Discurso durante a 53ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem pelo transcurso, hoje, do Dia do Índio; e outros assuntos.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA INDIGENISTA. DIREITOS HUMANOS.:
  • Homenagem pelo transcurso, hoje, do Dia do Índio; e outros assuntos.
Aparteantes
Randolfe Rodrigues, Wellington Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 20/04/2011 - Página 12016
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA INDIGENISTA. DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, INDIO, COMENTARIO, HISTORIA, LUTA, VULTO HISTORICO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), DEFESA, COMUNIDADE INDIGENA.
  • NECESSIDADE, AGILIZAÇÃO, TRAMITAÇÃO, PROPOSIÇÃO, DEFESA, DIREITOS, COMUNIDADE INDIGENA, IMPORTANCIA, IMPLEMENTAÇÃO, POLITICA INDIGENISTA.
  • REGISTRO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, PARTICIPAÇÃO, PSICOLOGO, PSICANALISTA, REPRESENTANTE, PROFESSOR, ALUNO, DEBATE, VIOLENCIA, JUVENTUDE, IMPORTANCIA, FAMILIA, PERIODO, ADOLESCENCIA, NECESSIDADE, FACILITAÇÃO, ACESSO, TRATAMENTO, PSIQUIATRIA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Randolfe, que falará após o meu discurso, Senadoras e Senadores ainda presentes nesta sessão, são quase 21 horas. O Senador Wellington Dias, o Senador Suplicy e o Senador João Vicente Claudino estão heroicamente resistindo aqui - repito: são quase 21 horas -, para que os Senadores concluam seus pronunciamentos.

            Ontem, aqui, fiz um pronunciamento. Embora o texto estivesse escrito, eu improvisei. E recebi e-mails de alguns descendentes de povos indígenas e também de descendentes dos chamados afro-brasileiros, que queriam ouvir o meu pronunciamento na íntegra. Eu disse: “Está bem! Então, faço o pronunciamento amanhã, que é o Dia do Índio”.

            Quero dizer a V. Exª, Senador Wellington - e eu o disse aqui ontem -, que falamos, e falamos corretamente, em Comissão da Verdade na África do Sul, na Argentina e em uma série de países e a queremos também no Brasil. Cheguei a dizer ontem que, talvez, precisássemos de uma Comissão da Verdade para contar a verdadeira história do povo indígena e do massacre que aqui aconteceu. Poderíamos fazer com que, na mesma Comissão da Verdade, fosse contada a verdadeira história do povo negro, que foi sequestrado na sua pátria-mãe África e que aqui foi tratado como animal, eu diria, com a escravidão, com o açoite, com o pelourinho. Muitos foram jogados dos navios. Outros negros e negras tentavam voltar para a África nadando, no momento em que estavam sendo colocados nos navios; muitos conseguiam se rebelar e tentavam voltar, nadando, e, é claro, morriam.

            Então, tomara que, um dia, a gente consiga colocar nos livros escolares essa história verdadeira dos negros e dos índios! Existe uma lei que fala desse tema., mas essa lei não é aplicada em 20% dos Municípios brasileiros.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Com certeza.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Veja: o próprio nome “índio” já diz da ousadia dos que vieram aqui. Nem lhes perguntaram do que queriam ser chamados e já os batizaram logo de “índios”, e pronto. Estamos falando, Senador João Vicente, de 50 mil anos, em que já se reconhecia a presença do homem no Brasil, nas Américas. São Raimundo Nonato, situado na região da Serra da Capivara, hoje, é reconhecido por cientistas dos cinco continentes do planeta, por todas as organizações, porque, ali, havia a presença do homem há 50 mil anos atrás. Aliás, Senador Paim, há um detalhe, e, por isso, é importante que V. Exª mostre isso aqui: segundo estudos da Drª Niède Guidon, ali vivia uma das mais avançadas civilizações para sua época. Eles trabalhavam com cerâmica ali muito antes que em outras regiões do planeta. Ela apontava um dado interessante outro dia, em uma palestra que ela fazia, que achei fantástico: a forma do homem conviver com a natureza. O desapego à coisa material era tamanho, que, quando morriam, eles eram enterrados naquelas urnas, naqueles potes, com todos os seus pertences. Seria o mesmo de alguém, hoje, ser enterrado com seu carro, com seu relógio, com todas as suas coisas. Eles mostravam uma preocupação muito grande com a natureza. Então, há muita coisa que a gente pode aprender com nossos antepassados. O fato de terem sido mantidos em muitos lugares, ainda de forma original, abre-nos grandes possibilidades. Muito obrigado.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - V. Exª me concede um aparte?

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Vou passar, de imediato, a palavra ao Senador Randolfe,. Antes, porém, quero dizer que, mesmo na sala de aula, quando a gente fala do continente africano, a gente não fala dos países desenvolvidos de lá, só fala da Etiópia, desse ou daquele país em estado de miséria absoluta. Mas, se olharmos para o Egito do passado, veremos que ali havia a medicina mais avançada do planeta. Mas, na sala de aula, a gente não aprende isso, a gente não aprendeu isso. Por isso, digo que seria muito bom que se falasse só a verdade.

            Ouço o Senador Randolfe.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - Senador Paim, no mesmo sentido que o Senador Wellington ainda há pouco destacou, essa denominação para a data de hoje de Dia do Índio parece-me inadequada. Seria melhor que fosse chamado de Dia dos Povos Originários, porque - foi muito bem destacado - a palavra “índio” veio da casualidade de uma denominação, pois os europeus, ignorantes sobre o conhecimento que, inclusive, já havia na América, imaginavam que suas navegações os estavam levando às Índias. Tenho um orgulho especial do meu Estado, entre os vários que tenho, Senador Paim: o de ser o único Estado da Federação que tem todas as suas reservas indígenas demarcadas. Há um conjunto de povos no Amapá: Guaiampis, Tiriós, Galibis, Galibis-Maruornos e Uaçás. O povo Uaçá tem um ensinamento, um legado que deve servir de reflexão para todos nós. Veja só: o povo Uaçá habita a margem esquerda e a margem direita do rio Oiapoque, ou seja, os dois lados da fronteira, o brasileiro e o francês. Eles têm os mesmos hábitos e a mesma cultura e falam a mesma língua. Ou seja, a artificial fronteira cunhada pelos europeus não os separou, a artificial fronteira criada pelos europeus não separou suas culturas e não os separou da unidade que possuem. Então, sua sugestão é belíssima: aqui, deveria haver uma Comissão da Verdade. Talvez, devêssemos alterar essa denominação, com a qual, acredito, nem os próprios povos indígenas se identificam, porque a reivindicação à identificação deles - e é assim que eles devem ser tratados - é como povos originários. Na América, havia um conjunto de civilizações muito mais avançado do que a própria civilização europeia. E o mais destacado disso é que, na América, não havia uniformidade entre essas civilizações: havia uma cultura asteca no norte, uma cultura inca no centro, uma cultura maia no centro-sul e a cultura dos povos amazônidas, cada uma com suas diversidades. Realmente, ao longo desses 500 anos, não dá para medir qual chacina, qual genocídio foi maior: se foi o dos povos originários ou se foi o do negro. Ambos devem ser sempre lembrados como os maiores genocídios acontecidos na história humana, neste planeta. Esse foi o genocídio perpetrado pelos europeus com a invasão deles à América.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Muito bem, Senador Randolfe!

            Sr. Presidente, como hoje é o Dia do Índio, vou fazer uma pequena homenagem a eles. Falei ontem de forma sintetizada e aqui vou ler, com rapidez, devido ao horário.

            Uma vez, falaram-me que houve um tempo em que tudo era bom. Tudo era alegre. Era tudo só felicidade. Os deuses olhavam para todos nós. Não havia doenças. Então, não havia pecado. Então, não havia dor, nem febre, nem varíola, nem azia, nem desperdício. Saudáveis viviam os índios. Mas aí esse tempo acabou, foi embora, ficou para trás, pois o ódio chegou e, com ele, os seus hediondos cães de guerra. Navios com suas velas coloridas chegaram. Trazendo o quê? Trazendo cobiça, engano e traição. E, pelos séculos que se passaram, podemos ver os semblantes refletidos, devastados, queimados, torturados, esmagados e mortos. Assim, vivia e ia morrendo a nação indígena. Fala-se em mais de 100 milhões de irmãos indígenas sacrificados, caídos em genocídios, um continente inteiro escravizado. E ali valia o saque, principalmente, ao ouro, à prata, à madeira e à terra.

            Ah! América Latina! O que fizeram com seus filhos que aqui nasceram? Eles só queriam manter o amor à terra, ao sol, à lua; respirar o ar tão respeitado e venerado por eles. Enfim, eles queriam só a vida.

            Victor Heredia assim descreveu o movimento indígena chamado Taki Ongoy: movimento indígena de dimensões complexas que surgiu na América Latina, entre 1564 e 1572, em oposição à invasão do homem estrangeiro. Esse movimento combinava elementos políticos, religiosos e culturais.

            Duzentos anos depois, no atual Estado do meu Rio Grande do Sul, o cacique guarani Sepé Tiaraju, corregedor dos Sete Povos das Missões, e mais de 1,5 mil indígenas são trucidados e tombam em martírio. Ali ninguém há de esquecer - e lá está a imagem dele - o bravo guerreiro Sepé Tiaraju, que não aceitava e não entendia a chamada política externa e acordos internacionais. Queria apenas preservar a sua terra, queria preservar o seu povo, queria manter a liberdade. E ele disse, no Rio Grande, contra a invasão dos estrangeiros: “Esta terra tem dono”.

            A resistência heróica de Sepé não compreendia, porque também não aceitava, o tal Tratado de Madri, assinado pelos reis de Portugal e de Espanha, que dava ao primeiro os Sete Povos das Missões e ao segundo a Colônia de Sacramento, que fica hoje na atual República do Uruguai.

            Sepé Tiaraju é o herói que o Rio Grande jamais vai esquecer, um índio que orgulha todo o povo gaúcho.

            Apresentei, Senador Randolfe, um projeto a esta Casa - o Senado aprovou-o por unanimidade, e o Presidente Lula o sancionou -, considerando o dia 7 de fevereiro o Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas. Essa foi a data em que Sepé e mais de 1,5 mil índios tombaram em defesa do Brasil no Rio Grande.

            Jamais vou me esquecer também de outros mártires como Ângelo Kaingang, Marçal Tupã, Xicão Xucuru, Galdino Pataxó, que foi queimado vivo nesta Capital Federal, Arnaldo Apurinã, Marcos Veron, Dorvalino Guarani-Kaiowá e tantos outros que se juntam lá no céu, na constelação de estrelas que brilham e iluminam os nossos caminhos e daqueles que levam como símbolo as palavras da sua vida, as palavras liberdade, igualdade e justiça.

            Os povos indígenas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, primeiramente, têm direito sim à memória, à verdade, à sua história e à preservação da sua cultura. E também podemos dizer que, paralelamente a isso, direitos que lhes garantam direito à vida, à liberdade, à educação, à saúde, à demarcação de suas terras, à proteção à biodiversidade, ao meio ambiente, ao ensino. Enfim, a tudo que a eles não é dado.

            Existe hoje, no Congresso Nacional, tramitando nas duas Casas, mais de cem propostas sobre o assunto. Sei que é fundamental a aprovação e lembro que o Estatuto dos Povos Indígenas está engavetado há vinte anos na Câmara dos Deputados e de lá não sai.

            Claro que seria importante aprovarmos o Estatuto dos Povos Indígenas ouvindo os povos indígenas. Que a redação que for dada represente uma visão de país, mas também a visão da nação indígena.

            Sr. Presidente, entendemos a luta e a indignação dos lideres indígenas como ouvi hoje das nove horas da manhã até as três horas da tarde, sem parar para almoçar, na Comissão de Diretos Humanos. E o fiz com enorme alegria e satisfação. Se eu fiquei das nove às três da tarde sem almoço, eles também ficaram. Ficaram ali só tomando água, e eu estava com eles, naturalmente, presidindo a sessão.

            Quem assistiu à TV Senado naquele período vai ver que na expressão, na fala, no gesto de cada um havia uma carga muito forte de emoção, de sentimento, de rebeldia. Mas é um povo que demonstrou ali a sua resistência e a sua coragem de dizer o que pensa.

            Que bom que estamos em uma democracia. Lá cada um disse o que pensa da Funai, do Congresso, do Senado, da Câmara, dos órgãos de governo, do Presidente Lula, da Presidente Dilma.

            E eles disseram no final: “Que bom, Senador. Enfim, podemos aqui, pelo menos, expressar o que pensamos!”. E pediram-nos gentilmente duas pequenas coisas. Uma é que eles querem ser recebidos pela Presidente Dilma. Acredito que a Presidente - faremos o pedido em nome da Comissão de Direitos Humanos e, creio, em nome do Senado - há de receber uma comissão dos líderes dos povos indígenas.

            Disse a eles que, no momento do governo Lula, eu presidi uma audiência aqui no Petrônio Portella, Senador Rondolfe, com mais de mil líderes indígenas. Mais de mil. Foi uma sessão forte. Muito forte. De lá, encaminhei um pedido, e o Presidente Lula recebeu a comissão de líderes dos povos indígenas. Tenho certeza de que a Presidente Dilma também há de receber a comissão de líderes dos povos indígenas. Eles pediram isso.

            A outra questão é que se formasse uma comissão especial que se debruçasse sobre a realidade dos povos indígenas e que, dentro do possível, visitasse algumas regiões do País para ver a realidade deles, como vivem as crianças, como são as áreas de saúde e de educação, como é, enfim, sua vida e a miséria a que muitas aldeias estão submetidas.

            Acordamos que iríamos encaminhar ao Presidente do Senado a formação dessa comissão.

            Sr. Presidente, sempre digo que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário só escutam o barulho das ruas e só vão sentir e ouvir o vento das florestas e a batida dos tambores se houver uma grande mobilização. E eles farão aqui, no mês de maio, um grande mobilização. Segundo eles, mais de oitocentos líderes indígenas estarão aqui entre os dias 3 e 5 de maio. Eles pediram que, nesse período, se possível, a Presidente os receba.

            Deixo aqui, Sr. Presidente, com essas palavras, minha homenagem e meu respeito a todos os indígenas do Brasil e, por que não dizer, como eles dizem, da Pachamama, nossa América Latina.

            Sr. Presidente, quero também deixar registrado aqui, neste horário, que não é nem fim nem início, às 21 horas e 12 minutos, que estamos fazendo debates na Comissão. Já tivemos algumas audiências e reuniões. Houve uma audiência pública oficial sobre a questão da violência no Brasil, principalmente - mas não só - a partir do caso do Rio de Janeiro, gravíssimo, em que doze crianças foram covardemente assassinadas, discutindo o que está acontecendo.

            Senador Randolfe, ontem ou anteontem, eu assisti a um carro parar e a três jovens descerem do carro, dando 30 ou 31 facadas em outro jovem, devido a sua orientação sexual. Também não consigo entender e não aceito outra cena que vimos. Aliás, quem vê pensa que é filme de terror ou de ficção, que não é real. A filmagem mostra um outro carro correndo pelas ruas de Santos, se não me engano - o outro foi na Paraíba -, e atiram em oito jovens: um faleceu e sete ficaram feridos. No caso do Rio - não vamos repetir -, doze jovens covardemente assassinados.

            O debate que eu propus, e a Comissão de Direitos Humanos assim o fez, trouxe psiquiatra, psicanalista, psicólogo, representante dos professores e dos alunos. Para mim, o interessante foi que ali não ficamos só na questão de uma política de desarmamento ou não. Claro que é importante desarmar, mas fomos além: qual o compromisso de nós todos na formação da nossa juventude. Foi interessante quando alguns de nossos convidados disseram o seguinte: “Agora vamos querer transformar as escolas em um novo presídio; vamos colocar paredes, cercas elétricas, homens armados na frente, como se nossos filhos estivessem em um presídio para se protegerem”. Outros também disseram, com muita firmeza, que temos de ter é investimento na educação, que temos de melhorar a qualidade do nosso ensino em todos os sentidos, e que haja uma interação entre pais, alunos, professores e o Estado. A partir daí, podemos apontar soluções, como lá foi colocado. Um aluno que surta não tem direito sequer a um clínico geral, devido ao caos da saúde, que todo mundo conhece. Calculem ter direito a um psiquiatra, a um psicólogo, a um psicanalista, enfim, a alguém que vá tratar da sua mente, no mínimo confusa e atrapalhada naquele momento.

            É por isso que - e aqui eu encaminho e quero que V. Exª considere meu pronunciamento na íntegra - eu também aqui faço uma análise de um projeto que relatei e já é lei.

            E aqui a mensagem que recebi da Associação Brasileira Criança Feliz, que completa três anos no dia 25 de abril. Essa associação trabalha com um problema da maior gravidade, que é o dos pais separados, com a chamada alienação parental. Aqui eles explicam e pedem até que eu faça um novo debate. E vou resumir: os pais se separam, é aquela história do mar e do rochedo, em que o marisco é que acaba sendo a parte mais fraca. Qual é a parte mais fraca? A criança. Por isso, aprovamos a Lei da Alienação Parental, que o Presidente Lula sancionou. Eles inclusive vão fazer uma série de manifestações em Porto Alegre e me convidam para estar com eles. Eles também acham que esse foco tem que entrar no centro do debate. A família também. Não é só dizer que a escola é a responsável. A família também é a responsável, em seu conjunto.

            Aqui eles relatam que a criança que é usada indevidamente acaba tendo transtornos em sua vida adulta. Infelizmente, eu relato os fatos que chegaram a mim durante o tempo em que fui relator, e aqui eles só reforçam. O pai ou a mãe joga com a criança. Muitas vezes, há denúncia - 50% dos casos - de exploração sexual da criança pelo pai ou pela mãe, o que não houve, mas é uma forma de ficar com a guarda da criança. Encaminha-se o caso ao juiz, e a criança fica no meio daquele tumulto, de um fato que inclusive não é verídico. Não digo que alguns não sejam verídicos.

            Então, esse projeto relativo à alienação parental tem de ser reforçado no debate para que, efetivamente, na separação... Não estou dizendo aqui - e quero o aparte de V. Exª - que agora vamos condenar o divórcio, a separação. Não é isso. A separação é legítima. Não deu certo... Mas que os pais, de fato, tenham um carinho especial com seus filhos; que eles não sejam usados como instrumentos em uma guerra estabelecida, muitas vezes, no ato da separação.

            Quero que V. Exª considere na íntegra este documento que recebi, mais uma vez. Estarei em Porto Alegre para que a possamos aprofundar a Lei da Alienação Parental, que prevê inclusive a participação da Justiça na proteção da criança em todos os casos, porque esse é o objetivo. Como eles dizem aqui, muitas vezes a situação é forjada pelo pai ou pela mãe, e a criança acaba sendo a grande prejudicada ao longo de sua vida.

            Senador Randolfe.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - Senador Paim, serei bem breve. Acho que V. Exª está alertando para a causa dos males que temos visto recentemente. Temos nos preocupado com os efeitos do que aconteceu em Realengo, no Rio de Janeiro e com o fato lamentável que aconteceu agora, quando um grupo de jovens esfaqueou um travesti.

Então, isso me parece ser o efeito que está a nos chamar a atenção para a necessidade de diagnosticarmos a causa desses problemas. Cheguei, inclusive, a levantar aqui, junto com outros Senadores, o debate sobre desarmamento, refletindo melhor, vendo, inclusive, alguns artigos publicados nesse sentido, dialogando, em especial. Tive a honra de ser o autor da lei estadual do Amapá da reforma psiquiátrica, de acordo com a lei federal do nosso querido Deputado Paulo Delgado, que aprovamos aqui no Congresso Nacional. Hoje, pela manhã, estive em um debate importantíssimo no Conselho Federal de Medicina, convidado pelo Dr. Rosano Barata, que é da Câmara Técnica do Conselho Federal de Medicina. Foi um debate sobre as consequências do crack na vida das pessoas. Dialogando com o Dr. Rosano, chamou-se a atenção - e aí é que está a causa - que a política de saúde mental não é tratada pelo Sistema Único de Saúde com a mesma prioridade de qualquer outra enfermidade. Há uma diversidade de doenças mentais, não só a esquizofrenia, mas o vício do crack é uma grave doença mental, por exemplo. Então, há um conjunto de doenças mentais, de que o nosso sistema de saúde - estou convencido disso - não tem tratado com prioridade. Imagine, no caso do Realengo, concretamente falando, já havia sido diagnosticado: todo mundo sabia que a mãe do rapaz era esquizofrênica, mas não houve nenhuma atenção. Não há nenhum centro de saúde, no Rio de Janeiro, no Amapá, no Rio Grande do Sul, que tenha um atendimento para aquelas pessoas que possam vir a ter algum distúrbio de esquizofrenia. Então, essa é uma causa que não estamos atacando, que não estamos refletindo. Essa é uma causa, é um tema sobre o qual, creio, V. Exª, que muito bem dirige a Comissão de Direitos Humanos aqui, no Senado, pode propor a realização de vários debates. Temos de fazer um balanço da lei da Política Nacional de Saúde Mental, que já tem quase dez anos de aprovação. E temos de fazer um balanço da implantação de Caps pelo Brasil afora, de Centros de Atendimento Psicossociais, e de como estamos enfrentando, por exemplo, o drama da epidemia do crack, que tem assolado a vida da sociedade brasileira. Creio que esse é um debate do momento, um debate para ser travado, para que comecemos a dialogar com o nosso Sistema Único de Saúde, a fim de que seja tratada a saúde mental com a mesma prioridade, com a mesma relevância com que é tratada qualquer enfermidade nos centros de saúde do País.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Muito bem, Senador Randolfe, que reforça a tese que estamos colocando, de que o debate é muito mais profundo do que simplesmente só cuidar das armas. Claro que temos de combater, de buscar o desarmamento, sabendo que é uma vergonha a maneira como as armas chegam às nossas fronteiras, a este País: de caminhão, daria para dizer. Por isso, entendo que, aprofundando o debate nessa linha, inclusive, da psiquiatria, da psicanálise, buscando a ajuda de psicólogos, podemos, efetivamente, buscar a origem dessa violência, que é condenada veementemente por todo o povo brasileiro.

            Cheguei a dizer, quando vi aquelas cenas, que já ouvi falar disso em alguns países, mas nunca no Brasil, como se vê hoje. Já vi isso em filme, mas nunca na vida real como estamos assistindo.

            Mais uma vez, Senador João Vicente Claudino, agradeço a tolerância de V. Exª e peço que considere na íntegra o meu pronunciamento sobre a alienação parental, que é uma contribuição da Associação Brasileira Criança Feliz, que completa, como dizia antes, três anos no dia 25 de abril. E pretendo estar com eles numa série de manifestações, em Porto Alegre, em defesa das nossas crianças.

            E quero dizer, Senador Randolfe, que a Comissão já aprovou que, no mínimo uma vez por mês, faremos, na Comissão de Direitos Humanos, um debate sobre o tema que comentamos, neste momento, da tribuna do Senado, com o aparte de V. Exª, sob a visão, principalmente, da psiquiatria, da psicanálise e dos psicólogos.

            Parabéns a V. Exª.

            Obrigado, Presidente.

 

*********************************************************************************************

SEGUEM, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTOS DO SR. SENADOR PAULO PAIM.

*********************************************************************************************

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma vez me falaram que houve um tempo em que tudo era bom. Tudo era alegre. Um momento feliz em que os deuses olhavam por todos nós.

            Não havia doenças, então, não havia pecado, então, não havia nenhuma dor óssea, nem febre, nem varíola, nem azia, nenhum desperdício. Saudáveis, vivíamos.

            Mas esse tempo acabou. Foi embora, ficou para trás. Pois o ódio chegou e com ele seus hediondos cães de guerra, estranhamente com olhos amarelos.

            Navios com suas velas brancas trazendo cobiças, engano e traição. E pelos séculos que se passaram podemos ver os semblantes refletidos, devastados, queimados, esmagados, torturados, mortos.

            Fala-se em mais de cem milhões de irmãos indígenas sacrificados, caídos em genocídios, um continente inteiro escravizado para saquear o ouro, a prata, a terra.

            América Latina o que fizeram com teus filhos que aqui nasceram junto com a criação da terra, do sol, da lua, do ar, da vida?

            Vitor Heredia assim descreveu Taki Ongoy: movimento indígena de dimensões complexas que surgiu na América Latina entre 1564 e 1572, em oposição à invasão do homem estrangeiro.

            Esse movimento combinava elementos políticos, religiosos e culturais.

            Duzentos anos depois, no atual estado do Rio Grande do Sul, o cacique guarani Sepé Tiarajú, corregedor dos Sete Povos das Missões, e mais de 1500 indígenas são trucidados e tombam em martírio.

            O bravo guerreiro Sepé não entendia de políticas externas e acordos internacionais, apenas desejava preservar sua terra contra aqueles a quem via como inimigos de seu povo.

            A resistência heróica de Sepé não compreendia que o Tratado de Madri, assinado pelos reis de Portugal e Espanha, dava ao primeiro os Sete Povos das Missões e ao segundo a Colônia de Sacramento, que fica hoje na atual república do Uruguai.

            No século passado outros mártires como Ângelo Kaigang, Marçal Tupã, Xicão Xucuru, Galdino Pataxó, Arnaldo Apurinã, Marcos Veron, Dorvalino Guarani-Kaiowá, e outros tantos se juntaram à constelação sagrada das estrelas que iluminam os caminhos que nos levam ao destino que nos espera, que é o de alcançar uma terra sem males.

            Os povos indígenas, senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, primeiramente, tem direito sim à memória, à verdade, à sua história, à preservação da sua cultura.

            E paralelamente a isso, direitos que lhes garantam acesso à vida, à liberdade, à demarcação de suas terras e proteção a biodiversidade, a saúde, ao ensino.

            Existem hoje no Congresso Nacional, tramitando nas duas Casas, mais de cem propostas sobre o assunto. Sei que é de fundamental importância a aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas.

            Sabemos que os interesses contra o estatuto são enormes. Mas, entendemos também que só alcança a vitória quem está na luta, exigindo os seus direitos.

            Eu sempre digo que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário só escutam o barulho das ruas, o vento nas florestas e a batida dos tambores, se houver mobilização e ação.

            Deixo aqui com essas simples palavras a minha homenagem, o meu respeito, a minha adesão à causa, a todos os indígenas do Brasil e da “pacha mama”, a nossa América Latina.

            Era o que tinha a dizer.

            Muito obrigado.

 

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, outro dia recebi mensagem da Associação Brasileira Criança Feliz que completará 3 anos no dia 25 de abril.

            Essa Associação trabalha com um problema muito grave sobre o qual já discorri nesta Tribuna, a alienação parental.

            Naquela fala explicamos um pouco o que é a alienação parental e suas danosas conseqüências.

            Acredito que valha a pena rememorarmos um pouco do que foi dito: o que vem a ser alienação parental? Em linhas gerais, é quando um dos pais (ou dos detentores da guarda) prejudica o estabelecimento ou a manutenção de vínculos com as crianças ou adolescentes.

            Com os divórcios vem, muitas vezes, a frustração e dor da separação e esses sentimentos levam muitos pais a programarem os filhos contra o outro pai.

            O fenômeno, que segundo psicólogos e juízes vem ganhando uma expressão preocupante, chega a extremos como acusações infundadas de abuso sexual. As crianças são vítimas e os pais também.

            Filhos muitas vezes chantageiam o pai, por exemplo, baseados em exemplos de coação que vem sofrendo pelas mães.

            Esta é apenas uma manifestação da síndrome de alienação parental, uma psicopatologia pouco conhecida da opinião pública, mas que, segundo psicólogos e juízes, vem aumentando nos casais divorciados, com sérias implicações para as crianças e pais.

            Nos casos mais graves esta patologia, associada à frustração da rejeição e à incapacidade de superar a dor sem recorrer à vingança, através dos filhos, chega mesmo a originar falsas acusações de abuso sexual, o que é bem mais frequente do que se pensa.

            Estima-se que, em cerca de metade dos divórcios problemáticos, há acusações ou insinuações de abuso sexual contra os pais.

            Este tipo de acusação predomina quando os filhos são mais pequenos e, por isso, mais manipuláveis, sendo induzidos a confirmar a teoria das mães.

            E, às vezes, basta uma leve insinuação, assessorada por hábeis advogados, para instalar a dúvida num juiz e restringir as visitas, agora que o tema da pedofilia faz surgir um alarme social sem precedentes.

            Essa é uma das razões pelas quais um número crescente de especialistas tem defendido uma maior especialização dos magistrados que tratam com processos de regulação do poder paternal e o apetrechamento dos tribunais com assessores em psicologia.

            Sr. Presidente, o fato de as crianças manipuladas não conhecerem a teoria da alienação parental, não evita as marcas profundas que ela vai deixar.

            Infelizmente a criança é levada a odiar e a rejeitar um pai que a ama e do qual necessita. O vínculo com o progenitor pode ficar destruído para sempre.

            Já se sabe que a depressão crônica e a incapacidade de adaptação social podem ser fardos a carregar por toda uma vida.

            De acordo com o presidente da Associação de Pais e Mães separados, Apase, Analdino Rodrigues Paulino Neto, pais separados em conflito prejudicam os filhos desde a mais tenra idade. Ele afirma que “desde os dois, dois anos e meio a criança começa a perceber o confronto que há entre o casal. Isso vai afetando o crescimento da criança de diversas formas.

            Elas perdem o interesse nas aulas, afastam-se de coleguinhas, algumas fogem de casa o que, em casos mais extremos e não raros, pode levá-las para drogas e exploração sexual”.

            Eu lembro, Srªs e Srs. Senadores, que frisamos naquela fala que o principal fator para evitar que tenhamos crianças expostas a essa situação é a consciência dos pais.

            Mas, tudo piora quando os pais ou responsáveis que praticam a alienação não têm consciência do que estão fazendo. Talvez quando passarem a ter essa consciência poderá ser muito tarde, pois a vida dos filhos já terá sido atingida.

            Precisamos de ações eficazes para coibir esse tipo de violência contra os filhos. Em 2010 o Deputado Régis de Oliveira apresentou o PLC 20 que visava inibir a alienação.

            Eu tive a alegria de ser relator desse projeto na Comissão de Direitos Humanos e hoje ele já é Lei.

            A Lei da Alienação parental prevê ainda que a Justiça possa determinar acompanhamento psicológico de pais e filhos ou impor multa ao genitor que cause alienação parental.

            Isso em casos em que, por exemplo, ficar comprovado que um dos pais proíbe ligações do filho para o pai ou a mãe que não tem a guarda; impede contato em dias de visita; orienta funcionários a não deixar o filho a ter contato com o ex-cônjuge; fazem denúncias falsas de agressão, ameaça, crimes contra a honra ou outros; agridem fisicamente o ex-cônjuge em locais não públicos e imediatamente se deslocam para locais públicos, para forjar um pedido socorro por terem sido agredidos. A Justiça poderá, inclusive, alterar a guarda da criança ou adolescente.

            Sr. Presidente, nós vamos realizar uma audiência pública no Senado para aprofundar o assunto e para levar à população informações acerca do tema.

            Não queremos passar para a Justiça a responsabilidade de educar. O que costumo dizer é que a lei é um dos meios que podemos utilizar para chamar atenção para determinado ponto.

            A Lei faz com que as pessoas pensem melhor no que estão fazendo. Prova disso são, por exemplo, o Estatuto do Idoso, a Lei Maria da Penha, o Estatuto da Criança e do Adolescente.

            Hoje estamos pensando diferente sobre esses temas porque lá atrás alguém detectou o problema e brigou para que ele fosse reconhecido pelo Estado. Ou seja, o Estado tem de ser parceiro das pessoas na solução desse mal.

            Quero finalizar esse pronunciamento cumprimentando a Associação Brasileira Criança Feliz pelo seu 3º aniversário e desejar sucesso em sua programação de uma semana.

            As atividades iniciarão dia 25 de abril, com uma sessão plenária na Câmara de Vereadores de Porto Alegre e abertura oficial da “I Semana de Conscientização da Alienação Parental de Porto Alegre” e encerrarão dia 1 de maio com uma manifestação no Brique da Redenção, em Porto Alegre.

            Quero agradecer ainda, de coração, o convite especial que recebi para participar do Jantar de Confraternização, dia 30 de abril.

            Bem, isso é tudo, mas preciso ressaltar uma coisa: De uma vez por todas, é preciso que se compreenda que a ruptura que acontece é entre o homem e a mulher e que os filhos continuarão sendo filhos de ambos, para sempre.

            Filhos não são instrumento de vingança!!!

            Era o que tinha a dizer.

            Muito obrigado.


Modelo1 5/8/246:52



Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/04/2011 - Página 12016