Pela Liderança durante a 106ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da renovação dos debates no Congresso Nacional, em torno de grandes temas em prol de um projeto sério de desenvolvimento do País.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
ATIVIDADE POLITICA.:
  • Defesa da renovação dos debates no Congresso Nacional, em torno de grandes temas em prol de um projeto sério de desenvolvimento do País.
Aparteantes
José Medeiros, Reguffe.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/2015 - Página 27
Assunto
Outros > ATIVIDADE POLITICA.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, DEBATE, CONGRESSO NACIONAL, ASSUNTO, RELEVANCIA, FUTURO, BRASIL, CRITICA, EXCLUSIVIDADE, ENFASE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB).

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Ana Amélia, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, eu aceitei falar antes do Senador Reguffe não apenas pela gentileza dele, mas também porque o que eu vou falar tem um pouco da inspiração de uma conversa que eu tive ontem com ele aqui cedo. Chamou a atenção do Senador Reguffe - e eu acho que a senhora vai estar de acordo com isso - que nós precisamos encontrar uma proposta que saia dessa dicotomia absurda entre PT e PSDB no Brasil. Não é possível que a gente continue achando que o Brasil se divide entre PT e PSDB, Senador Viana - há mais coisas no cenário brasileiro.

            E, ontem, depois dessa conversa com o Reguffe, por coincidência nós assistimos aqui a um debate ferrenho entre PT e PSDB, mas um debate ferrenho sobre o mesmo; um debate ferrenho, mas superficial, em torno da personalidade e do dizer de cada um; em torno das notícias sobre um ou outro. E nada em torno das concepções diferentes do Brasil; nada em torno de um futuro novo para o nosso País. Por exemplo, não se discutiu qual é o novo modelo industrial que este País precisa para sair do atraso de uma economia baseada na agricultura e em outros bens primários, a economia dos commodities ou das commodities, como queiram.

            Faz 500 anos que este País é um país de commodities, começando pelo pau-brasil, pelo açúcar, pelo ouro, pelo café, e com um pouco de indústria - e está caindo a nossa participação industrial no Produto Interno Bruto, mas essa participação industrial que vem caindo é, salvo algumas exceções, como a Embraer, uma indústria dos anos 50, dos anos 70, no máximo. Não é a indústria dos anos 90, do século XXI. Nós importamos tecnologia, ciência, e exportamos soja, ferro e, aqui e ali, alguns produtos industriais que eu gosto até de chamar de primários também.

            E esta discussão não se faz aqui: como é que o Brasil vai virar um país exportador de bens de alta tecnologia, mudando a cara do produto? Aqui se discute muito que o PIB é pequeno, mas não se discute que o PIB é feio, é atrasado, é antigo, não é moderno, não é bonito, não tem brilho da alta tecnologia. Não se discute isso.

            Aqui não se discute com seriedade o problema da previdência. A gente discute se deve dar reajuste igual ao do salário mínimo para todas as categorias, todos os níveis de imposto. A gente discute se acaba ou não o fator previdenciário. O Governo manda um novo fator previdenciário, um pouco diferente, mas é a mesma concepção, mas a gente não para para discutir qual é a proposta que nós temos para a previdência para as crianças que vão nascer hoje, e que vão se aposentar daqui a algumas décadas - é como se não existisse o futuro.

            O debate de ontem aqui, e o debate entre PT e PSDB, é como se fosse um debate só do presente. É um debate sem futuro, sem longo prazo, sem décadas na frente. Nós não discutimos aqui como este País vai ter uma inserção competitiva no mundo.

            Durante os anos 50, a competitividade vinha de frear as importações.

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Os nossos carros custavam três vezes mais que os carros estrangeiros, mas nós continuávamos importando o que o Presidente Collor chamou de carroças. Hoje a gente continua parecido, porque carro virou um produto de muita mão de obra, e a gente não consegue dar o salto, por exemplo, para fabricar os robôs que fazem os carros. A gente faz carros, mas não fazemos os robôs; a gente não consegue fabricar, criar os nossos remédios.

            Este é um país - com o qual o debate entre PT e PSDB se acostumou - em que se busca o made in Brazil, quando deveríamos estar querendo o created in Brazil. Não há created in Brazil: hoje em quase tudo que se compra se pode colocar o carimbo feito no Brasil, mas não se pode, sem mentir, colocar criado no Brasil, porque não é criado no Brasil o que a gente consome, salvo os bens primários, porque a Embrapa criou tecnologia para produzir soja no Centro-Oeste.

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - O debate está velho, superado.

            Senadora, eu gostaria de ter um pouco mais de tempo, aproveitando essa solidão que estamos sofrendo aqui.

            Não estamos discutindo a matriz energética, continuamos discutindo aqui se a Petrobras vai ter 30% em cada poço de petróleo ou se vamos abolir esses 30%. Eu quero saber é como não precisar mais de petróleo para fazer os carros andarem. É isso o que temos de discutir: qual é a nova matriz energética, como vamos aproveitar o sol, como vamos aproveitar o vento, e não apenas essa discussão sobre o papel da Petrobras no movimento das coisas no Brasil.

            Nós precisamos discutir aqui como ter uma instabilidade institucional neste País, e não estamos discutindo. Nós vivemos em um período de instabilidade profunda. Antigamente, quando mudava o Presidente da República, mudava-se; hoje, quando muda o Presidente da Câmara, a gente treme!

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Quando muda o Presidente do Senado, este País treme! Antigamente, era quando os generais mudavam.

            Nós vivemos em um período de instabilidade. É impossível fazer um debate político aqui dentro sem consultar os Ministros do Supremo, e há pouco, conversávamos sobre isso aqui com o Senador Jorge Viana. Intrincamos o poder político com o Judiciário.

            Isso é prova de instabilidade. Não sabemos se o que votamos aqui vai ser aceito ou não, porque depende dos juízes. E por culpa nossa provavelmente, e não deles, mas é instabilidade.

            É isso o que deveríamos estar debatendo. Não discutimos como modernizar a gestão neste País com alguns presos à estatização, e outros querendo a privatização, em vez de sabermos como funciona bem neste País, beneficiando o público, seja nas mãos do Estado, seja nas mãos do setor privado.

            Uma coisa pode ser privada e servir ao público; uma coisa pode ser do Estado, e não servir ao público. E isso não estamos debatendo. As universidades brasileiras estatais são públicas - é isso que deveríamos debater aqui - ou são apenas estatais?

            Os hospitais do Estado são públicos ou não são?

            A gente tinha que debater mais fortemente, Senadora, mas, para isso, vai ter que sair da dicotomia PT/PSDB, desses dois discursos que, aliás, eu acho muito parecidos sob o ponto de vista do conceito fundamental do Brasil, como também o nosso e o de todos os partidos - não são só PT e PSDB -, porque não estão trazendo o novo.

            Nós estamos discutindo os erros do passado e não os acertos que a gente quer para o futuro! A gente precisa mudar esse debate, trazer uma agenda nova para o Brasil, mas uma agenda nova olhando o novo, não uma agenda nova presa ao velho. Isso, a gente não está fazendo aqui.

            Senador, eu gostaria de dois apartes. Vou passar primeiro para o Senador Reguffe.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Reguffe (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Senador Cristovam, eu queria, primeiro, parabenizar V. Exª por esse brilhante discurso. Eu considero que, hoje, neste País, se discutem muito os projetos de poder, mas não se discute um projeto de país. Ninguém olha para o futuro e discute como chegar ali, qual é a meta e o que fazer para se chegar a essa meta. Não se coloca isso. Hoje, se arregimentam pessoas contra algo, mas não se consegue arregimentar pessoas a favor de algo. A pessoa sabe que é contra aquilo, mas ela não consegue saber o que ela quer colocar no lugar, em termos de ideias, de projetos. A discussão política se resumiu a cargos - se tem cargo no Governo, apoia o Governo; se não tem cargo, não apoia o Governo -, quando a colaboração para um governo deveria ser no plano das ideias, deveria ser no plano dos projetos. Se vir o Governo adotando um projeto correto para a população, apoiar aquilo. Então, V. Exª...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Reguffe (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... coloca em discussão, aqui, um projeto de país: discutir qual é a matriz energética, discutir qual é o futuro, o que nós vamos fazer. Precisa ser debatido isso, e eu sinto, neste momento, uma ausência desse debate, até porque eu sinto que, com o acirramento que nós vivemos no País, parece que o momento não é para quem pensa, para quem reflete, para quem pondera, para quem quer achar um caminho. Parece que o momento é para quem xinga. Vai ter espaço, hoje, nos meios de comunicação, quem xingar mais alto e mais feio, e não aquele que propuser um projeto, não aquele que tentar encontrar uma alternativa. Hoje, se um discurso, nessa tribuna, é crítico, ferrenho e com palavras fortes, esse discurso tem uma ressonância, uma repercussão. Um discurso, nessa tribuna, que formule um projeto, que apresente um projeto de lei não tem a mesma repercussão, porque, simplesmente, hoje, vale mais o ser contra algo do que a proposição de um projeto. Eu concordo com V. Exª...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Reguffe (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... que nós temos que achar uma alternativa a essa polarização e uma alternativa que represente algo novo para este País, até porque a população, do jeito que vê hoje o Estado brasileiro e a política brasileira, não está satisfeita. Nós temos que discutir uma reforma do Estado; nós temos que discutir uma reforma tributária; nós temos que discutir uma reforma política; e nós temos que discutir serviços públicos de qualidade. Com a quantidade de impostos, com uma carga tributária superior a 36% do Produto Interno Bruto, não pode a população receber os serviços que recebe, nas áreas precípuas de atuação do Estado - saúde, educação e segurança -, áreas em que, em minha opinião, o Estado deveria concentrar os seus recursos. A saúde pública, em qualquer pesquisa, dá-se como problema, e não só nesse Governo, não só nos governos do PT, mas nos governos do PSDB e mesmo antes. As pessoas nunca estão satisfeitas, porque não recebem serviços públicos de qualidade. Então, nós temos que fazer uma discussão. Por exemplo...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Reguffe (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... por que as pessoas consideram correto e elogiam o trabalho do Hospital Sarah? Qual é a diferença do Hospital Sarah para os outros hospitais? Por que não se discute a dedicação exclusiva do profissional de saúde no hospital? Por que não se faz essa discussão? Eu penso que nós temos que fazer uma discussão que leve em consideração aquele que recebe os serviços públicos e que hoje não está satisfeito com a qualidade desses serviços. Às vezes, essa discussão, na minha concepção, deveria se sobrepor a essa discussão simplesmente política que também não consegue reconhecer a virtude do que um fez ou do que outro fez. Eu acho que os governos do PSDB tiveram a virtude de alcançar a estabilidade da moeda neste País - isso precisa ser reconhecido -, de colocar em discussão a responsabilidade fiscal: um governo não pode gastar mais do que arrecada. Os governos do PT tiveram também o mérito de fazer um processo de inclusão social.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Reguffe (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Agora, nem um nem outro conseguiu introduzir uma nova relação política. As relações políticas entre Executivo e Legislativo foram muito parecidas, com coisas baseadas no toma lá dá cá; não se discutiu um projeto de País para o futuro; não se consegue olhar para o futuro e ver aonde se quer chegar, ver quais nichos de desenvolvimento vamos atacar, em quais nichos da economia vamos competir com outros países, fazendo uma política de macro desenvolvimento. Eu sinto falta dessa discussão de um projeto de País e não apenas de projetos de poder, como se vê hoje.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado, Senador. O senhor falou dentro, perfeitamente, do meu discurso. Eu fico muito satisfeito de ver essa maneira como o senhor o abordou: “Nós precisamos de um projeto de País!” E hoje, Senador Medeiros, antes de lhe passar a palavra, nós estamos jogando bombons para a opinião pública, debatendo superficialidade. Nada de concreto, de substantivo...

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... para mudar o País a gente debate aqui. Tudo é superficialidade, inclusive a reforma política da maneira como vem sendo feita: pura superficialidade. O concreto, entre algumas coisas que o senhor citou, está ausente daqui.

            Senador Medeiros.

            O Sr. José Medeiros (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Srª Presidente, Senador Cristovam, agradeço pelo aparte. Eu penso que não poderia haver hora mais oportuna para V. Exª fazer esse discurso. Realmente, o debate nacional está raso e em todas as instâncias. Eu vejo que, no momento em que o País está precisando justamente discutir um projeto, um rumo - porque ninguém sabe o rumo -, nós, realmente, temos perdido tempo em amenidades. E “nós” que eu digo é a sociedade inteira. Vejo as pessoas vibrando com a frase de efeito que o Boechat fez contra não sei quem: é a discussão do dia! Existe um provérbio chinês que diz o seguinte: o medíocre discute pessoas; o comum discute fatos; o sábio discute ideias. V. Exª tem sido um sábio porque, sempre que sobe a essa tribuna, V. Exª tem se preocupado com o futuro da educação deste País, com a produção de conhecimento e, agora, justamente nos trazendo...

(Soa a campainha.)

            O Sr. José Medeiros (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - ... com colaboração do Senador Reguffe, esse rumo, ao dizer: “o rumo é aqui, o caminho é aqui!” Eu moro num Estado, Senador Cristovam, em que esse debate de discutir, por exemplo, a matriz energética, para nós, é crucial: queremos usinas de fio d’água ou queremos grandes reservatórios? Eu acho que essa discussão nós deveríamos fazer de novo no momento de crise hídrica. Nós vamos usar usinas de cana só pra produzir álcool ou podemos produzir também energia com elas? São temas que poderiam ser discutidos aqui e que iam fazer uma contribuição para o Governo. Mas, realmente, temos pedido precioso tempo. E eu vejo cérebros maravilhosos que temos aqui realmente perdendo tempo discutindo pessoas, discutindo amenidades do dia a dia, como se fosse uma grande novela política, e a gente ficasse discutindo os personagens. Muito obrigado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Na verdade...

            Senador Reguffe.

            O Sr. Reguffe (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Só pra concluir: na minha concepção, V. Exª tem todas as condições...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Reguffe (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... de liderar esse projeto para um projeto alternativo para o País e que realmente pense no futuro deste País.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado, Senador Reguffe.

            Senador Medeiros, veja o caso do Mato Grosso. Eu já conversei isto com o Governador: o Mato Grosso quer continuar como um celeiro de soja para o mundo ou quer aproveitar a riqueza de hoje da soja e fazer do Mato Grosso um centro de produção de alta tecnologia, um Silicon Valley?

            Essa é uma pergunta, até porque o Brasil já aprendeu que um produto primário enriquece e quebra. Foi assim com a borracha, foi assim com o café, foi assim com o açúcar, foi assim com o ouro. E não vai demorar que se produza soja na África, na metade do caminho para o principal importador, que é a China. E o Mato Grosso poderá, daqui a 20 ou 30 anos, ficar na situação que ficou Belém e Manaus com a borracha, quando foi levada para a Malásia.

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Esse debate está faltando, Senador. Eu gostaria muito de levantar aqui outros temas, que acho que comporiam uma agenda para o futuro, mas o tempo se esgotou e não haveria tempo, mesmo que eu dobrasse esse período. Vou trazer isso outras vezes.

            Inclusive, se tivermos sessão amanhã, quero retomar o debate sobre a necessidade de sairmos dessa polarização entre dois iguais quase, PT e PSDB, que não têm grande diferença de concepção para o futuro do Brasil. Aqui e ali, um investimento maior no Bolsa Família, que o Lula criou no Bolsa Escola. Melhorou-se o Fundeb, que o Fernando Henrique criou com o chamado Fundef. A concepção é a mesma, sem radicalidade, sem reorientação dos destinos do País.

            E o Brasil, talvez... O Presidente Lula disse que o PT e a Presidente Dilma estavam abaixo do volume morto. Não são só esses dois. Não é só o PT nem só a Dilma...

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... todos nós estamos no volume morto. E eu temo que, se nós não agirmos, o Brasil também ficará no volume morto.

            Era isso, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/2015 - Página 27