Pronunciamento de Ruben Figueiró em 19/02/2014
Discurso durante a 13ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Referência a artigo escrito pelo Sr. Ives Gandra Martins sobre a situação dos médicos cubanos no Brasil e críticas às relações entre os Governos brasileiro e cubano.
- Autor
- Ruben Figueiró (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
- Nome completo: Ruben Figueiró de Oliveira
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, SAUDE, POLITICA EXTERNA.:
- Referência a artigo escrito pelo Sr. Ives Gandra Martins sobre a situação dos médicos cubanos no Brasil e críticas às relações entre os Governos brasileiro e cubano.
- Aparteantes
- Alvaro Dias, Jarbas Vasconcelos.
- Publicação
- Publicação no DSF de 20/02/2014 - Página 44
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, SAUDE, POLITICA EXTERNA.
- Indexação
-
- COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, PROFESSOR, IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, ASSUNTO, CRITICA, CONTRATAÇÃO, MEDICO, ORIGEM, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, PARTICIPAÇÃO, PROGRAMA DE GOVERNO, MOTIVO, DIFERENÇA SALARIAL, VIOLAÇÃO, DIREITOS HUMANOS, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, TEXTO.
O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco Minoria/PSDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Jorge Viana, Srªs e Srs. Senadores, senhores ouvintes da Rádio Senado, senhores telespectadores da TV Senado, senhoras e senhores aqui presentes, entendo que a tribuna do Senado, que me honra ocupar neste instante, tem sido há mais de séculos, e enquanto prevalecer o regime democrático com toda a expressão de sua liberdade, um templo de debates sobre temas que tiveram o condão de empolgar a opinião pública. E dela, nós, Senadores e Senadoras, somos conduzidos, por ideal de identidade e mesmo por conveniência política, a abordá-los, comentá-los sob o nosso ângulo de visão.
É o que me leva a proclamar minha voz neste instante. Não sei se V. Exªs tiveram a oportunidade de compulsar as páginas da Folha de S.Paulo, edição de domingo último, e dele extrair por leitura o artigo de um grande jurista e lúcido cientista político, o professor emérito de universidades e de entidades de estudos de problemas nacionais Ives Gandra da Silva Martins, sob o sugestivo epigrafo -: “O Neoescravagismo Cubano”.
Sei que entre V. Exªs poderá haver vozes e opiniões divergentes. Mas sei também que, nesta Casa de debates nacionais, o cruzamento de ideias e o confronto entre elas trazem a luz solar que ilumina o que já afirmavam os pensadores da Antiguidade: o encontro com a verdade verdadeira.
O Prof. Ives Gandra faz algumas afirmações das quais me permito estender comentários. De antemão, Sr. Presidente, Senador Jorge Viana, requeiro o registro integral do artigo “O Neoescravagismo Cubano” como parte integrante deste meu pronunciamento.
Depois de ler o artigo, atentei-me ao fato de que o Brasil está cometendo o sério e grave erro de desrespeitar a própria Constituição em troca de um acordo com a Ilha de Fidel e de Raul Castro. Acordo esse até agora incompreensível para nós, que tanto prezamos pela democracia, pelo direito de ir e vir, pela liberdade de opinião e expressão e pela livre iniciativa - só para citar alguns dos preceitos mais importantes da nossa Carta Magna.
O Prof. Ives Gandra traz informações acerca do contrato de trabalho dos médicos cubanos. Não é preciso ser nenhum jurista ou especialista em Direito Constitucional para perceber o desrespeito descarado à nossa Lei Maior.
Se a Constituição diz que é vedada a diferença salarial para o mesmo tipo de serviço por motivo de sexo, cor ou estado civil, entendo ser plausível e necessário acrescentarmos, aí, também, a vedação às diferenças salariais entre os estrangeiros que participam do Programa Mais Médicos. Cubanos, espanhóis, portugueses, ou seja lá de que nacionalidade forem, eles estão desempenhando a mesmíssima função no Brasil e precisam ter a isonomia respeitada. Todos vieram para preencher a lacuna da falta de doutores nos rincões mais distantes de nosso País.
Por que, então, o Brasil aceitou a condição do governo Cubano para exportar mão de obra praticamente escrava de lá para cá? Todos os médicos estrangeiros recebem R$10 mil por mês. Já, para os cubanos, US$400, menos de R$1 mil. Qual é a lógica disso, senão uma maneira enviesada de o Brasil sustentar a ditadura cubana? Pergunto eu.
É só fazer uma analogia, ou seja, uma operação lógica, mediante a qual se suprem as omissões da lei, aplicando à apreciação de uma dada relação jurídica as normas de direito objetivo disciplinadoras de casos semelhantes, para inferir que não seria nenhum absurdo acrescentar ao art. 7º, inciso XXX, da Constituição, a interpretação de que os médicos estrangeiros que desempenham a mesma função, dentro de um mesmo programa governamental devem receber o mesmo salário no final do mês.
Destaco, aqui, Sr. Presidente, Srs. Senadores, um trecho do artigo de Ives Gandra que julgo essencial para perceber o quanto a decisão do Governo brasileiro é equivocada e inconstitucional. Diz ele - abre aspas:
A leitura do contrato demonstra nitidamente que consagra a escravidão laboral, não admitida no Brasil. Fere os seguintes artigos da Constituição brasileira: art. 1º, incisos III (dignidade da pessoa humana) e IV (valores sociais do trabalho); o inciso IV do art. 3º (eliminar qualquer tipo de discriminação); o art. 4º, inciso II (prevalência de direitos humanos); o art. 5º, inciso I (princípio da igualdade), inciso III (submissão a tratamento degradante), inciso X (direito à privacidade e honra), inciso XIII (liberdade de exercício de qualquer trabalho), inciso XV (livre locomoção no território nacional), inciso XLI (punição de qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais); art. 7º, inciso XXXIV (igualdade de direitos entre trabalhadores com vínculo laboral ou avulso); e muitos outros que não cabe aqui enunciar, à falta de espaço, [diz o eminente Jurista].
Sr. Presidente, na semana passada a Associação Médica Brasileira (AMB) anunciou um serviço de apoio a profissionais estrangeiros insatisfeitos com o Mais Médicos. A entidade concede orientação e assessoria jurídica aos que quiserem solicitar refúgio ou asilo político, além de oferecer um curso para o Revalida, o teste que permite a um médico estrangeiro atuar normalmente no Brasil.
A AMB também empregou a cubana Ramona Rodriguez, que deixou o Programa em Pacajá, interior do Pará. Contratada para exercer funções administrativas de assessoria à instituição, a médica desertora trouxe o assunto à tona novamente quando fugiu do Norte e veio para Brasília.
Também ressalto, Sr. Presidente, que o procurador do Ministério Público do Trabalho responsável peio inquérito civil instaurado em agosto do ano passado para apurar as condições de trabalho dos contratados pelo Programa Mais Médicos já adiantou que a iniciativa federal descumpre as leis trabalhistas brasileiras. Segundo ele, não estão previstos nos contratos o pagamento de férias remuneradas e de 13° salário. Ele também deve pedir em relatório tratamento isonômico entre os profissionais cubanos e os demais participantes do Mais Médicos.
Felizmente vivemos numa democracia consolidada há um quarto de século e podemos contar com instituições públicas ou da sociedade civil organizada, como as que citei, para gritar contra a arbitrariedade e o desrespeito descarado às normas legais.
O Sr. Jarbas Vasconcelos (Bloco Maioria/PMDB - PE. Com revisão do aparteante.) - V. Exª me permite?
O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco Minoria/PSDB - MS) - Com muito prazer, concedo o aparte ao eminente Senador Jarbas Vasconcelos.
O Sr. Jarbas Vasconcelos (Bloco Maioria/PMDB - PE) - Meu caro Senador Rubem Figueiró, este tema trazido à tribuna por V. Exª, tem uma dimensão maior dito por uma pessoa da sua respeitabilidade.
O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco Minoria/PSDB - MS) - Obrigado, Exª.
O Sr. Jarbas Vasconcelos (Bloco Maioria/PMDB - PE) - V. Exª é um Senador atento, assíduo e que tem tido um comportamento de muita coerência aqui nesta Casa. E, quando vem à tribuna para denunciar o exagero dessa relação incompreensível entre o Governo do Brasil e a ditadura cubana, V. Exª presta realmente um serviço inestimável à democracia, aqui no nosso País. Ao estranhar o Executivo fazer o que faz,...
(Soa a campainha.)
O Sr. Jarbas Vasconcelos (Bloco Maioria/PMDB - PE) -contaminado, como toda a América Latina, com essa coisa de Cuba e da Venezuela. V. Exª questiona o Programa Mais Médicos, que poderia ser entendido pela população brasileira, mas não com esse desvio de conduta de se pagar apenas e tão somente US$400,00 a um médico cubano, quando outros médicos também e igualmente estrangeiros recebem bem mais. Lembrando, ainda a questão do dinheiro liberado para a construção de um porto em Cuba. Enquanto aqui, no Brasil, V. Exª sabe, não temos portos. Não temos também estradas, aeroportos e o Brasil financia, através do BNDES, 80% da obra, de quase R$ 1 bilhão, do porto de Mariel, na República Cubana. De forma que eu quero trazer a minha solidariedade a V. Exª, o meu respeito e, sobretudo, a minha admiração...
(Soa a campainha.)
O Sr. Jarbas Vasconcelos (Bloco Maioria/PMDB - PE) - ... pela sua conduta e como homem público.
O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco Minoria/PSDB - MS) - Eminente Senador Jarbas Vasconcelos, as palavras de V. Exª constituem uma dádiva a mim. Eu estou em minha atividade parlamentar, com certa interrupção, há mais de 30 anos, e receber expressões tão carinhosas, tão respeitosas de uma figura como V. Exª, para mim, é o coroamento da minha vida pública.
Eu agradeço profundamente as palavras de V. Exª. E quero dizer que tenho também por V. Exª extrema admiração, pela firmeza das suas posições políticas desde o tempo em que não era permitido uma voz tão livre quanto essa que nós temos hoje. V. Exª sempre esteve na vanguarda dos ideais maiores da nossa democracia. V. Exª tem também o meu mais profundo respeito.
(Soa a campainha.)
O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco Minoria/PSDB - MS) - Muito obrigado. E incorporo as expressões que V. Exª disse com relação à analise que acabo de fazer sobre a situação do Programa Mais Médicos.
Sr. Presidente, se me fosse possível, eu gostaria de conceder também a palavra ao meu Líder Senador Alvaro Dias.
O Sr. Alvaro Dias (Bloco Minoria/PSDB - PR) - Serei rápido, Sr. Presidente. Subscrevo as palavras do Senador Jarbas Vasconcelos e quero dizer a V. Exª que, no conteúdo, o seu discurso atende exatamente as expectativas da maioria do povo brasileiro, que está indignada com esta relação comprometedora do Governo brasileiro com o governo de Cuba, da Venezuela. Especialmente neste caso dos Mais Médicos a irritação se alarga. Hoje divulga-se que o Governo brasileiro está tentando convencer o governo cubano a aumentar para US$1.000,00 o pagamento dos médicos que participam no Brasil desse programa Mais Médicos. É uma relação espúria essa do Brasil com o governo de Cuba. Há uma paixão no ar, há uma paixão dos governantes brasileiros pelo regime cubano. Que se apaixonem por quem quiserem, mas não levem...
(Soa a campainha.)
O Sr. Alvaro Dias (Bloco Minoria/PSDB - PR) - ... para Cuba o dinheiro que é do povo brasileiro, como nesse caso do Porto de Mariel, como esses dez mil por médico que se encaminham para o governo cubano, nesse esquema de verdadeira escravidão branca, um sistema escravagista que é reeditado neste século, lastimavelmente. O Governo brasileiro é cúmplice de arbitrariedades, de violência, de prepotência, de corrupção lá fora. Por que essa cumplicidade toda? Em nosso nome? Em nome do povo brasileiro? Que sejam cúmplices às suas custas, e não à custa do povo do País. Muito obrigado, Senador, pelo aparte. Mais uma vez os parabéns.
(Soa a campainha.)
O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco Minoria/PSDB - MS) - Muito obrigado, Senador Alvaro Dias. Como sempre, as expressões de V. Exª coincidem perfeitamente com o meu ponto de vista.
Sr. Presidente, me dê alguns segundos para completar o meu pronunciamento. É rápido.
Vou além, estamos contrariando inclusive a Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida também como Pacto de San José da Costa Rica. É interessante ressaltar que desde 1998 o Brasil aderiu expressamente à jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
No art. 6º da Convenção está expressamente proibida a escravidão e a servidão; no art. 7º é garantido o direito à liberdade pessoal.
O contrato dos médicos cubanos proíbe a liberdade de ir e vir e a plena liberdade individual quando impede a opção de pedir demissão e obriga a autorização prévia por escrito da máxima direção cubana, caso o médico queira se casar com um não cubano.
Poderia citar ainda outros artigos do Pacto de San José, mas me atenho a esses, uma vez que são semelhantes ao que está em nossa Carta Magna.
Gostaria apenas, Sr. Presidente, de ressaltar que nesse caso do Mais Médicos entramos na seara das relações internacionais. Pergunto: a troco de quê?
Concluo com o fecho do artigo do Prof. Ives Gandra e sugiro a nossa reflexão, a reflexão desta Casa e de todos aqueles que nos ouvem ou nos assistem. Ele afirma - aspas:
[...] o Mais Médicos esconde a mais dramática violação de direitos humanos de trabalhadores de que se tem notícia, praticada, infelizmente, em território nacional. Que o Ministério Público do Trabalho tome as medidas necessárias para que esses médicos deixem de estar sujeitos a tal degradante tratamento.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, agradecendo a generosidade e a benevolência do tempo que me concede.
DOCUMENTO ENCAMINHADO PELO SR. SENADOR RUBEN FIGUEIRÓ EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)
Matéria referida:
- “ O neoescravagismo cubano”. Autoria: Ives Gandra da Silva Martins. Fonte: Folha de S. Paulo, 17/02/2014