Discurso durante a 47ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Expulsão da empresa brasileira EBX, pelo Presidente da Bolívia. Solicitação de transcrição, nos Anais do Senado Federal, do discurso proferido pelo Embaixador Marcos Azambuja, em reunião do PFL em São Paulo.

Autor
José Jorge (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: José Jorge de Vasconcelos Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. POLITICA ENERGETICA.:
  • Expulsão da empresa brasileira EBX, pelo Presidente da Bolívia. Solicitação de transcrição, nos Anais do Senado Federal, do discurso proferido pelo Embaixador Marcos Azambuja, em reunião do PFL em São Paulo.
Aparteantes
Alvaro Dias, Flexa Ribeiro.
Publicação
Publicação no DSF de 28/04/2006 - Página 13651
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • GRAVIDADE, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, EXPULSÃO, EMPRESA NACIONAL, CONSTRUÇÃO, SIDERURGIA, DESCUMPRIMENTO, CONTRATO, AMEAÇA, DESAPROPRIAÇÃO, ATIVO, PREJUIZO, BRASILEIROS, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).
  • REPUDIO, DECISÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONSTRUÇÃO, GASODUTO, LIGAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, ARGENTINA, SUPERIORIDADE, GASTOS PUBLICOS, ESTUDO, OPINIÃO, ORADOR, AUSENCIA, VIABILIDADE.
  • PROTESTO, PARALISAÇÃO, GASODUTO, LIGAÇÃO, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO SUDESTE, REGISTRO, ABASTECIMENTO, USINA TERMOELETRICA, ESTADO DO AMAZONAS (AM).
  • LEITURA, TRECHO, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, CONFERENCIA, EMBAIXADOR, APOSENTADO, ANALISE, POLITICA, AMERICA LATINA, DEFESA, PRESERVAÇÃO, INTERESSE, BRASIL.
  • OPOSIÇÃO, ENTRADA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Presidente da Bolívia, Sr. Evo Morales, expulsou a empresa brasileira EBX , que estava construindo uma siderúrgica em Puerto Quijarro, na Província de Germán Busch.

O Governo boliviano está cogitando em expropriar os ativos da empresa EBX. Trata-se de um flagrante descumprimento de contrato, que terá graves efeitos futuros para a República da Bolívia. Quem não cumpre um contrato é suspeito de não cumprir os outros.

O empresário brasileiro Eike Batista já havia investido U$50 milhões dos U$148 milhões previstos para a siderúrgica. Portanto, um terço dos investimentos já estão realizados. O investimento total no país vizinho seria de U$330 milhões, gerando seis mil empregos.

A EBX agora pensa em transferir a empresa para o Paraguai ou trazê-la para o Brasil, para Corumbá. A desmontagem da siderúrgica terá um custo de U$20 milhões, além dos riscos de uma batalha judicial para permitir a retirada dos equipamentos instalados na chamada Zona Franca boliviana.

O novo Governo boliviano ameaça também com a nacionalização das jazidas de petróleo e gás, que afeta os interesses da Petrobras, que tem U$1,5 bilhão investidos na Bolívia.

Lula quer fazer um supergasoduto - as fotos estão nos jornais -, orçado em algo entre U$17 bilhões e U$23 bilhões, para trazer gás natural da Venezuela para o Brasil, a Argentina e o Uruguai, gás esse que, diga-se de passagem, não tem tanto assim na Venezuela. A Venezuela tem muito petróleo; quem tem muito gás mesmo é a Bolívia, que tem esses problemas que estamos vendo aí.

O Brasil, a Venezuela e a Argentina deverão desembolsar U$10 milhões em estudos prévios de análise e viabilidade econômica e técnica da obra. Essa é uma obra para a qual não há projeto, para a qual não há idéia. É um gasoduto de milhares de quilômetros, que vem da Venezuela e atravessa toda a América do Sul para chegar até a Argentina e o Uruguai, e, na realidade, a viabilidade, inclusive ambiental, desse projeto é difícil de ser prevista.

A implementação do gasoduto deve começar em 2009 e a conclusão estaria prevista para 2017. A única segurança do Brasil é uma promessa verbal do Presidente Hugo Chávez de que o gás chegará “muito barato” para os países da região. Ora, todos sabem que o gás está-se tornando uma commodity internacional. Vai chegar o momento em que o gás vai ser como o petróleo: ele vai ter um preço internacional e ninguém vai vender o gás mais barato para ninguém.

E o que é mais importante: quem acredita na palavra de Hugo Chávez? Essa é a pergunta. O Presidente Hugo Chávez não é uma pessoa ponderada, em cuja palavra se possa acreditar, para algo que vai começar a funcionar em 2017.

Enquanto isso, o Presidente boliviano Evo Morales classificou o supergasoduto como “uma maluquice”. Na Petrobras, o supergasoduto já tem até um apelido: “transpinel” ou “pinelduto”. Ele, na realidade, é uma coisa de loucos, como estamos vendo agora na América Latina.

Enquanto isso, gasodutos como o Gasene, por exemplo, que vai ligar o Sudeste ao Nordeste - o risco de falta de gás no Nordeste vai-se transformar num risco nacional; hoje é um risco maior -, e o gasoduto Coari-Manaus, que vai permitir que as termoelétricas de Manaus funcionem com o gás natural - hoje elas funcionam com óleo combustível, óleo diesel, etc e geram uma enorme conta que, diga-se de passagem, é paga pelo consumidor do Brasil inteiro, por meio da chamada conta CCC -, esses dois gasodutos estão parados. Para o Gasene agora se licitou um pequeno trecho ligando o Rio de Janeiro ao Espírito Santo.

Então, na realidade, Presidente Tuma, não há dinheiro para se fazer as coisas normais que deveriam ser feitas. Não há dinheiro para se fazer o gasoduto Gasene, o Coari-Manaus, importantíssimos, e aparecem mais de US$20 bilhões para se inventar um gasoduto ligando a Venezuela, a Argentina, o Brasil e o Uruguai, um supergasoduto, atravessando inclusive a floresta amazônica. Imaginem o impacto ambiental que vai causar um gasoduto que vai atravessar a floresta amazônica.

Vale citar o pronunciamento do Embaixador Marcos Azambuja, um grande diplomata brasileiro, hoje aposentado, em recente palestra, proferida segunda-feira, no Instituto Tancredo Neves, no Rio de Janeiro, dentro das palestras que o partido vem fazendo no sentido de realizar uma política para o futuro governo.

O diplomata soube interpretar muito bem o atual posicionamento da política externa brasileira. Para ele:

O momento, contudo, requer muita sensibilidade, já que assistimos ao início de um novo ciclo populista na América do Sul [estão aí a Bolívia, a Venezuela e agora o Peru] que traz consigo uma carga de exaltação felizmente mais retórica e verbal do que real, mas que reclama de nossa parte a administração cautelosa e algum distanciamento. (...)

Será preciso sempre perseguir os nossos interesses estáveis e de longo prazo com países como a Venezuela, Bolívia, Peru - onde o fenômeno populista se manifesta [e de forma mais aguda] - sem nos identificarmos com desmandos ou excessos das lideranças atuais ou futuras desses países.

Fizemos bem em defender a legitimidade democrática na Venezuela quando esta se viu ameaçada. Faremos melhor ao nos dissociar da retórica cada vez mais estridente de Chávez, cuja administração, essencialmente incompetente, é camuflada pelo boom dos preços do petróleo.

            Concedo um aparte ao Senador Alvaro Dias e depois a V. Exª, Senador Flexa Ribeiro.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador José Jorge, quero cumprimentá-lo pela oportunidade do discurso, porque vejo o Presidente Lula apático em relação a essas questões que envolvem interesses do Brasil, especialmente junto a esses dois países a que V. Exª faz referência. Ainda há pouco, o mandatário boliviano, o Sr. Morales...

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Evo Morales.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - ... disse simplesmente o seguinte: “Contratos internacionais não asseguram direito adquirido”. E mais: ele afirmou que as empresas de petróleo ou de serviços que operam no país terão segurança jurídica assegurada pelo Executivo boliviano e não pelo Judiciário. São conceitos jurídicos tresloucados, e é evidente que o Presidente Lula tem de estar acordado para essa realidade, ou agravaremos essa situação. Hugo Chávez chega ao Brasil e administra o MST, elege o Pedro Stédile seu representante pessoal e dá lições de conduta dizendo como o MST deve proceder, que tipo de invasão deve realizar... Enfim, interferência indevida em assuntos que dizem respeito à soberania do nosso País. Então, é preciso que o Presidente Lula adote uma postura de líder. Aliás, o Presidente Lula desejava ser o líder universal. Quis andar pelo mundo, tentando conquistar uma posição de liderança, e nós fomos submetidos a determinados vexames que poderiam ter sido evitados. Mas nós estamos, agora, neste momento, diante de uma situação de constrangimento que envolve o Brasil, a Bolívia e a Venezuela. Então V. Exª tem toda a razão em vir à tribuna e chamar a atenção do Governo brasileiro para esta realidade.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Muito obrigado a V. Exª.

Concedo um aparte ao Senador Flexa Ribeiro.

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA. Com revisão do orador.) - Senador José Jorge, V. Exª faz um pronunciamento da maior importância. Como é reconhecido por todos, essa nova alucinação, o projeto faraônico do “transpinel”, mostra bem a atitude de los hermanos, como bem disse a jornalista Miriam Leitão. É importante que, ao invés de se gastar tempo e a atenção da sociedade brasileira com essas fantasias, se trabalhe naquilo que realmente pode ser executado, como o gasoduto Gasene e o Coari-Manaus, com extensão até Belém, citados por V. Exª. Ontem, eu disse que, nós do Pará, também queremos ter acesso ao gás natural.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - V. Exª não quer esperar esse gasoduto.

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA) - Isto que quero lhe dizer: não dá para esperar o “transpinel” para chegar com o gás a Belém. É preciso que façamos Coari-Manaus, que o liguemos a Belém ou que tragamos o gasoduto do Nordeste para ligar com Belém. São essas fantasias que levam a Nação brasileira a deixar de acreditar neste Governo que discursa muito e pouco faz.

O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Obrigado, Senador.

Na realidade, isso gera um prejuízo enorme, pois os investidores ficam confusos, sem saber o que realmente ocorre. Ninguém vai investir seu dinheiro se não houver uma política clara e consistente.

Por outro lado, nosso interesse com a Bolívia, cada vez mais em conseqüência da presença da Petrobras e de outras empresas brasileiras naquele país e da operação do gasoduto, requer a construção de uma relação eficaz e pragmática, marcada também pelo necessário distanciamento de algumas posições e algumas causas de Evo Morales.

Dito em outras e simples palavras, o Brasil é sócio natural e permanente de seus vizinhos, mas não é interlocutor solidário de eventuais governantes cujas agendas não nos dizem respeito e nos causam, em alguns acontecimentos, evidente embaraço e constrangimento.

É importante destacar o que está dito acima: um Brasil crescentemente maduro e racional terá que conviver com lideranças de rumos incertos em alguns países próximos e terá que separar a legitimidade deste Governo, democraticamente eleito, de bandeiras e sentimentos que não são nossos e que muitas vezes sequer nos convêm.

Em outro ponto do seu ilustre pronunciamento, o Embaixador exprimiu um sentimento que tenho colhido em minhas conversas pelo País.

Segundo ele:

É natural que cada Governo busque aparecer como inventor de algumas, senão de todas as rodas. Isso é da natureza do jogo, e não há talvez como corrigir. Registro, entretanto, a minha impaciência com um comportamento que sugere que a nossa história não conta ou não houve e que o Brasil, com trajetória de mais de cinco séculos, teria sido inventado ontem.

Efetivamente, o Presidente Lula, todos os dias, diz: “nunca, neste País, se fez isso”; “nunca, neste País, se fez aquilo”. Nós também dizemos agora, imitando-o: nunca, neste País, se viu tanta incompetência e tanta corrupção.

Para encerrar, Sr. Presidente, gostaria também de levantar a questão da entrada da Venezuela no Mercosul, outra coisa gravíssima. O Mercosul, essa associação entre o Brasil, a Argentina, o Uruguai e o Paraguai, já tem muita dificuldade de funcionar. Apesar de tanto tempo de existência, ainda não chegou a resultados palpáveis como poderia ter chegado.

A entrada da Venezuela no Mercosul seria um tumulto total, porque a Venezuela, como se diz, praticamente não é uma economia de mercado, não é uma democracia representativa, como os outros países. Tem um presidente que, apesar de eleito democraticamente, governa como se ditador fosse, porque o Congresso não tem Oposição.

Imaginem os Srs. Senadores e as Srªs Senadoras se não tivéssemos Oposição aqui!

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. JOSÉ JORGE (PFL - PE) - Já vou encerrar, Sr. Presidente.

            Com nossa Oposição pequena, porém atuante, conseguimos evitar muita coisa aqui. Lá, na Venezuela, não há oposição; todos os Deputados e Senadores são da Base do Governo. Então, imaginem o que pode acontecer!

            Quanto à entrada da Venezuela no Mercosul, o Brasil, em final de Governo, deveria ser contra, deveria deixar que o próximo Governo eleito, brasileiro, tomasse essa decisão.

            Ao concluir, gostaria de interceder junto ao Presidente Lula para que não tome medidas sérias, como a assunção de compromisso com um gasoduto desse porte ou com a entrada da Venezuela no Mercosul ao final do seu mandato, pois os parceiros preferenciais do atual Governo não são os mais confiáveis para o nosso futuro, como demonstrou essa crise envolvendo o novo governante da Bolívia, que considera Lula um irmão maior.

            Sr. Presidente, encerro solicitando a V. Exª a transcrição nos Anais da Casa da palestra realizada pelo Embaixador Marcos Azambuja no Rio de Janeiro, no Seminário do PFL.

            Muito obrigado. Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR JOSÉ JORGE EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

Palestra do Embaixador Marcos Azambuja realizada no Instituto Tancredo Neves, recentemente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/04/2006 - Página 13651