paulo Souto, costuma muitas vezes dizer que pagamos para termos um emprego para a nossa população.

Mas a tão discutida “guerra fiscal” não prima pela destruição de economias competidoras; trata-se de uma necessidade imperativa de gerar empregos e oportunidades locais capazes de diminuir a desigualdade, gerar riqueza e distribuí-la a parcelas maiores da população nacional. E o custo imediato disso, a renúncia à arrecadação, é cada vez mais significativo, um sacrifício para os Estados, em particular os mais carentes, que estão na Região Nordeste do Brasil.

Mas tudo isso, Srªs e Srs. Senadores, só ocorreu por falta absoluta de uma política de desenvolvimento regional do País. O País precisa urgentemente de uma política de desenvolvimento regional que faça com que as políticas públicas tenham um foco para as regiões mais pobres.

O que temos hoje é um País que gasta mais nas regiões mais ricas, inclusive naqueles investimentos em que deveriam priorizar os mais pobres, como o saneamento básico financiado pelo FAT; como as bolsas de financiamento do ensino superior; como também os recursos de renúncia fiscal, que se concentram, majoritariamente nas regiões mais ricas.

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Concedo o aparte ao Senador Tasso Jereissati.

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Senador César Borges, é com alegria e, mais do que alegria, um estímulo muito grande, para quem tem o seu compromisso político centrado na Região Nordeste, ouvir o seu discurso. Tive o privilégio de conviver com V. Exª como Governador da Bahia, quando eu era Governador do Ceará, e participar da sua inteligência, seriedade e compromisso com o povo da Bahia e o povo nordestino de uma maneira geral.

Quem conhece bem todo o seu talento e vê a firmeza do seu discurso, a maneira clara como se posiciona aqui nesta Casa, como um defensor inarredável da causa nordestina, sente-se também muito estimulado. As manifestações feitas por V. Exª têm sido bastante pertinentes no momento que estamos vivendo. A questão abordada por V. Exª somente pode ser entendida por alguém do Nordeste. O nordestino não quer a compaixão nem a humilhação da esmola, mas requer os meios necessários para se desenvolver de maneira justa e por esforço próprio. Os Estados nordestinos, quando usam de recursos como tributos e incentivos fiscais, não o fazem porque querem simplesmente dar os recursos do Estado para uma indústria ou para uma empresa qualquer. Essa é a última e única alternativa que lhes resta, em virtude da falta de interesse que, historicamente, os Governos centrais têm - não apenas este Governo, mas outros - em relação ao problema do Nordeste. V. Exª foi mais feliz ainda, quando disse que o diferencial regional guarda todas as diferenças existentes atualmente no País de renda e de qualidade de vida entre as pessoas. Enquanto os Governos centrais não prestarem atenção nessa situação e não perceberem o problema, essas diferenças não serão resolvidas adequadamente. Senador César Borges, eu faço este aparte e registro a minha alegria de ouvir o seu discurso contundente, como prova de que contaremos, nesta Legislatura, com lideranças como a de V. Exª, para realmente impormos, desta vez, uma solução nordestina. Parabéns pelo seu discurso e pelas suas palavras.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Obrigado, Senador Tasso Jereissati. Como Governador, tive a honra de ser seu colega, quando convivemos em um esforço imenso dos nossos Estados para alcançar um patamar de melhoria que, como foi demonstrado, é apenas absoluto, porque, se relativarmos com o restante do País, estaremos em descompasso. Precisamos dessa política diferenciada para promover o desenvolvimento do Nordeste. Há uma luta da Bancada de Senadores do Nordeste brasileiro nesta Casa para que o atual Governo, presidido por um nordestino retirante que foi para São Paulo atrás de oportunidade, possa, realmente, promover o resgate social e econômico de nossa região.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - V. Exª tem a palavra.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Senador César Borges, é muito importante ouvir V. Exª e o Senador Tasso Jereissati. Refiro-me à importância da visão do Nordeste por um nordestino. Isso torna muito claros os pontos que V. Exª trouxe para reflexão, sobretudo num momento em que discutimos a reforma tributária. São pontos absolutamente importantes e que podem ser discutidos com a visão de nordestino sem nenhum tipo de idéia preconcebida. Nessa discussão, temos que tratar da guerra fiscal como política de incentivo fiscal, como V. Exª observou claramente. Essa já é uma visão diferente. Não chamamos de guerra fiscal, mas de uma necessária política de incentivo fiscal, política de desenvolvimento regional. Nós que somos companheiros do mesmo Estado, sempre que analisamos o caso da Bahia, cujo território tem cerca de dois terços no semi-árido, entendemos que temos que fazer algo e buscar, como disse V. Exª, essa política com dois pontos fundamentais: ação e planejamento. Quero louvar sua visão lúcida, a visão lúcida de um nordestino que, conhecendo os problemas do seu Estado e os problemas da região, apresenta questões muito importantes nesta Casa que representa os Estados, para que possamos discuti-los com total liberdade, ouvindo as diferentes visões e diferentes versões tão necessárias para um bom entendimento no final da questão. Louvo mais uma vez o pronunciamento, repito, lúcido e com uma grande vivência de baiano e de nordestino.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Agradeço o aparte do Senador Rodolpho Tourinho. Tenho certeza de que S. Exª, que foi Secretário da Fazenda do Estado da Bahia, conhece muito bem a questão tributária e sabe que neste momento em que se fala na reforma tributária temos que estar atentos para que uma verdadeira política de incentivo diferenciado para o Nordeste possa ser instalada pelo Governo.

Concedo, com muita honra, o aparte ao Líder do meu Partido, Senador Agripino Maia, e, logo em seguida, ao Senador Eduardo Suplicy e ao Senador Eduardo Azeredo.

O Sr. José Agripino (PFL - RN) - Senador César Borges, quero cumprimentar V. Exª, porque, creio, seja este o primeiro discurso que profere da tribuna do Senado e fala, exatamente, sobre a nossa região, o Nordeste, e com muita propriedade, pois fala como Senador do Estado mais economicamente estruturado da região. E fala com propriedade, porque V. Exª foi Governador, tal como o fomos eu, o Senador Tasso Jereissati, e o Senador Eduardo Azeredo que vai aparteá-lo. Sabemos que o governador, no âmbito de seu Estado, faz aquilo que a Constituição lhe permite. Faz escola, estrada, hospital, desenvolve até um programa de geração de emprego e renda, mas não pode extrapolar esses limites. A fragilidade da economia dos nossos Estados não nos permite dar o passo que gostaríamos: incentivo fiscal. O novo governo, que anuncia o programa Fome Zero, é encabeçado por um nordestino e, como aqui foi dito, retirante. O novo Governo daria uma enorme demonstração de interesse pela causa social do Brasil, se, ao lado do programa Fome Zero, anunciasse um grande programa de recuperação do Nordeste, que é a maior chaga social deste País. Sabe V. Exª, que anda pelas ruas de Salvador, de um quilômetro para o outro, e assiste a contrastes terríveis, assim como eu vejo isso em Natal, Moçoró ou em Caicó. O turismo de Natal fez com que na cidade construíssem bonitos restaurantes e até um belo shopping, ruas ajardinadas, mas, na periferia e no interior, a pobreza hoje é mais aguda do que era há dez anos. Tenho que reconhecer isso! O País empobreceu por falta de uma ação federal! Fizemos - e aqui não vai descarte algum de responsabilidade - nossa parte! Mas a União e os Governos que se sucederam ao longo dos vinte últimos anos não foram corretos com o Nordeste. E não foi por falta de esforço dos Parlamentares nordestinos, dentre os quais me incluo, que procuraram elaborar junto com o Governo central uma política de incentivos fiscais, como a Itália fez com o Mezzogiorno, como os Estados Unidos fizeram com a Califórnia. A Califórnia não era rica. O sul da Itália era paupérrimo. As duas Alemanhas estão se igualando pela determinação política de um país e de um governo. E essa determinação política nos falta. Talvez seja o momento de, mais uma vez, cobrar uma política de incentivos fiscais que promova ou induza os investimentos na região mais pobre. Não é favor, é indução por necessidade, a fim de que o País seja mais igual, a não ser que não se queira praticar a democracia. Vamos sugerir algo que é o lógico: investir em nossas potencialidades. Não adianta construir fábricas de parafuso no interior do Rio Grande do Norte. No interior do Rio Grande do Norte há criação de camarão em cativeiro, o Estado é produtor de melão, manga, sal. Vamos aproveitar as vocações naturais de Fortaleza e de Natal, com o turismo! Vamos investir! Vamos criar uma agência de desenvolvimento, como já foi proposto, mas faltou a conclusão. Vamos nos organizar! Vamos aproveitar o novo Presidente, que é nordestino e confere um enfoque social preponderante em sua formulação de Governo. Vamos nos unir e apresentar propostas, a começar pela educação. Vamos propor a instalação de centros de excelência de acordo com a vocação de cada Estado. Vamos dar tratos à bola. Dentro da linha de raciocínio de V. Exª e daqueles que fazem este Senado - e há boas cabeças nesta Casa -, vamos dar a nossa contribuição e tentar arrancar um compromisso do Governo Lula com o Nordeste. Se há vontade política, muita coisa pode ser feita. Quero cumprimentar V. Exª pelo tema que aborda em seu discurso inaugural e me solidarizar por inteiro à causa da recuperação do Nordeste.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Senador José Agripino, o aparte de V. Exª me honra sobremaneira e suas observações estão exatamente no espírito deste discurso. Incorporo inteiramente todas as suas posições. V. Exª é um profundo conhecedor da questão nordestina, como Governador, como Senador, e tenho certeza de que juntos faremos um trabalho em prol dessa região.

Concedo o aparte ao nobre Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador César Borges, como Governador da Bahia, V. Exª pôde testemunhar a extraordinária força que teve Luiz Inácio Lula da Silva durante a sua campanha, em especial no próprio resultado eleitoral, e sabe o excepcional interesse que o Presidente tem em promover o desenvolvimento da Bahia, de todo o Nordeste. Conforme V. Exª pode se lembrar, no seu pronunciamento de posse, o Presidente Lula observou que o seu Governo iria tanto se preocupar com prover o peixe quanto a vara de pescar. Ele afirmou que iria fazer não apenas com que as pessoas tenham acesso à alimentação, mas também aos meios necessários para todos se desenvolverem. Ainda ontem, perante mais de 15 mil trabalhadores da Volkswagen, por ocasião do aniversário de 50 anos da empresa, Lula expressou que tem duas imensas preocupações: fazer com que todos os brasileiros possam se alimentar pelo menos três vezes ao dia e aumentar o número de empregos na sociedade. V. Exª, em seu pronunciamento, recorda as lições extraordinárias do Professor Celso Furtado, que tanto se preocupou com o desenvolvimento do Nordeste, e sabe quantas vezes Celso Furtado, criador da Sudene e um dos principais proponentes do BNDES e do Banco do Nordeste do Brasil, preocupou-se com a forma de desenvolvimento havido nas últimas décadas. Se, de um lado, conseguiu o Nordeste diminuir o atraso em relação ao Sudeste e ao Sul, por outro lado, uma das características que persiste em nosso País é a desigualdade. E isso tem a ver, às vezes, com a própria forma de desenvolvimento. Por vezes, Senador César Borges, proveram-se créditos subsidiados e incentivos fiscais a empresários, tanto àqueles que realizaram investimentos produtivos, criando empregos, quanto àqueles que não procederam adequadamente, o que causou a decisão do Presidente Fernando Henrique de querer fechar a Sudam e a Sudene, bem como corrigir outras distorções havidas. O fato é que se faz necessário um novo enfoque. Teremos amanhã a possibilidade de ouvir o Ministro José Graziano da Silva, que, desde 1981, vem assessorando Luiz Inácio Lula da Silva. A primeira vez foi acompanhando Lula, em 1981 e 1982, como candidato a Governador, por mais de duzentos Municípios de São Paulo. Mas muitas foram as ocasiões em que José Graziano da Silva acompanhou Lula pelo Nordeste brasileiro e, mais do que solidário, tantas as vezes partilhou da preocupação de Lula em promover medidas que pudessem dar direito à dignidade e à vida a todos no Brasil, em especial no Nordeste. Assim, amanhã, teremos a oportunidade de ouvir todas as preocupações e instrumentos que compõem o Programa Fome Zero. Eu próprio tenho algumas diferenças com respeito àquilo que tem sido o enfoque, em especial porque tenho propugnado, junto ao Ministro José Graziano, mas da forma mais construtiva, já caminharmos no sentido de simplesmente dar liberdade a cada família para decidir no que gastar e como gastar aqueles recursos do chamado cartão-alimentação. Assim eliminaríamos boa parte da burocracia envolvida em se ter de saber o que fazer com os recursos. E se o objetivo é proporcionar uma maior organização popular, seja para a construção da cisterna, seja para os programas de alfabetização ou para tudo aquilo que puder promover socialmente as pessoas, dando-lhes maior auto-estima, tudo isso pode ser feito, inclusive com as reuniões na comunidade, com as informações sobre a melhor qualidade nutricional dos alimentos locais, até para se estimular a produção local de alimentos e de outros bens de primeira necessidade. Acredito que poderemos dar um apoio muito forte ao objetivo, que, na verdade, galvaniza a opinião pública brasileira de erradicar a fome e a pobreza absoluta. É neste sentido que quero dizer que são muito importantes as reflexões que V. Exª traz, porque um debate muito rico tem se estabelecido no Senado, desde que iniciamos esta Legislatura, e atingirá, amanhã, um momento muito significativo com a presença do Ministro José Graziano da Silva. Conversei, ainda hoje, com o Ministro José Graziano e achei importante transmitir-lhe o conjunto de todos os pronunciamentos que aqui têm sido realizados, para que amanhã S. Exª venha com a melhor informação possível a respeito da reflexão de todos sobre o tema. Meus cumprimentos a V. Exª.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Agradeço pelo aparte, Senador Eduardo Suplicy, e quero dizer que, como V. Exª verá no nosso discurso, temos sinceras esperanças de que o discurso de mudanças praticado pelo Presidente e reconhecido pelo povo brasileiro possa agora, como ensina a dialética, ser efetivado na prática, saindo do plano da teoria ou das boas intenções e se transformando em realidade. É isso que desejamos. Mas há V. Exª de concordar comigo que o Programa Fome Zero é um projeto circunstancial, assistencialista e que tem o seu mérito no momento, para matar a fome daquele que tem fome, com o que estamos de pleno acordo. No entanto, para gerar renda e riqueza, ele não contribui. Para isso, são outras medidas que teremos de ver agora, a partir da reformulação da política tributária do Governo, da reformulação da Sudene, como comentarei no meu discurso que a partir de hoje foi formada uma comissão, pelo Ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, para fazer esse estudo. Nosso discurso é mais um alerta de que é preciso essa política de desenvolvimento regional. Se ela não existir, se não houver a necessária vontade e determinação política do Presidente da República da Federação brasileira, não conseguiremos corrigir a injustiça praticada contra milhões de brasileiros lá no Nordeste.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Concedo um aparte ao Senador Eduardo Azeredo.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senador César Borges, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero trazer minha palavra de concordância ao discurso de V. Exª. Quando Governador de Minas Gerais, pude acompanhar seu trabalho quando V. Exª sucedeu o Governador Paulo Souto. Nós, mineiros, somos vizinhos da Bahia e sabemos bem da importância que o Governo estadual teve para levá-la ao ponto que chegou: o de estar entre os Estados mais viáveis do Brasil, digamos assim. Por outro lado, Minas Gerais é uma síntese do Brasil: é um Estado que tem partes tão desenvolvidas quanto a Região Sul, quanto São Paulo, mas há regiões que, como os Estados do Nordeste, precisam de políticas especiais, como é o caso do norte de Minas, incluído na antiga Sudene, e também da região do Jequitinhonha. Não tenho dúvidas, Senador, de que precisamos ter políticas compensatórias para as regiões menos desenvolvidas do Brasil. O pronunciamento que pretendo fazer no Senado, propondo a redistribuição do Fundo de Participação dos Municípios, vai nessa mesma linha; uma linha que estabelece que precisamos de ações na origem dos recursos. Se não me falha a memória, somos aqui 21 ex-Governadores entre os 81 Senadores. Todos passamos por pressões e temos uma visão clara de como é importante atrair investimentos, pois estes trazem empregos e novos tributos. Entendo claramente o que V. Exª diz, corroborado pelos Governadores da Região Nordeste, da importância da manutenção de incentivos para compensar o desenvolvimento brasileiro. Não tenho também nenhuma dúvida de que só teremos um País mais igual com a melhor distribuição da população. Nesse sentido, o discurso trazido por V. Exª é muito bem elaborado. Da minha parte, tenha a certeza de que estaremos sempre aliados ao Nordeste na busca de melhores situações.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Muito obrigado pelo seu aparte, Senador Eduardo Azeredo.

A SRª PRESIDENTE (Serys Slhessarenko) - Senador César Borges, pedimos licença para declarar prorrogada a sessão por cinco minutos. V. Exª continua com a palavra, Senador César Borges.

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador César Borges, concede-me V. Exª um aparte?

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Concedo o aparte ao querido Senador Garibaldi Alves.

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Agradeço, Senador César Borges, e, tendo em vista a emergência dos cinco minutos, é evidente que meu aparte tem que ser breve. E ainda vou falar pelo Senador Mão Santa, o que não é fácil, principalmente em um minuto. Quero dizer que estou inteiramente solidário com V. Exª, que traz a este Plenário o alerta de que precisamos discutir uma política de desenvolvimento regional. E a hora é esta: a hora em que se está novamente reformulando a Sudene, a hora em que se está elaborando um Plano Plurianual de Desenvolvimento para o País, a hora em que estamos discutindo essas políticas compensatórias. Eu diria que o Nordeste, se precisa do Programa Fome Zero, necessita também do “Água Zero”. É importante que se faça uma política de recursos hídricos consistente. Aplaudo o discurso de V. Exª, dizendo que o Nordeste tem enorme expectativa com relação a Senadores como V. Exª. Muito obrigado.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Senador Garibaldi Alves Filho, agradeço a V. Exª por suas palavras.

Sinto que o nosso Senador Marco Maciel, ex-Vice-Presidente da República, deseja fazer um aparte. Concedo-lhe, portanto, a palavra.

O Sr. Marco Maciel (PFL - PE) - Nobre Senador César Borges, desejo expressar minha satisfação em ouvi-lo pela vez primeira nesta Casa do Congresso Nacional. E repetindo os aparteantes que me antecederam, felicito V. Exª pela escolha do tema: a questão regional. Sabemos que talvez seja a grande questão ainda não adequadamente resolvida neste País. O Brasil avançou muito, em muitos campos; não só no político, não só na sua inserção internacional. Já avançou muito no resgate de graves questões sociais. A indústria está altamente moderna e competitiva, agregando ciência e tecnologia. A agricultura, sobretudo por meio dessas novas tecnologias, está obtendo cada vez mais espaço no exterior. Mas o Brasil convive ainda com graves desníveis regionais, que provocam, como conseqüência, essas enormes desigualdades de renda. Por isso, quero cumprimentá-lo pela abordagem que faz do tema, chamando a atenção para que pensemos a questão regional brasileira. Penso que, na elaboração dos planos nacionais, sempre se comete, de início, um equívoco: é que se começa a trabalhar com políticas nacionais, esquecendo-se de que antes, talvez, devêssemos pensar as políticas regionais, para depois tentar compatibilizá-las dentro de um modelo nacional. Se assim procedêssemos, talvez conseguíssemos, de fato, ter um plano de desenvolvimento verdadeiramente nacional, posto que resultado da incorporação de diferentes aspirações regionais. Assim, haveria condições de termos uma proposta de crescimento social e econômico que ensejasse, como desejamos, o crescimento harmônico e integrado do País. O Brasil tem todas as condições agora, sobretudo neste início de século, de ter resolvida essa questão. Já somos um País que alcançou um nível de crescimento da sua economia, que já tem condições de enfrentar e vencer os desafios regionais, que de alguma forma comprometem a edificação de uma sociedade que seja não somente democrática, mas igualmente justa. Por isso, cumprimento V. Exª pela contribuição que traz a Casa. Desejo que suas palavras sejam ouvidas não somente aqui, na Câmara Alta do Congresso Nacional, mas que se espraiem pela Praça dos Três Poderes e cheguem ao Executivo, para progredirmos também nesse campo, criando condições para termos a Nação com a qual sonhamos. E faço meus votos de felicidades a V. Exª no exercício do mandato que ora inicia, depois de trazer uma grande experiência de funções relevantes exercidas na Bahia, inclusive governando o Estado. Desejo que, nesta Casa, V. Exª possa ajudar-nos a dilucidar questões momentosas em nosso País, mas, de modo particular, ajudar-nos a resolver a questão regional brasileira. Muito obrigado.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Agradeço-lhe pelo aparte, Senador Marco Maciel, que muito me honra, visto que V. Exª conhece muito bem a questão nordestina e fez muito pelo Nordeste. Tenho certeza de que sua ponderação sobre a necessidade de as políticas regionais comporem a política nacional faz parte também do pensamento do Presidente Lula, que pude ouvir pessoalmente no Palácio de Ondina, em Salvador, oportunidade em que o Senhor Presidente explicitou seu apreço pelo retorno à política de planejamento deste País.

Agradeço à Mesa pela compreensão. Vou encerrar o meu discurso, e é claro que voltaremos a este assunto complexo.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB - SE) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Com a tolerância da Mesa, concedo um aparte ao Senador Antonio Carlos Valadares, pelo querido Estado de Sergipe, que representa tão bem nesta Casa.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco/PSB - SE) - Senador César Borges, agradeço a V. Exª essa deferência. Somo-me aos Senadores que elogiaram merecidamente o discurso de V. Exª, profundo, consciencioso, equilibrado e cheio de dados, o que demonstra, insofismavelmente, a necessidade de implantar no nosso Nordeste uma política diferenciada de desenvolvimento. Sabemos que o Nordeste, como V. Exª acentuou, é a região mais pobre e problemática, apesar dos esforços feitos no passado, inclusive com a criação da Sudene - uma idéia magnânima daquele Presidente inesquecível, Juscelino Kubitschek -, que funcionou durante muitos anos e que foi extinta no ano passado, no Governo Fernando Henrique Cardoso. Mas a sua reinauguração com novo formato - tenho certeza absoluta - atenderá os reclamos não só dos Governadores e Senadores, como do povo do Nordeste. Para terminar a minha intervenção e para esclarecer melhor essa questão do programa Fome Zero, tenho um documento do Ministro José Graziano, que reza, em resumo: O Fome Zero vai combater a fome e garantir a segurança alimentar e nutricional, atacando as causas estruturais da pobreza. Ora, se o Ministro está disposto a enfocar a questão do desemprego, da industrialização e do fortalecimento da agricultura como fatores indispensáveis e essenciais do combate à fome, é lógico que S. Exª está cuidando de uma política de desenvolvimento que vai ao encontro justamente das estruturas hoje responsáveis pela pobreza na nossa região. Esse programa surgiu no momento realmente de maior adversidade do País, com mais de 50 milhões de brasileiros vivendo abaixo da linha de pobreza. Logo, algo tinha de ser feito do ponto de vista emergencial. Evidentemente, a estrutura do programa Fome Zero visa proporcionar à nossa região e às regiões mais pobres do nosso País a oportunidade de saírem da pobreza que tanto vem prejudicando os nossos conterrâneos, adotando políticas de desenvolvimento industrial e agrícola, fomentando a educação, cuidando da saúde e não somente promovendo distribuição de cesta básica ou de dinheiro gratuitamente. A política assistencialista não é alvo do Governo Lula. Ao contrário, o seu objetivo é acabar com o assistencialismo, mediante essa política de desenvolvimento que está sendo propugnada e que será levada a efeito. São apenas três meses de Governo. Não podemos corrigir uma situação secular em tão pouco tempo. Enfatizo, mais uma vez, minha admiração pela forma como V. Exª se conduziu na tribuna, trazendo dados que novamente acentuam a necessidade imperiosa de transformar o Nordeste numa região desenvolvida.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Agradeço-lhe o aparte, ilustre Senador. Temos expectativa de que o programa Fome Zero vise a alcançar as verdadeiras causas da pobreza brasileira, em especial da nordestina.

Sr. Presidente, para encerrar meu pronunciamento, saliento que a ação consciente e planejada do Governo Federal, em esforço conjugado com os Governos Estaduais, deverá ser focalizada, portanto, não na caridade, embora reconheça a urgência de determinadas situações de combate à miséria e à fome, mas na geração de oportunidades de desenvolvimento. Só assim poderemos quebrar o círculo vicioso da concentração regional da renda, do crescimento desigual e da transferência de renda dos Estados pobres para os ricos, com perda da sua capacidade produtiva.

É importante ressaltar nesse momento a informação anunciada nesta Casa pelo Ministro Guido Mantega, em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos, de que o Governo incluirá - estaremos vigilantes - ações de desenvolvimento político regional na formulação do próximo plano plurianual.

Aliás, faça-se justiça, como já disse, Sr. Presidente, pude ouvir do próprio Presidente Lula, em encontro na Bahia, manifestação sobre o seu desejo de retornar com o planejamento estratégico nas políticas de Governo. Esperamos que a prática confirme a intenção.

Nas minhas primeiras semanas de Senado, revi colegas com quem convivi nos últimos anos na função de Governador, a Senadora Roseana Sarney e os Senadores Tasso Jereissati, José Maranhão, Mão Santa, Garibaldi Alves e João Capiberibe. Certamente todos acumulamos uma expertise sobre a questão das desigualdades regionais, da necessidade política de desenvolvimento, e nossa atuação integrada, Srªs e Srs. Senadores, será da maior valia para as nossas regiões.

Sabemos que os governos do Nordeste e do Norte brasileiros não precisam de esmola, mas de espaço de articulação, que no caso do Nordeste pode ser a própria Sudene, recriada em novos modelos, em novos montes.

Precisamos, enfim, retomar as rédeas da nossa história para demonstrar: primeiro, que o Nordeste é econômica e socialmente viável; segundo, que é possível, com pouco esforço organizado, colocar a região no caminho do desenvolvimento auto-sustentável; por fim, que o povo nordestino é um povo trabalhador, competente, arrojado, capaz de dissipar, na prática, qualquer imagem negativa que dele se tenha quando se confunde a falta de oportunidade com a falta de capacidade.

Concluindo, Sr. Presidente, entre 1992 e 2001, o rendimento médio mensal real do trabalhador brasileiro com rendimento cresceu na ordem de 36,70%. O Nordeste apresentou um aumento de 39,73%. Entretanto, em números absolutos, continuamos apresentando o menor valor nacional, na ordem de 204 reais, contra 365 reais da média nacional e 452 reais do Sudeste, mais de 2,2 vezes o rendimento médio nordestino.

Com tamanhas disparidades, é natural que apareça o desejo de mudança rumo aos grandes centros, especialmente nas regiões que apresentam economia mais dinâmica e includente, tendo portanto melhores oportunidades de emprego.

Mas a migração, evidentemente, não resolve sua vida, porque, para o nordestino pobre, sem qualificação profissional, sem grau avançado de escolarização, as oportunidades são poucas. E, mesmo migrando, o nordestino acaba se confrontando com outro grande problema gerado pela desigualdade: o preconceito.

Sua sustentação lógica está na rejeição ao trabalhador menos qualificado, o mais desesperado pela busca de melhores condições de vida. Esta migração, que durante muito tempo foi bem vinda pelos produtores do Centro-Sul do País, que se beneficiavam da mão-de-obra barata numa ocasião em que a qualificação profissional não era tão necessária, agora representa uma ameaça, na mentalidade das pessoas.

Este preconceito está no subconsciente até das melhores e mais bem intencionadas cabeças, como ficou demonstrado no infeliz episódio no qual o Ministro José Graziano associou o aumento da violência em São Paulo com a migração nordestina, justificando dessa maneira, para empresários paulistas, o combate da fome e da pobreza no Nordeste.

A própria existência de um programa nas condições do Fome Zero se revela um preconceito contra a região. Se no governo passado não havia qualquer política de desenvolvimento regional estruturada, agora neste governo, quando se fala na pobreza nordestina, se apresenta o programa Fome Zero, que é mais um programa assistencialista, quando o Nordeste não quer apenas comida, quer a possibilidade de emprego, de crescimento.

E é nesse ponto que gostaria de incluir mais um elemento para reflexão. Como muito bem apontou Celso Furtado há mais de 40 anos, a diminuição das desigualdades regionais só se dá através da ação e do planejamento.

Concordo com o Ministro Graziano, filtrada sua conclusão preconceituosa, quando diz ser necessário criar empregos, dar educação e garantir o exercício da cidadania no Nordeste. Acrescento que estas ações são fundamentais também para as vastas áreas carentes que existem mesmo dentro dos Estados mais desenvolvidos. Entretanto, se queremos atacar a pobreza do país e as desigualdades entre pessoas, precisamos atacar as desigualdades regionais, porque esta diferença guarda todas as outras diferenças entre brasileiros.

É este o resgate da dívida social, tão presente no discurso do novo governo, que quero lembrar. Mas esse resgate não deve ser feito com o espírito de caridade, apenas. Não se deve dar o peixe, mas ensinar a pescar!

As políticas de geração de emprego devem ser colocadas em prática logo, pois tão importante quanto a renda que elas podem propiciar ao trabalhador brasileiro será a reconstrução da auto-estima do povo mais sofrido.

Também será necessário um maior investimento em educação básica e profissional. É interesse do Nordeste e, mesmo, do Brasil capacitar melhor o seu trabalhador, de forma a atrair maiores e melhores investimentos de empresas interessadas em deixar de atuar nos grandes centros.

Por enquanto, a arma, quase exclusiva, que os Estados mais pobres têm para garantir a atração de novos investimentos é a redução de impostos e a concessão de incentivos fiscais para as essas empresas.

Mas a tão discutida “guerra fiscal” não prima pela destruição de economias competidoras; trata-se de uma necessidade imperativa de gerar empregos e oportunidades locais capazes de diminuir a desigualdade, gerar riqueza e distribuí-la a parcelas maiores da população nacional. E o custo imediato disso, a renúncia a arrecadação, sabemos que é significativo para os Estados mais carentes.

Mas tudo isto, senhoras e senhores senadores, só ocorreu por falta de uma política de desenvolvimento regional no país. O país precisa de uma política de desenvolvimento regional que faça com que as políticas públicas tenham foco para as regiões mais pobres.

O que temos hoje é um país que gasta mais nas regiões mais ricas, gasta até mesmo naqueles investimentos que deveriam priorizar os mais pobres, como o saneamento básico financiado pelo FAT; como as bolsas de financiamento ao ensino superior; como também os recursos de renúncia fiscal, que concentram-se majoritariamente nas regiões mais ricas.

Um dos exemplos mais esdrúxulos vem do BNDES, que investe no Nordeste algo em torno de 15% de sua carteira. E nos dizem seus dirigentes que não investem mais por falta de projetos na região. Ora, um banco que deveria ser do desenvolvimento econômico e social se refugiar neste argumento é demais.

Afinal, se não há projetos no Nordeste, se há um problema desse tipo, há um enigma que um banco deste gênero precisa diagnosticar e resolver, porque é de sua própria natureza institucional.

Quer o problema seja a falta de uma política de estruturação da competitividade, de capacitação de pequenos empresários, de oferta de consultorias, e mesmo pela ausência de políticas fiscais ou de outra natureza que possam equalizar a diferença de custo que determina a localização dos investimentos nas regiões mais ricas, qualquer que seja, está dentro da esfera de sua atuação reverter este quadro.

Do ponto de vista da iniciativa federal, falta muita coisa. Falta até mesmo uma ação decisiva de programas governamentais que visem dotar o Nordeste da melhoria na infra-estrutura de transporte e comunicação, de modo a tornar menor o custo de produção em sua área.

É necessário o apoio do Governo Federal, único capaz de mobilizar recursos equivalentes ao tamanho do problema que deve ser enfrentado. Este apoio começará a vir quando se cumprir a promessa de recriação, em novas bases, da nossa SUDENE, que nunca foi um órgão de caridade e, sim, o articulador dos esforços de recuperação do atraso econômico do Nordeste, ocasionado por imperativos históricos.

Ao contrário disso, o que temos visto nos últimos anos foi a ausência de políticas regionais compensatórias, com certeza não tanto pela vontade ativa dos antigos governantes, mas porque a região poucas vezes tem sido uma prioridade nacional, desde que Juscelino Kubitscheck criou a Sudene.

A extinção da SUDENE, com o pretexto de combate à corrupção, seguida da promessa do governo passado, não materializada, de criação de uma agência de desenvolvimento, que hoje é pouco mais do que algumas salas com alguns funcionários sem autonomia de ação, foi tão danosa para a região quanto a pretensa corrupção existente.

A verdade não deve ser oculta, Srªs e Srs. Senadores.

É forçoso reconhecer que aquele modelo de Sudene exigia revisão. Precisamos agora de um sistema de incentivos fiscais seletivos, voltado para o desenvolvimento de setores estratégicos, baseado na criação de pólos de excelência e na integração de cadeias produtivas, como também no apoio à pequena e média empresa.

Não cabe mais para as necessidades da economia do Nordeste a existência de um modelo de intervenção que não se adapte às reais necessidades dos estados, não cabe mais um sistema de incentivo destituído de foco, sujeito à desvios e corrupção. Precisamos de uma verdadeira agência de desenvolvimento.

A ação consciente e planejada do Governo Federal, em esforço conjugado com os Governos Estaduais, deverá ser focalizada, portanto, não na caridade, embora reconheça a urgência de determinadas situações de combate à miséria e à fome, mas na geração de oportunidades de desenvolvimento.

Somente assim poderemos quebrar o círculo vicioso da concentração regional de renda, do crescimento desigual e da transferência de renda dos Estados pobres para os ricos na forma de perda da capacidade produtiva.

É importante ressaltar neste momento a informação anunciada aqui nesta casa pelo ministro Guido Mantega, em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos, de que o governo vai incluir ações de política de desenvolvimento regional no próximo Plano Plurianual.

Aliás, faça-se justiça, eu pude ouvir do próprio presidente Lula, em encontro na Bahia, a necessidade de se retornar com o planejamento estratégico nas políticas de governo. Esperamos que a prática confirme a intenção.

Nas minhas primeiras semanas de Senado, pude rever aqui vários colegas com os quais convivi nos últimos anos, na função de governador: a senadora Roseana Sarney, os senadores Tasso Jereissati, José Maranhão, Mão Santa, Garibaldi Alves, João Capiberibe. Certamente acumulamos uma expertise sobre a questão das desigualdades regionais, da necessidade de políticas de desenvolvimento, e nossa atuação integrada, conjunta, muito ajudará nossas regiões.

Nós sabemos que os governos do Nordeste não precisam de esmola. Precisam de espaço de articulação, que deverá ser a própria SUDENE.

Precisam, enfim, retomar as rédeas de sua história, para demonstrar que:

·     SIM, o Nordeste é econômica e socialmente viável;

·     QUE é possível, com pouco esforço organizado, colocar a região no caminho do desenvolvimento auto-sustentado; e

·     QUE, ENFIM, o nordestino é um povo trabalhador, competente e arrojado, capaz de dissipar, na prática, qualquer imagem negativa que dele se tenha quando se confunde falta de oportunidade com falta de capacidade.

Muito obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância. Agradeço também aos Srs. Senadores pelos apartes que ilustraram meu pronunciamento.


             V:\SLEG\SSTAQ\SF\NOTAS\2003\20030409DO.doc 5:56



Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/04/2003 - Página 7070